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Jornal 63: Outubro/Novembro de 2013


30 de outubro de 2013
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GOVERNO DILMA (PT) ENTREGA AS RIQUEZAS DO PAÍS! ABAIXO O LEILÃO DO CAMPO DE LIBRA!

Alexandre Ferraz e Massaru Uematu

O Campo de Libra é o maior campo de petróleo descoberto no mundo. Tem reservas entre 12 a15 bilhões de barris (quantidade igual a todas as demais reservas brasileiras de petróleo nos dias de hoje). Em 10 anos será o maior campo produtor do Brasil. Tem valor estimado entre US$ 1,5 a 3 trilhões de dólares. Mas, está sendo entregue pelo valor irrisório de, aproximadamente, US$ 15 bilhões! (menos de 0,1% do valor do campo).

Além disso, as empresas que o abocanharem, entregarão ao Estado apenas 40% do lucro líquido, ficando com 60% do lucro, praticamente sem ter gastos, já que toda a pesquisa e tecnologia foi desenvolvida pela Petrobras. E para a exploração as empresas podem pegar dinheiro à vontade junto ao BNDES com juros camaradas. O governo do PT é realmente uma mãe para as transnacionais do petróleo.

E ao contrário do discurso, a quantidade vinculada aos chamados royalties é irrisória dentro de toda essa imensa riqueza entregue. Não chega a 15% do valor do petróleo e, após várias divisões, não terá impacto nem de 1% sobre o investimento do PIB em Educação (ler artigo nesta edição).

“Privatizar o pré-sal é um crime, ele é o nosso passaporte para o futuro”

Essa frase acima foi dita durante a campanha, em 2010, por Dilma Rousseff e está gravada. No entanto, com o Leilão do Campo de Libra vai caindo por terra toda e qualquer ilusão de que o PT seja menos privatista ou um mal menor em relação ao PSDB. Só que agora a realidade está se mostrando mais abertamente. Nunca na história desse país houve uma entrega tão grande das riquezas naturais para as grandes transnacionais. Nem mesmo nos anos de FHC em que foram entregues diretamente aos grandes capitalistas, empresas fundamentais para a economia como a Vale do Rio Doce, a Furnas, Bancos estaduais, etc. E nessa privatização há uma lógica cruel: os investimentos são bancados em grande medida pelo BNDES (Banco de fomento controlado pelo governo e que recebe seus recursos do Tesouro), mas os lucros vão para o bolso das grandes empresas.

Diferentemente do PSDB que realizou as privatizações diretamente, com o PT o processo tem sido mais encoberto, nem por isso menos grave, possibilitando o avanço das privatizações com menor questionamento.

Isso porque geralmente o discurso petista vem revestido da ideia de que o Estado não teria condições de realizar as obras e a exploração dos setores em questão (sejam os transportes, geração de energia ou extração do petróleo) tendo por isso que empreitar à iniciativa privada – suposta detentora de tecnologia e de capitais – que operando sob a lógica privada seria mais eficiente do que o Estado. Essa parceria público-privada possibilitaria a exploração mais eficaz e ao mesmo tempo o maior controle petista garantiria para a sociedade uma fatia maior da riqueza obtida.

Ainda de acordo com esse raciocínio, as concessões resultariam em investimentos diretos e indiretos que gerariam emprego e renda. As divisas obtidas com as concessões, assim como as rendas ou royalties posteriores, seriam aplicados nas áreas sociais como Saúde e Educação.

Por fim, ao final do processo teríamos ainda a possibilidade do Estado rever as ditas concessões. De acordo com esse raciocínio as concessões petistas seriam o que há de mais moderno em matéria de conivência entre o Estado e a iniciativa privada. Um mal bem menor frente à privatização tucana e a única possibilidade frente à falência das alternativas socialistas revolucionárias tidas como utópicas.

Muitos trabalhadores são ganhos para a ideia de que com o PT não temos privatização, mas concessões controladas pelo Estado.

A tecnologia de pesquisa e exploração de petróleo na camada do pré-sal é da Petrobras, que inclusive opera em outros países. Já foram realizados 11 leilões e tudo o que é apregoado não se efetiva na realidade. Como exemplo temos Campos dos Goytacazes, o município que mais recebe royalties no Brasil, com um dos piores IDH, além de ser o recordista no estado do Rio em trabalho escravo. O Estado do Rio, que fica com mais de 80% dos royalties, tem os professores mais mal pagos e uma das piores escolas públicas do Brasil e o dinheiro do royalties, até hoje só serviu para colocar chafarizes em praça pública, porcelanato nas calçadas, financiar shows e campanhas políticas. Quanto ao leilão, no caso de Libra, quem arrematar terá direito de explorar o campo por 40 anos. Em quatro décadas, a petrolífera estrangeira vai secar a reserva. Petróleo não tem duas safras. São reservas que não se renovam e levam milhões de anos para se formar.

O Governo Dilma não hesita até mesmo em chamar o exército para garantir os leilões de privatização e entrega das nossas riquezas naturais

Essa entrega dos recursos naturais em prol do lucro dos capitalistas tem inúmeras consequências na vida de todos nós trabalhadores: Desde o aumento do preço dos combustíveis, das tarifas de ônibus (movidos a diesel), passando pela falta de verbas para a Educação e a Saúde públicas, pela precarização e terceirização das empresas privadas que vierem a explorar o Pré-Sal, até a perda de soberania nacional e a destruição ambiental.

O processo de privatização da Petrobrás

A partir dos anos 90, apoiando-se no clima favorável às privatizações pós queda dos Estados Burocráticos da URSS e do Leste Europeu, mas também na derrota da Greve dos Petroleiros (95) contra a qual o governo colocou o Exército para ocupar as Refinarias em greve, foram adotadas uma série de políticas de ataque ao caráter estatal da Petrobrás.

A privatização completa da Petrobrás não foi possível naquele momento pelo passado e pela resistência que se formou, mas houve passos largos nesse sentido. Entre eles podemos citar a quebra do monopólio da extração e do comércio do petróleo. A partir daí começaram os leilões das reservas de petróleo.

A abertura do capital acionário da Petrobrás, permitiu que o capital privado fosse abocanhando uma parte cada vez maior das ações, tendo hoje a maioria, principalmente das ações chamadas preferenciais, que dão maior lucro. 40% dessas ações são hoje negociadas na Bolsa de Nova Yorque e todos os anos recebem a maior parte dos dividendos (lucros).

