Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

Jornal 21: Julho/Agosto de 2007


3 de janeiro de 2009

Os seis primeiros meses do segundo mandato de Lula confirmam as previsões gerais de que esse mandato será de grandes ataques contra os trabalhadores, particularmente contra o funcionalismo público e as categorias mais organizadas.

O PAC, o Supersimples, as Reformas e o ataque ao direito de greve são expressões políticas e jurídicas de um processo de precarização das condições de trabalho e de arrocho dos salários, que já vem ocorrendo dentro dos locais de trabalho e na sociedade e que com o amparo da lei se pretende que seja generalizado e aprofundado. Os únicos ganhadores serão as grandes transnacionais, os bancos e o agro-negócio, ou seja o capital e o imperialismo. Ao contrário do discurso do governo e dos empresários, se eles conseguirem implementar essas medidas, não haverá geração de empregos e sim a precarização dos existentes.

Mas dois novos acontecimentos vêm colocar obstáculos ao governo Lula: a retomada das lutas dos trabalhadores e estudantes e um novo ciclo de denúncias de corrupção envolvendo desde juízes, o presidente do Senado, Renan Calheiros, até o compadre de Lula, e Vavá, seu irmão.

O que está por trás das Operações da Polícia Federal

 Por trás dessa crise política está a disputa pelas verbas do PAC e pelos ganhos com as Reformas. Essa disputa envolve desde os setores da burguesia representados pelo PSDB e DEM, passando por aqueles representados pelo PMDB e envolvendo também a burocracia de estado e sindical, representada pelo PT.

Essa disputa também tem sua expressão ideológica nos diferentes modos com que cada setor pretende levar a cabo as chamadas reformas estruturais. O PSDB e o DEM querem um processo mais direto e com cortes na própria burocracia de estado, no sentido de diminuir rapidamente os gastos públicos, privatizar o que for possível, diminuir os impostos e assim aumentar seus lucros. Já a burocracia e os setores da burguesia representados pelo PT e PMDB pretendem implementar as mesmas reformas, mas querem fazê-lo de forma que suas posições e seus rendimentos sejam preservados. Pela intensidade dos ataques previstos, por sua relação com a CUT, Força Sindical e MST e por seu aprendizado nos anos em que esteve à frente dos movimentos sabem que precisam trilhar um caminho mais mediado e negociado, para evitar um ascenso das lutas apoiando-se para isso no papel de contenção da CUT e da Força Sindical. Ou seja, apesar de haver acordo geral entre todos eles na intenção de fazer as Reformas, há divergências de interesses entre os principais setores da burguesia e da burocracia. Depois da crise do mensalão, estamos agora assistindo ao segundo capítulo dessa disputa que seria risível se não envolvesse o dinheiro dos trabalhadores.

A ânsia dos setores representados pelo PSDB e DEM pelo aumento de sua fatia nos lucros do PAC e das Reformas é tão grande que os leva em alguns momentos a priorizar seus interesses específicos em detrimento do que seriam os interesses da burguesia de conjunto (avançar logo na votação das Reformas), mas isso apenas dentro de certos limites.

O acordo maior no sentido de realizar as Reformas que se expressou no pacto de governabilidade entre PT e PSDB firmado logo após a posse de Lula e Serra ainda é o predominante. Assim, não devemos ter qualquer ilusão no prosseguimento das investigações da Polícia Federal. A intenção não é dar xeque-mate no presidente, mas apenas pressioná-lo para barganhar mais e melhor. Lula permanece blindado como na crise do mensalão, mesmo que agora até seu compadre e seu irmão estejam envolvidos.

Por isso, como vimos das outras vezes, se a questão das denúncias permanecerem restritas ao Congresso Nacional, acabarão em nada. A criação de CPI’s como propõe o PSOL não é uma saída real, pois mesmo que descubra algo, não conseguirá ir a fundo nas investigações a ponto de desmontar qualquer esquema, como ficou demonstrado na crise do mensalão. Pois nesse campo prevalecem as negociatas entre os partidos para que as apurações não passem dos limites e depois se negociem pequenas punições para que tudo fique como antes.

Somente uma ampla e profunda investigação feita pelas organizações dos trabalhadores que sejam independentes e não-governistas (sindicatos, organizações estudantis, etc) poderá decifrar todos os esquemas e garantir que os responsáveis sejam punidos com a prisão e o confisco de seus bens.

O Ressurgimento das Lutas

Se de um lado temos a manifestação da podridão das instituições burguesas, do outro temos o surgimento de algo novo: pela primeira vez desde que Lula foi eleito, os trabalhadores dão os primeiros sinais de reação e luta unitária contra o governo. As greves e mobilizações do funcionalismo público e demais setores organizados da classe trabalhadora, assim como as greves e ocupações nas universidades promovidas pela juventude marcaram a conjuntura política atual. As mobilizações do dia 17 de abril e do dia 23 de maio e várias outras lutas foram a expressão mais clara desse processo. E isso está acontecendo apesar do papel de contenção e peleguismo da CUT e da Força Sindical.

A iniciativa ainda é do governo, dos patrões e de seus aliados, mas estamos em um processo que só começou e nesse momento tende a se fortalecer.

A combinação entre o início das mobilizações e essa disputa mais de fundo entre os setores da burguesia e da burocracia já estão provocando algum atraso no ritmo dos ataques previstos. No entanto sabemos que somente o aumento das lutas, sua unificação e radicalização poderão provocar uma crise política no governo capaz de fazê-lo recuar de seus planos ou até mesmo impor uma derrota maior ao governo e seu projeto.

O peleguismo da CUT e a experiência dos trabalhadores

Primeiro queremos chamar a atenção sobre o papel nefasto da CUT e Força Sindical, pois em outros tempos por motivos muito menores teriam chamado mobilizações e hoje se calam a medida em que subordinaram os interesses gerais dos trabalhadores aos interesses de sua manutenção como burocracia atrelada ao estado burguês e aos interesses dos patrões. A negociata em torno da Reforma Sindical e do dinheiro do Imposto Sindical já realizada e que deve ser baixada como medida provisória nas próximas semanas é o que realmente interessa. Sua estratégia é a fusão entre o sindicalismo e a estrutura de estado em que sua ascensão possa ser contínua até os altos escalões do estado.

O silencio da CUT e da Força Sindical diante da declaração de Lula de que as greves dos servidores públicos são férias é a demonstração cabal de seu total peleguismo.

Essa nova realidade abre a possibilidade de avançar no processo de ruptura dos trabalhadores e dos sindicatos com a CUT e na construção de uma nova ferramenta de luta que seja superior à CONLUTAS e à INTERSINDICAL e sirva de referência muito maior de aglutinação para as entidades de luta.

Assim é totalmente descabida qualquer exigência de que a CUT rompa com o governo Lula, como feita pelos  companheiros do PSTU nas manifestações do dia 23. Pois já está bem claro para todos, e nem a própria CUT esconde, que defende o projeto burguês do governo Lula e que o considera como um governo seu.

O papel de uma organização revolucionária não é contribuir para o aumento da confusão, mas para o esclarecimento da situação. Exigências são corretas para desmascarar as direções burocráticas quando sua posição é dúbia. Esse não é de modo algum a postura da CUT perante o governo Lula na realidade atual.

Do que se trata é de desmascarar a inconsistência de seu projeto pelego e chamar os sindicatos e os trabalhadores a romperem com a CUT e a não sustentarem nem mais um dia essa casta de parasitas.

A realidade exige uma Nova Central Unificada entre Conlutas, Intersindical e demais movimentos e sindicatos que rompam com a CUT!

As lutas aprofundam à experiência dos trabalhadores dos serviços públicos e das categorias mais organizadas contra o governo Lula, as Reformas e também contra a CUT. Isso se expressou no fato de que as mobilizações do dia 23 de junho, ao contrário do que a CUT queria, foram manifestações contra o governo Lula e em sua maioria por fora do controle da CUT. A CONLUTAS foi sem dúvida a vanguarda em chamar e dirigir essas lutas que também envolveram outros setores da classe trabalhadora e dos explorados como Movimento dos Sem Terra, Movimento dos Atingidos por Barragens,  etc.

Apesar de não ter revertido a correlação de forças ao nosso favor, esse primeiro ciclo de lutas tem que servir para tirarmos a conclusão de que é necessário impulsionar, apoiar e unificar as lutas em curso e, em segundo lugar, que é preciso construir uma unidade mais orgânica daqueles que estão contra o governo e contra as reformas. Pensamos que, em um momento histórico que não há nenhuma força de esquerda que consiga mobilizar o conjunto do proletariado, a unidade na luta é praticamente uma condição para a vitória dos trabalhadores.

Assim, ganha importância o chamado feito pela CONLUTAS a todos os sindicatos sérios e combativos que ainda estão filiados a CUT, particularmente aos companheiros da Intersindical a que rompam com a CUT e estabeleçam as discussões no sentido da formação de uma única Central que unifique a CONLUTAS,  a INTERSINDICAL e todos os setores de luta que ainda existem nos demais movimentos sociais como no MST. Independente dos limites que tal iniciativa venha ter, estaríamos efetivamente numa situação muito mais avançada do que nos encontramos. Evidentemente que se abriria todo um debate sobre o programa, projeto, atuação e forma de organização dessa nova central, o que seria extremamente rico além de se constituir definitivamente como um novo ponto de referência para milhões de trabalhadores em todo o país. Com a palavra estão os companheiros da INTERSINDICAL.

Enquanto isso ainda não se concretiza, temos que apontar os novos passos do movimento. Nesse sentido o calendário de manifestações apontado pela CONLUTAS ainda é insuficiente pois prevê duas manifestações: uma no Rio de Janeiro, por ocasião do PAN e outra em Brasília em outubro, mês em que termina o Fórum Nacional da Previdência e o governo deve enviar o projeto de Reforma da Previdência para o Congresso. É preciso ao retomar o 2º semestre discutir e preparar novas manifestações e campanhas no período até outubro de modo que a Marcha à Brasília seja uma confluência de todos os processos de luta deste ano.

Assim, será preciso uma data de mobilizações em agosto e a preparação da Marcha a Brasília. Tal marcha não pode ficar restrita a si mesma, mas ser respaldada por um conjunto de manifestações nos diversos pontos do país, combinando com greves, paralisações, panfletagens, e outras ações que interfiram na produção e circulação do capital.

Superar as Lacunas do Processo de Reorganização do Movimento!

Desde o início deste ano vimos alertando para a necessidade de superar duas lacunas importantes para o avanço do movimento contra o PAC e as Reformas, sem que no entanto as principais correntes e partidos atentem para essa necessidade.São elas:

1) Realizar Plenárias Regionais de Base contra o PAC e as Reformas.

Desde que se iniciou o movimento de unidade na luta contra o PAC e as Reformas, a partir do Encontro de 25/03 em São Paulo, apesar da falas de todos os participantes terem frisado a importância de se levar a luta contra as reformas para a base, não há uma orientação concreta de como isso poderia ser feito. O Espaço Socialista propôs no mesmo Encontro e em momentos posteriores que sejam realizadas Plenárias Regionais de Base contra as Reformas (ver matéria da Plenária do ABC). Essa é uma forma concreta de se juntar milhões de ativistas em todo o país e levar para a base das categorias e dos demais setores sociais a campanha contra as Reformas.

2) Apresentar um Programa Socialista Alternativo às Reformas do capital 

Outra defasagem que precisa ser corrigida é a ausência até agora de um Projeto Alternativo ao PAC e às Reformas, um Programa Mínimo que possa ser abraçado e defendido pelo conjunto das forças políticas e dos trabalhadores como uma alternativa real para combater a precarização, o desemprego, a degradação dos serviços públicos, a agiotagem, a corrupção, a degradação ambiental. Precisamos dessa proposta alternativa para disputar a consciência dos milhões de trabalhadores dizendo que não somos obrigados a aceitar as Reformas e que existe outra saída que significa levar em contra os interesses dos trabalhadores e da maioria da sociedade e não os interesses do capital.

