Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

Contribuição do Espaço Socialista para o Congresso da ANEL -2011

Contribuição do Espaço Socialista para o Congresso da ANEL -2011

Construir a ANEL pela Base e ao Lado dos Trabalhadores

         No Congresso Nacional de Estudantes em 2009, onde surgiria o projeto da ANEL, levamos uma tese que trazia um sério balanço da realidade da educação e a inserção desta nos marcos da crise econômica mundial que então se iniciava.

            Discutimos o papel do movimento estudantil na realidade sob o impacto da então inicial crise econômica mundial e a necessidade de se construir o movimento com amplo debate nas escolas e universidades e que caminhasse para a unidade com os movimentos dos trabalhadores.  De cara colocamos como problemática a fundação de uma nova entidade sem antes fazer uma profunda discussão e balanço com a base estudantil. E na luta por uma ANEL realmente construída pela base é que fazemos algumas contribuições.

            Como hoje entendemos que os efeitos da crise continuam a se espalhar pelo mundo e no Brasil, apesar do discurso da “marolinha”, sabemos que o setor da educação pública tem sido e continuará cada vez mais a ser precarizado, como uma das medidas necessárias  para a retomada dos lucros dos capitalistas. Desta forma, boa parte de nossa tese de 2010, mantêm-se atual, já que a crise está ainda presente e as necessidades básicas dos trabalhadores continuam crescentes.

A crise e suas conseqüências no Brasil e no mundo

            A crise econômica mundial que deu seus primeiros traços ainda em 2008 é uma crise de reprodução do capital e tem suas raízes já nos anos 70, quando a tendência de queda da taxa de lucro e a crise de superprodução nos países da Europa e nos EUA forçaram uma forte intervenção estatal e um majestoso incentivo ao consumo das massas, visando assim garantir novo ascenso  de lucratividade e expansão do sistema. Com efeito, a crise iniciada em 2008 nada mais é do que um dos elementos de uma crise muito maior, a saber, crise sistêmica e social do capital.

            A liberalização econômica iniciada por Ronald Reagan nos EUA e Margaret Tatcher, na Inglaterra e que alcançou o Brasil com Collor, desenvolvendo-se nos governos de FHC e Lula, mostrou seus limites econômicos e políticos mais uma vez, na falência do atual modelo de crédito precipitado pelo estouro da bolha imobiliária estadunidense.

            Outro elemento da atual crise econômica é que esta apresenta-se como consequência da aplicação da tecnologia à produção e a formação de um mercado mundial globalizado e realmente integrado. Dessa forma a capacidade de produção foi multiplicada e o desemprego deixou de ser reserva de mão de obra para se tornar estrutural. Pela primeira vez na história da humanidade todos os países do globo estão interligados na cadeia de produção e consumo do sistema capitalista. Não há mais novos mercados a conquistar, não há mais novos exércitos de mão de obra a serem anexados, não há mais mercados consumidores a serem integrados. Mas a pior característica da atual fase do capitalismo é que mesmo que houvesse novos mercados de mão de obra, matéria prima ou consumo, não há como manter os níveis de consumo nos padrões estadunidenses sem comprometer a reprodução material das espécies vivas de nosso planeta.

            Hoje os efeitos da crise se mostram cada dia mais aparentes e colocam para a burguesia a necessidade de repassar a conta da crise aos trabalhadores, por meio de cortes e do conseqüente rebaixamento das condições de vida de nossa classe. Buscam, assim, construir novas bases para um novo ciclo de acumulação.

            Outro fator importante do desenrolar da crise é o fato de a classe trabalhadora e o movimento estudantil voltarem à cena para responder a estes ataques em vários países.

            Desde o inicio da crise assistimos em praticamente todos os cantos do planeta levantes contra os ataques, França, Grécia, Espanha, Egito, Tunísia, entre muitos outros, revelam que os trabalhadores e estudantes do mundo não ficarão parados, e mais, revelam a necessidade de reconstruir pela base a alternativa socialista.

            O Brasil entra neste contexto e dos trabalhadores e estudantes exige-se uma unidade em perfeita simbiose, capaz de superar os limites das demandas mais imediatas e de recolocar no plano atual a alternativa socialista como condição necessária à superação dos limites impostos pelo sistema do capital.

A situação do ensino no Brasil e as tarefas do movimento estudantil

            Apesar dos discursos oficiais que têm ecoado por todos os cantos do país, carregados de frases vazias como “educação é a prioridade das prioridades”, na prática professores e estudantes sabem que a realidade demonstra prioridades outras, tais como o pagamento de amortizações da dívida pública.

            Atualmente o Brasil  ocupa o 88° lugar no Índice de desenvolvimento da educação (IDE/2010), em penúltimo lugar na América do Sul, à frente apenas do Suriname. 14,1 milhões de brasileiros são analfabetos, representando 9,7% da população com idade superior a 15 anos. (Fonte: Caros Amigos/n°53)

            No ensino fundamental e médio professores deparam-se com salas aula superlotadas, na média 27 alunos por sala (MEC), mas quando andamos pelas escolas da periferias facilmente encontramos salas com 40, 50 alunos.

            A situação não é diferente quando falamos de ensino superior para os trabalhadores. Segundo dados do IBGE de 2009 apenas 13,9% dos jovens brasileiros conseguem matricular-se em um curso universitário, e dos matriculados 73,31% estão no ensino privado (MEC).

            Fica ainda mais esvaziado o discurso de “prioridade das prioridades” quando analisados os investimentos do governo federal na educação nos últimos 10 anos. Atualmente apenas 4% do PIB é destinado à educação, sendo que boa parte deste montante está a serviço da criação de bolsas de estudos em universidades privadas, por meio da transferência de renda pública aos cofres de investidores do ensino.

            Programas como o PROUNI, FIES, e agora com Dilma, PRONATEC e PROMÉDIO, apenas mostram que, longe de pensar em educação, o governo tem priorizado garantir os lucros do ensino privado. Só para termos uma ideia, este setor sofria com o não preenchimento de vagas e as altas taxas de inadimplência que antes do PROUNI beiravam um percentual de 40%.

            Para piorar 30% das universidades privadas que aderiram ao PROUNI não mantém sequer um aluno bolsista em sala de aula.

            Pouco mais da metade das bolsas anunciadas pelo governo foram realmente ocupadas, sendo que entre 2005/2008 das 610 mil bolsas ofertadas apenas 385 mil foram preenchidas, fora o fato do peso das bolsas ser irrisório quando tratamos de cursos mais elitizados, como medicina onde o peso das bolsas do PROUNI representam apenas 0,7%.

            Hoje as discussões quanto aos investimentos na educação voltaram à tona com o novo Plano Nacional de Educação (PNE), que estipula metas para um período de dez anos. O novo PNE apresentado pelo governo federal apresenta como percentual de investimento na educação apenas 7% do PIB, percentual este que fora aprovado dez anos atrás no congresso e que foi vetado por FHC e mantido por Lula. Agora dez anos depois propõem implementar os 7%, completamente defasados pelos anos de inflação.

            Entendemos o Movimento Estudantil (ME) como um movimento importante na luta frente aos ataques dos governos contra o direito dos trabalhadores a uma educação de qualidade e acessível, porém o ME só pode de fato ser um movimento transformador se superar os limites das lutas imediatas, colocando suas demandas ao lado das demandas dos trabalhadores e dando assim um salto rumo ao socialismo, respeitando ainda assim a evolução rumo ao socialismo do pensamento dos estudantes trabalhadores em relação às questões que a luta os coloca.

            É na atual conjuntura de crise estrutural do capital que devemos nos localizar para iniciar uma discussão a respeito do que interessa ao ME. A educação, como qualquer outra esfera da vida no capitalismo, assume cada vez mais o sentido de mercadoria. A lucratividade na educação privada, aliada à redução de custos em todos os níveis no ensino público, dão a tônica das políticas aplicadas ao setor.

            É esse pano de fundo que justifica que os gestores do Estado, de um lado, dêem condições para que a educação se torne cada vez mais uma mercadoria lucrativa, e de outro, se combine a possibilidade de aplicar a produção científica gerada nos centros públicos de excelência para desenvolver novos produtos. Além disso vemos o Estado se utilizar da escola nas periferias como forma de conter a revolta dos jovens que serão parte do exército de desempregados estruturais e que somente encontrarão atividades precarizadas e de baixa renda como forma de sobrevivência. Nessa missão, o Estado conta com a participação das entidades estudantis oficiais (UNE, UBES), com o financiamento de órgãos internacionais e com diversas ONG’s que fazem propaganda dos limites da vida na periferia como único espaço de sociabilidade viável e desejada, contribuindo para que os horizontes da juventude da periferia nunca alcancem os equipamentos culturais diversificados que somente existem no centro, como museus, teatro, cinemas, praças públicas e as praias das cidades litorâneas.

            Precisamos contrapor ao projeto burguês, de uma classe que vive da extração da riqueza, um projeto da classe que produz a riqueza, um projeto da classe trabalhadora. Pois, com a crise econômica capitalista, a tendência é que se aprofundem os ataques à educação, com cortes de verbas e mais precarização das escolas/universidades, o que coloca para nós a necessidade de apresentarmos um programa que responda a essa crise e também coloque para os estudantes que só poderemos ter uma educação de qualidade e a serviço da humanidade com o socialismo.  

            A crise da educação é, portanto, o reflexo da crise da sociedade capitalista. Não é mais possível construir um ME que não responda a esses problemas estruturais. Necessitamos de um ME que lute pelas questões especificas da educação, mas que, necessariamente, faça delas uma ponte para a luta pelo socialismo.

O Movimento Estudantil e trabalhadores: Uma aliança estratégica

            Um projeto dessa magnitude precisará mobilizar amplos setores da sociedade, pois qualquer projeto alternativo aos interesses da burguesia irá enfrentar a oposição organizada dessa classe, isso, portanto, inviabiliza a possibilidade desse projeto ser elaborado somente pelos acadêmicos ou mesmo pelos intelectuais orgânicos da classe trabalhadora ou ainda por um ou outro partido ou organização. A construção de um projeto de educação a serviço das necessidades humanas somente será possível na convergência dos esforços de todos os setores envolvidos com a educação e das organizações dos trabalhadores que se mobilizarão na defesa de melhores condições de trabalho, salário e emprego para fazer frente aos ataques dos mais diversos governos e patrões.

            Somente a articulação das camadas que ainda não tiveram acesso ao ensino de qualidade, dos trabalhadores e profissionais da educação, dos estudantes e suas ferramentas de luta (grêmios, C.As, D.A’s, D.C.E’s) bem como da comunidade que utiliza as escolas e universidades poderá apontar uma ação eficaz contra a lógica do capital de seguir transformando a educação em mercadoria e a escola de periferia em depósito de desempregados estruturais.

 

Propostas para unir o Movimento Estudantil à lutas gerais e específicas dos Trabalhadores

 

  1. 10% do PIB para a educação já!!!!
  2. Proporcionalidade nos processos seletivos, que os trabalhadores e seus filhos ocupem em todos os níveis de educação a mesma proporção que existe na sociedade;
  3. Cotas proporcionais para negros e indígenas em todas as esferas da educação;
  4. Educação em período integral (8h), com investimento financeiro que propicie um ensino e equipamentos de qualidade, combinado com atividades culturais e de lazer;
  5. Gestão paritária. Que os alunos tenham possibilidade real de interferir na construção do conteúdo que estudam nas escolas e faculdades;
  6. Defesa da qualidade de ensino nos seus três níveis. Melhores salários e condições de trabalho para os professores e funcionários das escolas e universidades , melhores instalações e recursos materiais (laboratórios, bibliotecas, material didático, etc.). No ensino fundamental e médio: fim da progressão automática, fim do ensino religioso, inclusão obrigatória das disciplinas de educação sexual, filosofia, sociologia, psicologia, história e cultura da África e da América Latina;

 

  1. Redução da jornada de trabalho do jovem para 06 horas/diárias;

 

  1. Que os estágios deixem de ser forma de precarizar o trabalho do jovem. Direito trabalhista para o estagiário;

 

  1. Fiscalização dos estágios por organismos de base do movimento estudantil;

 

  1. Mínimo do Dieese como referência salarial a ser aplicado ao cálculo da remuneração proporcional dos estágios;

 

  1. Creches públicas, gratuitas, com qualidade educacional nos locais de trabalho e estudo;

 

  1. Fim do pagamento da dívida externa. Que se invista as riquezas produzidas pelo povo brasileiro para resolver os problemas do povo brasileiro.

 

  1. Fim do PROUNI, FIES, PROMÉDIO, PRONATEC, que os valores das bolsas sejam investidos imediatamente na abertura de mais vagas e escolas públicas.

 

  1. Fim das terceirizações e incorporação imediata dos terceirizados.

 

  1. Fim da criminalização dos movimentos sociais, pelo direito de livre organização, mobilização e greve!!!

 

 Espaço Socialista, Junho de 2011.

 

 

 

 

 

Leia mais

TESE PARA O ENCONTRO NACIONAL DA OPOSIÇÃO BANCÁRIA

1 CONJUNUTRA

1.1 O caráter da crise

O 2º semestre de 2008 trouxe à tona a crise estrutural do capital, que está em curso há quase quatro décadas e que se tornou evidente por meio do encerramento do último ciclo periódico da economia. Esse fenômeno recebeu o nome de “crise financeira” e vem sendo tratado pela imprensa burguesa e pela esquerda reformista como uma simples recessão, da qual o capitalismo sairá em pouco tempo e apenas levemente avariado.
Na realidade, trata-se de uma crise mais séria, que expõe uma série de limites estruturais do capitalismo. Os mecanismos que o sistema tem utilizado nas últimas décadas para deslocar suas contradições esgotaram sua eficácia. O modelo de acumulação flexível (toyotismo), a formação do mercado mundial de força de trabalho (e sua conseqüente precarização) com a incorporação da China e da Índia, a mundialização neoliberal e sua desregulamentação financeira, o endividamento do Estado, das empresas e dos consumidores; todas essas estratégias foram tentativas de evitar a contradição fundamental do sistema do capital, que opõe a socialização da produção à apropriação privada.
O capitalismo produz mais mercadorias e mais capital (com destaque para as mais recentes modalidades de capital fictício), mas o número de consumidores se reduz, o que leva a crises cíclicas de superprodução cada vez mais violentas. A chamada crise financeira é apenas uma manifestação superficial do acirramento das contradições em nível estrutural. Além do seu aspecto puramente econômico, a atual crise envolve também uma série de outras dimensões, como a deterioração das condições ambientais, a proximidade do esgotamento da atual matriz energética, o repúdio ao imperialismo (em particular estadunidense) no Oriente Médio e na América Latina, a crise generalizada da cultura em todas as suas esferas (filosofia, ciência, artes, ética, relações interpessoais), incapazes de apontar um sentido para a vida, etc.
Estamos diante de uma verdadeira crise civilizacional, que coloca para a humanidade a necessidade vital de reconstruir a alternativa socialista. Enquanto não se materializar uma alternativa socialista, a burguesia seguirá adiante no aprofundamento da barbárie. A superprodução de mercadorias e de capital chegou a um limite que obriga a burguesia a encontrar formas de destruir o capital excedente para desbloquear o processo de realização do valor. Historicamente isso é feito por meio da guerra e do rebaixamento geral das condições de vida da classe trabalhadora.

1.2 As respostas da burguesia

A burguesia mundial reagiu ao primeiro surto da crise através do endividamento do Estado, cujos recursos foram usados para salvar o capital financeiro e evitar uma derrocada geral acelerada. Trilhões de dólares foram gastos pelos Estados do mundo inteiro em pacotes de salvamento do sistema financeiro, tanto pelas maiores potências imperialistas como pelas mais insiginificantes semi-colônias. Entretanto, os desequilíbrios não foram corrigidos, pois não podem sê-lo sem a abolição do próprio capitalismo.
A situação atual é de um impasse, no qual a burguesia tem conseguido administrar a crise apesar dos números alarmantes do desemprego e da crise social que avança nos países centrais. O ataque sobre as condições de vida da classe é a única forma do capital recuperar sua taxa de lucro. As demissões, as reduções de salário e os cortes de direitos são a receita da burguesia para salvar o capital, sendo aplicados com a colaboração dos governos e burocracias sindicais do mundo inteiro. Em tese, o capital precisaria nivelar por baixo o grau de exploração da força de trabalho em escala global, forçando os trabalhadores do mundo inteiro a aceitar as condições salariais e laborais mais rebaixadas possíveis, que são aquelas hoje já vigentes na China e nos países asiáticos. Se isso ainda não foi conseguido nos países centrais, como Estados Unidos, Europa e Japão, é porque a burguesia até o momento não construiu politicamente uma correlação de forças suficientemente favorável para impor tais medidas sobre o proletariado desses países.
Em países intermediários, como o Brasil, há setores da classe trabalhadora que também estão numa condição econômica e social ligeiramente acima do nível mínimo chinês. Trata-se de uma minoria da classe, já que a maioria dos trabalhadores brasileiros vive entre o desemprego e o subemprego, o trabalho precário, terceirizado, intermitente,temporário e informal, sem proteção social, sem regulamentação das condições de segurança e de saúde no trabalho, ou mesmo da duração da jornada, sem direito à organização, sindicalização ou greve; e com uma renda que mal cobre os custos de sobrevivência. Há um setor da classe, porém, que ainda está protegido por contratos de trabalho formais, previdência pública, seguridade social, legislação trabalhista, direito à organização e sindicalização, etc. Do ponto de vista do capital, esse setor é mais um alvo potencial da política geral de rebaixamento das condições de vida do proletariado global.