Na divisão do capital social total a União propriamente dita tem 28,7%, o BNDES (banco controlado pelo governo) tem 10,9% e o BNDES-Par (Fundo do BNDES) tem 6,9%. Assim o governo pode interferir direta ou indiretamente, pois controla o BNDES e o BNDES-Par sobre 46% do capital social total, enquanto que o setor privado de conjunto detém 54%, a maioria. (fonte: site da Petrobrás).

Essa situação tem levado ao questionamento se a Petrobrás já não seria uma empresa privada, ainda que com participação estatal. Esse é um debate aberto no movimento e na organização.

Por outro lado, o Estatuto Social da Petrobrás garante ao governo a maioria (pelo menos 50% +1) das ações ordinárias que são as ações que dão direito a voto. Isso permite ao governo definir a maioria do Conselho Diretor e do pessoal que gerencia a empresa.

O governo poderia recobrar a maioria ou totalidade do capital social da Petrobrás, mas para isso teria que enfrentar seu aliado (o capital financeiro), o que não pretende fazer, pois também defende e aplica a lógica do capital.

Desde o governo Lula vêm ocorrendo movimentos combinados: o PT buscou manter o controle político da empresa, de modo a reorientar suas atividades, colocando-a a serviço de sua política de atração de capital para o Brasil e, a partir de 2009, de sua política anticíclica de combate à crise. O governo também aumentou as operações da Petrobrás em outros países. Por um período evitou reajustar os combustíveis na mesma proporção do mercado mundial e injetou dinheiro do BNDES na empresa através de sua participação acionária. Por outro lado, isso ocorreu reforçando os lucros e o setor privado rentista no capital social total que vem cada vez mais peso nas definições dos rumos da empresa.

Nos últimos anos, a Petrobras também entrou numa escalada de super endividamento. Hoje possui uma dívida líquida superior a quase 3 vezes o que gera de caixa num ano. Em dezembro de 2012, tinha uma dívida de R$ 196 bilhões de reais!

Por essa via ocorre o aprofundamento da lógica capitalista do lucro na empresa à medida que para conseguir pagar em dia os juros de sua dívida, a Petrobras tem que operar cada vez mais sob a lógica do lucro máximo.

Todo esse processo de privatização em várias fases e por vários meios vem provocando uma intensa terceirização e precarização das relações de trabalho, perda e direitos e arrocho salarial na empresa. O número de terceirizados subiu de 120.000, no Governo FHC, para 300.000 no Governo Lula e 360 mil no governo Dilma. Até maio de 2013, 81% da mão de obra nas dependências da Petrobras eram terceirizados. Apenas 19% são funcionários diretos da empresa. Isto inclui atividades-fim, o que é, inclusive, ilegal. Os salários iniciais têm sofrido grande rebaixamento, bem como os ritmos de trabalho aumentado.

Por uma Petrobrás 100% estatal, sob controle dos trabalhadores!

Como dissemos acima, a Petrobrás segue a lógica do capital e em relação à sua privatização está em uma encruzilhada se é que já não a cruzou: ou os trabalhadores impõem a completa estatização da Petrobras em um processo que assumam seu controle ou os governos (seja do PT ou outro) juntamente com a burguesia completarão o processo transformando-a em uma empresa privada.

Defendemos uma Petrobrás 100% estatal sob controle dos Trabalhadores, com o cancelamento de todas suas ações sem indenização (salvo dos pequenos acionistas individuais) e sua saída da Bolsa de Valores.

O controle dos trabalhadores é estratégico!

Para nós, o debate deve ir além da luta pela completa estatização ou reestatização da empresa. Deve-se apontar a serviço de qual lógica dede estar: a lógica de atender aos interesses dos trabalhadores ou ao capital? Isso é importante porque muitas empresas mesmo sendo estatais como a Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil ou os Correios funcionam hoje com uma lógica bem parecida à de uma empresa privada (com pouquíssimas e cada vez menores mediações), com metas, sobrecarga de trabalho, arrocho salarial, serviços privilegiando as empresas privadas, perseguindo e aumentando o assédio moral sobre os seus trabalhadores, etc.

Assim, o desafio fundamental colocado para a Petrobras, assim como para as empresas estatais citadas acima é que possam servir às necessidades da classe trabalhadora, com suas receitas aplicadas nos serviços públicos e ao mesmo tempo em uma exploração racional dos recursos não-renováveis e controle do ambiente; para que isso ocorra é preciso revolucionar a Petrobras rompendo com a lógica do lucro/exploração e colocando-a sob uma outra lógica, somente possível com o controle dos trabalhadores.

Assim, diferente de outras organizações como o PSTU e certas correntes do PSOL, para nós o elemento do controle dos trabalhadores não é tático: é estratégico. Uma proposta genuinamente socialista é necessária para reverter essa situação e o controle dos trabalhadores é imprescindível, ainda mais tratando-se de empresas ligadas ao estado burguês ora existente.

Ao contrário de correntes que defendem uma concepção de socialismo estatista, entendemos que o processo de estatização deve ter caráter transitório e o elemento que pode apontar para além disso é o controle direto dos trabalhadores sob formas concretas como a tomada de decisões em Assembleias ou Conselho amplos compostos por representantes dos trabalhadores da empresa e das demais categorias, eleição e revogabilidade dos cargos de chefia, fim dos privilégios do pessoal de comando com o pagamento de um salário médio de um trabalhador especializado, etc.

Esse programa implica uma luta implacável contra os interesses empresariais, a ordem burguesa e o governo que os defende. Apenas os trabalhadores com sua luta podem impor essas mudanças. Essas mudanças por sua vez só podem ocorrer no quadro de uma ofensiva geral da classe, começando hoje por lutar contra o leilão do campo de Libra, o avanço do processo de privatização que ocorre a passos largos na Petrobras como em todas as demais empresas estatais ou sob controle do governo, tendo como perspectiva um governo revolucionário dos trabalhadores e uma sociedade socialista.

– Abaixo o Leilão do Campo de Libra!
– Todo apoio às Greves e lutas contra aprofundamento da privatização do Pré-Sal e da Petrobrás!
– Não à repressão aos lutadores! Não à criminalização dos movimentos sociais e da pobreza!
– Pela exploração do Pré-Sal 100 % estatal sob controle dos trabalhadores!
– Por uma Petrobrás 100% Estatal sob controle dos trabalhadores!
– Não pagamento da Dívida Pública e investimento desse dinheiro em um Plano de obras que construa e melhore hospitais, escolas, universidades, transportes coletivos e demais serviços públicos!
– Por um governo revolucionário dos trabalhadores!
– Por Uma sociedade Socialista!