Essa alternativa deve ser agitada e propagandeada não apenas para os setores diretamente atingidos pelas Reformas, mas para o conjunto dos trabalhadores no sentido de apresentar um outro projeto de país e de sociedade, um projeto socialista dos trabalhadores.

Temos que ligar as bandeiras de luta concretas com as propostas que rompam com os interesses do capital e apontem para a necessidade de que sejam os trabalhadores a decidirem os rumos do país.

Assim, colocamos abaixo nossas propostas para um Programa Mínimo Socialista dos Trabalhadores:     

– Não pagamento da dívida pública, interna e externa. No primeiro mandato de Lula foram pagos R$ 331 bilhões, que não foram suficientes sequer para pagar os juros, que eram de R$ 590 bilhões. Assim, a dívida cresceu ainda mais e hoje atinge 1 trilhão e 300 bilhões de reais. Só neste ano, estão previstos mais R$ 165,9 bilhões para pagamento de juros. Na prática, essa dívida já foi paga. Defendemos que desse dinheiro seja investido num programa de obras e serviços públicos sob controle dos

trabalhadores, para gerar empregos e melhorar as condições imediatas de saúde, educação, moradia, transporte, cultura e lazer;

– Redução da jornada de trabalho para 30 horas semanais, sem redução do salário;

– Carteira de trabalho e direitos trabalhistas para todos, em todos os ramos da economia, da cidade e do campo. Fim das terceirizações e do trabalho precário;

– Salário mínimo do DIEESE (R$ 1.564,52) para todos os trabalhadores;

– Reestatização das empresas privatizadas, sob controle dos trabalhadores, com reintegração dos demitidos;

– Estatização do sistema financeiro sob controle dos trabalhadores;

– Reforma agrária sob controle dos trabalhadores. Fim do latifúndio. Por uma agricultura coletiva, orgânica e ecológica voltada para as necessidades da classe trabalhadora;

– Por um governo socialista dos trabalhadores baseado em suas organizações de luta;

– Por uma sociedade socialista.

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ABC realiza plenária de base contra as reformas

A partir da proposta do Espaço Socialista e apesar da resistência inicial de algumas correntes, terminou havendo acordo no sentido de se convocar no ABC uma plenária contra as reformas e o governo Lula. Esta Plenária realizou-se em 3 de junho. Assinaram a lista mais de 130 pessoas, representando 27 organizações políticas e entidades do movimento social, estavam presentes praticamente todas as forças de oposição ao governo Lula que atuam na região.

A importância dessa plenária está no fato de que a região é um dos “berços” da CUT e do PT, e que os trabalhadores da região ainda têm ilusões em Lula e nos dirigentes sindicais cutistas, se bem que estão cada vez mais desgastados em fábricas importantes como a VW.

Outra questão é que a realização de plenárias nas regiões é um caminho para dar seqüência às resoluções do Encontro Nacional do dia 25 de março, organizando a luta pela base e envolvendo o maior número possível de trabalhadores e ativistas. Se essa experiência se realizasse pelo país afora, certamente poderíamos reunir milhares de trabalhadores, discutindo medidas e ações concretas contra as reformas. Essa tarefa cabe à CONLUTAS e à INTERSINDICAL, como correntes nacionais que devem impulsionar sua realização e organizar os trabalhadores, pela base, contra o governo, as reformas e sua política econômica.

A realização dessa plenária, com tamanha diversidade de posições políticas, só pode ser explicada pela pressão objetiva que existe entre os trabalhadores e os ativistas pela unidade da esquerda, representando um sentimento de que: ou lutamos juntos ou corremos o risco de sermos todos derrotados. Sem dúvida que a sua realização foi uma vitória importante, ainda que tenhamos que seguir construindo essa unidade.

Em relação às decisões do encontro, também acreditamos que foram positivas, pois tendo como base o acordo político e o consenso entre as correntes, os eixos aprovados refletem que o peso político da plenária era de esquerda e de oposição ao governo Lula e aos prefeitos da região, que também dão sustentação à governabilidade.

Os principais eixos aprovados e que servirão de base para a elaboração do panfleto são os seguintes: contra as reformas, vinculando a denúncia destas no papel do capitalismo; oposição ao governo Lula; denúncia do papel do PT e da CUT, que se colocaram contra as lutas e a favor do governo e dos patrões; contra a criminalização dos movimentos sociais; contra a redução da maioridade penal; apoio às lutas que estão em curso (professores e estudantes das universidades paulistas, CSN, Ibama, etc.); e também apresentando reivindicações das mulheres, da juventude e dos trabalhadores/as negr@s.

Esses eixos políticos, ao nosso modo de ver, nos permite ir ao encontro dos trabalhadores e disputarmos sua consciência para a luta contra as reformas.

Outra resolução fundamental foi a construção de atividades nas fábricas da região, nas escolas e faculdades, e nos centros das cidades de São Bernardo e Santo André, com distribuição de material explicando para os trabalhadores o verdadeiro conteúdo ideológico das medidas do governo.

QUANDO O DEBATE PODE AJUDAR E QUANDO PODE ATRAPALHAR

Para nós do Espaço Socialista, a luta pela unidade da esquerda ocupa um papel central na nossa política, mas temos ciência das dificuldades de construí-la, tanto pelo estágio ainda inicial do ressurgimento das lutas de massas, que imponha a unidade sobre as organizações, como pela própria trajetória da esquerda, que tem concentrado suas forças numa disputa pelo controle do movimento sem levar em conta as necessidades da luta e dos trabalhadores.

Temos a plena convicção de que a unidade não é fácil, mas também temos a plena convicção de que ela é fundamental, e é por isso que jogamos todas as nossas forças para essa construção e, como é natural, temos aberto mão de várias de nossas propostas para viabilizar esta unidade.

Unidade não é uma imposição do programa de uma organização sobre as demais, pelo contrário, é a busca de um programa comum entre todos, ou seja, na prática é um programa mínimo que unifica a todos e na qual todos têm que abrir mão de alguma coisa. Não alegra a todos, mas também não entristece a todos. Atitudes proclamatórias em nada contribuem.

Remarcamos a vitória dessa plenária, até porque durante os debates não foram poucas as vezes em que a unidade esteve em risco porque algumas organizações insistiam em querer impor suas posições até mesmo realizando discussões que não cabiam naquele espaço, como o balanço da greve de professores de SP, pois são discussões específicas, ou seja, já se colocam discussões que de antemão sabem que não terá acordo. Por outro lado, também havia aqueles que queriam condicionar sua presença ao fato da plenária adotar a sua formulação.

Situações como essas são totalmente improdutivas, pois mesmo que se chegue ao absurdo (naquele momento) de realizar a votação, a polêmica não acaba ali, pois é a realidade da luta de classes que vai demonstrar para qual lado os fatos vão pender.

O debate entre as organizações de esquerda é fundamental para a formação política e teórica dos militantes, inclusive como forma de buscar sínteses teóricas e programáticas. Mas esse debate deve ter uma finalidade, um objetivo, que é ajudar os trabalhadores a desenvolverem a sua consciência e construírem um projeto socialista. Sem esse objetivo, o debate torna-se estéril, acadêmico e de interesse escolástico e é nessa situação que muitas vezes as polêmicas entre as organizações de esquerda caem.

CONLUTAS E INTERSINDICAL DEVEM IMPULSIONAR PLENÁRIAS DE BASE

A experiência do ABC mostra que é possível construir um amplo movimento pela base para lutar contra as reformas e contra o governo Lula. Já afirmamos que o encontro do dia 25 de março foi um marco importante nessa luta, mas ele não armou o conjunto dos militantes para a construção de comitês, fóruns e plenárias de base que pudessem reunir os trabalhadores que estão contra as reformas.

Em cidades em que o peso da CUT (metalúrgicos do ABC, bancários, etc) e da Força Sindical (metalúrgicos de SP, por exemplo) é muito forte, iniciativas como essas podem romper o cerco a que os trabalhadores estão submetidos. É perfeitamente possível que nas maiores cidades do país reúnam entre 15 ou 20 mil trabalhadores ao todo para discutir como organizar essa luta. Fortaleceria ou não a luta contra as reformas e o governo Lula?

Então, cabe tanto à CONLUTAS como à INTERSINDICAL, como organizações presentes em quase todo o país, impulsionar esse processo, pois, se perdermos essa oportunidade, a história cobrará um preço caro pela omissão.

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A Violência no Estado Capitalista

Neuza A. Peres – Professores – SP

“Nosso planeta está cheio. Não somente do ponto de vista físico, como também social e político. Hoje são postos em movimento enormes contingentes de seres humanos destituídos de meios de sobrevivência em seus locais de origem. Já não há mais espaço social para os parias da modernidade, os inadaptados, expulsos, marginalizados, o lixo humano produzido pela sociedade de consumo”. (Zygmunt Bauman – Vidas Desperdiçadas)

A situação de violência que se manifesta nas sociedades, particularmente a brasileira, é o objeto de reflexão deste artigo. Não a violência urbana que aparece diariamente em manchetes nos meios de comunicação, mas a verdadeira violência que é o resultado da divisão de classes do sistema econômico capitalista.

No recorte acima, o autor classifica as pessoas fora do setor produtivo (formal e informal) como refugos do processo econômico. Essa massa de excluídos é constituída por trabalhadores que não possuem uma formação profissional e por isso não se caracterizam como mão-de-obra qualificada. Não acompanharam o desenvolvimento tecnológico dentro do processo de globalização da economia e mais, são o reflexo do fortalecimento das políticas de “Estado mínimo” dos governos neoliberais.

Até os anos setenta, o desemprego era um fenômeno que ocorria apenas em alguns setores da economia, ou em conjunturas específicas. Com as transformações do capitalismo, em decorrência de sucessivas crises e os desenvolvimentos tecnológicos que originaram a globalização da economia (e da pobreza), o desemprego deixou de ser circunstancial para ser permanente.

Dentro deste contexto, estão fora do setor produtivo: os operários de fábricas, descartados pela robotização da mão-de-obra; os trabalhadores do setor de serviços substituídos pelas máquinas; os que não se enquadram aos padrões físicos, diante da redução do limite de idade, considerado pelo sistema capitalista como tempo de vida ativa; os que não tiveram acesso a um ensino público de “qualidade”, resultado das políticas educacionais adotadas pelo Estado, em obediência aos desmandos do capitalismo imperialista.

As novas tecnologias não afetaram somente os operários dos grandes centros urbanos, mas também os trabalhadores no campo, provocando um êxodo rural em grande escala. O crescimento rápido das cidades resultou numa urbanização desordenada e acúmulo populacional em zonas de periferia. O difícil acesso aos morros e favelas transformaram esses locais em quartéis-generais de comandos do crime organizado. É neste cenário que se estabelece o índice maior de violência e criminalidade resultante da falta de perspectiva, emprego, qualidade de vida e ainda a pauperização crescente.

“Essa população fora da lei jamais será incorporada ao sistema produtivo nem manterá qualquer tipo de relação estável. Também não há mais espaço para onde fugir, nem para pensar no futuro. Essas pessoas não têm futuro”. Diante de uma realidade de fome e miséria, a vida deixa de ter valor. Assim, cada vez mais, a luta pela sobrevivência diária é o objetivo único no cotidiano das pessoas. Reflexo da crueldade que se estabelece na divisão de classes.

Nunca antes foram as máfias tão numerosas, influentes e bem armadas. O dinheiro que todo dia muda de mãos e que provém de fontes criminosas e ao mesmo tempo se destinam a fontes criminosas, nada mais é do que lavagem de dinheiro do crime organizado ou produto da corrupção na política. São esses escândalos de corrupção envolvendo políticos e o dinheiro público que demonstram a importância da violência para o Estado capitalista.

“O grande problema dos Estados é que destino dar a esse ‘lixo’  – que não pode mais ser enviado para as antigas fronteiras móveis do capitalismo colonial. É ele que constitui o objeto das políticas de segurança, o aspecto número um da atenção pública de todo o planeta”.