1.3 A situação do Brasil

Se não conseguir impor rapidamente uma derrota política brutal ao proletariado dos países centrais, ou deparar-se com uma resistência suficientemente forte, o capital poderá deslocar seu foco para os países periféricos que ainda possuem alguma margem de conquistas salariais e sociais disponíveis para serem “queimadas” na busca do nivelamento global, entre os quais o Brasil. Por enquanto, o desemprego, a redução de salários e o corte de direitos seguem avançando nos Estados Unidos, Europa e Japão, tendo provocado uma resistência mais significativa principalmente por parte dos trabalhadores europeus, que tem se mostrado insuficiente porém para barrar o processo. Em função disso, o ataque direto aos setores organizados do proletariado brasileiro ainda não é uma prioridade para a burguesia.
O Brasil tem sido relativamente poupado das conseqüências mais devastadoras da crise. Depois da primeira onda de demissões, especialmente nas montadoras e setores ligados à exportação, a situação foi momentaneamente estabilizada. Isso não se deve a nenhuma virtude, competência ou demonstração de habilidade do governo de plantão, mas ao fato de que a nossa vez ainda não chegou. Antes de partir para o ataque direto contra os trabalhadores, a burguesia ainda tem uma importante carta na manga, o controle sobre o Estado, que lhe permite socializar indiretamente as conseqüências da crise.
O Estado pode endividar-se, emitir títulos, gastar reservas cambiais, ampliar o crédito, baixar os juros, fornecer dinheiro às empresas e bancos com problemas, cortar investimentos em saúde, educação e serviços públicos, reforçar os programas assistenciais para manter os mais pobres sob controle e consumindo, etc. Com pequenas variações, essas têm sido as políticas de todos os governos burgueses em face da crise, e o caso de Lula no Brasil não é exceção. Essa margem de manobra do Estado permite à burguesia brasileira administrar a crise sem que os desequilíbrios se tornem explosivos.

1.4 A falsa recuperação e a propaganda governista

O fato de que uma explosão mais grave ainda não tenha acontecido está sendo interpretado pela propaganda governista como indício de que uma recuperação já está à vista. Os índices econômicos oficiais apresentam um cenário estável, senão róseo. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) do Ministério do Trabalho, houve uma variação positiva de 0,15% entre o número de admissões e desligamentos no primeiro quadrimestre do ano. Segundo o DIEESE, o desemprego nas principais regiões metropolitanas mais o Distrito Federal ficou em 15,3% em abril. A inflação medida pelo mesmo organismo ficou em 1,43% entre janeiro e abril de 2009.
Essa situação até que não parece ser muito ruim, considerando-se a ameaça de uma crise catastrófica que paira no horizonte. É preciso considerar porém o fato de que, segundo o mesmo DIEESE, o salário mínimo necessário (que constitucionalmente deve cobrir as despesas do trabalhador e sua família com alimentação, saúde, educação, vestuário, higiene, moradia, transporte, lazer e previdência) deveria estar na casa de R$ 1.972,64 – sendo que a remuneração média do trabalhador nas regiões metropolitanas (ou seja, onde a renda é mais alta) está em R$ 1.240,00 – e o salário mínimo oficial está em apenas R$ 465,00. Ou seja, a maior parte dos trabalhadores sobrevive com muito menos do que o mínimo necessário. Esse aperto imposto aos trabalhadores é o segredo para a recuperação da economia capitalista. O aperto permite aumentar a taxa de lucro num momento em que há uma diminuição da massa de mais-valia por conta das quedas na produção.
Para completar a propaganda governista, entram em cena os números das bolsas de valores, que há alguns meses têm apresentado altas significativas. O Ibovespa fechou o mês de maio aos 53.198 pontos, praticamente o mesmo nível de agosto de 2008 (55.680), imediatamente antes da eclosão da crise. Da mesma forma, o dólar também chegou a uma cotação (R$ 1,970 em maio) praticamente idêntica à de agosto de 2008 (R$ 1,905). Os índices das bolsas são tomados como indicadores da saúde do conjunto da economia, quando na realidade indicam apenas as expectativas de lucro dos capitalistas, as quais estão momentaneamente elevadas por conta do empenho do governo em ajudar as grandes empresas. Não há uma recuperação real e duradoura, mas um simples reflexo das políticas governamentais para salvar o capital.
Essa política envolve medidas como o pacote da habitação, que vai simplesmente desviar dinheiro do FGTS dos trabalhadores para as construtoras em apuros, sem qualquer traço de um projeto de reforma urbanística estrutural, que envolva, além da moradia de qualidade, obras de saneamento, infra-estrutura, transporte público, equipamentos públicos de lazer, etc. Há também atos puramente demagógicos, como a troca do presidente do Banco do Brasil por um nome mais afinado com a queda dos juros, mas que está longe de representar uma mudança real na atual política de um banco de mercado, em direção a um banco verdadeiramente público e de fomento.

1.5 As disputas políticas

Diante da generalização da crise internacional, a tendência é de que haja uma agudização da luta de classes, que se reflete num acirramento da polarização política. Tragicamente, a classe trabalhadora está desprovida de uma alternativa política para a luta. No plano ideológico, a consciência mais geral da classe que permanece prisioneira da idéia de que “não há alternativa” ao capitalismo, à propriedade privada, à competição, etc. No plano organizativo, não há um partido ou movimento social com representatividade e inserção de massa suficiente para se apresentar como direção.
No Brasil, a maior parte da classe permance reconhecendo Lula como sua direção. A política de Lula é parte de uma lógica geral de funcionamento das burocracias. Num cenário de crise, a direção burocrática tende a acentuar seus traços de substituísmo social, resalvadas as diferenças de condições sociais e regimes políticos em que cada burocracia opera. A burocracia pode em determinados momentos ser a melhor gestora dos interesses do capital, como é na China. Entretanto, ela não é homogênea com a burguesia e pode realizar algumas diferenciações táticas limitadas em relação ao imperialismo. A burocracia pode diminuir o ritmo da restauração do capitalismo, como está fazendo o governo cubano, ou mesmo realizar estatizações, como está fazendo Chávez.
Entretanto, o fundamental para todas as burocracias é impedir o desenvolvimento de uma alternativa independente própria da classe trabalhadora, o que as leva a se tornar mais repressivas e autoritárias contra as greves e lutas dos trabalhadores. Ao mesmo tempo que aumenta o autoritarismo, a burocracia trabalha em diversas outras frentes para se aferrar no controle do Estado. De um lado, continua o assistencialismo, para manter o controle sobre o curral eleitoral formado pelos setores mais pauperizados da classe, que fornecem o respaldo social e a legitimidade política da burocracia. De outro lado, realizam-se algumas medidas econômicas anti-cíclicas, como o ensaio de retomada do PAC, o pacote habitacional, benefícios para grandes empresas e setores médios da população.
Para completar o pacote, a burocracia lança mão de uma ofensiva ideológica de “esquerdismo reciclado”, que se dá por meio da propaganda do estatismo. É o caso da campanha do PT em defesa da Petrobrás, que é na verdade uma tentativa de evitar que a direita jogue no ventilador via CPI a gestão corrupta do governo Lula. É também o caso da troca do presidente do BB a pretexto de forçar a baixa dos juros, sem que na verdade tenha mudado nada na gestão do Banco. Da mesma forma, Lula faz discursos nos fóruns internacionais contra os abusos do capitalismo, contra o neoliberalismo, em defesa da regulamentação das finanças, etc., como se não estivesse realizando há seis anos um governo completamente servil aos mesmos interesses que precipitaram a crise.
Ao mesmo tempo em que Lula realiza essas manobras demagógicas, a direita tenta antecipar a disputa eleitoral, explorando o fato de que Lula não dispõe de um substituto à altura no interior do seu campo de apoio. Entretanto, os ataques da direita não colam no presidente, que mantém margens estratosféricas de popularidade.
A despeito disso tudo, a crise tem provocado a eclosão de lutas, ainda limitadas. Se é correto dizer que a crise não chegou ao Brasil com todo seu impacto, também é fato que a crise já provocou respostas por parte dos trabalhadores. Nos últimos meses aconteceram greves importantes, como a dos ferroviários do Rio, dos servidores da USP, dos trabalhadores da Sabesp, dos funcionários técnicos da Caixa Econômica Federal, de várias categorias de servidores públicos, estaduais e municipais, em especial da educação, em vários estados do norte e nordeste (Pará, Roraima, Piauí, Paraíba e Ceará).

2 SITUAÇÃO DA CATEGORIA

2.1 História recente da categoria bancária

A história recente da categoria bancária se divide em antes e depois da histórica greve nacional de 30 dias em 2004 (que já tinha tido uma prévia na greve dos bancos federais em 2003). Naquela ocasião a direção oficial do movimento (então chamada CNB-CUT, hoje Contraf-CUT) tentou aprovar um acordo rebaixado que foi repudiado pelas bases, as quais desencadearam uma greve (contra a vontade dessa direção e passando por cima dela) que teve fôlego para se manter por 30 dias.
O principal fruto daquela greve histórica foi a formação do Movimento Nacional de Oposição Bancária – MNOB – o qual aglutinava os setores combativos que estiveram à frente dos piquetes e garantiram a greve contra a direção oficial cutista. Desde então, o MNOB tem protagonizado todos os principais enfrentamentos da categoria, estando à frente das greves, das lutas cotidianas, dos enfrentamentos motivados pelas questões específicas de cada segmento da categoria; e também montando chapas combativas para a disputa dos sindicatos e outras entidades representativas dos trabalhadores.
Por outro lado, desde 2004, não se produziu novamente uma convergência entre a política de mobilização do MNOB e a participação da base, que pudesse resultar num movimento que tivesse a força demonstrada naquele ano. A experiência daquela greve, se por um lado forneceu os ativistas que construiriam o MNOB, por outro lado fez também com que um amplo setor da categoria se tornasse descrente em relação ao movimento sindical e deixasse de aderir às greves nos anos seguintes. Uma boa parte da base passou a identificar os sindicatos e os movimentos grevistas com a sua direção de plantão, a Articulação – PT (setor majoritário da Contraf – CUT), que sistematicamente traiu, sabotou e desconstruiu todas as greves e lutas da categoria desde então.
A Articulação desenvolveu uma política de desmobilização das lutas, esvaziamento dos fóruns do movimento, burocratização das assembléias, dispersão e negação dos organismos de base (como os encontros de delegados sindicais – representantes dos locais de trabalho – tornados puramente “consultivos”, ou seja, decorativos), descumprimento dos encaminhamentos que contrariassem sua política, etc. Tudo isso, somado à repressão dos bancos e do governo (desconto dos dias parados no BB e na CEF, perseguição aos grevistas, comissionamento dos não-grevistas) influenciaram para diminuir a mobilização da categoria.
Chegamos então a um impasse em que o MNOB e setores de oposição continuam ativos e atuantes, contando com o respaldo e o reconhecimento de um setor da base, mas sua atividade não tem sido suficiente para trazer uma quantidade maior de trabalhadores para a luta, sem os quais não se poderá romper o controle absoluto da Articulação sobre o movimento.
É preciso também tocar na questão da forma de funcionamento do MNOB, que ao longo dos últimos anos experimentou um progressivo esvaziamento, deixando de contar com a amplitude e diversidade de forças políticas e militantes independentes que o compunham na sua origem. Esse esvaziamento tem a ver certamente com o refluxo das lutas e o ceticismo que se instalou em setores da categoria. Mas também tem a ver com as rupturas políticas de setores que deixaram de se sentir representados pelo MNOB ou discordam da metodologia com a qual o movimento é conduzido pela corrente política majoritária.
Todos esses elementos precisam ser levados em consideração na tentativa de elaborar propostas para a estruturação de uma oposição bancária nacional que seja realmente representativa e capaz de oferecer à categoria uma alternativa contra o controle do movimento pela Articulação.

2.2 Formato das últimas campanhas salariais

De modo geral, as últimas campanhas salariais conduzidas pela Articulação seguem um mesmo padrão.
O ponto de partida é a inexistência de trabalho de base, em especial nos bancos privados. A direção do movimento desenvolve uma relação exterior com a categoria, não participando de seu dia a dia, comparecendo apenas nas campanhas salariais ou nas eleições para os sindicatos. No restante do tempo, o sindicato funciona apenas como um escritório burocrático que homologa as demissões, encaminha algumas questões judiciais e de brinde oferece ações assistenciais, convênios, etc. Nos bancos federais, existem formalmente os fóruns de delegados sindicais, que entretanto não têm caráter deliberativo, não se reúnem com regularidade, não se organizam de forma independente e são desrespeitados quando conseguem aprovar propostas contrárias à direção, que não as encaminham. As assembléias são tão burocratizadas que traumatizam os poucos trabalhadores de base que eventualmente comparecem, o que faz com que seja extremamente difícil convencê-los a participar de atividades do sindicato ou greves.
Dado esse cenário, não existe interferência da base na vida dos sindicatos, que assim ficam de mãos livres para aplicar a política que lhes interessa. A política da Articulação (já há muitos anos) é de não enfrentar os banqueiros, e desde o governo Lula, passou a ser também de poupar o governo, patrão dos bancos públicos (aliás, Lula e os banqueiros tem sido aliados inseparáveis).
Nas campanhas salariais, essa política se concretiza por meio de minutas de reivindicações rebaixadas. Essas minutas são construídas em congressos ultra-burocratizados, dos quais só participam dirigentes sindicais, escolhidos em assembléias esvaziadas. No curso das campanhas, não se realizam assembléias, plenárias, mobilizações, os atos são apenas de fachada, em que punhados de dirigentes sindicais aparecem na porta de alguma agência ou concentração para tirar fotos e aparecer nas suas publicações como “lutadores” (publicações aliás nas quais não há espaço para expressão da base ou de outras correntes políticas).
Em caso de greve, os sindicatos não mobilizam, não oferecem infra-estrutura, não disponibilizam faixas, adesivos, cartazes, carros de som, piqueteiros, não organizam atos e passeatas, etc. Nos bancos privados não há adesão a partir de dentro e a greve é também uma farsa, quando algum piqueteiro, em geral funcionário de banco público, coloca um adesivo na fachada da agência, barrando parte dos clientes (de baixa renda), sem impedir que os funcionários continuem trabalhando lá dentro. Apesar da existência de uma minoria mais ativa e consciente de funcionários de bancos públicos, que pode ou não estar disposta a fazer piquetes, a maioria dos grevistas faz “greve de pijama”, limitando-se a não ir trabalhar e nem sequer indo nas assembléias. Os piquetes e paralizações mais fortes se limitam às concentrações de bancos públicos nos centros das maiores cidades.
Nossas greves tem sido assim meras simulações, que não afetam o funcionamento dos bancos, a continuidade de seus lucros, e quando muito acarretam algum dano na sua imagem perante o público. A falta de diálogo do movimento sindical com a classe trabalhadora faz com que a maioria se coloque contra as greves, o que resulta em danos à imagem dos bancários, já que a população de baixa renda passa a nos considerar um bando de “marajás” e “vagabundos”.
Para completar, a Articulação encerra a “greve” com uma assembléia em que há presença maciça de gerentes e fura-greves (convocada providencialmente em horário especialmente adequado para que esses setores compareçam), os quais são maioria em relação aos grevistas, piqueteiros e ativistas, para aprovar um acordo rebaixado que já havia sido combinado desde o início da pantomima.
O problema da categoria vai portanto muito além da direção de plantão nos sindicatos, a qual é traidora e burocrática, mas requer um trabalho de reconstrução da identidade do trabalhador, da sua perspectiva de classe, da idéia de mobilização e luta. Isso envolve a retomada de um trabalho estrutural, de base e ideológico muito bem feito para disputar a consciência da categoria não apenas com a burocracia, mas com a patronal, a burguesia e o governo, não apenas nas campanhas salariais ou eleições de sindicatos e entidades, mas no dia a dia.

