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Na guerra entre polícia e crime organizado, o alvo são os trabalhadores (versão completa)

 

Versão completa

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>> versão resumida

 

A ideologia do policiamento

Nas últimas semanas de outubro e início de novembro, as manchetes foram tomadas por notícias de uma “onda de violência” na periferia de São Paulo, com o assassinato de policiais, de baixa e alta patente, e mortes também de alegados criminosos em supostos confrontos com a polícia. As mortes chegaram a algumas dezenas por semana, e estabeleceu-se o temor de que algo semelhante ao que aconteceu em 2006 (quando confrontos do mesmo tipo numa escala muito maior paralisaram a maior cidade do país na época do dia das mães), inclusive com toque de recolher em alguns bairros da periferia e regiões da Grande São Paulo. O governo federal e o estadual estabeleceram um acordo de cooperação para debelar a onda de violência, incluindo a presença do exército nas ruas e a transferência de líderes da facção PCC para presídios federais em outros estados. No entanto, há quase um mês, as mortes continuam.

A primeira consideração a se fazer é que nenhuma onda de violência e atividade criminosa, nem esta em particular, poderá ser refreadas apenas com recurso a mais policiamento, mais confronto, mais militarização. As razões para o estado de guerra que vigora na periferia de São Paulo e de outras grandes cidades do país são complexas e profundas, e da mesma forma devem ser as soluções. O discurso que resume tudo a falhas específicas na política de segurança pública ou na competência de seus gestores apenas arranham a superfície do problema. Esse discurso simplista sobre assunto tão complexo não é politicamente inocente, pois existe para justificar um projeto determinado, justamente o projeto de colocar mais policiais nas ruas, com maior liberdade para agir. Busca-se legitimar perante o conjunto da população a prática policial já corrente de atirar primeiro e perguntar depois. Até os paralelepípedos das ruas da periferia sabem que a polícia de São Paulo mata indiscriminadamente, de preferência se o suspeito for negro, e monta “autos de resistência” forjados, colocando armas nas mãos dos mortos para legitimar as execuções.

O reforço do policiamento, e especificamente esse tipo de policiamento ultraviolento, é feito mediante um processo de convencimento junto à população e aos trabalhadores, no sentido de que a “guerra ao crime” é a única solução para “o problema da violência”. Esse convencimento é permanente, por meio de programas televisivos estilo “mundo cão”, que se popularizaram enormemente na última década, com o método sensacionalista e oportunista de ignorar os problemas sociais profundos e prometer soluções simplistas: mais polícia e mais mortes. A população é levada a apoiar essa polícia que atira primeiro e pergunta depois, que mata indiscriminadamente, que dispensa o devido processo judicial e age simultaneamente como investigador, juiz e carrasco, que executa a pena de morte instantaneamente, que tem a tortura como método sistemático de investigação, que nunca paga por seus crimes.

Os interesses políticos e de classe

Como uma organização revolucionária que luta pela superação do capitalismo, somos contra esse discurso e o projeto que ele legitima. A polícia que ganha essa completa liberdade de ação nas ruas será a mesma polícia usada para reprimir movimentos dos trabalhadores, como greves, ocupações, manifestações e ações diretas. Ambos serão tratados com a mesma brutalidade e violência, como foram os moradores do Pinheirinho em São José dos Campos no início deste ano e os estudantes da USP em fins do ano passado. Perante a opinião pública em geral toda a repressão será legítima, seja aquela disparada contra o crime, seja contra os movimentos sociais em geral. Qualquer movimento por salário, moradia, educação, passa a ser tratado como atividade criminosa, punida com prisão e condenação judicial ou administrativa de diversos tipos. Com essa prática de criminalização e repressão armada, os movimentos são isolados da grande maioria de trabalhadores, que poderia vir a apoiá-los.

A questão social torna-se assim caso de polícia, como era assumidamente nas palavras do último presidente da República Velha. A república neoliberal que se estabeleceu no Brasil pós-ditadura, seja sob gestões do PSDB ou do PT, tem a criminalização dos movimentos sociais como método preferencial para suprimir todo o possível descontentamento que não seja suficientemente abafado pelas diversas modalidades de bolsa-esmola. Para isso, foi preciso apenas lançar mão daquilo que permaneceu como legado inalterado da ditadura, uma polícia militar montada para tratar os pobres, pretos e periféricos como inimigos. A “democracia” brasileira mostra assim a sua verdadeira face, a ditadura de uma classe, que não precisa revogar formalmente as garantias democráticas como no tempo da ditadura, basta soterrá-las debaixo de balas e cassetetes policiais, com ou sem as câmeras de TV como coadjuvantes, conforme o caso.

O recrudescimento da repressão em geral no Brasil e a “guerra ao crime” no caso em particular se baseiam em métodos, estruturas e preconceitos seculares, mas possuem razões econômicas e políticas bastante atuais, como a necessidade de “limpar a casa” para receber os estrangeiros nos megaeventos esportivos de 2014 e 2016. O Estado brasileiro precisa demonstrar que possui controle sobre o território das periferias, pois isso é crucial para vender a imagem de um país que está progredindo rumo ao “1º mundo”. Que esse suposto progresso esteja sendo alicerçado numa maior exploração sobre os trabalhadores como a que estamos vivenciando nos últimos anos, particularmente depois da crise mundial iniciada em 2008, é algo que deve ser ocultado, por meio da exposição estrondosa de alguma grande vitória, e nada melhor para isso do que uma Copa do Mundo. O sucesso em vender essa imagem é crucial para que o atual dirigente do Estado, o PT, consiga se perpetuar como gestor do capitalismo brasileiro. Daí a cooperação entre Dilma e Alckmin no caso da atual “onda de violência”.

Para completar esse ponto, é preciso assinalar que as lutas contra a repressão aos movimentos sociais, contra a violência policial, abusos de poder, maus tratos, corrupção policial e em defesa dos direitos humanos, constituem um conjunto de lutas parciais que não pode ser isolado da luta política global contra a totalidade do projeto que está em curso no país, o projeto da burguesia e do PT de gestão do capitalismo periférico brasileiro. Não existe possibilidade de vitória na luta contra a violência sem que esta seja parte da luta geral contra os demais problemas causados pelo capitalismo, e que seja uma luta não apenas contra os efeitos, mas contra as causas desses problemas, o próprio capitalismo, uma luta abertamente anticapitalista e socialista.

A militarização de São Paulo

A violência estatal ou mesmo a “militarização” que o crime organizado instaura nas periferias é uma ferramenta fundamental na manutenção da exploração, intimidando os trabalhadores para que não entrem em luta. A polícia tem como papel fundamental reprimir os trabalhadores e mantê-los sob controle. O Estado brasileiro tem um projeto para o país e para implantar esse projeto passa por cima dos direitos e das aspirações de milhões de trabalhadores. A polícia funciona como um agente direto dos setores do capital que controlam o Estado. Para favorecer a especulação imobiliária, o judiciário e a polícia realizam despejos em áreas ocupadas e favelas, remoções forçadas, caçada a moradores de rua, etc., tudo isso no sentido de “higienizar” as cidades e literalmente abrir terreno para construtoras, shopping centers, etc.

Em Janeiro de 2012 a desocupação do bairro Pinheirinho em São José dos Campos já foi uma expressão da escalada reacionária em curso no país e também uma demonstração da ligação orgânica das forças da repressão com o grande capital. Um bairro inteiro, com milhares de habitantes, foi desocupado, com a destruição das casas e do patrimônio dos trabalhadores, com enorme brutalidade despejada indiscriminadamente contra mulheres, idosos e crianças, apenas para garantir os interesses da especulação imobiliária.

Impossível não notar que estamos no momento que antecede a Copa do Mundo e há grandes áreas, como a Zona Leste de São Paulo, que estão na mira da especulação imobiliária. O Estado precisa preparar essas áreas para exploração por imobiliárias e empreiteiras. Por isso aumentam os incêndios de favelas, desocupações, remoção de moradores de rua, etc. A violência é também uma forma de afastar a população para regiões mais distantes e facilitar a exploração. Certas regiões da cidade se tornam palco de guerra entre a polícia e organizações do crime.