As campanhas salariais, a continuidade das lutas e a necessidade da alternativa socialista

 

As categorias organizadas e a burocracia sindical

Todos os anos, entre os meses de setembro e outubro, acontecem as campanhas salariais de importantes categorias nacionais, como bancários, ecetistas (funcionários dos Correios), petroleiros e metalúrgicos. Isso coloca todos os anos a possibilidade da realização de greves unificadas, com as mesmas datas de paralisação, unificação de piquetes, atos e manifestações, etc., que fortaleceriam as lutas dessas categorias e do conjunto da classe. Esse potencial é dificultado ou não se efetiva pelo fato de que a representação sindical dessas categorias está sob controle de burocracias como CUT, CTB, Força Sindical, etc.

Essas entidades não apenas estão sob controle de partidos governistas, como PT e PCdoB, como estão na verdade integradas ao Estado e à gestão do capitalismo no Brasil, por meio de múltiplos vínculos, como o imposto sindical, convênios do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador, que administra verbas do FGTS) os fóruns tripartites (que reúnem representantes do Estado, dos empresários e dos trabalhadores), os fundos de pensão (por meio dos quais os burocratas sindicais se associam à gestão das empresas), etc. Ou seja, as centrais sindicais não apenas apoiam o governo de plantão, no caso exercido pelo PT, mas apoiam e participam da gestão do capital no Brasil.

A nova situação do país e os ingredientes das campanhas salariais

 

Este ano, havia a expectativa de que a mudança da situação política, provocada pelas manifestações de junho, e a intensificação das lutas sociais nos meses seguintes, levassem a campanhas muito mais fortes, capazes de desafiar a aplicação do projeto do governo e da classe empresarial. Depois do pico de mobilização que houve em junho, quando milhões de pessoas saíram às ruas em centenas de cidades, estabeleceu-se uma “rotina” em que as manifestações, ainda que restritas a uma vanguarda, se tornaram constantes, praticamente diárias.

Justamente no período em que acontecem essas campanhas, outros importantes processos de luta se abriram. Na USP os estudantes voltaram a se mobilizar em defesa da democratização da estrutura da Universidade, que ainda carrega restos da ditadura, como o seu estatuto e a própria figura do reitor Rodas. E no Rio de Janeiro, cidade que viveu um estado de mobilização praticamente ininterrupto desde junho, os professores da rede municipal entraram em greve depois de 19 anos, contra um plano de carreira que piora a sua remuneração e as condições de trabalho.

Para completar o cenário, o governo federal marcou para 21 de outubro o leilão do campo de Libra do pré-Sal, com uma reserva estimada entre 26 a 42 bilhões de barris de petróleo, com potencial para produzir mais de um milhão de barris por dia, o que seria comparável a todo o petróleo extraído pela Petrobras em seus 60 anos de existência. Esse petróleo se encontra em camadas ultra profundas, que exigirão alto investimento em inovação tecnológica para ser extraído. O governo quer entregar essas reservas às empresas privadas, a maioria estrangeiras, e financiar os investimentos na tecnologia necessária para exploração por meio dos bancos públicos e do BNDES, dando uma riqueza inestimável e vital para o país de bandeja ao capital internacional. A luta contra o leilão do campo de Libra deveria dar o tom da campanha dos petroleiros ou até mesmo mobilizar o conjunto dos movimentos sociais.

A falta de uma oposição unificada, combativa e antigovernista

Entretanto, mesmo com todos esses ingredientes para que houvesse uma verdadeira mobilização nacional, em defesa das reivindicações dos trabalhadores, da Educação e do controle sobre as riquezas naturais do país, as campanhas salariais transcorreram de maneira extremamente fria, controlada e limitada. O controle das burocracias sindicais sobre os espaços de organização das principais categorias, em cada sindicato de base, cada assembleia de cada categoria, continuou sendo determinante para que não houvesse uma verdadeira greve geral no país e um verdadeiro processo de mobilização.

Assim como em junho fez falta um projeto unificado que desse um direcionamento às manifestações (por exemplo, uma luta global pelo controle do orçamento público, contra o pagamento da dívida e os incentivos às empresas, para aumentar drasticamente os investimentos em saúde, Educação, transporte, moradia, etc.), nas campanhas salariais faz falta uma central sindical ou fórum unitário de mobilização, de oposição ao governo e às burocracias governistas, que conseguisse a unificação das lutas das diversas categorias e movimentos. Faz-se sentir com todo peso a derrota do Conclat, em 2010, que impediu a formação de uma central de oposição a partir da unificação entre Conlutas e Intersindical. Apesar das sérias limitações programáticas e metodológicas dessas entidades, uma central unitária de oposição seria um pólo importante para a unificação das lutas, tanto no campo sindical como no conjunto dos movimentos sociais.

Ao invés disso, a política de suas direções majoritárias (PSTU e PSOL, respectivamente), leva a que cada vez mais essas centrais percam o seu caráter de oposição, classista, combativa e antigovernista. Cada vez mais se aprofundam os vínculos com correntes governistas, como CUT Pode Mais, as chapas com setores burocráticos e oportunistas, os desvios metodológicos (como o caso do Sinsprev RJ de que tratamos na edição passada), etc. Os mesmos interesses aparatistas que determinaram o fracasso da unificação em 2010 somente aumentaram sua influência.

Na falta de um pólo alternativo de unificação das lutas, os processos de enfrentamento seguem atomizados e desprovidos de um projeto totalizante. Mesmo com essa debilidade, a repressão à greve dos professores do RJ despertou uma nova onda de manifestações pelo país, o que demonstra que ainda há disposição de luta pronta para ser mobilizada. Numa dinâmica e linguagem semelhante aos protestos convocados inicialmente pelo MPL em junho, que se massificaram e impuseram a revogação do aumento das passagens (além de trazer à tona uma imensa insatisfação represada e várias reivindicações), sucessivos protestos foram marcados em várias cidades do país, semana após semana, a partir de sites da internet, grupos de facebook e outras redes sociais, com o título de “1milhão pela educação”.