2.3 Os bancários, os bancos e a sociedade

O setor bancário brasileiro emprega cerca de 400 mil trabalhadores. Esse número não inclui os cerca de 200 mil terceirizados que não são reconhecidos como bancários pela patronal, pelo governo e pela direção oficial do movimento sindical, o qual se abstém da tarefa para nós fundamental de organizar também esse setor (com base na premissa a ser regatada de que “quem trabalha em banco, bancário é”). Paralelamente a isso, está acontecendo uma diluição das funções do trabalhador bancário, as quais estão sendo assumidas pelos chamados “correspondentes bancários” (lotéricas, correios, supermercados, farmácias, etc.).
A terceirização e o uso de correspondentes bancários são recursos que tem sido usados pela patronal para escamotear a necessidade de contratar funcionários, deixando de pagar os salários e benefícios legalmente assegurados à categoria e despejando sobre os bancários restantes uma sobrecarga de serviços. A automação bancária, da qual os grandes bancos brasileiros se orgulham de estar na vanguarda da tecnologia mundial, tem substituído uma parte do serviço antes realizado por bancários (cerca de 90% das operações antes realizadas por caixas hoje são feitas via internet ou caixas eletrônicos). Entretanto, é preciso levar em consideração o aumento do grau de “bancarização”, ou seja, da quantidade de pessoas que passaram a ter contas bancárias e necessitar de operações bancárias. Grosso modo, o aumento da bancarização não é compensado pelo da automação, de modo que aumenta a sobrecarga de serviço e a exploração sobre os bancários remanescentes (e os terceirizados e correspondentes).

2.3 Distribuição geográfica e política da categoria

2.3.1 A Articulação em São Paulo

Daquele total de 400 mil bancários (“oficialmente” reconhecidos como tais) no país, mais de 100 mil trabalham na base do sindicato de São Paulo, Osasco e região. Desses mais de 100 mil, cerca de 15 mil pertencem ao BB e CEF e os restantes aos bancos privados (esse número deve mudar um pouco com a incorporação da Nossa Caixa Nosso Banco pelo BB, uma vez que o banco estadual conta com cerca de 15 mil funcionários no Estado e fora dele, o que deve resultar em alguns milhares na base sindical da capital). A Articulação tem como sua base social e política os bancos privados, em que está a grande maioria dos cerca de 45 mil sócios com direito a voto nas eleições sindicais.
No setor de de bancos privados, a direção desenvolve o sindicalismo de tipo mais rebaixado, conforme mencionamos antes, alheio ao dia a dia dos trabalhadores, voltado para o assistencialismo, convênios, etc. Não há luta pela estabilidade dos trabalhadores, por melhores condições de trabalho, contra o assédio moral, etc. O resultado é que esses trabalhadores vivem sob permanente ameaça de demissão, em constante sensação de insegurança, de modo que não se mobilizam nas campanhas salariais, não enfrentam as empresas por conta das condições de trabalho e se submetem à ideologia da patronal de tentar fazer carreira dentro da instituição. Esse setor registra também uma alta rotatividade: a maioria trabalha em banco apenas enquanto paga uma faculdade ou estuda para um concurso público. Isso faz com que tenham uma relação muito débil com a categoria, permitindo que os ataques da patronal e os retrocessos nas condições de trabalho sejam impostos de ano para ano.
Nos bancos públicos, em função das traições das últimas campanhas salariais, os funcionários novos (que já são maioria nesses bancos) em sua maioria não se sindicalizam, de modo que apenas uma pequena minoria se mantém associada. Mesmo que todos os funcionários de bancos públicos fossem sindicalizados (a tendência atual é o contrário) e 100% deles votassem numa chapa de oposição, ainda seriam minoria em relação aos funcionários de bancos privados. A participação em greves não depende de sindicalização, mas a votação que elege a diretoria do sindicato ou a elegibilidade para a condição de delegados sindical exigem associação, o que dá uma confortável margem para que o atual grupo dirigente se mantenha no poder.
Dada essa correlação de forças na base de São Paulo, a Articulação se perpetua eleição após eleição na direção do sindicato e realiza ano após ano campanhas salariais cada vez mais farsescas. O controle desse grupo sobre o aparato sindical lhe permite transformar um organismo de luta dos trabalhadores em um verdadeiro conglomerado empresarial, com ramificações como a Bangraf (parque gráfico com capacidade industrial equivalente ao de um jornal de grande porte, usado para imprimir materiais do PT e da CUT usados no país inteiro); a Bancredi (cooperativa de crédito que faz empréstimos para bancários, o que representa no mínimo um seríssimo conflito de interesse para uma instituição que deveria ter como finalidade lutar por aumento de salários); e a Bancoop (cooperativa habitacional envolvida em escândalo policial pela não entrega de imóveis pagos pelos cooperados e desvio de dinheiro para campanhas eleitorais do PT).
Para completar, a Articulação usa ainda sua prerrogativa de controlar as instituições de representação dos trabalhadores para galgar postos de direção nos fundos de pensão dos trabalhadores de bancos públicos (Previ, Funcef), o que lhe granjeia cargos nos conselhos de administração das empresas em que os fundos tem participação, entre as quais algumas das maiores empresas brasileiras (Vale, Embraer). Esse processo deu um salto de qualidade com a chegada de Lula ao governo em 2003, de modo que os ex-dirigentes sindicais se tornaram co-gestores dos interesses do capital, convertendo seus prepostos que os substituíram no movimento sindical em defensores diretos dos interesses da burguesia e do aparato de Estado.

2.3.2 A Oposição nacionalmente

O enorme poder político e financeiro do grupo dirigente no sindicato de São Paulo lhe permite determinar a linha política dos demais sindicatos dirigidos pela Articulação e seus satélites no país. Desde a década de 1990 o setor hegemônico do PT e da CUT tem transformado os organismos de luta dos trabalhadores em instrumentos de contenção das lutas, colaboração de classe com a burguesia e sustentação eleitoral do PT. A partir da eleição de Lula, o centro da política da Articulação enquanto preposto do PT no movimento sindical passou a ser o de impedir que os setores organizados da classe trabalhadora entrassem em luta contra o governo. Na categoria bancária, isso foi feito através da estratégia da mesa única da FENABAN, que se discutirá na seção seguinte.
O controle da Articulação sobre as campanhas salariais só não é maior porque a base social que sustenta sua linha política é muito menor no restante do país do que é em São Paulo. A distribuição numérica dos trabalhadores de bancos públicos e privados aparece invertida no restante do país. BB e CEF juntos tem quase 200 mil funcionários no país inteiro, quase metade do total nacional da categoria. Na maioria dos Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, os funcionários de bancos públicos são maioria em relação aos privados. Existe portanto uma maior possibilidade de mobilização espontânea das bases nesses Estados.
Onde as bases estão mais mobilizadas, é mais difícil para a Articulação impor sua política burocrática e governista. Existe uma pressão no interior da própria Articulação para que as campanhas não sejam tão farsescas quanto são em São Paulo, pois é preciso mostrar algum serviço para as bases. Existe inclusive uma maior receptividade para a política do MNOB e de outros setores de oposição. Não é coincidência o fato de que dois dos sindicatos já dirigidos pelo MNOB (RN e MA) sejam dessas regiões.
Em várias das últimas campanhas salariais, a mobilização partiu dos outros Estados, forçando São Paulo a entrar em greve e permanecendo em luta depois da direção haver enterrado o movimento na capital paulista.

2.4 A estratégia da mesa única

A justificativa para a estratégia da mesa única seria a de pôr fim ao congelamento salarial sofrido pelos funcionários dos bancos públicos durante o governo FHC, fazendo com que tivessem o mesmo reajuste concedido na FENABAN. Entretanto, ao fazer isso, a Articulação omitiu a questão crucial das perdas acumuladas durante o período FHC. Os reajustes concedidos durante o governo Lula passaram a ser chamados de “aumento real”. Na realidade, esses aumentos mal cobrem a inflação durante o período e servem para escamotear o problema das perdas acumuladas, que estão por volta de 100% no BB e na CEF. A Articulação se recusa a reivindicar as perdas acumuladas ao governo Lula e atrela as cláusulas econômicas do acordo dos bancos públicos, ou seja, reajuste, PLR, etc., aos índices discutidos na mesa da FENABAN. As mesas de negociação específicas dos bancos públicos se convertem em “grupos de trabalho”, “negociação permanente”, etc., nos quais as reivindicações específicas dos bancos públicos desaparecem numa “enrolação permanente”.
A estratégia da mesa única faz com que os funcionários de bancos públicos sejam obrigados a entrar em greve contra os bancos privados, para forçar a FENABAN a conceder aumentos maiores. Na greve de 2004, bancários do BB e da CEF se desdobraram nos piquetes para paralisar agências de bancos privados. Entretanto, desde aquela campanha salarial, esse fenômeno não mais se repetiu. A traição daquela greve e de todas as demais lutas da categoria fez com que uma boa parte dos funcionários dos bancos estatais deixassem de acreditar no movimento. A armadilha da mesa única passou a ser um obstáculo decisivo contra a mobilização nos bancos públicos. Os trabalhadores desse setor se recusam a fazer greve contra a FENABAN.
Desde 2004 o MNOB tem lutado pelo fim da mesa única, propondo que a campanha seja unificada, mas com mesas de negociação separadas, de forma que as questões específicas de cada segmento da categoria possam ser discutidas diretamente com a patronal. No caso dos bancos públicos, isso significa fazer reivindicações diretamente contra o governo Lula.

2.5 A ideologia das soluções individuais

A categoria bancária está hoje aprisionada na armadilha das soluções individuais. Os trabalhadores acreditam que o futuro de suas vidas está em adaptar-se às exigências dos bancos e tentar fazer carreira. Isso abre as portas para a tirania das administrações locais e o recrudescimento do assédio moral, além de dificultar a organização coletiva para as lutas. O individualismo se completa com o peleguismo, o puxa-saquismo, as panelinhas, as rivalidades, as intrigas, as fofocas, etc., pequenos sintomas de uma grande degeneração do ambiente de trabalho.
Além do individualismo, a disposição de luta da categoria é corroída pelo imediatismo das campanhas salariais, cujo exemplo central está na importância que assumiram as participações nos lucros. A Articulação conseguiu converter as campanhas salariais em campanhas por PLR. Ao longo do ano as contas dos trabalhadores se deterioram e tendem ao vermelho porque o salário não é suficiente para as despesas mensais. Quando chega a proximidade da campanha salarial, a maior parte dos trabalhadores está ansiosa para que um acordo seja assinado o mais depressa possível para cobrir o cheque especial, o cartão de crédito ou o CDC.
Esse imediatismo impede que se perceba o X da questão, que é a queda dos salários. Ao longo dos anos, as perdas salariais se acumulam, mas isso não é percebido porque os trabalhadores enxergam apenas o resultado imeditato da PLR na conta. Além disso, esquece-se o fato de que o aumento de salário impacta em todas as outras verbas, como férias, 13º, INSS, FGTS, etc., enquanto a PLR tem um resultado efêmero nas contas, que se dissolve no ano seguinte.
Mais grave do que isso, a dependência em relação à PLR legitima uma lógica de remuneração variável, em que o salário do trabalhador passa a depender do lucro da empresa. Em tempos de crise econômica, a patronal tem um argumento para não aumentar salário, não pagar PLR e ainda por cima aumentar a exploração, pois é preciso melhorar o resultado da empresa, e todos devem “vestira a camisa”, etc.

2.6 Função dos bancos públicos

Essa relação de dependência entre remuneração e lucro que se construiu nos últimos anos é muito mais absurda quando se considera a situação dos bancos públicos, que não deveriam ter como função gerar lucros. Para questionar essa relação é preciso questionar a própria função dos bancos públicos. Essas instituições tem cada vez menos o caráter público. O BB tem acionistas privados, inclusive estrangeiros, e tanto BB como CEF colocam seus funcionários para trabalhar para empresas coligadas vendendo seguros, planos de previdência, capitalização, etc. A venda desses produtos consome a maior parte do trabalho dos funcionários das agências, servindo como critério para as promoções e comissionamentos e como brecha para o assédio moral.
Os bancos federais tem sido usados para gerar lucros bilionários que não revertem em nenhum benefício para a sociedade, a despeito do fato de que o Tesouro Nacional seja o seu acionista majoritário (o único controlador no caso da CEF). A parcela dos lucros dos bancos públicos apropriada pelo Tesouro é desviada para o pagamento da dívida pública, prioridade da gestão dos governos burgueses na era neoliberal, de Collor a Lula. Ou seja, em última instância, os funcionários de bancos públicos trabalham para aumentar os lucros dos especuladores.
Além de ter seu lucro apropriado pela burguesia financeira, os bancos públicos deixam de ter a função de fomento. Os bancos públicos sempre foram usados no Brasil para cobrir a incompetência empresarial da burguesia nacional, conforme testemunham os históricos calotes que os latifundiários espetaram no BB não muitos anos atrás. A população mais pobre, em contrapartida, jamais teve acesso ao crédito com a mesma facilidade. Os bancos públicos praticam os mesmos juros extorsivos do cartel dos bancos privados. A recente troca do presidente do BB tendo como pretexto o suposto desejo do governo federal de baixar os juros não passou de uma manobra publicitária. Internamente, nada mudou no Banco do Brasil em termos de objetivos de negócios e relações de trabalho.
O debate sobre o papel dos bancos públicos precisa ser retomado junto à sociedade. É preciso disputar a consciência da população contra as idéias de privatização que dominaram nas últimas décadas. É preciso abrir o diálogo com os clientes e usuários, mostrando que os bancários estão do seu lado na luta por melhores condições de atendimento, contratação de mais funcionários, etc. Essa é uma tarefa que caberia ao movimento sindical, mas que foi abandonada pela Articulação.
Por tudo isso, é preciso retomar o debate sobre a função dos bancos públicos na perspectiva da luta pela estatização do sistema financeiro.

3 REIVINDICAÇÕES

O Banco do Brasil passou por uma violenta reestruturação em 2007, a qual atingiu cirurgicamente a vanguarda das lutas dos anos anteriores. Diga-se de passagem, a reestruturação foi implantada com a conivência da direção oficial, que se absteve de lutar contra o processo e descumpriu os encaminhamentos do Encontro realizado em Brasília para tentar organizar a defesa dos trabalhadores.
A reestruturação intensificou o processo de “Bradescalização” do BB, a sua transformação num banco de mercado voltado para disputa com os bancos privados. O objetivo em longo prazo é extinguir o setor de suporte operacional, terceirizar completamente suas funções e manter no quadro do Banco apenas os setores voltados para vendas. A reestruturação foi o primeiro grande passo na direção desse projeto, que continua em implantação.
Os eixos da reestruturação foram:
– PAA, Plano de Aposentadoria Antecipada, que afastou do banco milhares de funcionários, muitos dos quais com uma experiência de luta que vinha desde o ascenso dos anos 80 e que vinham sendo fundamentais para o último ciclo de greves;
– Fechamento de unidades inteiras, como a GEREL Campinas;
– Reforma estatutária da CASSI, desobrigando o Banco de se comprometer com a saúde dos funcionários, aprovada por meio de uma campanha de votação terrorista no próprio sistema do Banco e com a participação ativa dos sindicatos dirigidos pela Articulação;
– PEE, processamento eletrônico de envelopes, início da terceirização dos caixas;
– Redução do número dos caixas em quase dois terços. É sempre importante lembrar que os caixas foram a vanguarda das últimas greves, são a maioria dos delegados sindicais em agências e agora estão numericamente reduzidos e funcionalmente isolados, como se fossem “alienígenas” nas agências, o que dificulta sobremaneira o trabalho político e a organização no local de trabalho.
Entretanto, além do ataque sobre os caixas e funcionários antigos, a reestruturação continha também uma faceta “benigna” para um outro setor de vanguarda, os escriturários que foram comissionados como assistentes de negócios. Essa estratégia foi uma tentativa explícita de cooptação da vanguarda pela patronal. Uma boa parte desses novos assistentes de negócios passou a ver a comissão como um favor devido aos administradores, e para não se indispor com a gerência, deixou de fazer greve. Hoje os caixas e escriturários são numericamente uma minoria na maior parte das agências, que podem funcionar normalmente sem eles em caso de greve.
Para completar a reestruturação, prepara-se uma nova rodada de redução dos caixas, por meio do PSO, que desvincula os funcionários do prefixo das agências e os transforma em caixas volantes, ou seja, flutuantes, à disposição de uma central que vai distribuí-los conforme a demanda do dia.