Esses episódios de guerra facilitam o discurso de demonização dos pobres, dos negros e da periferia em geral. Para o Estado e a burguesia, é conveniente manter certas regiões sob uma espécie de estado de sítio, fortalecendo a polícia e o aparato repressivo em geral. O próprio aparato do Estado, em nível municipal, está sendo militarizado.

Das 31 subprefeituras de São Paulo, 30 estão sob comando de ex-coronéis da PM. Esse movimento de militarização (realizado pela gestão de Kassab, ex-DEM, hoje PSD) coincide com o esvaziamento das funções das subprefeituras, que perdem atribuições sociais, e também suas verbas, que caíram de R$ 2,9 bilhões para pouco mais de R$ 1 bilhão (http://www.redebrasilatual.com.br/temas/politica/2012/09/subprefeituras-sao-desmanteladas-1); transformam-se em meras zeladorias e órgãos de fiscalização.

A militarização e o discurso de guerra não correspondem exatamente ao que apontam os números. A cidade de São Paulo é a capital menos violenta do país, de acordo com o Mapa da Violência 2012, com uma média de 13 assassinatos para cada 100 mil habitantes (dados de 2010, os mais atualizados disponíveis. A capital mais violenta é Maceió, com 109,9 assassinatos para cada 100 mil (http://mapadaviolencia.org.br/pdf2012/mapa2012_web.pdf). Para legitimar o clima de terror, é preciso algo mais.

Para avançar na militarização, é preciso um pretexto mais forte, e para isso recorre-se à guerra contra organizações criminosas como o PCC. Desde a crise de 2006 vigorava um acordo entre a polícia/governo e o crime, que mantinha a situação “estável” na periferia. Por algum motivo, esse acordo foi suspenso em 2012. Policiais começaram a ser mortos, inclusive fora de serviço, e em represália, agentes policiais começaram a matar criminosos e supostos criminosos em grande número, numa situação de guerra declarada e completamente por fora de qualquer procedimento legal (investigação, julgamento, prisão). A versão policial dos “autos de resistência” sempre prevalece e torna-se impossível distinguir entre os mortos quem realmente tinha envolvimento com o crime e quem foi pego pelo fogo cruzado de um ou de outro lado.

O que importa é que foi criada uma legitimação social para a ação violenta da polícia. A polícia de São Paulo abriga em seu interior grupos de extermínio, que cumprem esse tipo de missão com alguma “discrição” em períodos “normais” e são “liberados” para agir mais abertamente em momentos de crise como esse. O Estado aproveita a situação, criada por ele mesmo, para aumentar a repressão ao movimento social. No limite, o avanço da atual política de confronto aponta para a possibilidade de ocupação das favelas em São Paulo, tais como as UPPs do Rio.

As múltiplas dimensões do problema

Os interesses políticos e de classe que estão por trás da escalada repressiva são evidentes, mas desmontar o mecanismo ideológico que legitima a repressão às lutas sociais perante os próprios trabalhadores que poderiam se beneficiar delas não é tarefa fácil. Os ideólogos da repressão, como os “jornalistas” dos programas “mundo cão”, podem manipular as emoções da população com muita facilidade, ao tratar o crime em uma única dimensão, como um simples caso de policial-herói X bandido-monstro. Os ideólogos da repressão são sórdidos o suficiente para caricaturizar todos os críticos dos abusos policiais e defensores de direitos humanos como “amigos dos bandidos”, ou no caso dos estudantes da USP, como “maconheiros”. Trata-se de uma batalha duríssima e que está sendo vencida pelos agentes ideológicos da extrema direita. Parte disso contaminou até mesmo as artes e a cultura, como as “stand up comedies”, que fazem sucesso ridicularizando o assim chamado “politicamente correto”, o que em si não é problema, mas no atual contexto não faz mais do que inclinar os sentimentos do público mais para a direita.

Como não estamos diante de “um simples caso de policial-herói X bandido-monstro”, mas de uma escalada de violência e repressão relacionada à gestão do capitalismo periférico brasileiro no contexto da crise mundial do sistema, precisamos discutir a “onda de violência” não em seu aspecto superficial e fenomênico, mas em suas determinações sociais profundas, que se estendem por diversas dimensões da realidade:

  • ainda relacionado ao discurso da televisão, precisamos recusar o uso que se faz do termo “bandido” como algum tipo de subespécie, um não-humano que pode legitimamente ser morto, como um personagem de videogame. De acordo com esse discurso, “bandido” não pode ter acesso aos direitos humanos, pois “não é gente” (ou como dizem, “direitos humanos para humanos direitos”, uma formulação que evidentemente só poderia vir da direita). Ora, muitos dos que chamam por “bandidos” são humanos que foram desumanizados pela miséria do meio social de onde provêm, pelo convívio com a violência de policiais e outros criminosos, e desumanizados mais uma vez ao serem tratados como menos do que humanos pela TV e a opinião pública que a segue. Não negamos que os criminosos sejam extremamente cruéis e brutalizados, mas isso não justifica nenhum tipo de política de extermínio. Justifica o emprego do devido processo legal e da aplicação de todas as garantias fundamentais, podendo culminar, ao fim do processo, com a prisão, pois essa instituição abre ao menos a possibilidade, mesmo que remota, de algum tipo de recuperação. Mas, para isso, seria preciso que os presídios deixassem de ser os bárbaros depósitos de gente que existem hoje no Brasil, e que servem apenas para brutalizar ainda mais os seres já violentos que nela são despejados. Se a saúde e a educação para os trabalhadores e seus filhos recebem verbas minúsculas (em função da prioridade que é o pagamento da dívida fraudulenta aos banqueiros e o apoio ao capital), que se dirá então sobre o sistema prisional, em que os condenados são despejados como lixo, apenas para sumir da vista da sociedade, sem qualquer perspectiva de recuperação. Nos presídios, estão sujeitos a todo tipo de atrocidades, assassinatos, estupros, torturas, maus tratos, superlotação, sem qualquer possibilidade de ressocialização pelo trabalho e sem o devido isolamento para líderes de facções e criminosos de alta periculosidade. Desse modo, só podem sair piores do que entraram;
     
  • Como a humanização do sistema penal em geral não está entre as prioridades, é mais simples condenar todos os “bandidos” automaticamente à morte, concedendo à polícia e seus arautos na TV a prerrogativa de determinar quem é bandido e quem não é. Essa categoria fictícia do “bandido” com as características de um animal irracional ultraviolento e irrecuperável é aplicada principalmente sobre um segmento social muito real, os jovens negros da periferia. A polícia brasileira é bastante seletiva e racista, e sabe muito bem quem se encaixa nesse estereótipo televisivo de bandido, quem deve ser abordado numa ronda noturna, quem não se espera que possa estar dirigindo um carro um novo, etc. De outro lado, a mídia é hipócrita o suficiente para tratar os mortos da periferia, tanto criminosos de verdade quanto trabalhadores mortos por criminosos e pela polícia, como simples estatísticas. Os mortos da periferia não têm nome, não têm rosto, não sentem dor, não têm sentimentos, não têm sonhos, não têm entes queridos que choram por eles. Já os mortos dos bairros centrais, onde moram a pequena burguesia e a burguesia, esses sim têm nome, sobrenome, fotografia, família para lançar depoimentos emocionados na TV e até mesmo motivar passeatas “pela paz”. Essa operação de mistificação atribui a uma determinada classe social a condição de sujeito, de protagonista, de ser considerado entre os que tem direito à voz no espaço público, enquanto aos trabalhadores e pobres em geral se nega a condição de humano e se aceita por definição que possam morrer às dúzias em chacinas anônimas, merecendo nada além de notas de rodapé com o número de vítimas;
     