A posição do Estado de contensão da violência, investimento massivo em armamentos e na formação de um contingente humano reprodutor das normas “disciplinares” serve apenas para colocar trabalhador contra trabalhador. O controle da natalidade disfarçada em medida de prevenção contra doenças sexualmente transmissíveis, nada mais é do que medida para evitar a superpopulação. Colocar o Exército nas ruas, reduzir a idade penal ou evitar o crescimento populacional não vai resolver um problema que é estrutural.

Este processo não é novo. Ao longo de toda a história da humanidade, qualquer que tenha sido o sistema econômico seja ele o escravista, feudal ou capitalista sempre que os trabalhadores tiveram consciência da exploração a que estavam submetidos, buscaram unidade entre si e mudaram a história, promovendo revoluções.

Desta forma, somente a luta dos explorados por saúde e educação públicas de qualidade, moradia,  e emprego pode levar a adoção de um novo modelo de Estado que não se utiliza da violência para marginalizar a classe que vende a força de trabalho.

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 Jogos do PAN: Corrupção e repressão

Ney Nunes – União Comunista – RJ

O Rio de Janeiro vai sediar em julho os Jogos Panamericanos. Esse evento que, em tese, deveria ser de celebração da vida e da paz, um encontro dos povos americanos através do esporte, vai, na verdade, se caracterizar como uma das maiores intervenções repressivas na cidade. A principal preocupação dos organizadores é com a “segurança”, mas obviamente não a segurança da maioria do povo carioca, e sim das autoridades, turistas e atletas presentes. Os investimentos públicos nessa área somam perto de quatrocentos milhões de reais, mobilizando uma força policial de 18 mil homens.

            O Pan-2007 vai ficar marcado também como uma das maiores negociatas, com um orçamento, que pulou de oitocentos milhões para 3,2 bilhões de reais, principalmente devido “a instalações e infra-estrutura do evento superdimensionadas, não aproveitamento das instalações já existentes e irregularidades em licitações”, segundo um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU).

Quando o próprio TCU (órgão do aparato estatal que na maioria das vezes se presta a encobrir as irregularidades cometidas pelos governantes) aprova por unanimidade um relatório com esse conteúdo, fica evidente o quanto de corrupção e desperdício de recursos públicos estão presentes na preparação desse Pan-2007.

            Estão unidos nessa farra com o dinheiro do povo, o Presidente Lula (PT), o Governador Sérgio Cabral (PMDB) e o Prefeito Cesar Maia (DEM). Assim, podemos ver que as diferenças entre esses políticos a serviço da burguesia são pequenas diante da oportunidade de sangrar os cofres públicos. Os empreiteiros e os empresários da indústria do turismo serão os grandes beneficiados, além daquelas empresas que vão receber muito dinheiro através de concessões de estádios e outras instalações pela Prefeitura carioca.

            No tocante a segurança, montou-se uma articulação que envolve todo o aparato repressivo do Estado, começando pela ABIN (antigo SNI), polícias federal, rodoviária, militar, Guarda Nacional e Guarda Municipal. Diante do quadro de violência cotidiana que vive o Rio de Janeiro, onde a maioria do povo vive imprensada entre o banditismo e a repressão policial indiscriminada, a opção dos governantes foi sitiar a cidade, cercando áreas consideradas mais perigosas com tropas de choque da Polícia Militar e da Guarda Nacional.

Desde o final do ano passado os moradores vêm denunciando as conseqüências desse cerco. Em ato público no Complexo do Alemão em outubro de 2006, eles informaram que sofrem diariamente humilhações de todo tipo, como roubos, extorsão contra comerciantes, invasão de casas, agressões e ameaças de morte. Sem falar nas ditas “balas perdidas”, oriundas dos tiroteios que acontecem a qualquer hora do dia ou da noite. Mas essas manifestações não foram suficientes para impedir a escalada repressiva. Agora, com a proximidade do início do Pan, ela se intensificou. Só na região do Complexo do Alemão e bairros do entorno, num período de dois meses são mais de setenta baleados e trinta mortos. As escolas estão fechadas e os alunos sem aula, serviços públicos interrompidos, falta água e energia, o comércio funciona precariamente. Um estado de guerra, guerra contra o povo pobre do Rio de Janeiro.

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A quem serve o discurso da redução da maioridade penal?

André Luis Bender (Estudante da Faculdade de Direito São Bernardo).

            De tempos em tempos o debate sobre a “Redução da Maioridade Penal” volta à cena, quase sempre impulsionado pelas emissoras de televisão, porta-vozes da classe dominante, com o objetivo principal fazer com que as idéias dessa classe sejam aceitas como idéias de todos. Por essa razão é muito comum ver pessoas de baixa renda, que sofrem com todos os distúrbios e exclusões da favela, defenderem com firmeza a redução da maioridade penal e até, pasmem, a pena de morte. Não se dão conta que essas leis vão pegar apenas os seus filhos, e os filhos de seus amigos e vizinhos. Jovem branco, de classe média, paga propina ou presta pena alternativa. Jovem negro vai mofar no depósito.

            O que está implícito no discurso dos que defendem a diminuição da maioridade penal é que aí está a solução para os problemas. Mas, qual é o problema disso?

            Os dados revelam que é quase insignificante a participação de adolescentes na “nova onda de violência”. Vejamos: 1) Apenas 0,2% da população entre 12 e 18 anos havia cometido algum tipo de ato infracional, sendo que 73,8% destes eram crimes contra o patrimônio, e não contra a vida (Dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal, ano 2004). 2) No estado de São Paulo, menos de 4% das infrações foram cometidas por crianças ou adolescentes como autores, sendo que os adolescentes são responsáveis por apenas 1% dos homicídios praticados (dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo, dados de 2003).

            Os dados, ao contrário, mostram que as crianças e adolescentes são as maiores vítimas da violência. A população de 0 a 19 anos foi alvo de 110.320 homicídios entre 1980 e 2002 (dados de estudo publicado pela USP). Isso representa 13 homicídios por dia cometidos contra uma criança ou adolescente. E o pior, este número cresceu 316% neste período. Outros dados mostram que, no período de 1994 e 2004, o número de morte entre jovens de 15 e 24 anos aumentou 48,4%, enquanto o crescimento populacional foi de 16,5%. Um determinado tipo de jovem – da periferia, de baixa renda, e normalmente negro – está sendo exterminado.

            Outro argumento utilizado é que sem medidas penais passaria a impressão de impunidade. Ora, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) já responsabiliza o jovem adolescente autor de ato infracional, pois prevê seis tipos de medidas sócio-educativas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semi-liberdade e internação. Claro que essas medidas deveriam ser aplicadas visando à proteção integral do jovem, mas, se formos investigar o que ocorre nas unidades que abrigam o jovem autor de ato infracional, vamos encontrar verdadeiros depósitos, sem qualquer possibilidade de “recuperar” tal jovem.

            Se as autoridades quisessem de fato resolver o problema da violência teriam que começar cumprindo o art. 227 da Constituição Federal que diz: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Cumpra-se a lei, diria o “operador do direito”. Mas, a questão é que cumprir essa lei, coloca em xeque os “negócios” do Estado, que é fazer girar o capitalismo.

            O governo atual está aumentando o superávit primário. O que isso significa? Significa que está gastando menos. Onde? Em áreas sociais, como saúde e educação. Tudo isso o estado está fazendo para dar aos empresários isenções de impostos e construir obras de seu interesse como portos, estradas, hidrelétricas. Simplificando: o Estado tira das verbas sociais para dar aos empresários.

            Por isso somos radicalmente contra a redução da maioridade penal. E como resposta, exigimos que o Estado cumpra o artigo 227 da Constituição Federal. Para os menores em conflito com a Lei, que se cumpra o ECA. E para evitar que os jovens caminhem para a violência, que haja uma escola de tempo integral de qualidade, ondeas crianças ocupem seu tempo de maneira saudável e criativa. Para isso é preciso também que os professores sejam valorizados com salários adequados e formação permanente.Que haja também uma redução da jornada de trabalho para 30 h, sem redução dos salários, gerando os empregos necessários.

            Mas, nenhuma ilusão no estado capitalista. Para isso, precisamos de um movimento unitário entre professoras/es, trabalhadoras/es, e estudantes, no sentido de exigir mais e melhores empregos para todos, e de um projeto de escola e de sociedade que tire as crianças e jovens da rota do crime, que desenvolva todo seu potencial, e se concretize, enfim, num estado dos trabalhadores rumo ao socialismo. Até lá.

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Lei de Greve joga movimento sindical na ilegalidade

Márcio Cardoso (Bancários/SP)

No bojo das reformas neoliberais, o governo Lula do PT (Partido dos Traidores) prepara mais um duro golpe nos trabalhadores: jogar o exercício do direito constitucional de greve na ilegalidade, prevendo suspensão, compensação dos dias parados, e, pasmem, DEMISSÃO do trabalhador  que participar do movimento. Começa atacando o setor público, para depois estendê-lo para o restante dos trabalhadores. Segue abaixo as principais linhas do Projeto de Lei (PL) 4497 de 2001. TODOS os servidores tanto estatutários quanto os celetistas serão afetados pela medida.

O Projeto de Lei determina que os servidores alocados em órgãos ou entidades públicas responderão nos termos da presente proposição. Tal definição do que é órgão ou entidade pública está no art. 2º, I do Projeto de Lei, que está com a seguinte redação:

. Art. 2º.  Para fins desta lei considera-se:

. I- Órgão ou entidade pública: órgão da Administração direta ou indireta de qualquer dos Poderes  da união, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e suas respectivas autarquias e fundações públicas.

Funcionários da Administração direta são aqueles cujo regime jurídico é o do Estatuto dos Funcionários das esferas Federal, Estadual e Municipal e estão alocados notadamente nos Ministérios e Secretarias, Câmaras e Assembléias. Já os funcionários da Administração Indireta são aqueles trabalhadores de fundações, autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista. Sendo que estes dois últimos são trabalhadores regidos pela CLT por que estão no mercado como qualquer empresa. Tais trabalhadores encontramos nas empresas como Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Petrobras.

Primeiro, cai a falácia de que o projeto só valeria para os estatutários, abrangendo trabalhadores regidos pela CLT. Dessa forma, para a cassação do direito de greve passar para a classe trabalhadora de conjunto é só uma questão de tempo, pois suas bases já estão lançadas. E começa pela vanguarda do movimento.

Conceitos e regras burguesas para a Greve

O primeiro golpe dado pelo governo foi na conceituação de greve. Segundo o Projeto de Lei, a greve é:suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, da prestação de serviços públicos subordinados  à Administração (art. 2º, IV).

Isso quer dizer que, basta o patrão chamar a polícia para desfazer um piquete para que caia por terra o caráter pacífico da grave e a considere abusiva, ensejando uma série de sanções aos trabalhadores. É uma medida que inviabiliza o piquete e o enfrentamento com o patrão, pois não se permitirá uma comissão de esclarecimento na porta dos locais de trabalho.

O governo Lula chega ao absurdo de fixar a exigência de presença de até 50% da categoria na assembléia que deliberará a greve. Vai às favas a autonomia sindical. Se levado à risca o Projeto de Lei, a greve sempre será abusiva. Um exemplo disso é a greve dos bancários em 2004, que foi a mais representativa e significativa depois de 10 anos. As maiores assembléias tiveram 3000 trabalhadores. Isto representa apenas 3% da base de São Paulo, com mais de 100 mil bancários. Para a deflagração da greve, nos moldes deste Projeto, seria necessário que o sindicato fizesse assembléias no Estádio do Morumbi, único lugar da cidade que comporta mais de 50 mil pessoas, tamanha a insanidade do governo!