BB
Reposição de perdas
Isonomia
Pagamento das substituições
Fim do PSO/USO
Fim das metas e do assédio moral
Respeito à jornada de 6 horas
Resgate da CASSI
Plano odontológico

Categoria
Fim da Mesa Única: Campanha Unificada e mesas separadas
Estabilidade
Delegados sindicais nos bancos privados
Fim dos correspondentes bancários
Fim das terceirizações
Contratação de funcionários

4 ORGANIZAÇÃO INTERNA DO MNOB

Estatuto
Programa
Auto-financiamento
Autonomia (instâncias próprias)
Ação de base
Organização no local de trabalho
Mandatos revogáveis
Rodízios
Veto a reeleições indefinidas
Tarefas determinadas
Transparência
Prestação de contas
Regularidade
Democracia

O fechamento da campanha salarial deste ano também fecha um ciclo no movimento. O MNOB, consolidado na rebelião de base na greve histórica de 30 dias em 2004, já não tem a mesma força na categoria. Muitas vezes, a categoria nos vê como “vocês do sindicato”, ou seja, como partes da mesma máquina. Quando entendem que não somos dirigentes sindicais, imaginam que o MNOB funciona como se fosse um sindicato paralelo, como se seus integrantes estivessem liberados do trabalho para tarefas políticas. O MNOB ainda não é uma direção alternativa para a categoria, mas é exigido como se fosse. Somos cobrados pela base como se tivéssemos infra-estrutura, logística e finanças para “concorrer” com a Articulação, como se tivéssemos condições de imprimir e distribuir boletins para responder à Folha Bancária do sindicato, etc.
Isso significa que a categoria na prática não sabe o que é o MNOB. Os trabalhadores vêem o movimento como um corpo à parte, uma entidade destacada do conjunto da categoria. Os bancários não vêem a si próprios como Oposição. Não entendem que o MNOB só pode ter alguma força através da participação da própria base. Ao invés de participar, esperam que montemos uma estrutura para “o seu bem”. Em outras palavras, a categoria ainda não se vê como o principal responsável pela sua emancipação. Não entende como uma tarefa sua o desafio de expurgar do sindicato a Articulação e seus pelegos, burocratas, governistas e agentes da patronal. Vive-se uma situação de alienação da categoria diante do MNOB.
Diante deste quadro, cabe-nos fazer um balaço profundo, fraterno e franco com os companheiros sobre a nossa atuação e sobre o que podemos fazer para que o MNOB seja de fato o conjunto da categoria bancária.

Problemas da Oposição

Priorizar as eleições sindicais – O MNOB é visto como um corpo à parte do restante da categoria porque na maior parte das vezes se apresenta apenas como uma chapa de oposição para a disputa de eleições sindicais e de entidades representativas. O MNOB só aparece na época das campanhas salariais e das eleições de entidades. No restante do ano, ele não existe. A inexistência do MNOB na maior parte do ano faz com que a sua atividade seja sempre reativa, jamais pró-ativa. O MNOB somente tenta responder aos fatos, jamais se antecipa a eles. Embora esteja presente em todas as lutas, não é capaz de conduzí-las para a vitória, pois não acumula massa crítica suficiente para inverter a correlação de forças a favor da categoria.
Não se trata aqui de propor a ausência do MNOB das eleições sindicais, mas de desenvolver um projeto estratégico que faça das campanhas eleitorais um instrumento para fortalecer o movimento na base, com vistas às lutas cotidianas da categoria e aos processos de longo prazo da luta de classes. A prioridade dada para as disputas superestruturais, sem um projeto estratégico claro, impediu que o MNOB desenvolvesse um trabalho estrutural de educação da base e elevação da sua consciência.
Ausência de organicidade – Aquilo que chamamos de inexistência do MNOB na maior parte do ano se traduz pela ausência de reuniões. A falta de uma periodicidade das reuniões impede que os problemas sejam conhecidos de todos, que o debate se realize, que as propostas sejam refinadas, que as tarefas sejam distribuídas, que exista controle e balanço das atividades. Aquilo que era a panacéia de todos os males num determinado momento, como a proposta de formação de uma Associação Nacional dos Bancários, no momento seguinte é esquecido como se jamais tivesse existido, pois é preciso correr atrás de uma nova panacéia salvadora. A cada retomada do movimento, o MNOB é obrigado a reinventar a roda, redistribuir tarefas, refazer cadastros, retomar as finanças, que jamais deveriam ter parado de funcionar.
Essa ausência de organicidade se reflete na diminuição do número de militantes. Não se trata apenas de um “refluxo” da categoria. Trata-se de um estranhamento da base com o Movimento, que o enxerga como algo à parte. Embora o MNOB esteja sempre presente nas lutas da categoria, não se acumula um saldo organizativo para os próximos embates. O resultado disso foram as diversas defecções do Movimento, que o reduziram praticamente à mesma vanguarda combativa pré-2004. Com a saída de militantes e a falta de novos ativistas, sobrecarregam-se aqueles que ficaram para tentar realizar as mesmas tarefas.
Falta de um projeto estratégico – O projeto estratégico do MNOB deve ir além das campanhas salariais e das campanhas eleitorais dos sindicatos. Precisa ter como horizonte preparar a categoria para os enfrentamentos mais globais da luta de classes. Precisa desenvolver na categoria uma consciência capaz de nos situar no conjunto da classe trabalhadora, como participantes de um processo de lutas mais amplo, que se enfrenta não apenas com a Articulação no controle dos sindicatos, mas com o governo e a burguesia no controle da economia. É preciso fornecer aos trabalhadores um horizonte mais amplo, uma alternativa de sociedade que permita vislumbrar saídas concretas para a crise do Brasil e da humanidade.

Propostas para o próximo período

O MNOB tem se destacado, como dissemos, por ser o principal organizador das lutas da categoria, com muito mérito e sacrifício. Entretanto, sua atuação apresenta diversas debilidades que precisam ser superadas. As debilidades dizem respeito menos ao seu programa que a sua metodologia, que precisa de uma drástica reformulação. Conforme os problemas apontados acima, propomos as seguintes medidas para superar a crise organizativa do MNOB e sua conseqüente debilidade política:
1.Estruturação profissional do MNOB – A estrutura montada para as eleições sindicais (como a de São Paulo em 2005), em que se estabeleceu um calendário de reuniões periódicas e uma divisão de tarefas, precisa ser tornada permanente. A princípio, propõe-se reuniões periódicas (no mínimo, quinzenais) para debater estrategicamente os rumos da categoria (e não somente após o acontecimento dos fatos, como ocorre atualmente). Propomos também distribuir dentro do movimento as tarefas, como a organização das finanças, a redação de materiais e sua diagramação, distribuição dos boletins por circunscrição de influência dos militantes, etc.
2.Priorizar a disputa político-ideológica dos bancários e da população – Os boletins do MNOB precisam ir além de questões corporativas e incorporar os interesses de todos os trabalhadores. A luta dos bancários é uma luta contra a política dos bancos de agiotagem contra o conjunto da sociedade e de extorsão dos trabalhadores em particular (tarifas astronômicas, juros escorchantes, venda casada, filas e péssimo atendimento nas agências). A classe trabalhadora precisa ver o trabalhador bancário como seu aliado e não um inimigo. E entre os trabalhadores bancários, é preciso contar os funcionários de bancos privados e também os terceirizados. Cabe ao MNOB desenvolver esse debate mais profundo.
3.Uma política clara para os bancários da rede privada – Os funcionários de bancos privados são a imensa maioria da categoria e no entanto praticamente não estão representados no MNOB. É preciso incorporar as bandeiras históricas deste setor fragilizado da categoria nos boletins da Oposição, e desenvolver formas de atuação clandestina para viabilizar sua militância deles, tendo em vista a ameaça de demissão iminente dos ativistas.
Esperamos com essas propostas contribuir para superar a paralisia do MNOB, para retomar a sua estruturação e sua capacidade de iniciativa política, para enraizar o movimento na base da categoria e preparar os trabalhadores para os duros embates que se aproximam.

REIVINDICAÇÕES.

BANCO O BRASIL

Os bancários do banco do Brasil sofreram um duro ataque contínuo durante a ´decada de noventa e início dos anos 2000, isto é, durante o período do governo do PSDB na presidência. Foi quase 10 anos de salários congelados. Em 1998, houve uma cisão entre o funcionalismo com a retirada de direitos dos funcionários que ingressariam no banco a partir de então. Em 2007 o governo Lula desfere mais um duro golpe no funcionalismo com a reestruturação organizacional, em que fechou diversos locais de trabalho, com deslocamentos forçados de colegas sem qualquer assistência e assunção de responsabilidade pelo banco destas transferências. Destacamos aqui os bancários que trabalhavam na antiga GEREL Campinas, que foram transferidos compulsoriamente para São Paulo, cerca de 100 quilômetros de suas casas e o banco não assume as despesas de deslocamento de Campinas para São Paulo.

Durante este período, destacamos também mais um ataque desferido pelo governo Lula ao funcionalismo do BB: a reforma estatutária da CASSI em que as entidades sindicais da CUT fizeram campanha pela aprovação da proposta do Banco e do governo de não cobrar a dívida com a Caixa de Assistência de cerca de R$ 500 milhões, resultado do calote sobre a contribuição do banco dos salários dos bancários que ingressaram no banco após 1998, de 4,5% para 3% sobre a folha de salários.

Temos de ressaltar ainda que durante todo o governo Lula, houve a inédita ação de se descontar os dias da greve dos lutadores e da vanguarda, como um claro ataque contra a livre organização dos trabalhadores.

Diante deste quando,o Espaço Socialista defende:
Reposição de todas as perdas salariais desde o início do plano real até os dias atuais, que acreditamos superar mais do que 100% para que o salário do funcionalismo recupere o poder de compra aos salários percebidos pelo funcionalismo em julho de 1994, implantação do plano real;
Isonomia de direitos entre os bancários pré-98 e pós-98 em que for mais vantajoso para os trabalhadores. Deve-se levar em consideração os direitos dos bancários das instituições incorporadas pelo BB, como o Banco do Estado do Pará (BEP), Banco do Estado de Santa Catarina (BESC), e Nossa Caixa. O que for mais vantajoso para o funcionalismo deve-ser aplicado.
Fim do programa de PSO/USO que é um duro ataque ao setor mais precarizado e mais combativo do funcionalismo: Caixas Executivos e Escriturários. Tal plano visa tirar todo o setor operacional das agências e concentrá-las numa única dependência como base. Os funcionários passaria a perambular pela cidade para trabalhar nas agências de acordo com a demanda. Os funcionários não teriam local fixo para trabalhar, acarretando diversos transtornos, sobrecarregando os funcionários, além de diminuir a quantidade de Caixas nos guichês disponíveis apara o atendimento da população. Também é um duro golpe contra a livre organização dos bancários, tendo em vista que a maior parte deste setor é delegado sindical, protegido pela cláusula de inamovibilidade. Também se trata de mais um passo para se terceirizar definitivamente o setor operacional do banco, sendo que o primeiro passo foi dado com o processamento de envelopes de depósitos de dinheiro e cheque .
O Banco do Brasil precisa votar a ter uma gestão pública, de atendimento ás necessidades de bancarização dos trabalhadores excluídos do sistema financeiro. Não faz o menor sentido todo a estrutura do BB estar voltado apenas para o lucro por meio de assédio moral aos bancários para que se cumpram metas de vendas. Quase sempre os funcionários acabam por empurrar os produtos o conglomerado do banco como moeda de troca para concessão de crédito para os clientes. Mas isso reflete da forma de que são realizadas estas “vendas”, isto é, por meio do assédio moral que virou ferramenta de gestão dos resultados do banco, provocando um exército afastados por doença, ou de lesionados. Somos pelo fim das metas para vendas (qualquer uma) e pelo fim do assédio moral.
Respeito à jornada de 6 horas, extensível para a gerência média. A conquista pela jornada de 6 horas diárias está fundamentada no alto grau de adoecimento e de pressão a que são submetidos os bancários. Cada vez mais o Banco do Brasil lança mão de distribuir comissões de Assistentes de Negócios para fraudar a nossa conquista e fazer com que o funcionário trabalhe em tempo integral, isto é, 8 horas. Porém o mais grave é o desvio de função. Os Assistentes têm responsabilidade de gerente, mas não recebem como gerente.
Resgate da CASSI está na ordem do dia diante do greve processo de sucateamento de nossa Caixa de Assistência por meio de descredenciamento em massa da rede de prestadores e de hospitais. Há casos em que os bancários optam por contratar um plano de saúde para ter garantias de atendimento. O atual quadro da CASSI é fruto de uma gestão privada e de colaboração com o Banco para que o governo não tenha mais responsabilidades com a saúde de seus funcionários, dando mais um passo concreto para a privatização. Somos contra a última reforma estatutária da entidade, bem como o perdão de mais de R$ 500 milhões de dívidas que o Banco do Brasil tem com a CASSI, contra a co-participação e contra a desoneração das responsabilidades do governo com a saúde dos funcionário.
Implantação do plano odontológico sem prejuízo do atual PAS, para todo funcionalismo, à cargo do banco. Que o plano odontológico seja prestado pela própria e CASSI e não por uma empresa terceirizada, plano otontológico privado.

CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

CATEGORIA BANCARIA.

Com o ressurgimento das greves em 2003 e com a forte greve histórica de 2004 quebrasse o congelamento dos salários nos banco públicos, mas cria-se um obstáculo para a recuperação das perdas na campanha salarial: a mesa unificada de negociação da FENABAN. O governo, por meio dos sindicatos filiados à CUT, utiliza a mesa única para se desviar de atender as reivindicações específicas dos bancos públicos .

Para os bancários de bancos privados, também não é conveniente a mesa unificada, pois entendemos que o governo e o movimento sindical atrelado a ele são os maiores responsáveis pelos índices rebaixados de reajuste que mal repõem a inflação. Os aumentos salariais poderia ser bem maiores se não fosse esta simbiose dos sindicatos pelegos com o governo. Ademais, a mesa unificada ainda apresenta os sindicatos cutistas como combativos, pois defendem a greve nas assembléias mas não dão sustentação á paralisação. A fama de combativo se dá pelos piqueteiros dos bancos públicos que garantem alguma paralisação.

Quanto a organização de base ela ainda mais precária. Os bancos privados não têm representante sindical de base (delegado sindical), com estabilidade e inamovibilidade para fazer trabalho sindical de base. Outro problema grave é a ausência de estabilidade dos bancários do setor privado que impedem a sua organização.

O processo de terceirização é um método muito utilizado para baratear a mão-de-obra, por meio de precarização nas instituições financeiras e superexploração dos trabalho terceirizado. Agora, este tipo de mão-de-obra avança nas atividades-fim de forma escandalosa por meio de centrais de atendimento telefônico, serviços de pagamento e recebimento de contas, e agências financeiras de concessão de crédito, em que o trabalho é tipicamente de intermediação financeira, mas o trabalhador não é considerada da categoria bancária.

Em tempos de crise, fica mais intenso o processo de aquisições e fusões entres os grupos econômicos. No setor bancário este processo já vinha em marcha desde a criação do plano real. Santander entrou no país comprando o velho Noroeste. Depois adquiriu o Banespa e por último o Real. Recentemente presenciamos o Banco do Brasil adquirir o BEP, BESC, parte do Banco Votorantin , e a Nossa Caixa. No Inicio de 2009 Assistimos a aquisição do UNIBANCO pelo Itaú.

Para cada fusão, o resultado a categoria sabe muito bem: Gera um exércitos de demitidos, resultado direto pelo fechamento dos postos de trabalho. Quem saí, está na rua. Quem permenece no emprego se vê obrigado a trabalhar muito mais e em situações precárias, expostos a toda sorte de adoecimentos e lesões por LER/DORT.

Diante desse quadro, defendemos:

Fim da mesa única da FENABAN e abaixo a mesa única mínima. Campanha unificada , mas com mesas separadas de negociação como forma de atendimentos ás pautas específicas dos trabalhadores do setor privado e do setor público;
Estabilidade para todos os bancários, sobretudo do setor privado, contra demissão imotivada;
Eleição de delegados sindicais em todos ao bancos como forma de se iniciar um processo de organização e mobilização dos bancários dos setor privado, com prerrogativa da inamovibilidade, estabilidade, etc, etc, não só nos prédios, como também nas agências;
Fim das terceirizações e os correspondentes bancários, como formas de superexploração, precarização das condições de trabalho e retirada de direitos da categoria bancária.
Contratação de mais funcionários para atender a demanda de serviços bancários, incorporação dos terceirizados ao quadro funcional dos bancos. Afinal, quem trabalha em banco, bancário é..
Fim da pilarização e da discriminação na prestação de serviços bancários. Abertura das agências destinadas para o público de alta renda para atendimento de toda a população, sem distinção.
Redução da jornada de trabalho, sem redução de salários, para 5 horas diárias. Expediente bancário de 10 horas, com dois turnos de 5 horas cada uma, como forma de contratar mais bancários e garantir atendimeto de qualidade para todos, sem distinção.

ORGANIZAÇÃO INTERNA .

Talvez aqui resida o motivo de fato pelo qual o MNOB passou de pólo aglutinador da esquerda combativa para apenas uma fração deste setor, isto é , pela condução do movimento de acordo com o que se decidiu nas instâncias internas do maior partido do MNOB, o PSTU.

Sendo coerente com a sua concepção de construção de partido de revolucionário, passou a impor para o resto do movimento esta concepção. No início, passou a impor a CONLUTAS como condição para estar na Oposição, Depois vieram toda a sorte de prática de ingerência nos fóruns internos do movimento. Não há mais a discussão sobre o conteúdo dos materiais, as reuniões são marcadas de acordo com a conveniência da força majoritária, e desmarcadas também pelo mesmo critério. As finanças do movimento não são transparentes , não há discussão nem da contratação de funcionários.

O resultado disso é a saída de outras organizações, ou a “volta para casa” de elementos do setor independente, pela absoluta falta de condições de participar do rumos do movimento. Quem não pertencia ao maior partido do movimento não participava da construção das políticas do MNOB.