  • a naturalização do “bandido” deve ser combatida ainda por outro motivo: não é simplesmente um problema da natureza do indivíduo ou de caráter que o torna apto a cometer crimes violentos, mas uma determinada situação social, a miséria material extrema que reina nas periferias. A falta de empregos ou empregos extremamente precários e degradantes, falta de moradia, de saneamento básico, de saúde pública, de educação, de lazer e cultura, em que vivem os moradores da periferia, fazem com que o crime se torne uma opção razoável, mesmo que seja apenas para a pequena minoria que efetivamente adere ao crime. Quando se situa a causa da existência de criminosos na “natureza” violenta de alguns indivíduos, isso é pretexto para deixar de combater a miséria e sua causa, o sistema capitalista;
     
  • a miséria é a causa do crime, e o capitalismo é a causa da miséria. Logo, o crime é parte do capitalismo, não é um fenômeno exterior ou oposto ao modo de produção capitalista. O capitalismo estabelece o monopólio do uso da força (armas) pelo Estado, por meio das forças armadas e da polícia. Mas ao mesmo tempo, ao estabelecer a competição de todos contra todos, e criar também um exército industrial de reserva (cada vez mais permanente) de desempregados e miseráveis, o capitalismo cria também a tentação de prevalecer na competição por meio de atividades banidas pelo Estado e que envolvem o uso da força. Essas atividades criminosas são presididas pela mesma lógica da competição empresarial capitalista. O objetivo de todos os líderes criminosos é obter riqueza suficiente para entrar no mundo dos negócios “legais” e ingressar na burguesia. A ideologia dos soldados do crime ao seguir seus chefes é obter status e prestígio, comprando carros e mulheres (como se estas fossem mercadorias).
     
  • em relação à “ideologia policial” de resolver as questões sociais por meio da força, trata-se de uma tendência recorrente e perigosa em momentos de crise. Na Grécia, ex-policiais integram as milícias do partido neonazista Aurora Dourada, que promete resolver os problemas do país expulsando os imigrantes por meio da violência. Na Alemanha, Hitler contou com os restos do aparato militar e policial do antigo império e da República de Weimar, convertidos em desordeiros, bem como lúmpens e elementos desclassificados em geral, para recrutar as milícias nazistas das SS e SA. O fato de que esse fenômeno esteja começando a se repetir em países europeus periféricos, no bojo da crise que é a mais séria desde a de 1930, é algo que deve nos deixar em estado de alerta. As milícias paramilitares do nazismo serviram como braço armado da patronal alemã para dizimar as organizações dos trabalhadores na base da violência (a divisão entre comunistas e socialistas, por obra do stalinismo, contribuiu decisivamente para isso, mas trata-se de outra história) nos anos 1930 e abriram caminho para a subida de Hitler ao poder. Quando dissemos que a mesma polícia hoje utilizada para “combater o crime” será usada para combater os movimentos dos trabalhadores, precisamos ter esses exemplos históricos passados e atuais em perspectiva;
     
  • num país periférico como o Brasil, o Estado sucateado pelo pagamento da dívida não consegue exercer a sua função básica de monopólio do uso da força, pois os agentes que emprega para isso acabam agindo por conta própria e usando a força não para fins públicos, mas para seus próprios fins particulares. Tanto as forças armadas como as policiais são sucateadas, sem instalações, sem equipamento, sem treinamento, sem formação, sem recursos, com baixos salários, etc. Dessa forma, os agentes diretamente envolvidos no “combate ao crime”, os que atuam na linha de frente das periferias, acabam dando seu “jeitinho” para sobreviver. O Estado praticamente empurra os policiais para as práticas ilegais. Alguns fazem “bicos” e serviços “por fora” em empresas de segurança (muitas vezes comandadas pelos próprios oficiais e ex-oficiais da polícia) nos dias de folga. Ou o que é mais grave, fazem acordos com as próprias organizações criminosas, deixando de reprimi-las em troca de uma parte de sua renda. Os periódicos surtos e “ondas de violência” entre policiais e criminosos em geral se referem a desacordos entre os dois setores sobre a porcentagem que cabe a cada um na repartição dos lucros do tráfico. E é aqui que o crime organizado mais uma vez se revela como parte integrante do próprio sistema capitalista: é uma empresa em funcionamento; como tal, o que lhe interessa é o lucro. É nesse sentido que o tráfico é um grande negócio do mercado brasileiro. Em casos extremos, como no Rio, grupos de ex-policiais formam “milícias” que, sob o pretexto de combater o tráfico, se tornam elas próprias “donas” dos morros e extorquem dos moradores em troca dos seus “serviços”, controlando todos os pequenos negócios legais e ilegais no bairro. Ou seja, o Estado brasileiro não tem controle sobre os seus homens armados, que ao invés de combaterem o crime, tornam-se parte dele. Nesse sentido, por sua vez, o crime organizado termina por instaurar nas regiões em que controla um “Estado de viés fascista”, muito pior do que os Estados de direito oficiais. Para completar, os políticos e “jornalistas” que manipulam o medo da população e advogam “mais polícia” estão defendendo uma espécie de “indústria do policiamento”, como os coronéis do nordeste defendiam a “indústria da seca”, mais um pretexto para transformar determinados territórios em verdadeiros feudos sob controle de homens armados.
     
  • não são apenas os policiais na linha de frente do “combate ao crime”, mas também as demais instituições do Estado, como o judiciário, órgãos de fiscalização, etc., que se associam aos negócios criminosos. Juízes, advogados, promotores, fiscais, gerentes de bancos, etc., todos eles recebem também a sua parte da renda do crime. Sem os serviços dessa camada de “especialistas”, as organizações e lideranças criminosas não teriam como fazer a lavagem do seu dinheiro. Ao mesmo tempo, os canais que permitem a lavagem de dinheiro do crime, como as contas em paraísos fiscais, não podem jamais ser fechados, pois são os mesmos que os próprios grandes burgueses usam ordinariamente para remeter ilegalmente seu dinheiro para o exterior. O combate efetivo à lavagem de dinheiro e aos paraísos fiscais, seja para asfixiar as organizações terroristas, seja para criminosos comuns, jamais terá sucesso, pois tratam-se dos mesmos mecanismos usados por políticos corruptos, grandes empresários que sonegam impostos, banqueiros e investidores, etc. Sem esses mecanismos, também ilegais e que movimentam grandes fortunas, o capitalismo não funcionaria para os burgueses individuais, portanto, nenhum Estado nacional será capaz de extinguí-los (mesmo porque se tratam de redes mundializadas de circulação de dinheiro), e eles seguirão sendo usados também pelas organizações criminosas.
     
  • a “guerra às drogas” é uma versão para a América Latina daquilo que se pratica no Oriente Médio com o nome de “guerra ao terror”. É um pretexto para que o exército estadunidense controle países como a Colômbia e mais recentemente o México. Nesses países, instalam-se bases militares estadunidenses, de onde as tropas imperialistas podem ter fácil acesso às riquezas do continente, como petróleo, minérios, água potável, biodiversidade, etc. Sob o pretexto da “guerra às drogas”, o que se quer também é controlar os movimentos sociais da região, que desde o início da década passada têm sido uma força política importante.

Propostas para a questão da violência

Retomamos então a discussão apresentada no início quando indicamos que o simples aumento do policiamento não irá resolver o problema do crime e da violência. No caso brasileiro, o limite a que se pode chegar com essa política de mais policiamento é um estado de terror nas periferias, sob controle de agentes policiais extremamente violentos (e nem por isso menos corruptos, nem menos associados ao crime), que transmitam uma falsa sensação de “tranquilidade” e “paz social” por ocaisão dos megaeventos esportivos.