Outra manobra para considerar o movimento de greve como abusivo é condicioná-lo à previa comunicação ao patrão imediato, com antecedência mínima de 72 horas, ou seja, 3 dias (art.4º)! Junto com isso ataca também os piquetes:

. §1º. É obrigatória a comunicação da deflagração da greve das reivindicações dos servidores à Administração, por parte da entidade sindical, ou da comissão de negociação a que se refere o art. 3º com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas antes do início da greve.

É bom ressaltar que, historicamente, os trabalhadores sempre se pautaram pela negociação com o patrão, respaldada pela base, para conseguir conquistas ou defender direitos, sem a necessidade de um enfrentamento extremo como é a greve. Antes da greve, os trabalhadores promovem intermináveis rodadas de negociação. Somente quando os patrões se mostram irredutíveis é que os trabalhadores lançam mão do último recurso para dobrar a patronal. Novamente temos como exemplo a categoria de bancários, que na campanha salarial de 2006, após 6 rodadas de negociação, com duração de 3 meses e data base estourada, é que a greve foi deflagrada. Tendo como resultado apenas 3,5% de reajuste, diante de uma proposta inicial de 2% (a reivindicação da categoria era de 7%) .Assim, já se responde a seguinte pergunta: São necessários 3 DIAS DE ANTECEDÊNCIA para avisar os patrões sobre a deflagração da greve? Claro que não, pois é a condução natural do processo infrutífero de negociação e de intransigência dos patrões.

As medidas antipiquetes buscam acabar com a alma do movimento grevista. O piquete é utilizado para se evitar que o movimento seja minado pelos trabalhadores que não queiram aderir ao movimento e colocam em risco o interesse do coletivo. É através do piquete que se consegue adesão massiva dos trabalhadores e se esclarece a população sobre os objetivos do movimento. Mas  as maldades ainda não terminaram…

Para os trabalhadores os três P´s: Prisão, Punição, e Porta da rua.

O Projeto de Lei 4497/01 institucionaliza a compensação dos dias parados para os trabalhadores que exercerem o direito legítimo e constitucional de greve. Acaba com qualquer possibilidade de adesão ao movimento, pois os trabalhadores saberão de antemão que serão punidos com a reposição dos dias parados. Geralmente a reposição é feita por meio de horas extraordinárias de trabalho, em que o indivíduo tem direito ao acréscimo de, pelo menos, 50% da hora trabalhada.  É a legalização da fraude da hora-extra, conforme o art. 9º.

. Os dias de greve serão contados como de efetivo exercício para todos os efeitos, desde que, após o encerramento da greve, sejam repostas as horas não trabalhadas, de acordo com o cronograma estabelecido conjuntamente pela Administração e entidade sindical, ou comissão de negociação a que se refere o §2º do art. 3º.

E mais, constatado o abuso do direito de greve (segundo as regras do patrão) o servidor ainda se submeterá a uma suspensão de até 90 dias, que poderá ser convertida em multa de até 30 % do salário. Dependendo do conseguido o reajuste virará pó, diante de uma mordida dessa no bolso do trabalhador, por exercer um direito. É o primeiro  “P” de Punição.

Os trabalhadores, infringindo as normas patronais no presente Projeto de Lei, responderão processo nas esferas administrativas, penal e civil pelos “prejuízos” causados em função do movimento. Convém aqui fazer um debate: E quando houver a radicalização do movimento por intransigência do patrão, que não tem nada a perder com a referida lei? Ele não é obrigado a sequer analisar a proposta dos trabalhadores ou repor a inflação. Por outro lado, dá carta branca para que o patrão prenda o funcionário que optou por “furar” a greve nas repartições, focando, inclusive, a pernoite no local de trabalho. Mas para isto pode-se alegar que o patrão está exercendo o direito constitucional de propriedade, não é, DEMocratas de plantão? Nestes casos, com a  radicalização do movimento, por culpa da intransigência da Administração, só restaria a prisão do servidor num eventual enfrentamento com a polícia, mandada pelo patrão. É o segundo “P” de prisão.

Agora, a pá-de-cal vem com a determinação do Projeto de Lei que prevê a DEMISSÃO do trabalhador, assim que constatado o abuso do direito de greve, sempre no juízo burguês, nos casos em que haja “reincidência” no abuso. É tudo que os papagaios de “Uóchintom” sempre quiseram: Dar um pé-na-bunda daqueles que exercem a cidadania, como determina o art. 11, II do projeto de lei. É o terceiro “P” de porta-da-rua.

Breve reflexão sobre o projeto de lei.

A lei ataca o setor de vanguarda do movimento operário brasileiro, servidores públicos e os trabalhadores das empresas estatais como a PETROBRAS, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, que estão com os salários arrochados por conta do congelamento de salários imposto por FHC nos anos 90, agravado pelas perdas acumuladas no governo Lula. Tudo indica que a relação com a administração ficará ainda pior por causa do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento), que prevê reajuste ao funcionalismo de 1,5% ao ano. Só para repor a perdas dos funcionários do Banco do Brasil desde julho de 1994, os salários dos trabalhadores da estatal deveria ser reajustado em mais de 130%, por exemplo.

Mesmo diante de um quadro tenebroso, as esquerdas ainda não acordaram para o tamanho do ataque que está por vir. Não há qualquer movimentação das entidades combativas. A CONLUTAS (Coordenação Nacional de Lutas), cuja maior base de filiados está  no setor público não fez nenhuma campanha ostensiva tratando deste ataque ao direito de greve como mais uma medida neoliberal. Embora tal medida faça parte das Reformas neoliberais é necessário que se dê um tratamento diferenciado ao tema, pois se com as poucas garantias já é difícil mobilizar, ficará impossível tal tarefa se levarmos em consideração que o movimento ainda está em refluxo.

E necessário disputar a consciência da população, por meio de esclarecimento, distribuição de materiais. Promover debates e definir que o governo é inimigo dos trabalhadores. Que o governo, papagaio dos EUA, inviabiliza a qualidade do serviço público por meio do desvio de verbas para garantir o superávit primário, impedindo a contratação de mais funcionários, a abertura de mais escolas e a construção de hospitais. Nós, trabalhadores, somos vítimas e não causadores dos problemas.

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Reestruturação Banco do Brasil – Governo prepara privatização

Daniel e Márcio – Bancários – SP

 

Em maio de 2007, o governo baixou um plano de reestruturação do Banco do Brasil com a finalidade de fechar postos de trabalho (redução de custos), disponibilizando os poucos funcionários que restavam e que faziam o atendimento às pessoas mais abastadas, o que resultará na expulsão da população que se utiliza das agências bancárias.

O fim dos postos de trabalhose dá pelo corte de aproximadamente de 20 mil funcionários, que tem como foco os funcionários localizados em áreas de suporte do banco como as Gerências Regionais de Logística (GERELs), os Núcleos de Análise  de Crédito (NUCACs) e, principalmente, os Caixas Executivos (CAIEX) nas agências. São exatamente os setores que fazem greve, vanguarda do movimento bancário, e que se enfrentam cotidianamente com a direção do Banco na luta por melhores condições de trabalho.

Nas grandes cidades será cortado a metade dos Caixas em cada dependência. Logo, o que já era ruim ficará ainda pior. Hoje já existe local que colocam estagiários para impedir o acesso dos clientes às agências sob a alegação de que não há Caixas. Na verdade, os poucos Caixas que existem estão sendo deslocados do atendimento para o processamento de envelopes de depósito ou simplesmente, deixando de ser Caixas para trabalhar no ATENDIMENTO AOS CLIENTES DE ALTA RENDA E GRANDES EMPRESAS, DEIXANDO DE FORA DO ATENDIMENTO À POPULAÇÃO. Os clientes e usuários excluídos das agências terão duas opções: se virarem no auto-atendimento ou ir para os correspondentes bancários (lotéricas, supermercados, etc.), onde já existem filas intermináveis.

Não nos enganemos quanto à ida dos funcionários provenientes das GERELs e NUCACs para as agências. Boa parte dos trabalhadores sairá com os PDVs (Plano de Demissão Voluntária) ou PAAs (Plano de Aposentadoria Antecipada). Trata-se de trabalhadores que ainda preservam direitos como anuênio e licença-prêmio, que os funcionários pós-98 não têm. Assim o banco acaba com o paradigma de isonomia, ou seja, igualdade de direitos entre funcionários novos e antigos, que é uma luta histórica dos funcionários admitidos pós-98.

Mas o prejuízo à população não fica somente nas filas intermináveis nas agências… O Banco avançará no processo de terceirização. Instituirá o PEE (Processamento de Envelopes Emborrachados), que consiste na centralização do processamento de envelopes de depósitos feitos nos terminais de auto-atendimento, e dos malotes de empresas.  Esse processamento será feito por empresas terceirizadas, o que é proibido por lei. Os trabalhadores dessas empresas não são bancários e terão acessos a dados sigilosos, colocando em risco a segurança das transações. Por outro lado, estes mesmos trabalhadores terceirizados não têm os mesmos direitos dos trabalhadores bancários. Além disso, são superexplorados, têm os direitos mínimos desrespeitados, recebem os salários com atraso, não têm vale-transporte e recebem menos da metade do salário de um bancário, que já não é lá grande coisa.

Mais um passo para a Privatização

O início de qualquer processo de privatização começa com os planos reestruturantes sob o pretexto de diminuir os custos operacionais e de pessoal, além de aumentar a produtividade. Foi assim com a Vale do Rio Doce, com  a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), com o Banespa, etc. Os trabalhadores destas empresas sofrem até hoje com os efeitos nefastos da privatização. Muitos se suicidaram, ficaram com problemas psicológicos e psiquiátricos, não conseguiram mais lugar no mercado de trabalho, ou se subempregaram, ganhando um salário de fome.

O Banco da Brasil também trilha o mesmo caminho. No início da década de 90, a empresa tinha cerca de 170 mil funcionários, hoje há menos de 85 mil trabalhadores. Este enxugamento se deve a pacotes semelhantes ao atual, que vêm desde a época de FHC. O governo Lula avançou em direção à privatização do Banco do Brasil com a abertura da venda de ações em poder da União. Reduziu-se a participação governamental (e aumentou a participação privada) na composição acionária da entidade, com claro reflexo no aprofundamento do seu direcionamento para o mercado. Agora, Lula lança este plano de desemprego em massa e expulsão do público das agências.

Quem fica no Banco também perde

Aqueles que sobreviverem ao plano de reestruturação também sofrerão, pois a carga de trabalho se multiplicará em progressão geométrica. O Banco institucionalizará o assédio moral, não só para obrigar os funcionários a cumprir metas de vendas de produtos, mas também a dar conta da carga de trabalho antes suportada por dois ou três funcionários. Além disso o Banco institucionalizou a jornada de 8 horas por meio da função de Assistente de Negócios, que na verdade, é um trabalhador que executa funções de gerente, mas ganha, proporcionalmente, menos que um CAIEX. É bom lembrar que a legislação trabalhista prevê que a jornada do trabalhador bancário não seja superior a seis horas, de acordo com art. 224 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT): “Art. 224. A duração normal do trabalho dos empregados em bancos, casas bancárias e Caixa Econômica Federal será de 6 (seis) horas contínuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de 30 horas de trabalho por semana.”

Os trabalhadores reagem, apesar do sindicato governista

Apesar dos sindicatos governistas, os trabalhadores conseguiram importantes vitórias contra a política de desemprego e de arrocho salarial implementada pelo governo neoliberal petista. Eis aqui as mais importantes:

. Os trabalhadores de Campinas fizeram passeatas pela cidade, ganharam apoio da prefeitura local, por meio da emissão de moção de repúdio ao Banco do Brasil por fechar a GEREL local. Outra vitória importante conseguida pelos valorosos companheiros foi a pressão para que o sindicato ingressasse com uma ação trabalhista que impediu o fechamento daquele local de trabalho;

. É parte do plano de reestruturação do Banco a desvinculação da responsabilidade da empresa com a saúde do funcionalismo por meio do sucateamento da Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (CASSI). O Banco colocou em votação uma proposta de mudança estatutária na qual estava prevista a co-participação em exames. O Funcionalismo NÃO aprovou a proposta. É bom lembrar que os sindicatos da CUT faziam campanha pela aprovação;

. O Tribunal de Contas da União (TCU) julgou ILEGAL a reestruturação do Banco. Com isso, é possível acionar o Ministério Público do Trabalho para denúncias.