A reconstrução da unidade da esquerda combativa passa não somente pelas questões políticas. Como percebemos, as questões de organização do movimento é tão importante quanto as questões políticas. Não basta fazer apologia à unidade. Ela deve ser uma ato concreto e consciente nossa.

Diante de todo o exposto, o Espaço Socialista propõe:

Estatuto que fixe o critério de permanência, funcionamento democrático e da soberania dos fóruns do movimento, etc. Ela seria resultado do trabalho de uma Coordenação Nacional e submetido à apreciação dos fóruns locais. A aprovação do documento se daria pelo conjunto de manifestações nas bases locais;
O programa deve ser naquilo em que já temos acordo isto é: 1-ser contra o governo, que é patrão da metade da categoria bancária e ajuda a promover os ataques para os bancários do setor privado; 2-contra os patrões, que são nossos inimigos de classe em que se manifesta pelas demissões em massa, arrocho de salários, precarização das condições de trabalho, retirada de direitos, etc.; 3 contra a Articulação, que é o braço governamental e patronal no seio da categoria bancária, com um agravante, que é a confiança que os bancários depositam no governo Lula, dificultando as lutas; 4- funcionamento de acordo com a democracia operária e do respeito os fóruns do movimento.
Independência dos governos, dos patrões e dos partidos. Tudo que diz respeito ao movimento deve-se discutir e decidir nos fóruns do movimento e submeter-se à sua soberania (política, finanças, escrever materiais, etc, etc,). O movimento deve se sustentar por meio da contribuição dos seus integrantes e por campanhas financeiras impulsionadas pelo próprio movimento.
A ação de base deve ser a razão de ser da frente nacional de oposição bancária visando a retomada das lutas para enfrentar os ataques dos patrões e dos governos. Deve-se fazer trabalhos agitativos, como panfletagens, e propaganda, como seminários e outras atividades de formação como catalisadores no processo de avanço da consciência da categoria bancária. Deve-se ter reuniões periódicas ordinárias (duas vezes por mês, ao menos).
Impulsionar a organização da base por meio dos locais de trabalho, por meio de um trabalho estruturado sobre os representantes sindicais de base (delegado sindical) nos bancos em que já existem, e lutar para que a conquista se estenda para toda a categoria, sobretudo em banco privado, onde a organização é mais frágil. Além da agitação é necessário fazer diversas atividades de formação direcionadas para a base.
Mandatos revogáveis, rodízio na direção do movimento e proibição das reeleições indefinidas são ações concretas contra a burocratização da direção do movimento. Os mandatos são concedidos pela base do movimento e ela tem o direito de revogar, se a direção não estiver de acordo com a vontade da categoria, a qualquer momento. Rodízio na direção serve para renovar constantemente o quadro dirigente e permitir que a base, a razão de ser do movimento, tenha participação efetiva na construção dos rumos da categoria. A vedação à reeleição indefinida evita que haja dirigentes vitalícios, isto é, há anos fora da base. Por outro lado, isso só terá sentido se fomentarmos o aparecimento de novas lideranças e renovação do quadro dirigente do movimento. Ainda propomos renovação de 1/ 2 da direção por eleição, que ocorreria a cada 2 anos.
Transparência na condução do é um dos principais princípios para se evitar a burocratização e de educação perante a base. Pelo menos em uma reunião do mês haverá o ponto de finanças. A prestação de contas estará disponibilizada, por escrito, pra qualquer integrante da frente, de forma clara;
Democracia é proporcionar que qualquer pessoa e organização possa participar da frente, desde que haja acordo com o programa apresentado acima, que o bancário sinta que pode ser sujeito da mudança e o principal ator e da lutas de resistência e das conquistas para a categoria. Para isso reiteramos o respeito aos fóruns internos da frente, fixação das tarefas e de seus cumprimentos discutidos de forma clara e coletiva. Regularidade da reuniões, etc.

Assinam esta tese

Daniel Menezes Delfino – BB Vila Alpina, SP – Espaço Socialista

Leia mais

Tese para o Congresso Nacional de Estudantes – Junho 2009


ESTUDANTES E TRABALHADORES UNIDOS NA LUTA

Nossa proposta com o presente documento é contribuir para o debate sobre os rumos, necessidades e desafios do  movimento Estudantil (ME) que, por ocasião do Congresso Nacional de Estudantes, tem um momento privilegiado devido à possibilidade de reunir estudantes de todas as regiões do Brasil independentes das entidades governistas e por ser uma oportunidade de armar o ME de um instrumento capacitado política e ideologicamente a fazer frente aos ataques que o Estado, através de suas esferas federal, estadual e municipal, com o auxílio da UNE, UBES e UEE’s, vem desferindo contra todos os níveis da educação e que visam garantir a lucratividade do capital privado investido tanto nas universidades pagas quanto no uso da estrutura pública para pesquisa e produção de conhecimento aplicado a produtos e serviços a serem ofertados no mercado.

O Movimento Estudantil numa conjuntura de crise econômica mundial

O fato central da realidade mundial é a atual vigência de uma crise de reprodução do capital que extrapola os limites das repetidas crises periódicas. É em resposta a essa crise que o Estado brasileiro irá impulsionar as mais diversas ações na busca de uma linha ascendente para a lucratividade do capital.

A atual crise tem suas raízes nos anos 70, quando o capitalismo voltou a manifestar a tendência à queda da taxa de lucro e a crise de superprodução nos países da Europa e nos EUA. Os mecanismos de intervenção estatal e o incentivo ao consumo das massas demonstraram-se insuficientes para deslocar mais uma vez as contradições inerentes ao sistema capitalista. O último choque de liberalização econômica iniciado por Ronald Reagan nos EUA, Margaret Tatcher na Inglaterra e que aportou e se desenvolveu no Brasil com Collor, FHC e Lula esgotou suas possibilidades tanto econômicas quanto políticas com o estouro da bolha imobiliária estadunidense, a falência do atual modelo de crédito, o inicio de um novo ciclo de lutas dos trabalhadores latino-americanos  questionando a aplicação do receituário neoliberal e buscando novas formas de controle sobre a riqueza produzidas em seus países.

Outro elemento da atual crise econômica é uma conseqüência da aplicação da tecnologia à produção e a formação de um mercado mundial globalizado e realmente integrado. Dessa forma a capacidade de produção foi multiplicada e o desemprego deixou de ser reserva de mão de obra para se tornar estrutural. Pela primeira vez na história da humanidade todos os países do globo estão interligados na cadeia de produção e consumo do sistema capitalista. Não há mais novos mercados a conquistar, não há mais novos exércitos de mão de obra a serem anexados, não há mais mercados consumidores a serem integrados. Mas a pior característica da atual fase do capitalismo é que mesmo que houvesse novos mercados de mão de obra, matéria prima ou consumo, não há como manter os níveis de consumo nos padrões estadunidenses sem comprometer a reprodução material das espécies vivas de nosso planeta.

O que essa crise tem como característica marcante, e que não se poderá desenvolver neste texto, é o fato de que ela perpassa vários níveis da realidade social, entrelaçando fenômenos econômicos, sociais, políticos e culturais de longa duração. O atual momento do capitalismo expressa: 1º uma crise econômica estrutural, 2º o esgotamento do padrão de acumulação, 3º a crise do modelo neoliberal, 4º o esgotamento do último ciclo periódico, 5º a crise política-ideológica da utopia burguesa do “fim da história”, 6º a crise política-administrativa da forma estado enquanto instância de controle social, 7º a crise ambiental, 8º a crise energética e a crise alimentar.
É esse conjunto de elementos combinados interagindo entre si que faz do atual momento do capitalismo algo que vai muito além de uma simples crise econômica, mas que se configura como uma crise de reprodução da vida em sociedade, na verdade, o momento histórico pelo qual passamos assume a gravidade de ser uma crise civilizacional.

O Movimento Estudantil e a luta por uma concepção de Educação

É na atual conjuntura de crise estrutural do capital que devemos nos localizar para iniciar uma discussão a respeito do que interessa ao ME. A educação, como qualquer outra esfera da vida no capitalismo, assume cada vez mais o sentido de mercadoria. A lucratividade na educação privada, aliada à redução de custos em todos os níveis no ensino público, dão a tônica das políticas aplicadas ao setor.

É esse pano de fundo que justifica que os gestores do Estado, de um lado, dêem condições para que a educação se torne cada vez mais uma mercadoria lucrativa, e de outro, se combine a possibilidade de aplicar a produção científica gerada nos centros públicos de excelência para desenvolver novos produtos, além de utilizar a escola nas periferias como forma de conter a revolta dos jovens que serão parte do exército de desempregados estruturais e que somente encontrarão atividades precarizadas e de baixa renda. Nessa missão, o Estado conta com a participação das entidades estudantis oficiais (UNE, UBES), com o financiamento de órgãos internacionais e com diversas ONG’s que fazem propaganda dos limites da vida na periferia como único espaço de sociabilidade viável e desejada, contribuindo para que os horizontes da juventude da periferia nunca alcancem os equipamentos culturais diversificados que somente existem no centro, como museus, teatro, cinemas, praças públicas e as praias das cidades litorâneas.

É em oposição ao projeto de educação atualmente encaminhado pelo Estado brasileiro que devemos construir uma concepção de educação que permita aplicar o conhecimento gerado nos espaços acadêmicos para solucionar as necessidades das maiores camadas da população que não tem acesso garantido à saúde, educação de qualidade e a moradia e garantir a utilização racional e antipredatória dos recursos naturais.

Precisamos contrapor ao projeto burguês de uma classe que vive da extração da riqueza, um projeto da classe que produz a riqueza, um projeto da classe trabalhadora. Pois, com a crise econômica capitalista a tendência é que se aprofundem os ataques à educação, com cortes de verbas e mais precarização das escolas/universidades, o que coloca para nós a necessidade de apresentarmos um programa que responda a essa crise e também coloque para os estudantes que só poderemos ter uma educação de qualidade e a serviço da humanidade com o socialismo.   

A crise da educação é portanto o reflexo da crise da sociedade capitalista. Não é mais possível construir um ME que não responda a esses problemas estruturais. Necessitamos de um ME que lute pelas questões especificas da educação, mas que, necessariamente, faça delas uma ponte para a luta pelo socialismo.

O ataque à educação (reformas universitárias, corte de verba) é um processo mundial e não ocorre somente no Brasil. São medidas promovidas por toda espécie de governo comprometido com a lucratividade do capital e inclusive engloba a maioria dos países imperialistas. A explicação de que o governo Lula é o responsável pela situação da educação é apenas uma “meia verdade” e contém uma limitação teórica e política que pode comprometer nossa luta, pois não deixa evidente quais são os nossos inimigos. É preciso uma explicação que permita aos estudantes compreenderem que Lula é responsável, não só porque ele é um traidor, mas porque ele aplica uma política do capitalismo.

Trata-se de apontarmos uma perspectiva socialista para a nossa luta.

Se o movimento não der esse salto na consciência e combinar as lutas contra os governos e seus planos de plantão (luta imediata) com uma luta anticapitalista estamos fadados ao fracasso e vamos passar a vida inteira lutando contra esse ou aquele plano do governo.

A escola e sobretudo a universidade (pública e privada) estão a serviço da produção e reprodução de valores da burguesia, onde o conhecimento se transforma em mercadoria. A oferta de um tipo de educação aos trabalhadores voltada unicamente para as necessidades do mercado combinada com a exclusão dos trabalhadores dos principais  cursos de excelência obedece à lógica de privação do conhecimento e de manter afastada a única classe que pode modificar o rumo da educação e realmente universalizá-la. Por isso torna-se fundamental que denunciemos esse modelo e ao mesmo tempo lutemos para que a educação se volte para os interesses dos trabalhadores.

A negação desse modelo de universidade significa que o papel dos revolucionários (estudantes, funcionários e professores) deve estar voltado para denunciar qualquer proposta de educação que não rompa com os limites impostos à educação pelo capitalismo, ao mesmo tempo que discuta e propague as idéias socialistas. Portanto, a nossa atuação deve superar o academicismo que se preocupa única e exclusivamente com o “umbigo” da escola.

Para nós um movimento estudantil que se pretende ser novo deve em primeiro lugar lutar por uma educação sob controle e a serviço da classe trabalhadora, única classe capaz de produzir um conhecimento coletivo à serviço da humanidade.

O Movimento Estudantil e trabalhadores: Uma aliança estratégica

Um projeto dessa magnitude precisará mobilizar amplos setores da sociedade, pois qualquer projeto alternativo aos interesses da burguesia irá enfrentar a oposição organizada dessa classe, isso portanto inviabiliza a possibilidade desse projeto ser elaborado somente pelos acadêmicos ou mesmo pelos intelectuais orgânicos da classe trabalhadora ou ainda por um ou outro partido ou organização. A construção de um projeto de educação a serviço das necessidades humanas somente será possível na convergência dos esforços de todos os setores envolvidos com a educação e das organizações dos trabalhadores que se mobilizarão na defesa de melhores condições de trabalho, salário e emprego para fazer frente aos ataques dos mais diversos governos e patrões da rede privada.

Somente a articulação das camadas que ainda não tiveram acesso ao ensino de qualidade, dos trabalhadores e profissionais da educação, dos estudantes e suas ferramentas de luta (grêmios, C.As, D.A’s, D.C.E’s) bem como da comunidade que utiliza as escolas e universidades poderá apontar uma ação eficaz contra a lógica do capital de seguir transformando a educação em mercadoria e a escola de periferia em depósito de desempregados estruturais.

Propostas para unir o Movimento Estudantil à lutas gerais e específicas dos Trabalhadores

Ao considerarmos a profundidade da atual crise capitalista que vivemos e sabendo que as soluções criadas pelo capital e instrumentalizadas pelo Estado sempre resultam no aumento da exploração daqueles que produzem a riqueza e na mercantilização de todos os aspectos da vida concluímos que qualquer ação de qualquer segmento da sociedade na luta pela defesa de seus interesses fatalmente esbarrará nos limites impostos e encadeados pela lógica própria da reprodução do capital em um momento de crise. Isso significa que o ME precisará estar cada vez mais próximo às lutas da classe trabalhadora Para tanto propomos:

1.Defesa da qualidade de ensino nos seus três níveis. Melhores salários e condições de trabalho para os professores, melhores instalações e recursos materiais (laboratórios, bibliotecas, material didático, etc.), fim da progressão automática, fim do ensino religioso nas escolas, inclusão obrigatória das disciplinas de educação sexual, filosofia, sociologia, psicologia, história e cultura da África e da América Latina;

2.Proporcionalidade nos processos seletivos, que os trabalhadores e seus filhos ocupem em todos os níveis de educação a mesma proporção que existe na sociedade;

3.Cotas proporcionais para negros e indígenas em todas as esferas da educação;

4.Educação em período integral (8h), com investimento financeiro que propicie um ensino e equipamentos de qualidade, combinado com atividades culturais e de lazer;

5.Gestão paritária. Que os alunos tenham possibilidade real de interferir na construção do conteúdo que estudam nas escolas e faculdades;

6.Implementação da lei 10639, que institui a obrigatoriedade do ensino de História e Literatura Africanas em todas as escolas e universidades, bem como a história de resistência dos negros na África, no Brasil e no mundo;

7.Redução da jornada de trabalho do jovem para 06 horas/diárias;

8.Que os estágios deixem de ser forma de precarizar o trabalho do jovem. Direito trabalhista para o estagiário;

9.Fiscalização dos estágios por organismos de base do movimento estudantil;

10.Mínimo do Dieese como referência salarial a ser aplicado ao cálculo da remuneração proporcional dos estágios;

11.Creches públicas, gratuitas, com qualidade educacional. Funcionamento 24 horas e fins-de-semana. Nos locais de trabalho e estudo;

12.Fim do pagamento da dívida externa. Que se invista as riquezas produzidas pelo povo brasileiro para resolver os problemas do povo brasileiro.

É cedo para uma nova entidade estudantil, organizar os estudantes pela base

Sendo assim as organizações estudantis deverão unificar suas ações com todos os setores envolvidos na luta contra o desemprego, pela defesa de direitos historicamente conquistados e pela preservação do meio ambiente.

Por entendermos a construção do ME sob essa dinâmica e por acreditarmos que de sua atuação deve sair decisões que gerem soluções para os diversos desafios que enfrentamos, somos contra que o próximo Congresso Nacional de Estudantes termine oficializando uma nova entidade dos estudantes. Defendemos que, no primeiro momento, esse Congresso aponte um calendário de encontros locais e regionais para estruturar o ME combativo pela base e ligado às lutas concretas dos trabalhadores.

Propomos a generalização de fóruns de debates e decisões em nível local e regional como forma de impulsionar a construção de uma concepção de educação alternativa à da lucratividade do capital e de avançar na unidade dos estudantes com os trabalhadores e suas lutas. Dessa forma poderemos elaborar as reivindicações em conjunto com as organizações e entidades dos trabalhadores para acumularmos força para resistir e vencer os enfrentamentos que virão. É partindo dessa organização de base que acreditamos ser possível, num futuro próximo, a construção de um instrumento representativo dos estudantes em nível nacional dotado política e ideologicamente de uma concepção de educação a serviço das necessidades humanas e de um projeto capaz de, em aliança com os trabalhadores em luta, propor saídas para a atual crise capitalista que beneficie quem cria as riquezas na sociedade e não somente quem as consome.