Os aspectos que levantamos acima em relação às múltiplas dimensões do problema social do crime e da violência colocam como soluções correspondentes as seguintes propostas:

– emprego, moradia e serviços públicos para todos os trabalhadores;
– educação, cultura e lazer para a juventude em todos os bairros;
– redução de danos para dependentes e drogas, com narcossalas, fornecimento de seringas, etc; por tratamento humanizado, fim da internação compulsória;
– humanização do sistema penal em geral sob o controle do Estado, com a construção de novas unidades e a contratação de pessoal até dar fim à superlotação dos presídios, aos maus tratos e à corrupção dos agentes carcerários;
– combate à corrupção policial e judicial, julgamento de policiais em tribunais civis, expulsão e prisão de todos os corruptos e confisco de seus bens;
– desmilitarização da PM, unificação das polícias em uma única corporação civil, com direito de sindicalização e eleição dos comandantes e sob controle democrático da população dos bairros;
– fim da lavagem de dinheiro e repatriação de todo dinheiro remetido ilegalmente para o exterior;
– campanha contra a repressão aos movimentos sociais, pelo direito de greve e de manifestação;
– campanha permanente de esclarecimento dos malefícios causados pelo uso abusivo das drogas em geral.

Boa parte dessas medidas exigirão uma luta contra a lógica do sistema capitalista como um todo, conforme assinalamos acima. Para gerar emprego, moradia e serviços públicos de qualidade para todos, seria preciso, por exemplo, inverter a prioridade do orçamento público, que hoje está comprometido em cerca de 50% com o pagamento de juros da dívida pública aos banqueiros e especuladores. Para obter o não pagamento dos juros, por sua vez, seria preciso enfrentar um dos setores mais poderosos do capitalismo brasileiro e mundial, o mercado financeiro. Seria preciso desenvolver uma luta contra o Estado e suas atuais instituições, no contexto de uma luta que acabaria inevitavelmente se colocando contra o capitalismo e projetando a construção do socialismo. O mesmo se aplica a várias das demais medidas, que devem ser compreendias como parte de um programa anticapitalista e socialista.

Para finalizar, por falar em banqueiros, como dizia Brecht, “o que é o crime de roubar um banco comparado ao de fundar um?”

Espaço Socialista, Novembro de 2012

 

 

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Na guerra entre polícia e crime organizado, o alvo são os trabalhadores (versão resumida)

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Nas últimas semanas de outubro e início de novembro, as manchetes foram tomadas por notícias de uma “onda de violência” na periferia de São Paulo com o assassinato de policiais, de baixa e alta patente, e mortes também de alegados criminosos em supostos confrontos com a polícia. As mortes chegaram a algumas dezenas por semana, e estabeleceu-se o temor de que algo semelhante ao que aconteceu em 2006 (quando confrontos do mesmo tipo numa escala muito maior paralisaram a maior cidade do país na época do dia das mães), inclusive com toque de recolher em alguns bairros da periferia e regiões da Grande São Paulo. O governo federal e o estadual estabeleceram um acordo de cooperação para debelar a onda de violência, incluindo a presença do exército nas ruas e a transferência de líderes da facção PCC para presídios federais em outros estados. No entanto, há quase um mês, as mortes continuam.

A primeira consideração a se fazer é que nenhuma onda de violência e atividade criminosa, nem esta em particular, poderão ser refreadas apenas com recurso a mais policiamento, mais confronto, mais militarização. As razões para o estado de guerra que vigora na periferia de São Paulo e de outras grandes cidades do país são complexas e profundas, e da mesma forma devem ser as soluções. O discurso que resume tudo a falhas específicas na política de segurança pública ou na competência de seus gestores apenas arranham a superfície do problema. Esse discurso simplista sobre assunto tão complexo não é politicamente inocente, pois existe para justificar um projeto determinado, justamente o projeto de colocar mais policiais nas ruas, com maior liberdade para agir.

O reforço do policiamento, e especificamente esse tipo de policiamento ultraviolento, são feitos mediante um processo de convencimento junto à população e aos trabalhadores, no sentido de que a “guerra ao crime” é a única solução para “o problema da violência”. Esse convencimento é permanente, por meio de programas televisivos estilo “mundo cão”, que se popularizaram enormemente na última década, com o método sensacionalista e oportunista de ignorar os problemas sociais profundos e prometer soluções simplistas: mais polícia e mais mortes.

Enquanto militantes que lutam pela superação do capitalismo, devemos ser contra esse discurso e o projeto que ele legitima. A polícia que ganha essa completa liberdade de ação nas ruas será a mesma polícia usada para reprimir movimentos dos trabalhadores, como greves, ocupações, manifestações e ações diretas. Ambos serão tratados com a mesma brutalidade e violência, como foram os moradores do Pinheirinho em São José dos Campos no início deste ano e os estudantes da USP em fins do ano passado. Perante a opinião pública em geral, toda a repressão será legítima, seja aquela disparada contra o crime, seja contra os movimentos sociais em geral. Qualquer movimento por salário, moradia, educação, passa a ser tratado como atividade criminosa, punida com prisão e condenação judicial ou administrativa de diversos tipos. Com essa prática de criminalização e repressão armada, os movimentos são isolados da grande maioria de trabalhadores, que poderia vir a apoiá-los.

A violência estatal, ou mesmo a “militarização”, que o crime organizado instaura nas periferias é uma ferramenta fundamental na manutenção da exploração, intimidando os trabalhadores para que não entrem em luta. A polícia tem como papel fundamental reprimir os trabalhadores e mantê-los sob controle.

É preciso dizer que a luta contra a repressão aos movimentos sociais, contra a violência policial, os abusos de poder, maus tratos, corrupção policial, em defesa dos direitos humanos, constituem um conjunto de lutas parciais que não pode ser isolado da luta política global contra a totalidade do projeto que está em curso no país, o projeto da burguesia e do PT de gestão do capitalismo periférico brasileiro. Não existe possibilidade de vitória na luta contra a violência sem que seja parte da luta geral contra os demais problemas causados pelo capitalismo, e que seja uma luta não apenas contra os efeitos, mas contra as causas desses problemas, o próprio capitalismo, uma luta abertamente anticapitalista e socialista.

Nesse sentido, para que possamos dar conta das múltiplas dimensões do problema social do crime e da violência, apontamos medidas para solucionar as suas próprias causas e seus efeitos:

– emprego, moradia e serviços públicos para todos os trabalhadores;

– educação, cultura e lazer para a juventude em todos os bairros;

– redução de danos para dependentes de drogas, com narcossalas, fornecimento de seringas, etc.

– por tratamento humanizado aos dependentes de drogas, fim da internação compulsória;

– humanização do sistema penal em geral sob o controle do Estado, com a construção de novas unidades e a contratação de pessoal até dar fim à superlotação dos presídios, aos maus tratos e à corrupção dos agentes carcerários;

– combate à corrupção policial e judicial, julgamento de policiais em tribunais civis, expulsão e prisão de todos os corruptos e confisco de seus bens;

– desmilitarização da PM, unificação das polícias em uma única corporação civil, com direito de sindicalização e eleição dos comandantes e sob controle democrático da população dos bairros;

– campanha contra a repressão aos movimentos sociais, pelo direito de greve e de manifestação;

– campanha permanente de esclarecimento dos malefícios causados pelo uso abusivo das drogas em geral.

Boa parte dessas medidas exigirá uma luta contra a lógica do sistema capitalista como um todo, conforme assinalamos acima. Para gerar emprego, moradia e serviços públicos de qualidade para todos, seria preciso, por exemplo, inverter a prioridade do orçamento público, que hoje está comprometido em cerca de 50% com o pagamento de juros da dívida pública aos banqueiros e especuladores. Para obter o não pagamento dos juros, por sua vez, seria preciso enfrentar um dos setores mais poderosos do capitalismo brasileiro e mundial: o mercado financeiro. Seria preciso desenvolver uma luta contra o Estado e suas atuais instituições, no contexto de uma luta que acabaria inevitavelmente se colocando contra o capitalismo e projetando a construção do socialismo. O mesmo se aplica em várias das demais medidas, que devem ser compreendias como parte de um programa anticapitalista e socialista.