Governo Lula: O maior estelionato eleitoral de todos os tempos

O PT explorou muito oportunamente nas eleições de 2006 o medo da população de  mais uma onda privatista que entregaria ao mercado o que ainda restou de empresas estatais. Incutiu-se na população a alegação terrorista de que se o PSDB ganhasse a PETROBRAS, a CEF e o Banco do Brasil seriam privatizados pelo governo dos tucanos. Pois bem, diante do exposto, vimos que o PT não passava de lobo em pele de cordeiro. Agora, reeleito por mais 4 anos, o governo prepara o Banco do Brasil para que seja privatizado, com prejuízos para toda a população.

Não somente o público será expulso das agências como todo o direcionamento da empresa estará voltado para o segmento de alta renda e a especulação financeira. O Banco deixará de ter qualquer papel no desenvolvimento do país, no fomento da economia, no apoio às pequenas empresas, no microcrédito, etc., para concentrar-se exclusivamente no lucro, à custa da superexploração de funcionários e terceirizados e da extorsão dos clientes. Além do fato de que o lucro gerado pelo Banco não reverte em benefício para a sociedade, pois serve tão somente para ajudar o governo Lula a pagar a dívida pública fraudulenta aos especuladores. É o Banco deixando de ser do Brasil para ser de pouco$.

É necessário a união dos trabalhadores com a população em defesa do patrimônio do povo. É necessário que as oposições e setores combativos do movimento sindical se organizem em levar à população uma cartilha sobre os efeitos do corte de funcionários, principalmente nos grandes centros. Uma das ferramentas da luta de bancários e clientes por melhor atendimento e melhores condições de trabalho é a denúncia no Banco Central, através do telefone 0800 979 2345. Os clientes e usuários podem denunciar a falta de caixas e a demora no atendimento, fazendo com que o Banco seja prejudicado no ranking de atendimento das instituições financeiras, mantido pelo BC.

Também é importante denunciar que o inimigo dos trabalhadores e do povo é o governo do PT. Somente com a organização da população é que se conseguirá derrotar a política do governo e do FMI.

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Professores de SP iniciam retomada das lutas

Podemos dizer que os professores também fizeram parte do despertar das lutas, e não poderia ser diferente, pois a categoria representa o maior setor dentro do funcionalismo estadual (180.000) e amarga todas as conseqüências dos ataques deferidos contra aos trabalhadores: baixos salários, péssimas condições de trabalho, jornada estafante, altos índices de violência no local de trabalho, assédio moral, doenças do trabalho, entre outros. É um setor importante para o governo tentar impor uma derrota a todo o conjunto do funcionalismo no processo das Reformas e tentar mantê-lo em silêncio e sem ação durante o pacto de governabilidade existente entre Lula e Serra.

Desde a primeira assembléia deste ano (25 de março) aprovamos o eixo da pauta – que resumia a extensa lista de reivindicações acumuladas nos últimos anos “Em defesa da Escola Pública: fim da Promoção Automática, 25 alunos por sala de aula e reajuste salarial” – contrário ao eixo genérico apresentado pela diretoria majoritária do sindicato.

Mas já na assembléia seguinte (17 de abril) o governo Serra, apressando-se em iniciar a implementação da Reforma Previdenciária no estado, colocou em tramitação em regime de urgência o PLC-30 que criaria a São Paulo Previdência (SP-PREV). O PLC-30 representa mais um grande ataque ao funcionalismo estadual, pois de uma só vez o governo cancela sua dívida histórica de R$ 160 bilhões com o Instituto de Previdência do Estado de São Paulo (IPESP) proveniente da falta de contribuição do governo para as aposentadorias. Ressalte-se que antes nossa parcela de contribuição era de 6% e foi aumentada para 11% em 2004.

A proposta do governo em criar essa autarquia (SP-PREV) tem justamente o objetivo de se desobrigar da garantia da nossa aposentadoria e livrar-se de pagar a multa, o que potencialmente leva a que tenhamos, mais cedo ou mais tarde, que aumentar nossa contribuição. Em Manaus, onde já existe um regime semelhante, os professores contribuem com 14% e na Bahia com 17%, quer dizer, não temos aumento salarial, mas temos aumento no desconto em folha.

Para os professores não concursados (OFA’s), cerca de 80.000, a situação era ainda pior. Ficariam de fora do novo regime e seriam jogados para o INSS.

Esse enorme ataque imediato atravessou nossa campanha salarial e se tornou o centro dos esforços no sentido de barrá-lo mesmo com a diretoria majoritária do sindicato e a Articulação Sindical (corrente governista e que dirige a CUT) defendendo a criação dos regimes próprios de Previdência separados do estado conforme manda as Reformas do governo Lula.

O papel desmobilizador da Articulação e da CSC

Para o ato contra o SP-PREV, em Frente à Assembléia Legislativa (ALESP), conseguimos paralisar várias escolas no estado e as ruas foram tomadas por cerca de 15 a 20 mil professores.

Diante da pressão do movimento as propostas de greve começaram a surgir, e obviamente havia motivos mais do que suficientes para uma greve da categoria a partir desse dia, mas infelizmente essa não foi a disposição da imensa maioria dos professores ali presentes e dos que permaneceram nas escolas.

Essa situação se deve principalmente ao trabalho desmobilizador cumprido pela Articulação há vários anos e também dessa vez. Percorrendo as escolas, percebemos o resultado nefasto desta política: professores não sentem firmeza suficiente no sindicato e optam em parar, fazer grandes atos e passeatas, mas não greve como apresentada insistentemente por outras correntes de oposição.

Essa grande manifestação que parou a cidade provocou um impacto no governo Serra, que já estava de olho nos valores que seriam perdidos (15 bilhões) para o INSS (federal) ao transferir os professores OFA’s. Diante da mobilização e do pacto antilutas de Serra e Marinho (ministro da Previdência de Lula), perceberam que deveriam ir mais devagar. Assim, foram feitas algumas readequações no Projeto. A principal afirmava que os OFA’s que estivessem com vínculo na data de assinatura do Projeto permaneceriam na SP-PREV e aqueles que perdessem o vínculo por mais de 90 dias – situação que ocorre sempre que o OFA não consegue aulas no início do ano – passariam para o INSS.

Essas readequações no projeto tinham a clara intenção de desmobilizar o movimento e aprovar a SP-PREV como um todo, porém, foram alardeadas pela Articulação Sindical (PT) como uma vitória dos professores e do funcionalismo público, como se não houvesse mais nada a fazer a partir de então do que lutar por outros pontos da campanha salarial e educacional. Ela utilizou o aparato sindical para sabotar ainda mais a luta, enviou telegramas para as casas dos associados proclamando a vitória a fim de evitar qualquer possibilidade de greve e contou com o trabalho do governo e da mídia, no sentido de causar um sentimento de confusão, ao afirmarem que os professores OFA’s seriam efetivados, o que é inconstitucional.

No dia 23 de maio, que foi marcado por um conjunto de manifestações contra o governo Lula e as Reformas em todo o país, estivemos com os estudantes que ocuparam a reitoria da USP e setores do MST numa grande manifestação que culminou em frente a ALESP, onde o Projeto estava para ser votado. A repressão não permitiu nossa entrada, com o aval da maioria dos deputados governistas e obviamente os petistas.

Ao final do processo, o governo conseguiu aprovar o PLC-30, mexendo de novo o Projeto:

a) Incorporou na SPPREV o conjunto dos OFA’s atualmente vinculados, mesmo que vierem a perder o vínculo futuramente b) criou a paridade no Conselho Gestor da SPREV c) introduziu um parágrafo no qual se responsabiliza pela manutenção do instituto, caso haja falência. d) introduziu ainda uma cláusula confusa que afirma que nenhum OFA poderá ser demitido ao final do ano sem justa causa. Ora, sabemos que, para o governo o professor OFA é demitido por não haverem aulas e para o estado isso é uma justa causa.

As readequações ao Projeto ainda podem ser perdidas, pois entram em conflito com a legislação federal, que não permite a efetivação de nenhum funcionário público a não ser por mudança na legislação, portanto, a única forma de efetivação de todos os OFA’s com pelo menos cinco anos de magistério é a luta pela aprovação no Congresso Nacional de uma PEC (Projeto de Emenda Constitucional) como ocorreu alguns anos atrás, e que tornou estáveis os contratados pela Lei 500 com mais de 10 anos de trabalho. Essa deve ser uma das prioridades da nossa luta daqui por diante.

 

A Oposição Alternativa precisa ir para a base da categoria

Do ponto de vista do Projeto como um todo não conseguimos impedir sua aprovação e, nesse sentido fomos derrotados, mas a nossa luta conseguiu reduzir seus impactos. Quanto a nossa data base e campanha salarial podemos afirmar que nenhum avanço tivemos. Mais uma vez a direção majoritária do sindicato sabotou a luta pela possibilidade, no mínimo, da reposição das perdas salariais.  A campanha educacional com matérias pagas na mídia, carta aberta à população, intensificação de visita às escolas tão solicitada pela categoria jamais foi implementada. Muito pelo contrário, o primeiro semestre está sendo encerrado com um duro ataque, do governo e da mídia, ao trabalho pedagógico dos professores e ao direito dos alunos da periferia de realizarem avaliações escritas, forma utilizada no ENEM e nos vestibulares.

 Se tivéssemos uma direção de luta no sindicato certamente teríamos resultados melhores. Nesse sentido acreditamos que a  Oposição Alternativa deva assumir, cada vez mais, uma postura independente diante da direção majoritária e buscar a unidade com os setores mais combativos da nossa categoria e do funcionalismo público. Não podemos nos calar sobre o significado, para a categoria e para o movimento, de termos o maior sindicato da América Latina, apoiando o PAC e atrelado à CUT, uma  central sindical que está disposta a contribuir para implementar todas as Reformas do governo Lula, custe o que custar.

Agora, ao término desse semestre, fica a perspectiva de que possamos retomar o movimento no segundo semestre pois nenhum dos problemas estruturais foi resolvido. Para isso cabe a nós um grande trabalho de percorrer as escolas, chamar reuniões, preparar materiais explicativos e de chamado à continuação da luta.

Um bom exemplo para todos nós é a luta dos professores do Rio de Janeiro que envolvendo pais e alunos, conseguiu   provocar todo um debate na sociedade e impedir a extensão da Progressão Automática.  A nossa tarefa deve ser a de chamar à mobilização, realizar o trabalho de base e a denúncia da direção do sindicato para preparar as condições da retomada das mobilizações no 2º semestre e talvez uma greve efetiva da categoria que possa impor um revés aos planos de Serra e Lula.

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Professores do RJ – Luta unificada barra promoção automática

Leandro – União Comunista – RJ

Nas últimas semanas, a partir da mobilização dos professores e funcionários, assim como de pais e alunos da rede municipal de ensino do município do Rio de Janeiro, conseguiu-se impedir mais um ataque do prefeito César Maia à educação pública.  No dia 23 de maio uma mobilização rompeu com um longo período de ausência de reação por parte destes profissionais ao reunir pelo menos cinco mil pessoas diante da sede da prefeitura do Rio, mesmo debaixo de chuva. No dia 5 de junho, os mesmos, reunidos em frente à Câmara Municipal, pressionaram os vereadores a votar um projeto que torna inválida a resolução 946 da secretaria municipal de educação, que entre outras medidas estabelece a aprovação automática na rede de ensino e a adição do segundo e terceiro ciclos, o que estenderia  o sistema de ciclos para  todo o ensino fundamental.