FUNCIONAMENTO DO CONGRESSO

A tradição do movimento social (estudantil, popular e sindical) dirigido pela esquerda sempre foi de privilegiar os debates e as discussões com os delegados. No entanto os últimos congressos, coordenados pelo PSTU, abandonaram essa prática e têm secundarizado os debates, privilegiando a formação de mesas, onde alguns “iluminados”, em forma de palestras, substituem os debates. O erro grave dessa concepção é que reproduz no movimento uma prática da academia e da universidade burguesa, em que os “professores” falam e sequer podem ser questionados. Um exemplo dessa prática é que metade do Congresso será composto de mesas e painéis.

Além de reproduzir o formato da universidade burguesa há o fato, também grave, de utilizar esses painéis e mesas de discussão para que dirigentes do PSTU e de seus aliados apresentem o partido para os delegados e participantes, ou seja, utiliza um fórum do movimento em benefício do partido. Método que deve ser excluído do nosso cotidiano.

Defendemos um congresso que priorize os debates e as reflexões dos delegados eleitos em suas escolas/universidades, de modo que possam defender as posições que foram discutidas nas assembléias/eleições de delegados.

Quem somos: O Espaço Socialista é uma organização formada por trabalhadores para a intervenção na luta de classes e tem como objetivo a construção do socialismo. Entendemos que a luta contra o capitalismo é uma tarefa não apenas das organizações de esquerda, mas do conjunto da classe, pois, “a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores” (Marx). Por isso, defendemos a necessidade de elevar a consciência dos trabalhadores, lutando para resgatar os métodos da democracia operária, garantir a participação, retomar a formação teórica e política, e combater a burocratização dos sindicatos, e outros organismos de luta da classe. Para conhecer em detalhes nossas idéias visite www.espacosocialista.org ou entre em contato com espacosocialista@hotmail.com
 

Leia mais

Tese do Sindicato dos Servidores da Saúde do RN, sindicato dos Servidores Federais do RN e apoiadores para o CONCLAT

1) CONJUNTURA INTERNACIONAL

A economia mundial atravessa uma fase de estabilização depois da queda verificada na passagem de 2008 para 2009, ou seja, não está mais caindo como no período de auge da crise, mas não houve ainda uma retomada do crescimento. Do ponto de vista dos porta-vozes da burguesia, essa estabilidade já representa o início da recuperação. Mas na realidade, a economia apenas parou de cair, e ainda não começou a subir de volta para os níveis anteriores a 2008.

A burguesia não sai de uma crise econômica de grandes proporções como a que estamos atravessando sem impor uma derrota histórica aos trabalhadores, que resulte em um nível maior de exploração. A classe dominante ainda não reuniu as condições políticas para desencadear um ataque nas proporções daquele que seria necessário para recuperar a taxa de lucro. Por isso, apesar do aparente sucesso do Estado na administração da crise, as dificuldades para uma retomada do crescimento indicam que a crise permanece latente.

A economia dos Estados Unidos caiu 11,4 em 2009 em relação a 2008, ano em que já havia caído 3,2 sobre 2007. O nível de utilização da capacidade instalada ficou em 66,9%, contra uma média de 79,6 nos últimos 30 anos. A taxa de acumulação do capital industrial caiu em 1,7% no último trimestre de 2009, o 5º trimestre consecutivo em queda, um recorde desde a Grande Depressão. O desemprego permanece na faixa de 10%. O otimismo da burguesia é no mínimo injustificado, pois não há sinais de recuperação robusta em nenhuma das principais economias. Na Europa, países como Grécia, Portugal e Irlanda vivem crises severas de endividamento e a Espanha apresenta um recorde de desemprego de 20%.

Os principais sinais de crescimento estão em países como a China (8% em 2009) ou o Brasil. Entretanto, esses países não têm ainda condições de funcionar como uma nova locomotiva da economia mundial, pois o seu papel real de plataformas de exportação (de manufaturas no caso da China ou de matérias-primas no caso do Brasil) não foi alterado e não pode sê-lo sem uma mudança radical na hierarquia dos Estados capitalistas.

O eixo principal da atividade econômica dos grandes países periféricos ainda está nas exportações para os países centrais. Uma vez que a crise provocou uma retração no comércio mundial, ou seja, nas exportações da periferia para o centro, os governos desses países exportadores tiveram que lançar pacotes de estímulo ao mercado interno, o que explica a "recuperação" econômica artificial dos grandes países periféricos a partir do 2° semestre de 2009. O seu crescimento pode funcionar como contrapeso momentâneo para a crise, mas não como alavanca para uma retomada mundial.

Tanto nos países imperialistas como na periferia o Estado teve o papel fundamental de se endividar para absorver de forma organizada o impacto da dissolução do capital fictício. Os trilhões de dólares em papéis sem valor que circulavam na especulação financeira se transformaram em trilhões de dólares de dívidas assumidas pelo Estado sob diversas formas, como estatizações, pacotes de salvamento aos bancos, pacotes de estímulo ao crescimento, oferta de crédito, emissão de títulos públicos, rolagem de dívidas, emissão de moeda, etc. O núcleo do sistema financeiro mundial foi preservado às custas da socialização dos prejuízos.

O saldo da crise até o momento, além das imensas taxas de desemprego e da degradação das condições sociais nos países centrais, está no endividamento público em escala mundial e com velocidade inédita. Mesmo que a burguesia consiga encontrar uma nova locomotiva para substituir a especulação imobiliária, protagonista do último ciclo, e encetar uma recuperação do capitalismo, a "munição" gasta pelo Estado na atual crise o deixa em condição extremamente precária para enfrentar a próxima crise.

Nessas circunstâncias o papel do Estado como "comitê gestor dos negócios da burguesia" se sobressai e traz à tona a dimensão política da questão. A atual crise é a primeira grande crise da história do capitalismo desde 1848 em que não há uma alternativa social organizada, ou seja, em que não há um movimento socialista internacional se apresentando como oposição frontal ao capitalismo e alternativa de transformação social. Na época da crise de 1929 e no início do período de crise estrutural em 1970 ainda existia a URSS e o conjunto dos Estados burocráticos, que com todas as distorções ainda se apresentavam como contraponto ao capitalismo. Ainda que não estivessem mais impulsionando rupturas em direção ao socialismo (ao contrário, caminhavam para a restauração do capitalismo), sua simples existência mantinha viva a idéia da possibilidade dessa ruptura, que deveria se verificar através de revoluções que fugissem ao controle do stalinismo e se afastassem do seu "modelo" burocrático. A partir da década de 1990, desapareceu esse modelo burocrático stalinista, mas desapareceu com ele também a idéia de alternativa ao capitalismo.

Faz-se sentir com todo o peso o problema da crise de alternativas socialistas. O retrocesso ideológico da classe trabalhadora, em especial nas últimas duas décadas, deixou a burguesia de mãos livres para provocar crises e administrá-las como melhor lhe aprouve, sem enfrentar uma resistência organizada e muito menos o desafio de uma ordem social alternativa. As quedas de governantes nos países mais atingidos pela atual crise, como no leste europeu, foram processadas nos marcos da democracia burguesa, ou seja, através da simples troca de um governante por outro, sem alterações substantivas na ordem social. As mobilizações, inclusive as mais violentas, como na Grécia, ou as mais criativas, como os seqüestros de patrões na França, permanecem atomizadas, pontuais, e não apontam para a construção de uma alternativa sistêmica global.

Na ausência dessa alternativa, a ideologia burguesa segue monopolizando o debate. Um dos mais graves limites estruturais enfrentados pelo capitalismo, a questão ambiental, foi contornado pela burguesia mundial sem que se apresentasse nenhuma iniciativa capaz de sequer começar a enfrentar minimamente o avançado grau de degradação das condições ecológicas do planeta. A Conferência de Copenhague em dezembro de 2009 terminou sem apresentar qualquer proposta concreta de um plano viável para combater a degradação ambiental, pelo fato de que esse plano teria um custo insuportável para a burguesia.

A crise do capitalismo, que no momento da sua eclosão deixou entrever em sua multidimensionalidade (crise ambiental, energética, alimentar, etc.) os contornos de uma verdadeira crise societal, não resulta em desafio à permanência do capitalismo sem que se coloque de pé uma alternativa social organizada e consciente a ser impulsionada pela classe trabalhadora. A burguesia administra a crise e impõe a sua versão da história, a sua narrativa de que tudo não passou da irresponsabilidade de alguns indivíduos, alguns banqueiros gananciosos, pois "não há nada de errado com o sistema" e "tudo pode voltar a ser como antes".

O maior símbolo dessa continuidade através da mudança está nos Estados Unidos, onde o governo Obama segue implantando as políticas herdadas da era Bush. Os serviços públicos estão sendo desmontados em nome da necessidade de economizar recursos para o salvamento dos negócios dos capitalistas, em especial a burguesia financeira. No plano externo, estão sendo mantidas as invasões militares no Iraque e no Afeganistão, bem como as ameaças ao Irã, instalação de bases na América Latina e a presença física de militares dos EUA. O terremoto no Haiti deu também a oportunidade de ocupar militarmente o país caribenho, deslocando as forças da ONU chefiadas pelo Brasil e cortando as pretensões de maior proeminência geopolítica do governo Lula.

No conjunto da América Latina há um reposicionamento da direita. A década de 2000 começou com uma onda de governantes ditos "anti-neoliberais" ou "de esquerda", contendo uma ala "bolivariana" (Chavez, Morales, Correa) tida como mais radical devido a enfrentamentos limitados com a burguesia local e o imperialismo, e uma ala francamente adaptada ao neoliberalismo (Lula, Kirchner, Vasques, Bachelet, Lugo, Ortega). A ala chavista, apesar da retórica do "socialismo do século XXI", não rompeu com o capitalismo, adotando apenas algumas medidas limitadas (como as estatizações mediante indenização) e assistencialistas. A ala lulista, que também despertou ilusões de setores de esquerda no continente e no mundo, na prática manteve o essencial das políticas neoliberais (privatizações, pagamento da dívida, desmonte dos serviços públicos, ataques aos trabalhadores), não realizou reformas, não rompeu com o imperialismo e pôs em prática um assistencialismo bancado por superávits comerciais obtidos às custas das exportações de produtos naturais (petróleo, gás, commodities agrícolas). Sem enfrentar de fato as burguesias locais e internacionais não há como realizar melhorias mais duradouras nas condições de vida dos trabalhadores. Sem tais melhorias, as populações do continente voltam a olhar os políticos de direita como alternativa.

No Chile, depois de 20 anos, a direita tradicional voltou a ganhar as eleições, a despeito da popularidade de Bachelet, que não transferiu votos para seu candidato. Esse fenômeno paradoxal é uma expressão da "despolitização da política", em que os partidos deixam de apresentar diferenças em termos de alternativa social e defendem todos um mesmo projeto, ou seja, a permanência do capitalismo. Os partidos "de esquerda" que admitem a convivência com o capitalismo se convertem em clones da direita e são preteridos pelos eleitores devido à falta de "resultados". A institucionalização da esquerda e sua capitulação à democracia burguesa andam na contramão da luta para superar a crise de alternativa. A tarefa das organizações de esquerda é precisamente recolocar em discussão a necessidade de um projeto social alternativo, um projeto socialista que se construa nas lutas e para além das conjunturas e eleições.

Antes do Chile, houve um ensaio em Honduras, com o golpe de Estado contra o presidente Zelaya, que se aproximava do chavismo. O golpe foi sacramentado por eleições espúrias (tais como as que se realizam no Iraque e Afeganistão sob ocupação militar estrangeira), que deram posse a um presidente ilegítimo, sem que houvesse contestação internacional ou continental e contando com a capitulação do próprio Zelaya, que cedeu à direita antes que a mobilização popular tivesse condições de impor suas reivindicações.

Os ensaios realizados em Honduras e no Chile, bem como a ocupação do Haiti sob pretexto de ajuda humanitária, mostram que o imperialismo e as burguesias locais estão à postos para retomar o controle dos governos do continente da forma que for preciso. A via golpista não parece ser necessária no momento, pois se provou que os governos "anti-neoliberais" podem ser derrotados eleitoralmente. A democracia burguesa permanece sendo o regime mais eficaz de dominação. A lógica da alternância dos partidos permite que as agremiações da direita explorem as debilidades dos atuais governantes "de esquerda", tais como a corrupção ou a ausência de melhorias reais na situação material dos trabalhadores, para se credenciar novamente como alternativa. A década de governos "anti-neoliberais" no continente não produziu conquistas materiais significativas, e se esgota deixando as portas abertas para o retorno da direita tradicional.

Além das eleições, a democracia burguesa ainda conta com uma série de dispositivos de controle social que amortecem as contradições de classe, tais como a repressão policial, as instituições penais, o judiciário, que atacam os trabalhadores em luta sem que haja necessidade de uma ditadura militar aberta ao estilo das décadas de 1960 e 70.

2) CONJUNTURA NACIONAL

O grande teste para a direita tradicional se dará no Brasil, com o processo de sucessão de Lula. O presidente brasileiro está sendo canonizado em vida por setores da imprensa burguesa brasileira e internacional, que oferecem o seu exemplo como modelo mundial de governante capaz preservar os lucros da burguesia às custas dos trabalhadores e ainda assim desfrutar de imensa popularidade. O grande achado do governo Lula é o fato de que, como ele mesmo disse, "dar um pouquinho de dinheiro para os excluídos não desmonta a economia" (O Estado de S. Paulo – 10/12/2009). A exaltação da figura de Lula é também uma exaltação das instituições, um reforço ideológico do Estado e da democracia burguesa, do mito de que "qualquer um pode chegar lá" e o sistema é fundamentalmente justo.

O projeto encarnado por Lula consiste em empregar pão, circo e cacetete para criar a "miséria funcional", ou seja, a miséria que não gera revolta. O bolsa-esmola, a Copa do Mundo e a repressão feroz são as formas de administrar a deterioração das condições de vida dos trabalhadores sem que isso provoque mobilizações e desafio ao controle da burguesia. Opera-se uma espécie de desclassicização da classe trabalhadora, a destruição da sua identidade social em nome da sua transformação numa massa de indivíduos dependentes das benesses do Estado. Uma massa que se conforma com os baixos salários, as péssimas condições de trabalho, a superexploração, a ausência de serviços públicos decentes, o subemprego, o trabalho temporário, intermitente, informal, o desemprego aberto, desde que não morra de fome e possa assistir TV. Cria-se uma classe trabalhadora flexível e domesticada, disponível e desfrutável, que pode ser contratada ou demitida com agilidade ao sabor das flutuações do mercado mundial para o qual passa a estar voltada a burguesia instalada no país.

A implantação dessa miséria funcional contou com o indispensável concurso da burocracia do PT e PcdoB encastelada no controle dos principais instrumentos de luta da classe trabalhadora, a CUT, CTB, o MST e a UNE, que impediram os setores mais organizados e mobilizados da classe de entrar em luta aberta contra o governo Lula e atrapalhar os negócios da burguesia. As lutas que houveram ao longo de todo o mandato de Lula foram contornadas, desviadas e derrotadas pela burocracia. Houve importantes mobilizações de resistência dos trabalhadores contra a reforma da previdência, operários da construção civil, servidores federais, bancários, correios, petroleiros, professores, etc., bem como ocupações do MST, MTL e Terra Livre, que no entanto se depararam com o obstáculo das direções burocráticas. Essas lutas de resistência obtiveram conquistas parciais e defensivas, mas não puderam pôr em cheque a condução do projeto do governo e da burguesia. A crise atual deu a oportunidade para uma reestruturação nas empresas, com demissões em massa, reduções de salários e corte de direitos, com a colaboração ativa da CUT, CTB e demais centrais pelegas na assinatura de acordos lesivos aos trabalhadores.

O governo Lula tornou evidente o caráter de classe do PT como um partido burguês composto de burocratas. Sua base social está na burocracia estatal, nos aparatos sindicais, fundos de pensão, etc. O projeto e o programa do PT são nitidamente burgueses. Os traços remanescentes de presença operária na base do PT, em especial nos bairros e movimentos populares, não tem mais qualquer influência decisória em qualquer instância do partido. É dos aparatos estatais e sindicais que essa massa de burocratas aufere seus rendimentos e privilégios, como as participações nos lucros dos fundos de pensões, os altos salários nos cargos de confiança, nas diretorias de estatais, os privilégios parlamentares e sindicais, etc. Isso sem falar na captação de recursos via corrupção, de cujos exemplos o governo Lula foi pródigo, desde o mensalão até a Bancoop.

O PT defende um projeto capitalista com um pouco mais de controle do Estado do que o PSDB e o DEM. As diferenças entre eles residem na disputa para determinar quem vai usufruir maior controle da máquina do Estado. Em que pesem as divergências pontuais do PT com o PSDB, ambos têm acordo no projeto estratégico de tornar o Brasil um país viável do ponto de vista do capital, o que significa necessariamente a ajuda às empresas e o aumento dos ataques aos trabalhadores, particularmente com o agravamento da crise.