Espaço Socialista, Novembro de 2012

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O grito Guarani-Kaiowá e o riso do agronegócio

O mês de outubro de 2012 testemunhou o desesperado grito Guarani-Kaiowá chamar a atenção nas redes sociais e furar o bloqueio da imprensa. Veio à tona o problema das condições de vida dos indígenas no Brasil, através de seu caso mais grave no país: o conflito entre latifundiários e os Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul. Foi através de uma carta-denúncia que a situação atingiu tal repercussão, circulando pelas redes sociais e escancarando um problema que acontece há décadas. Um trecho da carta:

(…) pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos para decretar a nossa morte coletiva e para enterrar nós todos aqui. Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação/extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais.

Já aguardamos esta decisão da Justiça Federal, Assim, é para decretar a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay e para enterrar-nos todos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos daqui com vida e nem morto e sabemos que não temos mais chance em sobreviver dignamente aqui em nosso território antigo, já sofremos muito e estamos todos massacrados e morrendo de modo acelerado. (…)

Esta carta ecoou como um grito de desespero emitido pela comunidade Guarani-Kaiowá, a todos os ouvidos atentos. Circulou pelas redes sociais e parou na mente de trabalhadores que se identificaram com a luta deste povo.

Ao mesmo tempo, seu grito demonstrou também o estreito laço entre o judiciário, a imprensa e o agronegócio.
Esta é uma questão tão complexa que soa estranho até ser chamada de conflito, uma vez que entre os fazendeiros sulmatogrossenses e a população indígena das diversas etnias sobreviventes é somente esta última que sofre as consequências do dito conflito.

O “X” DA QUESTÃO

Uma pequena amostra dos números nos dá uma ideia de que muita dor ainda será infligida àqueles que assumem sua ancestralidade indígena e tem disposição pra sustenta-la até as últimas consequências.

Atualmente em Mato Grosso do Sul sobrevive a segunda maior população indígena do Brasil, com 73.295 remanescentes (IBGE 2010, 1º Amazonas, 108.080), e é nesse espaço físico que o agronegócio avança.

Os estímulos federais via PlanoSafra (o que só demonstra a aliança agronegócio e governo federal) aumentaram os recursos destinados ao setor de R$ 93 bilhões na safra 2009/2010 para R$ 115,2 bilhões na safra 2012/2013. Ao mesmo tempo em que a falta de recursos para a FUNAI realizar os estudos necessários gerou, em 2009, a desculpa necessária para o desembargador Luis Stefanini, do TRF 3ª Região suspender a demarcação das terras indígenas. Simples equação: Sem dinheiro, sem estudo, sem demarcação, mais terra para o agronegócio, mais dividendos para os acionistas.

De acordo com a estimativa de safra da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) em 2012 o Brasil produzirá 165,9 milhões de toneladas de grão, 1,9% a mais do que na safra anterior, só em Mato Grosso do Sul, o aumento foi de 22,9%. Se considerarmos a área plantada percebemos a fome de terra nesse estado, pois o crescimento nacional foi de 2% enquanto que das cercas sulmatogrossenses o aumento foi de 12,8%, ou seja, mais de seis vezes a média nacional.

Tal boom agrícola reflete tanto no mercado imobiliário que em maio de 2011 o estado sofreu um aumento médio de 30% no valor da terra em relação a 2010, sendo que esse índice chegou a 100% no norte do estado, de acordo com o Sindicato dos Corretores de Imóveis de Mato Grosso do Sul.

OLHANDO NO MAPA

E é na hora de esticar o mapa que a contradição salta os olhos. Se as terras indígenas demarcadas no estado ocupam 6.782 km² (FUNAI 2011) podemos fazer uma conta tosca e morrermos de vergonha por nunca termos pensado nisso: Para tanto, basta dividir a população indígena de 73.295 no território que o “civilizado” estado brasileiro demarcou e teremos 10,8 sobreviventes por Km². O absurdo é tanto que o rebanho bovino para ter uma produtividade mediana necessita de 3 a 5 KM² por cabeça.

E o que dizermos de nações inteiras com idiomas, costumes, rituais, concepção de mundo, tempo e espaço completamente diferentes entre si limitados por um estado com instituições e indivíduos que nem param pra pensar nisso? Que dizermos também da diferença cultural entre um universo formado fora do que habituamos chamar de “mundo ocidental”? Qual seu espaço vital?

É dentro dessa lógica nefasta que 60 famílias Kadiwéu estão sendo retiradas pela Polícia Federal de uma área de cerca de 160 mil hectares de terra indígena demarcada em 1900 e homologada em 1984, no município de Porto Murtinho, na região do Pantanal do Mato Grosso do Sul. Tal área fica dentro da Terra Indígena (TI) Kadiwéu e mesmo assim sofre ataque do judiciário que concedeu liminar de reintegração de posse, e claro, já foi cumprida. Nessas questões a “justiça” nunca tarda!

…E A SITUAÇÃO AINDA PODE PIORAR!

Não bastasse todo o já sofrido, o deputado federal Édio Lopes (PMDB/RR) apresentou substitutivo ao Projeto de Lei 1610/96, que dispõe sobre a exploração e o aproveitamento de recursos minerais em terras indígenas. Entre tantos ataques que o capital já fez sobre as populações originárias acrescentasse mais esse: “Qualquer interessado” poderá requerer ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) o direito de minerar qualquer terra indígena no Brasil, além da anulação de qualquer direito sobre mineração concedida antes da promulgação desta nova lei.

Ou seja, as nações que ainda não obtiveram reconhecimento continuaram sofrendo ataques de pistoleiros a mando do capital e a demora do judiciário e as que já arrancaram esse reconhecimento do estado brasileiro sofrerão assédio das companhias mineradoras, além de perderem toda e qualquer salvaguarda constitucional.

Num cenário de crise mundial, os grandes bancos e seus acionistas precisam garantir novas fontes de lucro e rentabilidade. As velhas guerras no Oriente Médio já não são suficientes, então resta o rico território indígena dessa pobre país emergente.

ORGANIZAR E RESISTIR

Compreendemos que o conflito pelo qual passam os índios Guarani-Kaiowá não é isolado, mas parte de um todo. A lógica do lucro a todo custo beneficia pouquíssimos indivíduos enquanto que colocam a maior parte da população em situação de medo, insegurança e preocupação. Um exemplo disso é a seguinte contradição: se a quantidade de terras cultivadas pelo latifúndio aumentou, por que o preço dos alimentos só sobem?

O problema está em que, os meios que deveria ser utilizado para resolver os problemas materiais do conjunto da sociedade (estes meios são: máquinas, ferramentas e terra) são hoje dominados por um conjunto mínimo de indivíduos. Os latifundiários, por exemplo, só querem saber de plantar soja e cana-de-açúcar. Nós, trabalhadores, simplesmente vendemos nossa força de trabalho a estes poucos proprietários, mas são eles que decidem o que fazer com as forças produtivas, não interessando o benefício da população, mas seu lucro.

Essa forma de organização é inerente ao sistema capitalista. Devemos propor uma nova forma de organização, onde os trabalhadores (que produzem a riqueza do mundo) detenham os controles da produção e a direcionem para o benefício do conjunto da sociedade.

Para isso, é necessário organizar-se, resistir e lutar pela derrubada do capitalismo, rumo a uma sociedade socialista. Nesse sentido, o combate ao agronegócio, bem como a todas as suas expressões políticas e institucionais, seja no Judiciário, no Executivo e ou no Legislativo, deve ser realizado sem trégua por todos aqueles que lutam por uma sociedade que supere o capitalismo.

Aos Guaranis-Kaiowás nossa solidariedade e disposição de luta!

Novembro de 2012

 

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Jornal 54: Novembro de 2012

  

Número 54- Novembro de 2012 

Edição especial

Esta edição é especial e conta com  o encarte:

95 ANOS DA REVOLUÇÃO RUSSA: OUTROS OUTUBROS VIRÃO

 

 

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A NECESSIDADE DE UMA ALTERNATIVA SOCIALISTA BATE ÀS PORTAS

O ano de 2012 foi sem dúvida bem diferente do ano anterior, quando o governo Dilma conseguiu aplicar a sua política de apoio às empresas, ou seja, retirar direitos dos trabalhadores e também impor importantes derrotas aos trabalhadores.