Entretanto, depois de haver absorvido a primeira onda de manifestações, que marcaram a volta das massas às ruas do país após décadas, o governo esperou alguns meses para contra-atacar com o recrudescimento da repressão, quando houvesse apenas um setor minoritário e mais combativo nas ruas. A polícia de SP recebeu a autorização para voltar a usar balas de borracha contra manifestantes, e um delegado enquadrou jovens detidos em São Paulo que participavam de protesto em solidariedade aos professores do RJ na Lei de Segurança Nacional, a mesma da época da ditadura.

No mesmo sentido, a mídia continua o seu bombardeio permanente contra as manifestações, destacando um único aspecto, as ocorrências de enfrentamento com a polícia (a mesma polícia que diariamente procede o genocídio da população negra nas periferias, sem que isso cause escândalo), que levam a depredações, como se isso fosse o único elemento a ser levado em consideração. As pautas de reivindicação dos manifestantes, os problemas sociais que levam milhares de pessoas às ruas, não são nada comparados a atos de violência, invariavelmente causados pela polícia e seus agentes infiltrados nas manifestações, como já demonstrado em vários flagrantes divulgados na internet. Isso é feito com o objetivo de deslegitimar as manifestações, da mesma forma como a cobertura das greves só fala dos transtornos causados ao restante da população, para colocar a opinião pública contra os grevistas.

A defasagem entre a disposição de luta de um setor da juventude e as formas de organização ausentes, movimentos, centrais e partidos, com conteúdo de ruptura radical do sistema, acaba sendo preenchida por grupos como Black Blocks e Anonymous, que fazem da ação direta a sua única virtude, e mesmo não apresentando nenhum conteúdo político, acabam se tornando referência. É preciso construir uma outra referência para as manifestações, tarefa que os movimentos, centrais e partidos de oposição não têm cumprido. Precisamos construir um movimento político dos trabalhadores, que esteja enraizado na base da juventude e da classe trabalhadora, nos seus locais de trabalho, estudo e moradia, em ruptura com o governo e os governistas, que se coloque em luta pelas reivindicações mais sentidas da classe, chocando-se inevitavelmente com a continuidade do sistema capitalista no país e apresentando uma alternativa socialista.

Da ilusão à decepção: a juventude explorada frente ao governo do PT

Juventude Maceió

Um metalúrgico no cargo de maior poder e responsabilidade do Brasil foi o sonho de muita gente durante anos. Em sua trajetória, para uma parcela considerável da população, o PT representava o que havia de mais avançado quando o assunto era justiça social, ética, respeito aos direitos trabalhistas etc. Hoje podemos afirmar categoricamente que não, não foi isso o que aconteceu quando Lula ganhou as eleições em 2002. O Partido dos Trabalhadores traiu várias gerações que confiavam em seu projeto de desenvolvimento nacional. Aqui ressaltamos que desde os anos 80 uma parcela considerável da esquerda brasileira já denunciava o que o PT tinha se tornado: um partido social-democrata que havia abandonado de vez as demandas dos trabalhadores em detrimento de uma política de conciliação de classe com a burguesia. Em seu discurso de posse do primeiro mandato Lula deixou isso bem claro: “transformemos o fim da fome em uma grande causa nacional… essa é uma causa que pode e deve ser de todos, sem distinção de classe, partido, ideologia.” Ou seja, desde o início não restavam dúvidas acerca de qual lado ele estava e a quem suas políticas privilegiariam… os banqueiros que o digam! Um pacto social imposto entre exploradores e explorados – concretizado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – foi o pontapé inicial para o que viria: reformas arbitrárias, privatizações, sucateamento dos serviços públicos e um longo etc.

SUCATEAR A EDUCAÇÃO PÚBLICA E FINANCIAR A INICIATIVA PRIVADA

Numa breve análise das políticas do PT para a educação superior fica evidente o caráter de continuação do projeto neoliberal de FHC (PSDB), onde, a entrada e a permanência (com qualidade!) da juventude pobre dentro da universidade pública se tornou um sonho cada dia mais distante. A lógica é invertida: por excelência o ensino superior público deveria ser destinado para aqueles(as) que passaram suas vidas nas escolas públicas e que encontrariam na universidade o caminho para a sua formação profissional, mas o que vemos é cada vez mais a juventude explorada tendo que “se virar nos 30” para garantir uma graduação em faculdades particulares, mesmo que ela seja precária e voltada apenas para a formação de mão-de-obra barata para o mercado de trabalho. Visto essa situação Lula planeja uma série de reformas que serviriam para “melhorar” esse quadro. Nessa hora, mais uma vez, recorre-se ao pacto social firmado desde o início do seu mandato com a burguesia, financiando pesadamente o ensino superior privado através de medidas como o ProUni (Lei nº 11.096), implantado em 2005. “Antes de sua implantação, o governo federal lançou uma série de documentos que buscavam ‘constatar’ a situação da juventude e seu acesso às universidades. Os dados lançados registram que entre 1998 e 2002, o número de estudantes no ensino médio subiu de 5,7 milhões para 9,8 milhões, sendo que apenas 9% dos jovens entre 18 e 24 anos estavam cursando o Ensino Superior. A solução encontrada para o problema do acesso às universidades, entretanto, não poderia ser pior: o governo Lula alimenta o setor privado como ‘provedor’ de ensino, oferecendo para os estudantes pobres as vagas ociosas dessas universidades.” ( Frente de Luta contra a Reforma Universitária). Nessa parceria entre governo e empresariado da educação, além do financiamento das vagas, a empresa é isenta do pagamento de muitos impostos, como o Imposto de Renda, a CSLL, Cofins e PIS. Disso tudo resulta uma dúvida: porque esse investimento não é feito na universidade pública, garantindo o acesso e a permanência da juventude pobre?!