O governo Lula é um governo burguês clássico. É importante diferenciar o governo Lula do próprio PT, pois o governo está mais à direita que o próprio partido. Isso ocorre pela opção do próprio PT e pela necessidade de governabilidade. A base de apoio do governo no Congresso se deslocou dos partidos menores e um pouco mais à esquerda (como PDT, PSB, etc.) para o PMDB, que possui uma grande bancada parlamentar, um grande número de governos estaduais e prefeituras, e portanto uma grande influência perante o governo. O PT obedece cegamente as diretrizes traçadas pelo governo e funciona como instrumento a serviço da governabilidade burguesa, abrindo mão de qualquer bandeira programática. Assim, o governo Lula enquanto projeto e política cotidiana não tem nada de essencialmente diferente em relação ao um governo burguês normal.

Do ponto de vista da disputa entre os partidos, o PSDB conta com um relativo desgaste do PT depois de 8 anos de gestão e sucessivos escândalos de corrupção, que horrorizam especialmente a pequena-burguesia. O PSDB não precisa apresentar um projeto diferente daquele que o PT vem implementando, que na verdade é uma continuidade do projeto FHC, o projeto de inserção do Brasil no mercado mundial como exportador de matérias-primas agrícolas e manufaturas de baixo valor, às custas da devastação ambiental e da superxploração do proletariado. Tudo o que o PSDB precisa fazer é apresentar as credenciais de uma gestão tecnocrática mais eficiente do mesmo projeto, em lugar da versão voluntarista e popularesca protagonizada por Lula.

Em relação ao PT, a vitória de Dilma é uma questão de vida ou morte. O PT se transformou numa máquina eleitoral cuja sobrevivência material depende mortalmente de mandatos parlamentares, cargos no executivo, cargos de confiança, diretorias de estatais, etc. Numa eventual vitória do PSDB, a "despetização" do Estado iria obrigar milhares de burocratas a se relocalizar nos sindicatos, nas ONGs, na academia, etc., ou seja, a ter que "pôr as mãos na massa" na relação direta com os trabalhadores para sobreviver politicamente e materialmente. Por isso, a burocracia fará da eleição de Dilma o principal eixo de atividade das entidades sob seu controle, secundarizando as campanhas salariais ou qualquer outra atividade. O PT fará de tudo para associar o prestígio de Lula à candidatura Dilma e transformar a aprovação do governo em votos, além de demonizar Serra e amedrontar os trabalhadores com a ameaça da volta da direita.

3) PLANO DE LUTAS

O interesse vital da burocracia e o interesse do PSDB em retomar o controle do Estado tende a fazer das eleições de 2010 uma disputa duríssima. Essa disputa deve polarizar a opinião pública ao longo do ano, estabelecendo um falso debate que caberá à esquerda tentar romper. Mais do que nunca será fundamental politizar a política, ou seja, colocar em discussão um projeto político calcado numa perspectiva de classe, numa disputa ideológica pelo socialismo.

Diante desse cenário, a principal tarefa deste Conclat não pode se limitar à definição do modelo de central. A Reorganização da classe trabalhadora não pode se reduzir a uma reacomodação de alguns aparatos dirigidos por correntes de esquerda. Para que se trate de uma Reorganização de fato, é preciso lutar pela renovação das estruturas e das práticas de organização dos trabalhadores que vigoram no Brasil há décadas. No que se refere especificamente ao movimento sindical, a estrutura herdada da Era Vargas nunca foi realmente superada, nem mesmo em períodos de forte ascenso das lutas dos trabalhadores como no pré-1964 e na virada da década de 1970 para 1980. É preciso romper com essa estrutura para que a nova entidade a ser criada tenha de fato condições de servir como alternativa organizativa.

A Reorganização deve ser concebida como construção de um Movimento Político dos Trabalhadores, que seja um fórum permanente de organização da classe, que vá além da esfera sindical ou eleitoral e desenvolva a disputa política e ideológica pela consciência da classe, apresentando uma resposta socialista para a crise em que vivemos e suas múltiplas dimensões. Esse Movimento inclui a atividade sindical e eleitoral, mas não como um simples arranjo na formação de chapas, e sim como espaço para a discussão de programas e expressão da auto-organização da classe e suas lutas, a partir das quais se constroem chapas sindicais e candidaturas eleitorais. Um pressuposto desse Movimento é a construção da unidade, por isso consideramos importante que o CONCLAT aprove uma única candidatura dos trabalhadores para eleições de 2010, como forma de se contrapor à falsa polarização entre Serra e Dilma.

A tarefa desse Movimento é dotar a classe de uma alternativa política classista, socialista, independente do Estado e funcionando com base na democracia operária, sem espaço para a burocratização e o aparatismo. Esse Movimento seria o motor da disputa ideológica pelo socialismo, entendida como disputa permanente pela consciência dos trabalhadores contra o domínio da ideologia burguesa, do reformismo e de diversas formas de atraso e senso comum que obstruem o avanço da luta pelo socialismo.

Apresentamos a seguir algumas propostas para um plano de luta que contém respostas para as questões imediatas colocadas pela continuidade da crise e que lançam a discussão sobre uma alternativa social global:

– Não às demissões! Estabilidade no emprego e readmissão dos demitidos!

  • Redução da jornada de trabalho sem redução dos salários!
  • Salário mínimo do DIEESE como piso para todas as categorias!
  • Carteira assinada e direitos trabalhistas para todos, fim da terceirização, da informalidade e da precarização do trabalho!
  • Cotas proporcionais para negros e negras em todos os empregos gerados e em todos os setores da sociedade!
  • Reestatização da Embraer, da Vale e demais empresas privatizadas, sem indenização e sob controle dos trabalhadores!
  • Estatização sob controle dos trabalhadores e sem indenização de todas as empresas que demitirem, se transferirem ou ameaçarem fechar!
  • Não pagamento das dívidas públicas, interna e externa, e investimento desse dinheiro num programa de obras e serviços públicos sob controle dos trabalhadores, para gerar empregos e melhorar as condições imediatas de saúde, educação, moradia, transporte, cultura e lazer!
  • Estatização do sistema financeiro sob controle dos trabalhadores! Fim da remessa de lucros para o exterior!
  • Reforma agrária sob controle dos trabalhadores! Fim do latifúndio e do agronegócio! Por uma agricultura coletiva, orgânica e ecológica voltada para as necessidades da classe trabalhadora!
  • Que o CONCLAT aprove a frente de esquerda, classista e socialista!
  • Por um governo socialista dos trabalhadores baseado em suas organizações de luta!
  • Por uma sociedade socialista!

4) ESTRUTURA SINDICAL

4.1) Combater a estrutura sindical vigente

A questão da legalidade e da permissão estatal – No Brasil os sindicatos dependem de autorização do Estado para existir. É preciso ter uma carta do Ministério do Trabalho para que a entidade tenha a condição legal de representar os trabalhadores perante a patronal e o próprio Estado. Os sindicatos passam a ter como limite da sua atuação as negociações trabalhistas. O fato dos sindicatos não poderem se organizar autonomamente, segundo suas próprias concepções, para desenvolver o processo de educação política da classe em direção ao socialismo paralelo ao enfrentamento cotidiano das questões trabalhistas, é um obstáculo estrutural para a luta emancipatória dos trabalhadores no Brasil.

Isso não significa que defendemos a criação de sindicatos paralelos ou clandestinos. Defendemos o direito legal de organização, o fortalecimento dos sindicatos, a inviolabilidade dos mandatos, a estabilidade e a inamovibilidade dos dirigentes sindicais, dos membros das CIPAS, dos representantes por locais de trabalho, assim como todos os direitos trabalhistas contidos na lei e os direitos democráticos de modo geral, e lutamos pela sua ampliação.

A questão é que não se pode confundir o direito de organização conquistado ao Estado burguês e materializado em sua legislação com o processo de adaptação e existência subordinada apenas à permissão estatal. É preciso, além da atividade legal e reconhecida, a construção de organizações clandestinas nas empresas privadas onde, por sua própria natureza, existe feroz ditadura de classe.

Contra o financiamento estatal – A luta pelo socialismo é uma luta pela destruição do Estado burguês e não pelo seu fortalecimento. Para que os trabalhadores exerçam o controle será preciso destruir a atual forma do Estado. Isso envolve inclusive destruir a atual forma de funcionamento dos sindicatos, o que exige lutar por uma autonomia real e total dos organismos de luta em relação ao Estado.

Na sua atual forma, o atrelamento dos sindicatos ao Estado se materializa por meio do financiamento, pois os sindicatos no Brasil são mantidos por meio do Imposto Sindical, uma contribuição compulsória cobrada de todos os trabalhadores brasileiros, independentemente de serem sindicalizados ou não, equivalente a um dia de trabalho por ano. Com esse dinheiro é possível manter artificialmente a existência de um aparato burocrático de sindicatos, federações, confederações e centrais sem que essas entidades tenham qualquer papel político real enquanto organizações da classe, até mesmo no que se refere ao plano da luta econômica elementar.

Os sindicatos não precisam realizar nenhuma luta, nem sequer uma campanha salarial, para se manter funcionando e sustentando uma camada de parasitas burocratizados. Além do imposto sindical, os sindicatos e centrais recebem outras verbas por meio de convênios com o Estado e com as próprias empresas, como o FAT, que financiam uma estrutura assistencial dependente do Estado burguês e conformada aos seus limites políticos. É preciso romper com essa barreira e construir organizações sindicais política e financeiramente autônomas, mantidas exclusivamente por meio da contribuição voluntária e consciente dos trabalhadores, em função do reconhecimento da sua representatividade.

A questão da independência político/financeira e do funcionamento burocrático dos organismos dos trabalhadores tem sido um calcanhar de Aquiles não apenas para o movimento sindical, mas também nos demais setores. O MST tem priorizado a busca de verbas do governo federal para que os assentamentos possam concorrer com o modelo de agricultura em vigor, ao invés de priorizar a luta contra o latifúndio e a ruptura do modelo do agronegócio. A UNE tem se financiado com a venda de carteirinhas de meia- entrada e outras formas de financiamento direto do Estado. Vários movimentos de combate à opressão racial ou de outros setores tem se convertido em ONGs financiadas pelo governo ou até por empresas, buscando a adaptação ao sistema ao invés do combate contra a realidade existente.

Não dá para manter a independência política e ideológica do Estado burguês sem romper com qualquer tipo de ajuda e convênios com os órgãos do Estado e da patronal. A nova entidade não pode aceitar -direta ou indiretamente- nenhum centavo do Estado e das entidades patronais. Também é preciso reafirmar que somos contra o imposto sindical e qualquer contribuição dos trabalhadores que não seja voluntária, através das mensalidades sindicais, decisões importantes dos congressos anteriores da Conlutas. Mas é preciso ir mais longe e colocar como condição para os sindicatos a não aceitação do dinheiro do Imposto Sindical e de nenhuma verba dos governos.

Liberdade para os trabalhadores se organizarem – Um dos instrumentos de controle sobre os sindicatos é a estrutura vertical (vinculação a federações, confederações e centrais) e a unicidade sindical (proibição de mais de um sindicato da mesma categoria na base de um município). Essa estrutura cria uma cadeia hierárquica vertical em que o centro das decisões passa a estar situado nas entidades superestruturais e deslocado da base. Além disso, o funcionamento verticalizado das centrais impede a autonomia das regionais. As subseções das centrais nos Estados e regiões limitam-se a reproduzir as campanhas e atividades propostas pela direção nacional, sem iniciativa para desenvolver atividades próprias.

Defendemos a unidade da classe e de seus organismos. Mas a unidade não pode ser imposta por determinações do Estado, ela deve ser fruto de uma decisão consciente dos trabalhadores. A formação de sindicatos, assim como a sua filiação a federações, confederações e centrais, deve ser uma decisão política autônoma da base das categorias.

Lutar contra o economicismo e o corporativismo – A forma de organização centralizada por categoria funciona de modo a manter a luta restrita aos limites corporativos de determinado segmento profissional. Os sindicatos organizam a luta pelas questões específicas das categorias e não desenvolvem lutas políticas mais gerais que contemplem os interesses do conjunto da classe. O calendário de atividades dos sindicatos se centraliza pelas campanhas salariais, de acordo com a data-base das categorias. Os sindicatos mobilizam os trabalhadores para as reivindicações econômicas, mas como uma simples massa de manobra, que deve comparecer nas assembléias e eventualmente paralisar a produção. Encerrada a campanha e assinados os acordos, os trabalhadores voltam à rotina. Desse modo, os sindicatos se abstém de fazer a mobilização permanente, perpetuando o economicismo e negligenciando a educação política e ideológica dos trabalhadores.

Muitas vezes existem subdivisões dentro da própria categoria, nas situações em que há trabalhadores de uma mesma empresa representados por sindicatos diferentes, já que não são considerados como pertencentes ao mesmo ramo profissional, como é o caso do terceirizados. Esse processo se aprofundou com as terceirizações e a precarização geral do trabalho. Os sindicatos se abstém de organizar os terceirizados, contratados, temporários, trabalhadores de segmentos considerados "subalternos", como serviços de limpeza, copa, telefonia, etc. Defendemos que os sindicatos da Nova Central devem dedicar parte importante de sua atividade para temas políticos e ideológicos e, obrigatoriamente, em conjunto com a luta pelo fim das terceirizações, desenvolver formas de organização dos trabalhadores terceirizados. É uma das formas -prática e concreta- de lutarmos contra o corporativismo.

Contra a conciliação de classe – O corporativismo e o economicismo, bem como a participação em convênios com o Estado, são expressões de uma atividade sindical pautada na conciliação de classe. As entidades sindicais abriram mão da defesa de uma alternativa política e social de conteúdo classista e socialista, assumindo abertamente a defesa da permanência da sociedade burguesa. O sistema capitalista é concebido como horizonte definitivo de organização da vida social. O fim da CUT e de seus sindicatos não está só na incorporação ao Estado e de apoio ao governo Lula, mas principalmente no fato de que a CUT e demais centrais governistas se incorporaram à lógica de mercado, onde os sindicatos passam a colaborar com a patronal e com o Estado na gestão da economia. Os sindicatos assumem o discurso da patronal de que as empresas precisam cortar custos para voltar a ter lucro e assim manter empregos e colaborar com "o bem comum". Em nome desse discurso, entidades sindicais assinam acordos que legitimam, demissões, redução de salários, corte de direitos, precarização das condições de trabalho, banco de horas, etc. Tornam-se a primeira fileira do aparato repressivo do capital. A função de repressão e conciliação de classe se expressa também na opção pela via da negociação e da judicialização dos conflitos trabalhistas. Ao empregar essa via, os sindicatos pelegos conseguem conter as mobilizações e colocam os trabalhadores numa posição passiva, à espera de que os dirigentes sindicais ou o Estado, através da justiça trabalhista, resolvam seus problemas.

Organização de base – O sindicalismo brasileiro se caracteriza ainda pela falta de efetividade das organizações por local de trabalho, como as comissões de empresa, CIPAs, corpos de delegados sindicais e representantes de base. A atividade sindical é desenvolvida como algo que emana da cúpula dirigente das entidades sindicais, ao invés de se construir na mobilização a partir da base. Os dirigentes atuam de forma exterior, de cima para baixo, de maneira descolada da realidade do "chão de fábrica". O sindicato comparece em época de campanha salarial com carro de som ou panfletos na porta das empresas, como um "corpo estranho", sem identidade com os trabalhadores e alienado do seu cotidiano.

Quando os trabalhadores atendem ao chamado dos sindicatos, comparecendo às assembléias e paralisando a produção, também agem de forma passiva, pois não lhes são dadas condições de interferir na condução da luta desenvolvida em seu nome. Funcionam apenas como massa de pressão usada pelas entidades sindicais para encenar uma ameaça à patronal e ao Estado. Os representantes de base não têm voz ativa no interior do sindicato, não se reúnem com regularidade, não tem caráter deliberativo. Da mesma forma, o comando de mobilização e de greve e os representantes nas mesas de negociação com a patronal e o Estado são compostos por elementos "biônicos", indicados pela direção das entidades sindicais, sem a possibilidade de que trabalhadores de base participem. Para completar esse quadro, as assembléias são burocráticas, conduzidas por uma mesa também "biônica", na qual apenas os dirigentes usam o microfone. O mesmo acontece em relação à imprensa sindical, em que não há espaço para a manifestação da base. Por isso é preciso que a Nova Central desenvolva formas de organizar os trabalhadores em suas entidades, mas também em seu local de trabalho, seja legalmente, por meio das comissões de fábricas ou CIPAs, ou mesmo clandestinamente.