Não estamos afirmando que nesse ano a correlação de forças passou a ser favorável para nós trabalhadores, mas que as contradições foram maiores para o governo e para a burguesia. E o principal elemento para isso foi sem dúvida o ressurgimento de lutas em categorias importantes.

A nosso ver, o balanço da situação política nacional desse ano se assenta sob quatro aspectos que expressam bem essas contradições:

a) Esgotamento do ciclo anterior de medidas de combate à crise, tomadas pelo governo e dificuldades econômicas crescentes. A expressão desse esgotamento foi a queda das exportações e da produção industrial, do setor de minérios e mesmo do agronegócio;

b) Adoção de novas medidas de apoio às empresas, o que significa um conjunto de ataques da burguesia e do Estado sobre os trabalhadores da iniciativa privada e do setor público;

c) Aumento das lutas e da polarização política como decorrência de maior tensão social;

d) Aumento da repressão e a criminalização dos movimentos e dos ativistas pelo Estado para fazer frente às lutas e garantir a implementação desse projeto.

Ainda que sob controle do governo, esses elementos demonstram o quanto já está se debatendo para manter o seu projeto original e constantemente tem que promover necessários ajustes. Por isso, desde o começo do ano estão sendo adotadas novas medidas na economia, como incentivos fiscais, facilitadores para o crédito e outras.

Outro elemento distinto do ano de 2011 foi o significativo aumento das lutas; embora todas elas se mantivessem nos limites da luta salarial, também enfrentaram a crescente repressão e o papel nefasto que as direções sindicais desempenham. As greves, na verdade, são uma resposta da classe trabalhadora contra a resistência da patronal em fazer concessões que significam elevação de custos e com isso aumente a dificuldade na competição do mercado.

As medidas adotadas pelo governo Lula, principalmente partir da crise de 2009, tinham permitido certo fôlego para o capital no país, mas, como havíamos alertado, somente tinham condições de jogar para frente as contradições, ou seja, não conseguiriam resolvê-la definitivamente.

Em cada medida que aparentava solucionar os problemas da economia já estava embutido o surgimento, em um futuro próximo, de novos problemas. Adotava-se um conjunto de medidas facilitadoras de crédito, mas isso no futuro significaria endividamento e aumento da inadimplência, o que, consequentemente, levava à diminuição no consumo.

Logo essas medidas mostraram seus limites com o aumento do endividamento (em agosto 59,8% das famílias estavam com dívidas) e o aumento da inadimplência, isto é, 19% das famílias estão inadimplentes (mesmo com todas as medidas de renegociação no Serasa). Essa situação, que é uma restrição objetiva ao crédito voltado ao consumo interno, base do crescimento econômico dos governos petistas, repercute na dificuldade da manutenção do mercado interno nos níveis necessários.

Para responder a esses problemas, o governo Dilma, a partir de abril adotou várias outras medidas no sentido de tentar dar um novo fôlego à economia e buscar um novo período de crescimento. A desoneração da folha de pagamento, o aumento do crédito público com juros abaixo do mercado para as empresas, a ampliação da redução do IPI para automóveis e outros produtos são parte dessa política.

O problema é que elas também não têm força para solucionar a crise definitivamente. Mais uma vez joga-se o problema para um futuro não muito distante, pois a razão da crise econômica continua intacta: a tendência à queda da taxa de lucro. O anúncio, todos os dias, de novas tecnologias é a expressão de que há um alto investimento em bens de capital e isso tem como consequência direta a queda da taxa de lucro do capital de conjunto.

O ESTADO CUMPRE O SEU PAPEL

Com dificuldade em manter as condições adequadas para sua reprodução, o capital dispara os seus mecanismos de “salvação”, naquilo que chamamos de contra tendências. A utilização do Estado passa a ser primordial, pois é o que vai garantir capital para novos investimentos ou mesmo para infraestrutura (o que tem acontecido muito no país). Vai Aperfeiçoar a legislação em favor do capital (as contrarreformas da previdência e trabalhistas são exemplos). E, acima de tudo, vai disparar os instrumentos de repressão jurídico-policial e ideológico.

O caso brasileiro é emblemático, pois são várias mudanças no sistema previdenciário, alto endividamento do Estado para favorecer as empresas e aumento de medidas de repressão (prisões, processos, mudanças na legislação, etc.).

Em relação à economia brasileira podemos dizer, com certeza, que, se não fosse a forte intervenção do Estado o país, estaria novamente em recessão. Foram várias medidas como o aumento da competitividade da indústria, a qualificação da mão de obra técnica, a redução do IPI, a construção e concessão de obras, concessão de aeroportos, desonerações tributárias, enfim, várias medidas que significaram o repasse de bilhões e bilhões para as mãos dos capitalistas.

A base da reconfiguração do Estado em tempos de crise estrutural do capital é a utilização de recursos que deveriam ser considerados públicos, mas são deslocados para as necessidades de um punhado de burgueses, sempre à custa da miséria e pobreza de milhões de pessoas.

Os governos petistas têm cumprido muito bem esse papel com medidas que procuram atender as necessidades do capital de conjunto e não apenas algumas de suas frações. Essa é, certamente, uma das razões do pesado apoio financeiro que as empresas deram aos candidatos governistas.

O MERCADO MUNDIAL

Também contribuíram, para o esgotamento do ciclo, as dificuldades de inserção no mercado mundial com produtos que não fossem do agronegócio. O processo de desindustrialização nacional, a política dos Estados Unidos em despejar bilhões de dólares no mercado (para diminuir o preço do dolar no mercado mundial, aumentar o preço dos produtos de outros países e dificultar que exportem), a crise em vários países da Europa (o que fez com que também a disputa desse mesmo mercado passasse a ser mais acirrada) são alguns dos fatores que, ainda que possamos apresentar várias mediações, estão empurrando o Brasil para a crise.

Essas contradições somente poderão ser compreendidas se levarmos em conta a forma com a qual o Brasil, a partir da divisão mundial do trabalho, busca se inserir nesse mercado, ou seja, centralmente pela exportação de commodities e de matéria prima.

Com a desaceleração de mercados como o chinês e a recessão nos países europeus, a demanda por esses produtos diminui e aumenta a competição entre as empresas e os países. O problema para a burguesia é que as medidas adotadas pelo capital de conjunto também têm tido um fôlego cada vez mais curto, principalmente por conta dos limites impostos pela crise estrutural do capital e que somente podem ser superados se conseguirem impor uma derrota histórica à classe trabalhadora em geral.

Assim, também como parte dos efeitos da mundialização do capital, toda e qualquer mudança na economia desses países refletem imediatamente na economia brasileira. Por isso que dizemos que a política econômica do governo brasileiro tem o objetivo de reduzir custos para facilitar a competição das empresas no mercado mundial. E na economia capitalista a redução de custos é sinônimo de redução de direitos trabalhistas.

O REGIME POLÍTICO ENDURECE…

Há uma tendência generalizada pelo mundo à diminuição dos mecanismos democráticos, com os Estados adotando todo tipo de restrição aos explorados. O discurso é o da necessidade de o Estado ser forte e enxuto para garantir o crescimento, etc. Discurso próprio de regimes antidemocráticos.

Como o projeto econômico é muito duro contra os trabalhadores, faz-se necessário que o regime atue de uma forma muito mais dura em relação ao movimento social de conjunto. As ações policiais nas áreas ocupadas, a ação dos tribunais trabalhistas impondo decisões antigreves, as iniciativas de mudança na legislação de greve colocando critérios impossíveis de serem cumpridos (mesmo que fosse possível o cumprimento, isso não os legitimariam) e as perseguições aos ativistas são parte desse processo de endurecimento.