O estatuto da juventude é um ataque direto à juventude explorada

 

Em 2010 passamos a ter Dilma Roussef como presidenta – troca-se a marionete, mas o roteiro é mantido. Uma das provas concretas dessa continuação é o Estatuto da Juventude, sancionado no dia 05 de agosto de 2013, como uma tentativa de frear o avanço da luta da juventude por um futuro melhor. O documento trata de maneira abstrata vários temas importantes, como o financiamento e direito à educação pública, garantia do direito à diversidade sexual, o compromisso do Estado com a juventude trabalhadora, a violência sofrida nas periferias etc. Essa “maneira abstrata” se concretiza na realidade: milhares de jovens fora da universidade pública, veto ao kit anti-homofobia nas escolas públicas, precarização do trabalho, principalmente no campo, onde o trabalho escravo ainda faz parte do cotidiano em muitos lugares do Brasil, genocídio e criminalização da juventude que vive nas periferias. Ao lado de pontos que foram vetados ou sequer mencionados no tal estatuto, outros foram aprovados de maneira absurda, retirando direitos existentes até então. Parece que Dilma não estava aqui no Brasil no mês de junho quando as manifestações pelo passe livre começaram e se espalharam rapidamente por todo o país, pois essa reivindicação que tanto ecoou das bocas da juventude foi esquecida na formulação do estatuto; e o pior: o governo vetou um item que garantia a meia-passagem estudantil no transporte inter-estadual, ficando claro o ataque a possíveis avanços. O acesso da juventude à cultura também foi atacado diretamente, impondo que apenas 40% dos ingressos de qualquer evento seriam destinados à meia-entrada – um retrocesso, onde antes bastava comprovar que era estudante que a meia-entrada estava garantida; atendendo aos apelos dos empresários da cultura, Dilma disfere esse golpe na juventude pobre. Acatando as imposições do capital estrangeiro, determina que a meia-entrada não terá validade na Copa do Mundo e nem nas Olimpíadas, um absurdo! A presidenta fez questão de deixar bem claro que a meia-entrada será válida mediante a apresentação da Carteira de Identificação Estudantil (CIE) e que ela será produzida pela UNE. Mais uma vez fica explícito o quão necessário é o combate a essa entidade vendida ao governo!

É hora da juventude se organizar!

Junho foi um mês histórico para a luta popular no Brasil, mesmo que de forma não organizada, milhões de pessoas foram às ruas botar para fora sua indignação frente ao estado atual das condições de vida nesse tipo de sociedade, e isso é muito importante! Houveram pautas centrais que impulsionaram os atos, mas quando as massas tomavam conta o que se via era um grito uníssono de revolta contra o que o capitalismo tem a oferecer. Depois de vários anos sem manifestações populares tão grandes seria um erro esperar por uma luta de massas com consciência de classe e um projeto oposto ao do capital. A realidade mostrou que o descontentamento com o sucateamento dos serviços públicos, a taxa de desemprego alarmante, a violência da PM nas periferias, o descrédito nas instituições políticas etc. revelam uma insatisfação com o conjunto da sociedade e não apenas com pontos específicos: esse fato é sintomático! O incrível foi ver a juventude na linha de frente desse processo, convocando atos com milhares de pessoas em todo o país. Uma nova geração de lutadores(as) nasceu e agora o momento é de se organizar para a próxima jornada de lutas. O Espaço Socialista conclama toda a juventude revoltada com a situação de calamidade social para que voltemos às ruas e só as deixemos quando nossas reivindicações forem atendidas!

Pelo passe livre para estudantes e desempregados(as) em todo o Brasil!
Não ao genocídio da juventude nas periferias! PM não é a solução!
Por Hospitais Universitários 100% SUS! Não à EBSERH!
Por 10% do PIB para a educação pública, gratuita e de qualidade para a juventude pobre!

A luta das mulheres à “doce” sombra do patriarcado no nordeste

Daniella Yezzi e Gelvane Andrade

Diante da cultura do coronelismo e do cangaço o nordeste brasileiro carrega, até os dias de hoje, uma particular bagagem de ferrenha violência e opressão contra as mulheres que por vezes extrapolam os limites dos direitos humanos. O patriarcado, guiado pelo ascenso do cultivo avassalador da cana-de-açúcar, presente em todos os âmbitos da vida da sociedade colonial, persiste nas relações sociais e políticas atuais. Tal processo de desenvolvimento da sociedade brasileira nos trouxe um saldo que remonta à barbárie em várias esferas de nossas vidas. E no cotidiano da mulher esse saldo tem-se mostrado muito mais caro. Para analisar a situação precária e estigmatizante das trabalhadoras nessa região do país, em especial no estado de Alagoas, faz-se necessário a retomada de alguns fatores históricos determinantes dessa dura realidade.

Apesar do controle que a coroa portuguesa manteve sobre sua colônia, o poder político no Brasil, do século XVI ao início do século XIX, foi exercido pelos senhores de engenho. A monocultura do açúcar e o grande latifúndio são as marcas desse período. O trabalho escravo sustentava a economia do Brasil nesse período, assegurando a concentração de poder nas mãos de poucos, bem como o modelo familiar vigente. O senhor de engenho ocupava o topo da hierarquia social.

A criação do grande latifúndio e da monocultura fomentou o surgimento do patriarcado, na figura do senhor de engenho, caracterizado pelo domínio de terras, escravos e da própria família. A dominação da mulher pelo homem e o aprisionamento desta à vida doméstica se concretizaram na “necessidade” de uma paternidade inquestionável, de modo que a propriedade privada do senhor passasse para um herdeiro legítimo assegurando a continuidade dos bens por parte daquela família. A casa grande, morada luxuosa do grande patriarca, abrigava não só a sua família como também agregados que lhes deviam lealdade, refletindo o modelo social existente. Ao homem da casa cabia administrar e proteger seus bens, certificar a lealdade e obediência de todos debaixo do seu teto e participar da vida pública.

O papel que a mulher do dono das terras exercia – não por vontade própria, mas que lhe era exigido, de cuidados domésticos e procriação (de preferência, filhos homens) com características criadas e atribuídas historicamente de que é ser inferior ao homem, frágil, submissa e que deve se esforçar para exercer sua “feminilidade” – é reforçado pela Igreja e Estado para controlá-la e mantê-la distante das atividades econômicas, impedi-la de qualquer participação e intervenção nos lucros. Ou seja, coisifica sua existência, transformando-a em algo próximo a um objeto de decoração da casa do patriarca.

Ao passo que tinham suas vontades e necessidades podadas, ainda mais do que as mulheres dos senhores, as escravas domésticas tinham a responsabilidade de criação e até amamentação dos filhos do senhor e para isso era necessário que deixassem de alimentar seus próprios filhos, o que provocava o aumento na taxa de mortalidade infantil entre crianças negras. Além disso, em muitos casos, serviam de brinquedo sexual do patrão, tendo seus corpos estigmatizados como objetos-símbolos de sensualidade e prazer descartável ainda hoje com resquícios em nossa sociedade.