Este conflito começa no ano 2000, início do segundo mandato do atual prefeito. A proposta de implementação da progressão continuada, sem uma discussão que sem dúvida se fazia necessária previamente, foi alvo de resistência por apenas uma pequena parcela da categoria; muitos foram convencidos pelas promessas de soluções fácies para a questão do fracasso escolar. Antes dos tempos neoliberais, a progressão continuada era vista como uma das ferramentas pedagógicas que serviam para superar o fracasso escolar no Brasil. Mas o fundamental na verdade seria a mudança estrutural no sistema público de ensino, com uma política de valorização profissional, democracia nas escolas e financiamento da educação. Advindos os tempos neoliberais construiu-se um discurso de que o problema central do fracasso escolar resumia-se ao uso de metodologias antiquadas e atrasadas.

O sistema de ciclos foi implementado de cima para baixo, levando muitos professores pelo “canto da sereia”. Qual foi o resultado? A imposição do Prefeito é a pá de cal de uma tragédia que desde 2000 já estava se desenhando e é aí que começa a política de aprovação automática. A partir deste momento começa, com a imposição de não se ultrapassar um índice máximo de reprovação, a produção de estatísticas que acobertam a real situação da educação. Professores são constrangidos e obrigados a aprovar levas de alunos sem as míninas condições; os pré-requisitos necessários para a implementação dos ciclos nunca foram realizados e nem mesmo colocados em pauta pelo governo.

Em quase dez anos, o número de alunos subiu 76.275 e a quantidade de profissionais reduziu-se em 1.545. Assim, hoje a relação professor/aluno é de um para 46 alunos. Desde o começo da gestão de César Maia o tempo destinado ao planejamento foi reduzido pela metade e há uma significativa carência de profissionais em todas os setores das escolas, e a falta de professores é escondida pela dupla regência a hora-extra.

Acabaram as funções de serviço de orientação educacional, assim como supervisores e coordenadores de área. As concessões de licença médica são cada vez mais dificultadas e praticamente proibidas para os professores que fazem dupla regência. O governo, que tem na lei orgânica a responsabilidade de aplicar 35% do orçamento em educação não aplica sequer os 10% constitucionais. Em 2007 ainda reduziu a carga horária de Língua Portuguesa da 5ª e 6ª séries e de matemática para 7ª e 8ª séries de seis tempos para quatro tempos (aulas). É importante lembrar também que o governo que somente com a construção do estádio João Havelange gastou 320 milhões, enquanto gastou 145 milhões com a educação nos anos de 2004 e 2005.

A destruição do ensino público é um atroz ataque àqueles que têm somente esta alternativa para a aquisição da cultura e do conhecimento, como é o caso dos filhos da classe trabalhadora.

A vitória que profissionais da educação pais e alunos tiveram ao fazer com que a Câmara derrubasse a resolução da aprovação automática é parcial. O prefeito ainda pretende recorrer judicialmente contra a decisão da Câmara, ou seja, o enfretamento terá seqüência. Em segundo lugar, a permanência do atual sistema de avaliação do aluno mantendo a reprovação não significa alguma melhora na educação pública, embora tenham evitado mais um ataque do governo. Talvez a maior conquista tenha sido a possibilidade de reorganizar a luta da categoria e de construir uma pauta que envolva também pais e alunos.

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Ciência a Serviço do Racismo

Eduardo Rosa – Coletivo de Resgate Afro Rosas Negra

Depois de seqüestrar mais de seis milhões de homens e mulheres de seus países de origem, em África, para escravizá-los a sociedade mundial, em específico a brasileira tenta se livrar da possibilidade de um eventual acerto de contas.

Durante 350 anos, no Brasil, africanos e seus descendentes foram escravizados e obrigados a construir a riqueza desse imenso país, de características continentais. São mais de três séculos de torturas, estupros e os mais variados tipos de humilhações.

Teorias “cientificas” foram desenvolvidas ao redor do mundo para provar a superioridade do “homem branco” europeu em relação aos homens não “brancos”, principalmente africanos e seus descendentes.

Em Maio de 1888, quando assinada a “Lei Áurea”, que pôs fim à escravidão legal, não foi garantida a indenização financeira pelos 350 anos de trabalho. O trabalho assalariado, distribuído entre imigrantes europeus, foi negado aos negros e negras livres, que passaram a ser os primeiros desempregados, sem tetos, sem terras e sem identidades. Fomos finalmente libertados, mas para morrer de fome, frio ou exterminados pelos poderes repressivos constituídos à época.

Como o número de negros nos centros urbanos era muito alto foi necessário encontrar meios não apenas de nos retirar dos grandes centros, mas de acabar com qualquer possibilidade de luta por reparações ou por um simples emprego assalariado. No entanto, a repressão não foi suficiente. O chicote e a tortura não tiraram do nosso povo o sonho de liberdade. Foi necessária uma política sistemática de desqualificação da população negra. No início, foi trabalhoso convencer os negros, da época, de que tendo construído as riquezas do país e impulsionado a economia européia, não poderiam ser preguiçosos e desqualificados para o trabalho assalariado.

Dessa situação nasceram os diversos mitos: O de que o negro é preguiçoso, de que no Brasil não existe racismo, de que somos todos iguais, o de que discriminação no Brasil é contra o pobre e não contra o preto, etc. E para dar seqüência à política de exclusão do povo negro e minar sistematicamente nossa resistência, se construiu mais um: o de democracia racial, que afirma sermos todos iguais com oportunidades iguais, ou seja, “ninguém é deixado de lado pelo fato de ser preto, são os pretos que não são suficientemente esforçados”. Concomitante a isso se construiu a “teoria do embranquecimento”, que afirma sermos todos iguais, entretanto, “quanto mais claro melhor”. Essas duas políticas são demasiadas cruéis e puderam criar as condições necessárias para que a burguesia nos mantivesse fora dos mais variados seguimentos da sociedade.

Num breve giro podemos observar que a sociedade mundial é “sócia majoritária” do Brasiltanto no processo de escravidão de homens e mulheres africanos, quanto na segregação em escala mundial.  Os Estados Unidos exterminou milhares de negros para não lhes “conceder” direitos civis mínimos, além de fornecer-lhes, direta ou indiretamente, armas para o auto-extermínio. A Inglaterra enquanto “pressionava” o Brasil, último país a pôr fim a escravidão legal, promovia guerras fratricidas e a partilha da África, além de manter Mandela na prisão por quase 30 anos. A Bélgica promoveu a destruição em Ruanda com a guerra entre Hutus e Tutsi, etc. No entanto, esses fatos não podem servir para retirar da burguesia brasileira a sua responsabilidade.

Agora a inovação ao ataque, contra os negros brasileiros, conta novamente com o apoio da Biologia. Utilizada anteriormente para tentar provar a “superioridade branca” e para tentar afirmar que a única raça existente é a “raça humana”, tenta utilizar, neste momento, os estudos do genoma humano para tentar mostrar que os negros brasileiros têm mais genes europeus do que africanos. O que está por trás dessa discussão é a tentativa de livrar a sociedade brasileira de possíveis reparações, ações afirmativas,  e da adoção de cotas proporcionais de inclusão para negros, em todos os seguimentos sociais.

Num estudo realizado pelo geneticista Sérgio Danilo Pena, da Universidade Federal de Minas Gerais, a pedido da  BBC-Brasil (Inglesa!!), foi traçado o perfil genético de nove famosos negros brasileiros através da análise de seu DNA, como parte do projeto Raízes Afro-brasileiras. A pesquisa mostrou, por exemplo, que o Neguinho da Beija-Flor, sambista carioca, é geneticamente mais europeu do que africano. De acordo com essa análise, 67,1% dos genes de Luiz Antônio Feliciano Marcondes, o Neguinho, têm origem na Europa e apenas 31,5%, na África.

Outro exemplo é o da ginasta Daiane dos Santos. Segundo o estudo a atleta gaúcha tem 39,7% de ancestralidade africana, 40,8% européia e 19,6% ameríndia. Dos nove indivíduos analisados, foi Daiane quem apresentou as proporções mais equilibradas entre os três principais grupos que deram origem à população brasileira.

O estudo afirma que o brasileiro é um dos povos mais miscigenados do mundo. Mas, o que é indiscutivelmente “puro”, no Brasil, é o racismo que exclui social, política e economicamente metade da população brasileira, a metade negra. Isso sim desmascara o “modelo democracia racial”.

Diversas conclusões podem ser tiradas desta iniciativa da BBC, com amplo apoio da rede Globo “fiel escudeira” na luta contra as políticas de ações afirmativas. Mas uma conclusão não pode deixar de ser feita: a Ciência só poderá cumprir totalmente o seu papel quando estiver a serviço da vida e for controlada por quem realmente trabalha e produz riqueza.

Infelizmente não nos surpreendemos com determinadas pesquisas, pois esta miscigenação defendida de forma tão “romantizada” pela burguesia racista brasileira é a mesma que teve seu início, nada romântico, com o estupro de mulheres negras, escravizadas e indefesas. O objetivo desse tipo de pesquisa, além de “romantizar” a miscigenação é o de tentar adiar o “acerto de contas”. Temos a convicção de que retardarão, mas não evitarão, é uma questão de tempo!

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A Comunicação na luta de Classes: O caso Chávez e a RCTV

Daniel – Bancários SP

            Tivemos oportunidade de discutir recentemente o projeto político do Presidente venezuelano Hugo Chávez no que diz respeito à sua alegada pretensão de apresentar o “socialismo do século XXI”, em artigo publicado na edição nº 19 de nosso jornal. Indicamos então que o socialismo somente pode ser construído por obra dos próprios trabalhadores, a partir de suas próprias organizações de luta, convertidas em instrumentos políticos independentes e armadas de seu próprio programa e ideologia; em completa ruptura com a institucionalidade burguesa e a forma Estado. O socialismo não será jamais uma dádiva benevolente concedida por um governante burguês como Chávez e suas limitadíssimas medidas “socialistas”, por mais que tais ações representem de fato algum avanço material e despertem o ódio da burguesia venezuelana e mundial.

            A última das novidades “revolucionárias” de Chávez a provocar estardalhaço foi a não renovação da concessão da emissora RCTV, uma das redes de TV privadas que se opõem ferozmente à sua política. A concessão da RCTV, renovada pela última vez em 27 de maio de 1987, acabara de completar 20 anos, de modo que cabia ao Estado verificar a conveniência de renová-la ou não, conforme a legislação em vigor no país, a qual é anterior ao próprio Chávez e permaneceu intocada mesmo depois da nova Constituição bolivariana de 1999.

            Imediatamente, porém, a mídia burguesa em todo o mundo passou a esbravejar furiosamente contra o “ditador” venezuelano, acusando-o de atacar a “liberdade de expressão”. TVs, jornais e revistas entoaram em uníssono o mesmo coro. Esse impressionante exemplo de solidariedade de classe manifestado pelas empresas de mídia (inclusive as do Brasil) diante do “perigoso” precedente aberto por Chávez demonstra o quanto o alegado compromisso desses “veículos de informação” com a verdade dos fatos não passa de uma grotesca farsa a servir de pretexto para encobrir a mais escancarada parcialidade política e ideológica.

            O discurso montado para atacar a decisão de Chávez não resiste à crítica mais elementar. O fato de que Chávez tenha sido democraticamente eleito, reeleito, submetido a referendo e plebiscito é completamente ignorado quando o acusam de “ditador”. O fato de que todas as redes de TV privadas tenham trabalhado ativamente em favor do golpe de 2002 contra o presidente eleito não impede que continuem sendo tratadas como “democráticos” baluartes da “liberdade”. O fato de que Chávez tenha agido na estrita obediência à lei de seu país (aliás, muito semelhante à do Brasil, como veremos), que faculta ao governante a condição de negar a renovação de uma concessão de utilização de um bem público, também é cinicamente desconsiderado.