São as instituições estatais os principais agentes de repressão. Mas, amparados nessa ofensiva, vários outros setores adotam medidas semelhantes. Temos o caso das reitorias, que têm instaurado vários processos administrativos contra os ativistas das universidades. Algumas sequer se dão ao luxo de realizarem o processo com direito à defesa.

Afora as características autoritárias da “democracia brasileira”, é importante evidenciar que o “modus operandi” do governo petista têm essa linha política com o objetivo muito definido de reforçar o controle social sobre a classe trabalhadora, seja com “ilusões democráticas” ou mesmo com a utilização do poder bélico nos morros cariocas “pacificados”.

Mesmo sob a ótica burguesa, há de forma cada vez mais intensa uma política da burguesia de conjunto contra as garantias democráticas. Por isso, a necessidade de que o movimento social e as forças de esquerda tenham uma política cada vez mais audaciosa contra os ataques aos direitos democráticos.

Esses elementos apontam para o fato de que há uma mudança qualitativa na relação do Estado com o movimento social e isso quer dizer que não é só o PT ou o PSDB ou a polícia ou o judiciário, mas, é o conjunto das instituições que miram suas armas contra as já pequenas conquistas democráticas das últimas décadas.

A razão última de todo esse endurecimento é a manutenção da hegemonia capitalista, sempre amparada em profundas desigualdades sociais e econômicas. Somente no atendimento das necessidades da rentabilidade do capital, a repressão (em todas as suas dimensões) torna-se fundamental para a manutenção dos mecanismos de exploração.

UM GOVERNO MAIS À DIREITA E MAIS DURO

Uma questão importante do balanço político do ano de 2012, para os que ainda tinham dúvidas, é de que o PT se consolidou ainda mais como o partido da ordem e do capital. Um gerente exemplar do capital que utiliza todos os instrumentos para que seu amo continue explorando os trabalhadores brasileiros.

Para levar adiante todos esses ataques, o governo do PT (desde Lula até Dilma) construiu um arco amplo de alianças, que inclui os setores mais reacionários do país, como Maluf e deputados do agronegócio. O governo Dilma, mais à direita que o de Lula, se colocou desde o início como mais duro, determinado a aprofundar os ataques aos trabalhadores para tentar reequilibrar aos poucos os problemas que a economia demonstrava.

Esse caráter do governo é expresso em todas as áreas. Na “Segurança Pública”, por exemplo, isto se demonstra com a autorização para que o exército ocupe os morros cariocas e com as ameaças de corte de ponto dos grevistas do funcionalismo público federal. Todos esses fatos já comprovam esse deslocamento para a direita.

A consequência disso tudo é a continuidade e até o aumento desses ataques no próximo período. Derrotar o movimento social é essencial para aplicar as políticas de arrocho que o governo vai lançar para fazer frente à crise que se avizinha.

MANOBRA DA REDUÇÃO DOS JUROS: BANQUEIROS CONTINUAM LUCRANDO

Os discursos inflamados do governo e das centrais sindicais pelegas sobre a redução dos juros escondem o fato de que o governo continua a favorecer os banqueiros e sanguessugas do dinheiro público. Vejamos os dados da Auditoria Cidadã da dívida:

a) A redução dos juros é da taxa SELIC (7,25% ao ano). Vale destacar que 75% da dívida do governo (sob responsabilidade do Tesouro Nacional) não está atrelada a taxa SELIC, ou seja, os credores praticamente não perdem nada com essa redução;

b)O custo médio efetivo (aquilo que o governo paga) da dívida pública federal está 11,3% ao ano, ou seja, bem superior aos 7,25%;

c)Os títulos em taxa fixa que Tesouro Nacional está vendendo estão com taxas bem superiores à SELIC, garantindo a alta lucratividade dos “investidores” em título públicos.

Assim, a constatação a que chegamos é a de que os bancos continuam sendo favorecidos. Essa é uma das razões de não terem reclamado da redução dos juros. Outro aspecto é de como e o quanto absorvem a imensa quantidade de recursos públicos que poderiam ser deslocados para a construção de escolas, hospitais, etc.

O peso da financeirização e dos interesses rentistas no orçamento público é tão grande e nefasto que a obtenção de recursos para o Estado (por meio da venda de títulos públicos) sequer cumpre o defendido pelos próprios “desenvolvimentistas” que é melhorar as condições para investimento estatal em obras públicas.

Assim, o Estado, também nesse item, continua a desempenhar o papel de mediador dos interesses privados na administração pública, mantendo o pagamento da dívida com os maiores juros do planeta.
A luta contra o pagamento da dívida ainda se mantém vigente e ganha importância, cada vez mais, a necessidade de realização de ampla campanha pela utilização de todo esse dinheiro para a construção de escolas, creches, hospitais, etc.

Diante de tudo isto, não nos resta alternativa que conclamar a todos para que a luta se desenvolva cada vez mais em unidade e em solidariedade, afinal, em 2013, e cada vez mais, radicalizar é preciso!

A luta dos trabalhadores é necessária em todas as esferas, seja no local de trabalho ou em seu bairro! Contra a repressão e criminalização dos movimentos! Pelo direito de greve! Por emprego! Por salário! Por moradia! Contra o pagamento da dívida! Por uma vida digna para quem precisa trabalhar para sobreviver!

RICOS MAIS RICOS E POBRES MAIS POBRES

Recentemente o relatório “Estado da Insegurança Alimentar no Mundo 2012” apontou que o Brasil reduziu a subnutrição da população de 14,9%, no período de 1990 a 1992 para 6,9%, nos anos de 2010 a 2012.

Se o governo comemora e dá o crédito “desse avanço” aos programas sociais (Bolsa Família e outros), os fatos apontam para uma grave situação social no país. Primeiro porque há no Brasil cerca de 13 milhões de pessoas passando fome ou sofrendo com desnutrição. Segundo porque esses programas sociais não acabam com a fome, mas apenas a minimiza (basta que se suspenda o auxílio um mês e a pessoa não terá nada com o quê se alimentar. Terceiro porque transforma milhões de pessoas em reféns do governo (um exemplo são as “ameaças” de que este ou aquele candidato vai retirar o Bolsa Família).

Somente com uma política de emprego para todos é possível acabar com a fome. Não somos contra programas que favorecem ou reduzem a fome de milhões de pessoas. No entanto, criticamos porque sequer se propõem a acabar com a fome, mas, como dito acima, apenas minimizá-la.

Por isso a importância, no programa socialista, da luta pela redução da jornada de trabalho, sem redução do salário para gerar e garantir emprego pleno possibilitando que os mais pobres se livrem dessa chantagem.
Atualmente, os custos do programa Bolsa Família representam, segundo dados do próprio governo, 0,46% do PIB. Em relação ao seu alcance, 25% dos brasileiros são beneficiários, indicando a força política desse programa dito social.

Já os banqueiros e especuladores continuam lucrando muito mais. De um orçamento de R$ 2,14 trilhões, R$ 900 bilhões (42% do orçamento federal) serão destinados para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública.

O governo do PT repete a lógica do orçamento dos anos anteriores: menos para os trabalhadores e mais para banqueiros e rentistas parasitas.

AS LUTAS

Esse ano foi, no último período, sem dúvida, um dos que mais greves e mobilizações aconteceram: motoristas, Correios, funcionalismo público federal, professores em vários estados, bancários, trabalhadores da construção civil, metalúrgicos, movimentos popular e estudantil.

Ainda que não tenhamos tido vitórias que mudassem a correlação de forças, a volta de greves no cenário político coloca a possibilidade de que a classe trabalhadora aprofunde a experiência com o petismo e com o cutismo (“modelo” sindical) e possa construir novos instrumentos de luta.

Dizemos isso porque o papel que a CUT e as demais centrais sindicais cumpriram nessas mobilizações foram de grande valia para os capitalistas, pois traíam descaradamente as greves ou, quando eram obrigadas a decretar as greves, faziam de tudo para não se fortalecerem. Bancários é o melhor exemplo de como essas direções atuam. Isso é assim porque essas centrais estão completamente integradas à lógica do capital.