Os vestígios dessa estrutura social se mantêm fortemente presentes em Alagoas. Apesar do surgimento de grandes usinas e de indústrias, a monocultura e a concentração de terras na mão de algumas famílias ajudaram a perpetuar relações de poder em muito semelhantes às dos antigos senhores de engenho. O coronelismo e o patriarcado figuram uma dura realidade em boa parte do interior do estado. Se por um lado o fim da escravidão põe fim ao engenho, as usinas atribuem o poder econômico aos grandes proprietários que assumem também o poder político através do poder do Estado e criam uma sociedade totalmente voltada para a monocultura do açúcar.

QUALQUER SEMELHANÇA NÃO É MERA COINCIDÊNCIA

Ainda temos o pior índice de violência contra a mulher em que, apenas nos dois primeiros meses deste ano, 810 ocorrências foram registradas em Alagoas. No Brasil, uma mulher é agredida a cada 5 minutos. Outras são espancadas a cada 24 segundos. Cerca de 70% dos agressores são os próprios companheiros. As poucas delegacias existentes têm funcionamento precário e não contemplam as necessidades das vítimas, o que agrava o silêncio por parte tanto das vítimas quanto das testemunhas – marca deixada pelo “cabresto” do coronelismo. O desemprego escancarado reflete a discriminação contra a mulher e o discurso dominante dá justificativas que vão desde a incompetência feminina até o “inconveniente” da maternidade, o que inferioriza ainda mais a mão de obra, cujas únicas alternativas restantes são o corte da cana, o trabalho doméstico, a dependência financeira ou a prostituição. A inexistência de creches públicas é uma dificuldade crescente no cotidiano das trabalhadoras domésticas, pois deixam seus filhos e o lar à própria sorte para cuidarem da casa e dos filhos da patroa. Essa é uma das causas do aumento do número de acidentes, raptos e morte infantil.

A necessidade de expansão do capital possibilitou a participação da mulher no mundo do trabalho, porém não foram dadas alternativas para substituir o vazio “deixado” no lar com a sua inserção no mercado de trabalho. O resultado é o aumento de seu nível de responsabilidade e a exploração dupla de sua força de trabalho. A dupla jornada de trabalho, tendo sido naturalizada, é mantida por trás da falsa ideia de emancipação feminina, na figura da mulher moderna.

No que diz respeito à maternidade vemos a violação de direitos básicos na hora do parto e a falta de estrutura e humanidade do serviço público.

Tudo isso somado às péssimas condições de trabalho sentidas, principalmente, na falta de segurança das trabalhadoras que são vítimas da cultura do estupro e da violência, banalizadas pelos diversos aparatos ideológicos, deixa clara a necessidade de mudança desse modelo de sociedade no qual estamos inseridos.

A luta pela emancipação feminina deve ser também uma luta pela emancipação humana. Deve estar atrelada à luta de classes, pois só poderá ser alcançada com a superação do capitalismo. Precisamos compreender que o problema das mulheres não é só um problema de gênero, mas também um problema de classe! Por isso a necessidade da participação dos trabalhadores nas lutas feministas. Unir forças para conquistas, mesmo que pontuais, é de extrema importância: Como a luta por igualdade salarial, construção de creches públicas, funcionamento 24 horas e criação de mais delegacias da mulher com atendimento digno, melhores condições de trabalho, prestação de serviço público de Saúde que respeite a autonomia da mulher sobre o seu corpo, contra o trabalho escravo remanescente nas grandes indústrias e contra a dupla jornada de trabalho. Essas e tantas outras reivindicações só podem ser travadas com a unidade Trabalhadora e Trabalhador.

Também a luta contra a rígida estrutura familiar que estigmatiza a figura da mulher é tanto mais necessária, uma vez que os vestígios da ideologia senhorial ainda se mantêm latentes tanto na família burguesa quanto nas famílias da classe trabalhadora, que quase sempre reproduz de forma incisiva as mesmas relações de dominação. Que possamos nos libertar das algemas do patriarcado e da exploração por uma vida justa e igualitária para a classe trabalhadora!!

Lutar por mais recursos e controle dos investimentos na educação

Núcleos de Professores – Espaço Socialista

O uso constante do dinheiro público para atender aos interesses do empresariado é algo corrente e recorrente. Nesse sentido, se faz necessário defendermos sempre mais investimentos nos serviços sociais essenciais – Educação, Saúde, Lazer, Transporte Público, etc.

Atualmente, menos de 5% do PIB são investidos na Educação, e se considerarmos apenas a Educação Pública, o percentual é ainda menor. Países que deram saltos na Educação investiram por décadas entre 10% e 15% do PIB na Educação Pública.

Mas além de lutarmos pelos 10% do PIB para a Educação Pública Já, é preciso que o controle desse dinheiro esteja nas mãos dos verdadeiros interessados na Educação Pública: os professores, alunos, pais e demais trabalhadores. Isso é muito importante pois, com a crise estrutural do capital, temos visto as empresas buscarem se apropriar do dinheiro público da Educação de inúmeras formas, como parcerias, Projetos, ONG’s, terceirização, etc.

Além disso, é na aplicação em si do dinheiro que se define o projeto de educação a ser implementado. Por exemplo, se o dinheiro será aplicado em recursos e condições de trabalho – salas de informática, laboratórios, excursões educativas e culturais, projetos dos alunos, salário e carreira dos professores –, ou se irá para um projeto de educação voltado apenas para contenção e controle social e para formar uma mão de obra precária – apostilas com conteúdos e atividades impostos de cima para baixo, cobranças burocráticas aos professores, grades e câmeras em salas de aula, privilégios para as direções de escola e Diretorias de Ensino –, ou ainda se irá para projetos educacionais elaborados por fundações, institutos e ONG´s de empresas e bancos – Instituto Itaú Social, Instituto Gerdal, Fundação Bradesco, dentre outros. – que adentram as escolas de modo crescente. Como vemos, o mesmo dinheiro pode servir a projetos político-pedagógicos e interesses de classe opostos.

Assim, não se pode deixar o controle do dinheiro nas mãos dos governos, secretarias de Educação ou gestões escolares. É preciso que o controle do dinheiro e das prioridades seja uma decisão coletiva de professores, pais, alunos e demais trabalhadores, ou correremos o risco de a raposa tomar conta do galinheiro. Por isso, afirmamos que não queremos uma educação sob a tutela do estado; uma educação de qualidade se faz com autonomia das escolas, dos professores e da comunidade escolar como um todo, que devem decidir sobre suas prioridades.