            Todos os fatos são distorcidos para que se possa apresentar a versão fantasiosa de que um “ditador” intransigente restringiu arbitrariamente a “liberdade” dos cidadãos de seu país ao impor repentinamente uma “censura” brutal e maciça sobre os meios de comunicação que são a garantia da “democracia”. Ora, apesar de ser a mais antiga emissora do país, com 53 anos de atividade, a RCTV não era a única nem a maior, pois perdia para a Venevisión e a Globovisión, as quais continuaram funcionando normalmente e fazendo oposição ao presidente. Assim como continuam funcionando normalmente os jornais e demais veículos anti-chavistas. Ou seja, a medida de Chávez nem sequer alterou qualitativamente o sistema de comunicação de massas do país, que continua nas mãos de empresas privadas (que detém 90% da audiência) e continua a propagar a ideologia burguesa e a política das classes dominantes. Apenas alterou-se quantitativamente o quadro ao tirar de cena a mais irresponsável das redes privadas.

            O nível criminoso de desonestidade desta emissora pode ser aferido a partir do exemplo do tratamento dado aos conflitos que precederam o golpe contra Chávez em 2002. A RCTV editou as imagens dos confrontos entre manifestantes nas ruas de Caracas de modo a dar a entender que os partidários do presidente eram os responsáveis por tiros disparados aleatoriamente contra uma multidão de seus opositores, quando se tratava exatamente do contrário. A mentira foi exposta no documentário “A revolução não será televisionada” (Kim Bartley e Donnacha O’Briain, 2003), obra de dois jovens irlandeses que filmavam uma reportagem sobre Chávez e tiveram a oportunidade extraordinária de registrar o golpe e a subseqüente reação popular massiva que o derrotou.

            O documentário exibe ainda os militares, políticos, empresários, donos de TVs e jornalistas congratulando-se pelo sucesso aparente de seu golpe, em diálogos escandalosos que mostram o quão longe vai o ardor “democrático” dessa burguesia venezuelana com a qual a mídia mundial tão prontamente se solidariza. O fato de que Chávez, por sua vez, não tenha tomado nenhuma atitude política contra os golpistas, mas somente agora, cinco anos depois, tenha agido por um ato puramente administrativo, revela a infinita disposição do líder bolivariano para a conciliação de classes, numa via que pode até trazer melhorias limitadas para o povo venezuelano, mas jamais o levará para o socialismo, pois não rompe com a dominação burguesa.

            Os pilares do capitalismo na Venezuela não foram alterados por essa decisão administrativa, pois os demais meios de comunicação continuam funcionando normalmente, ou seja, a serviço do capital. Todo o barulho que se fez em torno da decisão chavista visa apenas reforçar aos olhos do público o quanto os meios de comunicação querem ser considerados intocáveis e mostra o quanto zelam pela manutenção de seu poder quase absoluto sobre o imaginário coletivo contemporâneo. O título do documentário citado é bastante feliz neste aspecto, pois demonstra o fato elementar de que, na atual sociedade do espetáculo, qualquer revolução necessariamente se fará contra a televisão, que por sua vez se recusará a mostrá-la.

            Os meios de comunicação (não apenas a televisão, mas também rádio, cinema, jornais, internet, etc.) não são ferramentas tecnológicas politicamente neutras. No contexto das relações sociais capitalistas, as técnicas de comunicação não são meios de informação, mas de ocultação da realidade. Seu papel é exibir o nada, o vazio, a nulidade, a vulgaridade e a venalidade das relações fetichizadas da sociedade burguesa. Ao mesmo tempo em que exibe o nada, a mídia oculta o real: a miséria em que vive a imensa maioria da humanidade, prisioneira da violência, da exploração, da degradação ambiental, da doença, da ignorância, da neurose, etc., que necessariamente acompanham o capitalismo.

            A mídia produz incessantemente o esquecimento do passado e a negação do futuro em nome de um presente bárbaro perpetuado. Além de negar o real, negando-se a mostrá-lo, a mídia precisa substituí-lo pelo irreal, criando o seu próprio mundo imaginário, através do bombardeio maciço e ininterrupto dos valores burgueses. Os espectadores são expostos ao massacre ideológico 24 horas por dia, 365 dias por ano, em todos os canais. Nos empurram goela abaixo o individualismo, a competitividade, o utilitarismo, o pragmatismo, o imediatismo, a fragmentação, a uniformidade, a fugacidade, a incultura, o anti-intelectualismo, o misticismo, o medo, a rejeição ao diferente, o chauvinismo, o otimismo panglossiano, o escapismo infantilizante, o consumismo, o luxo imoral e irresponsável, o culto às celebridades, o padrão de beleza eurocêntrico, etc.

            O resultado desse processo industrial de imbecilização coletiva é o aviltamento das consciências, a anestesia da sensibilidade, a mutilação da subjetividade e o rebaixamento do ser humano a uma condição de passividade bovina. Seja nos programas de “entretenimento”, seja nos “noticiários” e “informativos”, o conteúdo ideológico é sempre o mesmo, a defesa intransigente da ordem estabelecida, da mercantilização do mundo e da vida, da adoração ao dinheiro, da obediência ao Estado e às instituições. É esse o papel que cumprem os meios de comunicação privados a serviço do capital, seja nas nações imperialistas, seja nos países periféricos como a Venezuela e nosso próprio país.

            A mídia brasileira, ciosa de seus interesses, prontamente condenou Chávez e antecipadamente pôs na alça de mira qualquer opinião que ouse considerar a sacrílega possibilidade de não renovar alguma concessão de telecomunicação no Brasil. Ai de quem ousar questionar os pilares da ordem… Nosso espectro eletromagnético está repartido em faixas de freqüência cuja utilização para transmissões radiotelevisivas também depende de concessão do poder público. O Código Brasileiro de Telecomunicação de 1962 estabelece um prazo de 15 anos para renovação das concessões de TV e 10 anos para rádio. A Constituição de 1988 tirou do Executivo e atribuiu ao Congresso a faculdade de outorgar e renovar concessões. Entretanto, entre 1985 e 88, o coronel baiano ACM, supérstite da ditadura e ministro das comunicações de Sarney, havia distribuído centenas de concessões a seus aliados políticos.

            Criou-se então o fenômeno do “telecoronelismo”, por meio do qual os representantes das oligarquias mais reacionárias passaram a estar equipados dos mais poderosos recursos tecnológicos, reforçando sua supremacia política por meio do controle férreo sobre currais eleitorais eletronicamente domesticados, blindados contra a interferência de pensamentos divergentes. O fenômeno do telecoronelismo e a “bancada da mídia” prosseguiram nos governos de FHC e Lula, compondo um dos esteios políticos dos ataques imperialistas ao país na era neoliberal.

            Na recente discussão sobre a escolha de um padrão tecnológico para as transmissões de TV digital, esteve em pauta a possibilidade da abertura de um número virtualmente ilimitado de faixas de transmissão a serem também disponibilizadas para emissoras comunitárias e movimentos populares. Essa possibilidade foi descartada quando Lula optou pelo padrão desejado pela Rede Globo, mantendo basicamente inalterado o esquema de exploração comercial do espectro eletromagnético. Manteve-se o monopólio dos grandes grupos de mídia sobre o espaço, que o utilizam para a transmissão de um conteúdo extremamente rebaixado, sem qualquer valor humano e cultural e cuidadosamente adequado aos interesses ideológicos e políticos da burguesia brasileira e imperialista.

            Coloca-se então como uma tarefa crucial das forças populares lutar contra esse modelo de comunicação e encontrar as formas para que as vozes dos oprimidos sejam ouvidas e seus interesses históricos sejam colocados em pauta.

            Abaixo o Grande Irmão!

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Encarte Rebeldia Socialista – número 01

OCUPA USP

GREVE, OCUPAÇÃO, PASSEATAS: O MOVIMENTO ESTUDANTIL EM AÇÃO

Daniel M. Delfino, estudante de filosofia.

            Os ataques de Serra

            No início de janeiro de 2007 o governador de São Paulo José Serra (PSDB) lançou uma série de decretos que modificavam a estrutura organizacional das universidades estaduais paulistas (USP, UNESP, UNICAMP, FATECs). Os decretos criavam uma Secretaria de Ensino Superior acima dos reitores, na qual foi acomodado um aliado político de Serra, o médico José Aristodemo Pinotti, do PMDB. A nova Secretaria passaria a centralizar a administração das universidades, controlando seu orçamento, o que entre outras coisas impediria a contratação de professores e servidores, investimentos em assistência (moradia estudantil), e a própria pesquisa e extensão das universidades.

            Mais do que apenas recompensar um aliado político com uma sinecura, trata-se de um violento ataque contra a educação pública, pois fere diretamente a autonomia universitária. A possibilidade das universidades disporem sobre suas necessidades cotidianas fica prejudicada com a perda de controle sobre o orçamento. Esse projeto é coerente com a atual visão de gestão pública hegemônica no Brasil na era PSDB/PT: o Estado deve cada vez mais se retirar dos serviços públicos (educação, saúde, transporte, comunicações, etc.) e deixar tudo para a iniciativa privada.

            A situação das universidades

            Na visão neoliberal, as universidades devem ser colocadas diretamente a serviço das empresas. A lógica do mercado, e não o interesse científico, passa a determinar o que deve ser estudado, e a pesquisa aplicada é privilegiada em detrimento da pesquisa básica. Os promotores desse modelo de gestão revelam aqui toda a sua miopia histórica, pois sem uma forte estrutura de pesquisa científica básica (na qual as universidades paulistas ocupam posição de liderança no Brasil e na América Latina) para formar novas gerações de cientistas, acadêmicos e técnicos, a própria pesquisa aplicada a longo prazo será asfixiada, e o Brasil continuará sendo um país eternamente dependente e um perpétuo importador de tecnologia.

            Se a pesquisa básica nas áreas de matemática, física, química, biologia, etc., é considerada um “luxo” ou “desperdício”, que dizer então dos estudos em ciências humanas? Os setores da universidade que desenvolvem o pensamento crítico sobre a sociedade brasileira são os mais sucateados: não se contratam professores, os prédios são precários, as bibliotecas são pobres, não há laboratórios de informática, as salas de aula são superlotadas, etc. As condições para que estudantes oriundos de escolas públicas se mantenham na universidade (moradia, alimentação, transporte, etc.) também são as piores possíveis, o que contribui para que as universidades públicas continuem sendo um “oásis” privativo da elite, praticamente vedado aos estudantes vindos da classe trabalhadora, aos negros, nordestinos e moradores da periferia.

            A resposta dos estudantes

            A situação de sucateamento do ensino público se agravaria ainda mais com a implantação dos decretos. Diante disso, os estudantes da USP, maior e mais importante universidade do país, também aquela que concentra a maior parte dos problemas de inclusão, e a mais diretamente visada pelos decretos, foram à luta. Exigiram a abertura de discussões com a reitora Suely Vilela, que no entanto se recusou a uma audiência pública, numa clara demonstração de que a burocracia universitária trabalharia pela implantação dos decretos. Diante da recusa da reitora em debater as suas reivindicações, os estudantes ocuparam a reitoria da USP, no dia 3 de maio.

            A partir da ocupação da reitoria, o movimento se expande e toma corpo. As assembléias passam a receber milhares de estudantes, algo que não acontecia há muitos anos. No dia 16 de maio é declarada greve dos estudantes e no mesmo dia os trabalhadores da USP também entram em greve. No dia 23 de maio é a vez dos professores da USP entrarem em greve. Com a greve dos três segmentos da universidade, o movimento alcança seu apogeu. Grandes atos, assembléias e passeatas com milhares de participantes colocam o problema da universidade no primeiro plano dos debates.

            A força do movimento

            A mobilização da universidade integrou-se aos movimentos dos servidores estaduais em campanha salarial, principalmente professores – também alvejados pela política de Serra –, bem como a setores do funcionalismo federal, MST e movimentos populares em geral, numa jornada de lutas que teve seu auge no dia 23 de maio. Ocupações e passeatas aconteceram em todo o país, numa tentativa de despertar a sociedade para a necessidade de lutar contra as reformas neoliberais em implantação pelos governos do PT e PSDB.