Finanças – Quanto à gestão financeira é necessário desenvolver uma política (até se tornar cultura) de controle público sobre as finanças e isso envolve prestação de contas, com comprovação dos gastos nas Assembléias, bem como a decisão coletiva dos gastos futuros. É preciso abrir o caixa do movimento sindical: quanto dinheiro tem os sindicatos, quem decide e como decide o que gastar? Não se pode fazer essa crítica aos governos da burguesia e deixar de construir outra prática. Para desenvolver essa cultura, propomos que:

  • cada entidade que receba verba fixa contribuirá com 1% de suas receitas para manter as despesas regulares da central. Se não houver verba fixa, quem define a contribuição, de acordo com a possibilidade do movimento popular, associação, oposição e outros, é a Direção/coordenação (cabendo recurso às instâncias deliberativas);
  • O controle de finanças deve ser por secretaria de finanças com 3 membros e deve ser apresentado balancete mensalmente;
  • Deve-se criar formas "transparentes e democráticas" de contratação e demissão dos funcionários das entidades aprovadas nas Assembléias. Essa é uma medida que visa acabar com a admissões pela amizade, pessoalidade e com o aparelhamento das entidades por alguma corrente.

    4.2) Jogar peso nas oposições sindicais para derrotar a pelegada

    As oposições podem ser o ponto de apoio a partir do qual se renovarão as formas de organização da classe, em direção à retomada da sua função histórica de instrumentos para a luta contra o capital. Estamos aqui falando das oposições não como simples chapas para eleições sindicais visando retomar administrativamente a direção das entidades. Entendemos as oposições como um movimento mais amplo que tenha como objetivo retomar ideologicamente a direção da classe. A tarefa desse movimento é desenvolver o trabalho que os sindicatos não tem desenvolvido de organização e elevação da consciência da classe. A retomada dos sindicatos é um meio e não um fim em si. O fortalecimento do movimento deve criar condições para que cada segmento da classe seja capaz de organizar sua luta cotidiana contra a burguesia mesmo com o obstáculo das direções burocráticas, passando por cima dessas direções, até que possam ser substituídas por direções combativas formadas no próprio curso da luta.

    Um movimento de oposição com essas características teria condições de restituir os sindicatos ao seu devido lugar, ou seja, o de instrumento de luta dos trabalhadores no interior da sociedade burguesa. Livrar as entidades sindicais dos burocratas deve ser uma obsessão nossa, tanto para facilitar as lutas contra o governo e contra a patronal, como para a própria construção da CENTRAL. Nos apresentaremos aos trabalhadores também com propostas de democratização dos sindicatos, como garantia de que o sindicato voltará, efetivamente, para as mãos dos trabalhadores. É preciso que os trabalhadores se convençam de que faz diferença votar em uma chapa da CENTRAL e que não buscamos o simplesmente controle do aparato sindical, mas sim transformá-lo em uma ferramenta de luta e que nos propomos a construir uma nova concepção sindical, ou seja, classista, socialista e democrática.

    Para isso precisamos impulsionar a formação de oposições sindicais, e naquelas que já existem, precisamos garantir um funcionamento permanente, com atividades constantes e debate político com a categoria, mostrando que é fundamental se organizar para varrer a pelegada dos sindicatos.

    4.3) A burocratização

    O rumo que a CUT tomou e a incorporação de vários sindicatos ao Estado deve nos servir de advertência. Não podemos cair no canto de sereia de que somos imunes ao processo de burocratização. Temos que tomar medidas que impeçam desde já o desenvolvimento de uma burocracia também no interior da CENTRAL.

    O processo de burocratização que afetou inclusive sindicatos da base da CENTRAL mostrou a gravidade e a urgência dessa questão. No CONAT, as propostas que apresentamos para combater a burocratização nos sindicatos e na própria CENTRAL foram derrotadas e a reflexão por nós apresentada foi deixada de lado. Isso significou um atraso na elaboração de uma política eficaz para o combate à burocratização. Os acontecimentos da luta de classes mostraram mais uma vez a urgência de um profundo debate sobre essas questões no movimento sindical, que consiga identificar a origem dos problemas e combatê-los.

    – Combater de fato a burocratização. Não pensamos que a burocratização seja inerente ao ser humano, mas ao sistema de dominação. Para se manter de pé o sistema cria mecanismos ou soluções aparentemente mais fáceis para atrair a consciência da classe trabalhadora. A burocratização, seja pelo parlamento, sindicatos ou mesmo o partido, é um elemento objetivo e assim temos que lidar.

    Devido à brutalidade e à alienação a que o trabalhador está submetido em seu trabalho, muitos acabam vendo no licenciamento sindical uma forma de se livrarem dessa condição miserável e passam a ter como objetivo de sua militância a liberação. Isso tem conseqüências porque mesmo esses pequenos privilégios diferenciam o dirigente sindical da categoria que representa. Há também uma conseqüência política danosa que é o afastamento da "pressão" dos trabalhadores, pois muitas vezes o militante liberado só vai à fábrica ou setor de vez em quando. O resultado é que, por suas condições materiais, suas necessidades passam a ser diferentes dos trabalhadores.

    Para que a CENTRAL se apresente aos trabalhadores como algo realmente diferente precisa demonstrar que tem uma estrutura anti-burocrática. Por isso propomos as seguintes medidas:

    a) Todas as decisões políticas importantes precisam ser tomadas em fóruns amplos, ou seja, deve ser retirado dos órgãos de coordenação/direção o poder de decidir tudo, sem discutir com a base;

    b) Defendemos a limitação do número de mandatos. Essa discussão precisa ser aprofundada e levada às entidades de base para discutirmos maneiras de viabilizar um limite às reeleições. Muitos dirigentes sindicais ficam anos longe de suas atividades, o que faz com que deixem de viver a mesma realidade material dos trabalhadores. Temos que acabar com os dirigentes sindicais "profissionais", ou seja, com esse modo de vida. Outra importância dessa medida é permitir que outros companheiros adquiram experiência em várias tarefas. Propomos que a Nova Central realize um Seminário específico, a ser marcado numa data definida neste Congresso, para discutir as medidas necessárias para um processo de transição que viabilize a aplicação de medidas anti-burocratização nas entidades, que permita envolver a base na discussão, preparar mudanças estatutárias, etc., estabelecendo medidas concretas para revolucionar os sindicatos.

    c) Substituição obrigatória de pelo ½ dos membros dos órgãos dirigentes a cada eleição, de forma que garanta uma renovação permanente;

    d) A liberação deve ser uma discussão com o conjunto da categoria, inclusive deve fazer parte da pauta de reivindicações. Que seja a categoria que decida quem se libera e quem não se libera. Quando a "liberação" for aprovada o salário não pode ser superior àquele que o militante recebia e deve existir rodízio, com prazo determinado para retorno ao trabalho. Além disso, o dirigente não pode receber salário do sindicato. Essas medidas possibilitam que a liberação não se torne um "negócio" para os dirigentes sindicais.

    e) Deve haver um rígido controle sobre o cumprimento de horário e das tarefas assumidas, de forma que se cumpra no mínimo o mesmo de antes da liberação. Todos os trabalhadores estão submetidos a um rígido controle de horário por parte dos patrões. Portanto, não é justo que os representantes estejam submetidos a condições mais favoráveis que os demais trabalhadores;

    f) Os sindicatos e demais organizações devem ser absolutamente democráticas, com garantias expressas ao debate entre os ativistas, liberdade de intervenção, discussão, votações, direito de expressão de todas as posições para os trabalhadores nos materiais do sindicato (jornais, revistas) e nas assembléias.Também deve haver um impulso sistemático à formação política e teórica, para superar as dificuldades que haja entre os trabalhadores.

    4.4) Formação teórica e política

    A disputa ideológica requer também uma disputa teórica. A formação dos dirigentes sindicais, dos militantes e dos próprios trabalhadores também precisa ser desenvolvida internamente, dentro das próprias entidades sindicais, sem o recurso a institutos e aparatos exteriores. Além disso, a formação sindical deve ir além de palestras do tipo acadêmico, em que um orador fala e os trabalhadores permanecem passivos. E também os temas tratados devem ir além das questões imediatas, como CIPA, condições de trabalho, legislação trabalhista, etc., que são importantes, mas não dispensam uma formação de caráter mais ideológico e político.

    É preciso superar a concepção das atividades de formação apenas como uma série de cursos que não se relacionam com o restante da atividade sindical e do dia a dia do trabalhador. O próprio desenvolvimento das lutas deve ser visto como um meio de formar novos dirigentes e de educar os trabalhadores em geral, para que desempenhem um papel mais ativo. A formação deve ser um processo permanente, em conexão com a atividade política e a disputa ideológico-cultural.

    Existem sindicatos que chegam ao ponto de oferecer cursos de aprimoramento profissional, economizando investimento da burguesia e do Estado na formação da mão de obra, colaborando para aumentar o lucro das empresas. Ao invés de oferecer cursos sobre a história do movimento operário, as idéias que orientaram a luta dos trabalhadores, o marxismo, etc., os sindicatos reproduzem a ideologia burguesa entre os trabalhadores.

    A formação intelectual é também um dos "privilégios" a que têm acesso os dirigentes sindicais no uso do "tempo livre" que a condição de licenciado do trabalho lhes proporciona. Esses dirigentes se aproveitam dessa condição não para desempenhar melhor o seu papel como liderança dos trabalhadores, mas para ter mais recursos no debate político interno ao sindicato e no controle sobre o aparato. Estudam para adquirir autoridade através do status de "especialista", perpetuando uma lógica tecnocrática.

    Também nesse campo os sindicatos reformistas e burocratizados reproduzem a lógica da sociedade burguesa, mantendo uma separação entre trabalho intelectual e trabalho braçal, entre dirigentes e dirigidos, os que pensam e os que executam. Ao contrário disso, os sindicatos devem ser um instrumento para elevar a consciência e a organização dos trabalhadores, através de cursos, seminários, palestras, atividades culturais abertas a todos. A elevação do nível cultural geral, do grau de consciência e da capacidade política são pré-requisitos para que os trabalhadores assumam o controle sobre sua própria luta, ou em outras palavras, para que a emancipação dos trabalhadores seja obra dos próprios trabalhadores.

    No plano de formação é preciso entrar as obras de Marx e do marxismo, Lênin e tantas outras que contribuam para "a compreensão nítida das condições, do curso e dos fins gerais do movimento proletário" (Manifesto Comunista). Para combater a burguesia também precisamos estudar os seus clássicos e os autores reformistas, principalmente porque muitos deles de alguma maneira influenciam setores do movimento sindical.

    As atividades de formação não podem ser terceirizadas para institutos e outras entidades externas. Por entendermos que essa atividade é parte da central somos contra transferir essa tarefa de forma permanente para qualquer instituto, pois qualquer projeto de formação fora dos organismos da central pode ser a base para a monopolização de uma corrente e criação de organismos paralelos à entidade. Assim, devemos aceitar os institutos de formação política que estejam comprometidos com o projeto da nova CENTRAL como parte de uma transição para o projeto de construir com o seu próprio instituto de formação teórica/prática para assessorar as entidades de base.

    4.5) A luta contra todas as formas de opressão e preconceito

    A disputa ideológica contra o capital não é completa sem a luta contra o racismo, o machismo a homofobia e todas as formas de opressão. O capitalismo cria segmentações e divisões artificiais entre a classe trabalhadora para fomentar a rivalidade e a disputa entre os diversos setores do proletariado pelas vagas cada vez mais escassas no mercado de trabalho num contexto de expansão do desemprego estrutural e de formação de um exército industrial de desempregados permanentes. A segmentação da classe em guetos definidos por etnia, religião, língua, imigração, etc., é mais um obstáculo para a ação conjunta do proletariado.

    No sentido de incorporar as mais amplas massas à luta é preciso ultrapassar a costumeira prática de isolar as questões relativas de raça, gênero e orientação sexual em um plano secundário, sob a inadequada rubrica de "temas específicos", e destinar a cada uma um guichê no qual deve debater "seus" assuntos. Usualmente, destina-se a cada um desses setores o seu departamento isolado e situa-se o conjunto desses departamentos num nível inferior ao das questões gerais. Forma-se o departamento das mulheres, o dos negros, o GLBT, etc, de uma maneira formal e artificial, pois não incorpora as bandeiras e demandas desses setores como eixos centrais de luta e como parte da mesma luta, que é a libertação dos homens e mulheres do domínio do capital. A prática que tem se reproduzido é que as "lutas específicas" não apenas são isoladas da luta geral, como são em seu conjunto empurradas para formar apenas um apêndice, um capítulo a mais que se incorpora burocraticamente porque consta no "manual" do que é "politicamente correto", mas que não se incorpora concretamente.

    As lutas das mulheres, dos negros e outros setores oprimidos precisam ser pautadas no dia a dia da nova central e nas atividades das entidades de base. Propomos algumas bandeiras de luta para levar adiantes este debate:

    • Barrar o assassinato, a violência e a agressão das mulheres, pôr na prisão os assassinos, agressores, pedófilos e seus coniventes! Investimentos para abrigos e recolocação das sobreviventes!
    • Que as verbas retiradas dos projetos de combate à violência doméstica sejam restituídas através da taxação das grandes fortunas prevista na Constituição Federal!
    • Fim da tripla jornada. Redução da jornada de trabalho sem redução do salário! Salário base do DIEESE igual para trabalho igual!
    • Sistemas de saúde compatíveis com as necessidades e as especificidades da mulher negra!
    • Que todas as decisões sobre o corpo e a vida das mulheres sejam tomadas por nós, inclusive sobre gravidez ou aborto.
    • Licença maternidade de 06 meses para todas as trabalhadoras!
    • Legalização e descriminalização do aborto. Distribuição pelo SUS e planos de saúde de preservativos, anticoncepcionais e pílula do dia seguinte. Preservar a vida da mulher com dignidade e respeito é a primeira questão!
    • Fim de todo tipo de discriminação e preconceito. Reconhecimento da união civil homossexual!
    • Uma sexualidade livre dos preconceitos religiosos, de raça, de orientação sexual e não submetida às imposições do capital!
    • Serviços públicos (escolas, postos de saúde, hospitais, creches, etc) de qualidade para os filhos da classe trabalhadora, com profissionais aptos e bem remunerados!
    • Perda de mandato para todos os deputados e deputadas que assinam o Projeto de Lei Estatuto do Nascituro que propõe conceder uma bolsa auxílio mensal até os 18 anos para os filhos de mulheres estupradas, que concede ao estuprador o papel de pai!
    • Repúdio às ações machistas, opressoras e conservadoras da Igreja Católica!
    • Barrar a Reforma da Previdência do Governo Lula e Burguesia!
    • Salário mínimo do DIEESE como forma de elevar o padrão de vida do povo negro em geral e das mulheres negras, em específico, principais vítimas do mínimo de fome;
    • Lutas pela implantação imediata das cotas no mercado de trabalho com objetivo de equilibrar, agora, a situação entre negros e brancos;
    • Que o 20 de Novembro seja reconhecido como feriado nacional e Zumbi reconhecido oficialmente como símbolo dos explorados e oprimidos na luta contra o regime escravocrata;
    • Cotas proporcionais para negros nas escolas técnicas municipais, estaduais e federais. Com vagas proporcionais para filhos de trabalhadores oriundos das escolas públicas;
    • Titularização de terras dos remanescentes de quilombo;
    • Retirada imediata das instalações militares das terras do Quilombo de Alcântara;
    • Reforma agrária com cotas proporcionais para negros como forma de garantir que nossos irmãos e irmãs que lutam pela terra não fiquem apenas com a enxada e a bandeira nas mãos;
    • Imediata preparação de professores e liberação de verbas para compra de livros e materiais necessários para a implementação da lei 10639, que institui a obrigatoriedade do ensino de História e Literatura Africanas em todas as escolas e universidades, bem como a história de resistência dos negros em áfrica, no Brasil e no mundo;
    • Pela libertação de Mumia Abu Jamal.

    5) CONCEPÇÃO E PRÁTICA SINDICAL

    • Cada luta sindical deve transpor seus limites tornando-se uma luta política no sentido de colocar em questão a ruptura com a lógica do capital e com o Estado capitalista e a necessidade de outro tipo de sociedade e de poder em que sejam os trabalhadores e suas organizações que decidam os rumos da sociedade. Mesmo os sindicatos, em uma época de domínio imperialista, se quiserem superar seus limites, devem ser radicais na defesa dos interesses dos trabalhadores: ter como estratégia a luta contra o capitalismo.
    • As lutas e principalmente os sindicatos devem romper seu corporativismo tornando-se mais amplos, unificando trabalhadores ativos e desempregados, trabalhadores diretos e terceirizados, estudantes e professores, etc., no sentido de um movimento o mais geral e coeso possível. Não pensamos que os sindicatos, como quer a burguesia, fiquem restritos à representação corporativa da categoria (em muitos casos representam apenas parte dessa categoria), limitando-se as suas reivindicações. As bandeiras de luta devem ser mais gerais, extrapolando os limites de fábricas, categorias, e ramos produtivos;
    • As lutas e organizações sindicais devem transcender os limites das bandeiras específicas, sob pena de não conseguirem mais sequer manter as conquistas que ainda restam. As bandeiras de luta imediatas devem ser combinadas com outras mais gerais, como: redução da jornada de trabalho para 36 horas sem redução dos salár

      Leia mais