A falácia dos royalties e do “Fundo Social” para a educação

É preciso entrarmos a fundo no debate sobre os royalties do Pré-Sal para a Educação, tarefa até agora desprezada pela esquerda, e que tem levado muitos trabalhadores a acreditarem que a partir de agora teremos de fato um aumento significativo, ou pelo menos razoável, de recursos para a Educação Pública.

Nos movimentos de junho/julho, a Educação Pública ressurgiu como uma das bandeiras centrais. O governo Dilma foi obrigado a vir a público e apresentar alguma proposta. O fez, porém de modo ilusório, bem no estilo petista, apenas com paliativos mínimos, aproveitando ao mesmo tempo para dar legitimidade ao seu projeto maior de entrega do patrimônio público – no caso o Pré-Sal – para as transnacionais.

No dia 14 de agosto, o Congresso Nacional aprovou o projeto de lei que supostamente destina 75% dos royaties do petróleo para a Educação e 25% para a Saúde. Além disso, destina metade do valor do “Fundo Social” a investimentos em Educação e Saúde.

Primeiro, a própria noção de “royalties” implica a entrega do imenso patrimônio natural para empresas que então pagam uma espécie de compensação mínima. Trata-se de um valor extremamente baixo, cerca de apenas 15% do valor obtido pela venda do petróleo. Em outros países, grandes produtores de petróleo, esse percentual chega a 70% ou mais.

Além do mais, destes 15%, nada menos que 78% irão para os estados e municípios, sem nenhuma obrigatoriedade de aplicação na Educação. Somente 22% destes 15% (ou seja, apenas 3,3% do valor da produção do Pré –sal) ficarão com a União e supostamente serão aplicados na Educação.

Porém, tal destinação somente ocorrerá a partir dos novos contratos de exploração, referentes a poços de petróleo leiloados a partir de 3/12/2012. Esses poços entrarão em operação só a partir de 2020!

Outro ponto importante é sobre o chamado “Fundo Social”, criado para receber os recursos do lucro do Pré-Sal, pago pelas empresas exploradoras ao governo.

O valor do piso mínimo que as empresas devem entregar ao governo foi rebaixado. Antes, as empresas teriam que entregar pelo menos 60% dos lucros ao governo. Agora essa parcela caiu para 41,65%! As transnacionais ficaram muito satisfeitas…

Além disso, o projeto inicial do governo era de que apenas 50% dos rendimentos financeiros do Fundo Social fossem para a Educação, e não de seu capital total.

Porém, no calor dos movimentos de junho/julho, o governo teve que aceitar que o total do capital depositado no fundo a cada ano, mais os rendimentos, seriam destinados para a Educação.

Mas espertamente, o governo e sua bancada negociaram o envio de novo Projeto de lei, mais pra frente, no sentido de destinar apenas 50% dos rendimentos do Fundo, e não de seus depósitos totais. Essa manobra é possível, pois até 2020 há tempo de sobra…

Com tudo isso considerado, haverá um aumento de apenas 0,6% a 1% do PIB para Educação a partir de 2022, e cifras ainda menores nos anos anteriores. Ou seja, em 2022, o país estará investindo 6% do PIB em Educação, muito longe dos 10 % necessários!

No fundo, essa discussão da destinação dos royalties do Pré-Sal para a Educação é uma grande cortina de fumaça. Para que a Educação receba uma mínima parte de dinheiro, o país deve entregar suas reservas de petróleo praticamente de graça para as grandes corporações.

Um exemplo desse entreguismo: o leilão do Campo de Libra

Em 60 anos de história, a Petrobrás atingiu uma produção de aproximadamente 15 bilhões de barris de petróleo. O Campo de Libra, descoberto sozinho pela companhia, tem no mínimo cerca de 12 bilhões de barris de petróleo. Mas, de acordo com o edital do governo, para a sua concessão às transnacionais, basta que apresentem o pagamento mínimo de 15 bilhões o que significa aproximadamente 1 dólar por barril! O preço de mercado atual é de, no mínimo, 120 dólares o barril! (fontes: http://noticias.terra.com.br/; http://fnpetroleiros.org.br/?p=3831; http://fnpetroleiros.org.br/wp-content/uploads/2013/09/boletim_fnp_especial_leiloes.pdf)

Só através da luta teremos investimento real na educação e saúde públicas!

É preciso uma ampla campanha de todos os setores de luta e antigovernistas – com vídeos, cartas abertas, carros de som, etc. – esclarecendo a população e chamando à luta contra o desvio do patrimônio público para as empresas. A CSP-Conlutas e a Intersindical deveriam estar voltando toda sua estrutura (dirigem vários sindicatos importantes) para essa finalidade, encampando de fato essa luta.

Infelizmente, vemos apenas campanhas de propaganda para círculos restritos, e a base da classe trabalhadora e setores populares nem imaginam o que está sendo feito com as riquezas naturais do país.

Ao mesmo tempo, precisamos apresentar os pontos de programa que possam resolver de fato o problema da Educação Pública, de modo que se faça sentir na sala de aula. Defendemos então:

– Não pagamento da dívida pública (na prática já foi paga várias vezes), investindo o dinheiro público nos serviços sociais essenciais, particularmente na Educação e Saúde Públicas;

– Exploração do Pré-Sal 100% estatal e sob controle dos trabalhadores, de modo que seja uma exploração em base às necessidades dos trabalhadores, ambientalmente sustentável, e cujas receitas venham na sua totalidade para os serviços públicos, como Transporte, Educação e Saúde;

– Controle público e democrático da utilização do dinheiro da Educação, de modo que seja empregado realmente para as necessidades dos professores, alunos e pais;

Nesse sentido, é preciso incentivar, desde já, tanto os movimentos maiores de rua e as greves, mobilizações, acampamentos, como também a luta e a organização de base nas escolas, seja em reuniões, assembleias de toda a comunidade, formação de comissões conjuntas de professores, pais e alunos, grêmios, participação e cobrança de funcionamento dos Conselhos de Escola, APM, etc;

– Da mesma forma, dado o papel que as gestões de escola vêm assumindo no sentido de aplicadores das políticas governamentais, devemos lutar pela eleição direta para diretores de escola – como já ocorre em alguns estados e municípios Brasil a fora –, pois com isso podemos ter diretores mais comprometidos com os interesses da comunidade escolar.