            Cabe destacar que, assim como os sindicatos da CUT boicotaram as lutas em curso contra as reformas do governo Lula, o DCE (Diretório Central dos Estudantes) da USP, ligado à UNE (controlados por PT/PC do B/MR8-PMDB) boicotou a ocupação e a greve da universidade, sendo maciçamente rechaçado pelos estudantes e praticamente expulso das assembléias.

            Cultura de greve

            Os melhores momentos do movimento estiveram nas grandes passeatas e manifestações, e também nas formas de organização inovadoras desenvolvidas para administrar o cotidiano da ocupação. Formaram-se comissões de limpeza, alimentação, segurança, informática e comunicação, desenvolveram-se atividades de “cultura de greve” com a presença na ocupação de professores como Paulo Arantes, Osvaldo Coggiola, Aziz Ab’Saber e Dalmo Dallari, que realizaram palestras e participaram de debates; e também contamos com artistas como Tom Zé, Bnegão, e a Cooperifa (cooperativa de artistas de periferia).

A maior parte das atividades foi tocada por estudantes não filiados a correntes políticas, os chamados “independentes”. A esquerda organizada, e principalmente os partidos mais reconhecidos, como PSOL e PSTU, atuou de forma superficial e dispersa, não ajudando a construir a ocupação. Como reflexo de uma concepção política que separa trabalho braçal e intelectual, a esquerda se dividiu entre uma ala dos que “carregam o piano”, tocando as atividades cotidianas (fazendo comida, lavando os banheiros, cuidando da limpeza, compondo as rondas de segurança) e a ala dos que “aparecem na foto”, falando à imprensa e comparecendo nas assembléias para dizer aos outros o que fazer. Os independentes erraram por sua inexperiência, e os organizados erraram por seu sectarismo e distanciamento, mas ainda assim houve acertos que se refletiram no fortalecimento do movimento.

            A tática da burguesia

         Naturalmente a imprensa burguesa esteve contra a ocupação e a greve: os ocupantes e grevistas foram apresentados nos jornais e na TV como baderneiros, bagunceiros, irresponsáveis, vândalos, autoritários (porque “cercearam o direito dos que querem estudar”) ou como loucos, utópicos e dinossauros, porque muitos dos participantes do movimento defendem o socialismo como resposta para os problemas da sociedade.

            A resposta do governo Serra foi a repressão. A polícia foi acionada mais de uma vez para reprimir manifestantes, o governador – que já foi presidente da UNE na década de 60 – ameaçou usar a tropa de choque para desocupar a reitoria pela força e também ameaçou invadir o campus da USP, algo que aconteceu pela última vez em 1968, no momento mais duro da ditadura militar. O custo político dessa medida extrema mostrou-se tão elevado que forçou Serra a desistir. A ameaça de invasão mostrou-se um blefe. Os estudantes pagaram para ver, mantiveram-se na reitoria, e venceram a aposta.

            Incapaz de usar sua arma derradeira, Serra recuou, fazendo ser publicado no dia 31 de maio um “decreto declaratório” com uma “nova interpretação” das medidas que provocaram a mobilização. Na prática, os decretos de ataque à universidade ficaram sem efeito. A partir daí, o movimento uspiano entrou num relativo refluxo: professores e funcionários saíram da greve em função de suas próprias pautas, a maior parte dos cursos aprovou fim da greve estudantil e a ocupação começou a ficar isolada na própria USP.

            Contradições e desafios futuros do movimento

            No mesmo momento em que a greve refluía, a situação nacional estava justamente refletindo a repercussão dos acontecimentos da USP. O exemplo dos estudantes uspianos começou a ser seguido. Em várias faculdades do estado e universidades federais pelo Brasil afora pipocaram greves estudantis, ocupações de reitorias, greves de funcionários e de professores. Várias dessas ações enfrentaram-se com a repressão policial. Outras obtiveram conquistas em face dos governos reacionários.  Reivindica-se aumento de salários, contratação de professores, melhorias na moradia e assistência estudantil, democratização e participação dos três segmentos na gestão das universidades. No geral, todas essas pautas formam uma luta pela defesa do ensino público, contra o sucateamento e privatização das universidades.

            No dia 16 de junho realizou-se na própria USP um Encontro Nacional das Faculdades em luta, expressando um grau de mobilização em nível nacional que não era vivenciado há muito tempo no movimento estudantil, mas mesmo em face desse cenário nacional, a assembléia do dia 21 de junho votou o fim da ocupação, depois de 51 dias.

            Apesar de suas limitações, que são as limitações da nossa esquerda em geral, como o aparelhismo, o fracionamento, o distanciamento das bases e a falta de programa, o movimento iniciado na USP apontou a única via capaz de enfrentar os ataques do imperialismo e dos governos neoliberais ao país: a luta direta. Os estudantes (com os partidos, sem os partidos ou apesar dos partidos) se articularam, debateram e construíram seu movimento, suas formas de organização, de decisão e de ação. Aceitaram o desafio e foram para a ação, erraram e acertaram, aprenderam e ensinaram, fortalecendo-se e crescendo na própria luta, mostrando que é possível.

            A ocupação terminou, mas como disse um grafite nos muros da USP, “ocupe a reitoria que existe dentro de você.”

HÁ VAGAS

MAS…

A. M. D.

Sim, eu escolho se você vai sair ou vai ficar. Se você vai entrar ou vai ficar de fora. Eu decido seu futuro, seu presente, seus sonhos. Eu sou mais rico que você, mais bonito que você, mais poderoso que você. Eu sou aquele que diz: “Pule!”, e você pula. Eu digo: “Estude!”, e você vai estudar. Cadê seu diploma? Cadê seu histórico profissional? Cadê seu trabalho voluntário?

Não, você não é bom o suficiente para mim. Você é pequeno, tímido, muito pouco incisivo. Me convença, me faça perceber que você é melhor que os outros. Melhor que eu não, isso você não pode ser, pois eu dou o veredito. Eu escolho seus próximos passos e decido até as roupas que você vai vestir.

Sim, eu decido. Decido se você come maçã ou sorvete, porque um deles engorda e você não vai querer ser gordo, não é? Quem vai olhar para você? Quem vai namorar você? Quem vai te contratar?

Não, não seja feio. Nâo seja ultrapassado. Aceite a homossexualidade, nem que seja só um pouquinho, para ser aceito pelo grupo. Aceite os negros. Afinal, eles estão por toda parte. Portanto, seja discreto e não demonstre preconceito porque isso está fora de moda.

Sim, eu sou bonito, glamouroso e perfumado. Eu sei o que falar e como falar, na hora certa. Você ainda não aprendeu? Entre para o meu clube e aprenda. Só depende de você querer. Você vai conseguir. Tudo depende de sua força de vontade e de sua capacidade de adaptação às mudanças e às exigências sociais. Por isso, repito, não seja preconceituoso, mesmo que apenas aparentemente. Isso está fora de moda.

E não confunda as coisas: hoje eu estou aqui te impulsionando, para que cresça comigo. Se você não quiser, terá que voltar ao fim da fila e reaprender tudo de novo, pois não posso parar. A fila é grande, é enorme, e grita neurótica e anônima.

Sou seu amigo, sim. Por isso, te sugiro: recicle-se, faça caridade, faça pós-graduação e academia. Não duvide do seu potencial. Você é capaz. Convença-se disso. Não deixe que os outros te abatam. Ao contrário, passe por cima deles e mostre a que veio. Afinal, é cada um por si e Deus por todos.

Eu decido seu futuro. Eu escolho sua postura sexual. Eu escolho o sim ou o não. Eu alterno entre um e outro, pois sou onipotente e onisciente. Mas eu sou bom. Eu só quero o bem de todos, a igualdade de todos, por isso dou iguais oportunidades para todos vocês, sem distinção. Não sejam ingratos. As portas estão abertas para todos os currículos. Mas os melhores não vão para o arquivo.

Você ainda está desempregado? A culpa é sua, porque as vagas chegam aos montes nas minhas mãos. E as profissões estão exigindo pessoas qualificadas. Seu inglês já é muito pouco, sua experiência é pequena. E sua estabilidade? Requisito básico: três anos na mesma empresa, para que eu perceba sua habilidade para lidar com problemas e situações inevitáveis de uma empresa. Mas não seja muito velho, porque o prazo de sua graduação terá expirado. Você tem que ser um jovem de muita experiência.

Quem você pensa que eu sou? Você pensa que eu sou o capital?

Não, eu sou apenas uma psicóloga recém-formada que ingressou numa empresa de recursos humanos como selecionadora, uma jovem que se sente cúmplice de um estilo de vida irreal e infeliz, subjetivamente falso e hipócrita; uma jovem que precisa pagar as contas e que ouve essas vozes, subliminarmente, em cada entrevista e a cada vez que uma pessoa é dispensada. Uma pessoa que vive nesse mundo, que também faz parte dele, e que também ouve muitos nãos, que também ouve que não está pronta, que não é boa o suficiente.

Na empresa em que trabalho, chegam jovens com cursos universitários, procurando por empregos que não correspondem à área de suas formações. Eles simplesmente querem trabalhar. Eles simplesmente precisam trabalhar. A maioria desses jovens trancou a faculdade. Parou no terceiro semestre. Abandonou no quarto ano. Motivo? Sempre a mesma resposta: não podia mais pagar. Mas ele não consegue uma oportunidade de emprego, porque ele não terminou a faculdade. E como ele vai trabalhar para dar continuidade ao curso se ele não termina o curso? É uma ciranda patética, sem sentido e alucinada, que provoca em todos uma sensação de culpa e impotência, capaz de aniquilar qualquer senso de direito e de dignidade. Por isso, certo dia entrevistei uma aluna de direito que estava procurando por um emprego em telemarketing. Isso a frustra? Não tive tempo de descobrir ou perguntar. Tinha outras entrevistas a fazer, e a ciranda continuava rodando com volume altíssimo, nas ruas do centro, de onde vem a gritaria que ouço, alucinada e neurótica, da sala do prédio onde trabalho. Mas a culpa é dela, não é?

Nesse mesmo emprego, devo sugerir às pessoas encaminhadas, essas sortudas “pessoas certas que apareceram no lugares certos”, que façam a barba e cortem o cabelo. Sim, eu olho para elas e sugiro que a maguiagem seja discreta, mas visível e interessante. Aconselho que o terno e a gravata sejam utilizados na entrevista da empresa para a qual a pessoa será encaminhada. E sugiro às garotas que usem salto. Afinal, o gerente que fará a entrevista quer saber mais da habilidade da garota de caminhar sobre dois finos saltos de 9 centímetros do que nas qualificações para a vaga.

O que fazer diante dessa constatação? Continuo me prostituindo para pagar as contas ou exerço com isonomia e respeito a profissão na qual me formei, e que eu acabei gostando? Será possível driblar a diferença no tratamento que se dá a um especialista que vale 11.000 reais e um telefonista de 550? Será possível perceber, diante de tanta massificação, exploração e competitividade a humanidade sofrida e subjetivamente destroçada de cada pessoa que me procura atrás de um emprego, independente do salário, e tratá-los igualmente? Ao mesmo tempo, também não posso odiar o trabalhador que recebe um salário de 11.000 reais. Isso é preconceito e limitação de pensamento. Somos todos humanos e todos temos o mesmo valor como seres humanos. Certo? Sim, será possível para mim. Será possível ao capital perceber essa desigualdade e sensibilizar-se com ela? O que você acha? Também sou aquele que pergunta e não tem respostas, e pede a você me ajude a pensarmos juntos.

Ainda acredito que posso fazer diferente dentro dessa podridão. Esse discurso perverso que separa os “capazes dos incapazes” é ouvido por todos nós, todos os dias. Por mim, como psicóloga, por você, estudante, trabalhador, empregado ou desempregado. Eu sou um enorme “mais um” no meio dessa multidão, não “apenas” mais um. Você é tão grande quanto a humanidade, independente da bandeira que hastear. Escolha uma, pois o tempo não pára. Não importa a sua profissão. O que importa é a sua posição.

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