A disputa Democratas x republicanos na crise orçamentária dos EUA: quando o chá parece coca-cola

Thiago Pierrô

O governo dos Estados Unidos da América (EUA) iniciou em 01º de outubro uma paralisação parcial do setor público, colocando cerca de 800 mil funcionários em licença não remunerada, fechando parques nacionais e suspendendo projetos de pesquisa médica. Tudo porque o Congresso estado-unidense não conseguiu entrar em acordo para aprovar o orçamento do ano fiscal de 2014. Uma vez que a aprovação do orçamento não saía, deveria o governo diminuir seus gastos num curto prazo para garantir o pagamento de certas dívidas que considera essenciais (como títulos financeiros, por exemplo, pagos a certos bancos).

Ao alardear a possibilidade de os EUA não fecharem o orçamento para 2014 e assim dar “calote” no pagamento das dívidas e títulos financeiros que sustentam boa parte da estrutura estatal estado-unidense, as atenções logo se voltaram para o impasse político ocorrido entre democratas e republicanos. De um lado, os democratas, com maioria no senado e alinhados ao presidente Obama e, de outro, republicanos, pressionados por seu estrato mais reacionário, o Tea Party*. Com a mesma qualidade nutricional de um sanduíche do Mc Donalds, mas com a demora de 16 dias, o acordo veio e aumentou o teto da dívida estado-unidense para 17,4 trilhões de dólares, permitindo ao governo fechar o orçamento e realizar novos gastos somente até 15 de janeiro de 2014. A oposição dos republicanos girava basicamente em torno dos pedidos de diminuição dos gastos da estrutura estatal estado-unidense, incluindo aqui o sistema acessível de assistência à saúde, o popularmente conhecido Obamacare.

Quem vê pela primeira vez este tipo de combate entre “democratas” e “republicanos” pode até se perguntar se estamos diante de uma ala de esquerda frente a outra de direita. Não, não é disso que se trata…o embate na verdade tem, de um lado, no máximo, aqueles que são de centro-direita (os democratas); do outro, aqueles que são de direita ou de extrema direita (os republicanos). Ok, ok…mas e por que, então, se engalfinham feito inimigos mortais? Não são eles mesmos representantes do modo capitalista tradicional de governar? Não são eles representantes dos capitais dos EUA e de grande parte do mundo? Sim… é isso mesmo! …só com esses dados, ficamos, então, sem resposta clara sobre os porquês desse germe de crise política. As interrogações continuam pairando em nossas cabeças. Como e onde, então, buscar alguma luz na penumbra deste grande e indigesto fast food, se é que há luz?

Em verdade, o confronto das forças republicanas no congresso estado-unidense é tão somente um embrião do que pode vir a ser ainda mais recorrente. O embate político em curso, em torno da disputa cada vez mais acirrada do orçamento, é reflexo de um ciclo de crise econômica iniciado em 2008 e que vem aumentando a cada ano as dificuldades do governo em administrar suas contas. Entre outras, as consequências da crise desencadeada nos EUA a partir de 2008 são: maior austeridade (leia-se: ataque aos direitos sociais) e, ao mesmo tempo, maior injeção de dinheiro público nas empresas e bancos “grandes demais para falir”. Essa política está sendo implementada desde o início da crise e mesmo assim nem a super-visão do Super-Homem vislumbra uma luz salvadora e reconfortante no fim do túnel. Em geral, os Estados e as corporações encontram-se cada vez mais endividados e os prazos para pagamento de suas dívidas são cada vez menores. Dá-se, então, a disputa ferrenha pelas fatias do orçamento do Estado, ocasionando diversas lutas e disputas… afinal, como se diz popularmente por aqui, “farinha pouca, meu pirão primeiro”.

É nesse contexto, pois, que se pode compreender a atual disputa democratas x republicanos: de um lado, temos os democratas como a manutenção da ordem, a manutenção das políticas acima mencionadas; de outro, os republicanos como uma força política disposta a aprofundar as medidas de austeridade contra a população estado-unidense. E é nesse contexto que o “novo” aparece, demonstra que a disputa não é só orçamentária e que pode explicar um pouco essa aparentemente estranha situação: é o crescimento do Tea Party como força política a chave da explicação.

Obviamente, o movimento Tea Party não começou agora. A ala de extrema-direita do partido republicano defende já há algum tempo um programa econômico radicalmente neoliberal (corte de impostos das empresas e grandes fortunas, corte de investimentos nos programas sociais, fim das regulamentações no mercado financeiro, fim das restrições ambientais às atividades das corporações) e uma visão social fundamentalista cristã (contra o casamento homossexual, contra o uso de contraceptivos, contra o aborto, contra a pesquisa com células-tronco e em defesa do ensino do criacionismo bíblico). O que explica, então, o ganho de força do Tea Party ?

Por um lado, diante da situação social permanentemente instável e com a degradação geral da vida, crescem as organizações de extrema direita perante a parcela mais pauperizada da população, vez que prometem o retorno da velha prosperidade, dos empregos, salários e condições de vida do velho Estado de bem-estar social. Por outro, diante da tendência de queda do lucro das mais variadas empresas, as mesmas organizações de extrema direita simbolizam a oportunidade de o Estado poder intervir para maximizar os lucros dos capitais.

A junção desses fatores com a instabilidade política no cenário das forças que compõem o bloco no poder nos EUA nos permitem entender como o episódio do orçamento deste ano, longe de ser uma derrota, foi uma grande demonstração de força do Tea Party. É propriamente uma alternativa de extrema-direita que surge da disputa no interior da própria burguesia e potencializa essa mesma disputa por caminhos mais e mais nefastos. Assim, podemos ver um deslocamento mais à direita de certa fração representante dos interesses dos capitais, ocasionando o atrito político que acabamos de ver. Uma vez compreendido esse deslocamento, o confronto entre democratas e republicanos deixa de parecer enigmático. Passa-se a compreender que o Chá é um forte representante e com crescente espaço no fast food político dos orgulhosos Estados Unidos da América.


Sobre o Tea Party – o nome foi tirado da “revolta do chá” de Boston, em 1773, quando comerciantes americanos se revoltaram contra o monopólio do chá estabelecido pela Inglaterra e se disfarçaram de índios para jogar carregamentos de chá no mar, no porto de Boston, e esse fato foi o estopim que detonou a formação do movimento independentista, que proclamou a emancipação das 13 colônias em 1776.