Como se não bastasse o papel cumprido por essas centrais, outro problema que as lutas enfrentaram foi a timidez da própria CSP-Conlutas, que não foi capaz de se apresentar como uma alternativa real para a classe trabalhadora.Nos principais desafios que teve à frente terminou por privilegiar uma intervenção rebaixada, como foi o caso das ameaças de demissão na GM em São José dos Campos – SP, pois sequer levantou a bandeira de redução da jornada de trabalho sem redução do salário e ainda comemorou um acordo complicado que aceita o PDV e o lay off (trabalhadores são afastados da empresa e passam a receber uma parte do salário da empresa e outra do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador – do Ministério do Trabalho).

Isso ocorre exatamente em um momento que se faz necessário uma disputa ideológica contra a burguesia. A principal central de esquerda do país aplica uma política que tem como base um sindicalismo imediatista e economicista, que se move em torno de pautas parciais.

No próximo período a construção de um sindicalismo de base e que se proponha a ir além da luta econômica e parcial será decisivo para o enfrentamento do capital. Essa é a tarefa que se propõe o “bloco classista, anticapitalista e de base” (Movimento Revolucionário, Espaço Socialista e Independentes) que se formou no Congresso da CSP-Conlutas desse ano e foi lançado oficialmente na última reunião da Coordenação Nacional desta Central.
 

 

A CRIMINALIZAÇÃO E A PERSEGUIÇÃO AOS QUE LUTAM NAS UNIVERSIDADES

Thais Menezes

Juventude do Espaço Socialista

Com o crescimento e aprofundamento dos problemas gerados pelo próprio capitalismo, o Estado vê como necessidade primária intensificar a repressão para manter a “ordem”.Para isso, difunde massivamente o espetáculo midiático da violência e com a desculpa de nos proteger, intensifica a repressão jurídico-policial. Acontece que a violência por parte do Estado adquire certa legitimação da maioria da classe trabalhadora por meio do discurso da “Segurança Pública”, em reação a um temor social generalizado fomentado não despretensiosamente pela mídia burguesa.

A neurose do medo é plantada na cabeça do trabalhador por meio da quase animalização da imagem do setor mais pauperizado da classe na mídia. Este apelo imputa aos trabalhadores um potencial violento e cruel exagerado, muito além do que realmente acontece nas ruas em larga escala. Assim, setores da classe são taxados como perigosos e jogados uns contra os outros. Amedrontados, os trabalhadores acabam assinando um cheque em branco para o Estado fazer uso da violência.

REPRESSÃO LEGITIMADA, TRABALHADORES DIVIDIDOS

Infelizmente legitimada pela maioria, a violência policial contra os trabalhadores é cotidiana. Em cinco anos, de 2006 a 2010, no Estado de São Paulo, 2.262 pessoas foram mortas após supostos confrontos com a PM, que matou, portanto, quase nove vezes mais do que a polícia norte-americana (Folha de São Paulo). Na Bahia, a situação é pior, mais de uma morte por dia: “Na média, este é o resultado dos Autos de Resistência (AR) na Bahia, de janeiro a agosto deste ano. Em 244 dias, foram registrados 267 óbitos de pessoas envolvidas em alegados confrontos com policiais” (Correio 24 horas). A própria ONU tem discutido a forma como a polícia militar atua no Brasil e já recomendou a extinção desta enquanto órgão separado (BBC Brasil).

Aos que não são assassinados, muitas vezes resta a privação da liberdade. O Brasil possui a 4ª maior população carcerária do mundo, tendo cerca de 500 mil pessoas hoje vivendo em um sistema prisional superlotado e em péssimas condições. "Pela lei brasileira, cada preso tem que ter no mínimo seis metros quadrados de espaço (na unidade prisional). Encontramos situações em que cada um tinha só 70 cm quadrados". (BBC Brasil)

Mas ao mesmo tempo em que o Estado marginaliza e criminaliza individualmente, assassina, encarcera e demoniza a imagem do setor mais pauperizado dos trabalhadores assim dificultando sua unidade para lutar, reprime e criminaliza também as tentativas coletivas de contestação a esta ordem, expressas nos movimentos social, sindical e estudantil.

ORGANIZAÇÃO TEM SIDO COMBATIDA COM MUITA REPRESSÃO

Em 2007-2008, o movimento estudantil manifestou um ascenso memorável. As pautas passavam da reação à tentativa do Governo Lula de implantar a Reforma Universitária e as consequências já sentidas de um processo anterior de privatização às reivindicações mais específicas de cada universidade. O país foi presenteado pela juventude universitária com muita mobilização estudantil de fora a fora, uma série de greves e ocupações de reitorias (UFBA, USP, UNICAMP, UEL, UFJF, UFPA, UFRJ, UFMA, UFRGS, UFAL, PUC, Unirio, UFF, FSA, UFAM, UNB, UFMG, UERJ, UNCISAL, UFMS, UFS, UFSCAR, UFC, FSA, etc.), inclusive culminando na queda de alguns reitores, como Timothy Mulholland, na UNB e Odair Bermelho na Fundação Santo André.

Em resposta a esse processo de lutas houve muita perseguição e repressão. Diversas universidades foram invadidas pela polícia, desocupações violentas foram feitas, policiais sem identificação espancaram e ameaçaram estudantes. A mídia nada dizia sobre a repressão, a situação precária das universidades e as reivindicações, somente acusava os estudantes de dano ao patrimônio público, exportando uma versão encomendada dos fatos e compactuando com os cenários de destruição de reitorias montados pela própria polícia.

Por lutar, em cada universidade dezenas de estudantes combativos foram punidos, presos nas desocupações, fichados, multados e tiveram que responder a inquéritos e assinar acordos com a justiça. Muitos acabaram saindo com processos criminais nas costas.

A ofensiva de criminalização aos lutadores foi dura e um movimento que estava nos primeiros passos de sua tentativa de reorganização após clara cooptação governista da UNE confirmada no primeiro mandato de Lula, sentiu fortemente o baque. O refluxo foi inevitável. A presença de setores governistas com sua atuação limitada à oposição eleitoral e à defesa das políticas do Governo, como a UNE, e a aparatização do movimento em prol da sua própria construção por partidos e organizações degenerados da própria esquerda, como o PSTU e o PSOL, não contribuíram para que a mobilização estudantil conseguisse superar esse momento difícil.

O ano de 2011 dá as caras com ascensos populares por todo o mundo. É dado o primeiro pontapé da posteriormente intitulada Primavera Árabe, a rebelião no Egito. A juventude se levanta por todo canto, Espanha, Portugal, Grécia, Inglaterra e Chile, com uma massiva luta pelo resgate da Educação pública. Alguns processos de luta estudantil se abrem também em algumas universidades brasileiras, porém agora em unidade e de certa forma na dependência das lutas dos trabalhadores do funcionalismo público e dos docentes das universidades.

Já na USP, o ME fecha o ano com maior radicalização e desvinculação. O saldo foram 73 estudantes presos e processados criminalmente. As mobilizações eram contra o avanço do projeto privatista da Universidade, culminando no fechamento de convênio entre a reitoria e a Polícia Militar, para vigiar e controlar os lutadores, limpando terreno. No início de 2012 a reitoria da USP avança nos ataques e investe nos processos administrativos, para os quais têm dado foco, visando a expulsão dos estudantes. A parca moradia estudantil também foi invadida pela polícia e pessoas foram agredidas e processadas.

O ano de 2012 não foi tranquilo para a burguesia nem para governo, contou com ascensos dos trabalhadores por todo o país. Nas universidades explodiu a grande greve nacional dos servidores públicos federais e docentes universitários. Em muitas universidades, os estudantes entraram em luta em solidariedade ao movimento dos trabalhadores, mas em algumas também encamparam sua luta estudantil autônoma paralelamente. A UNIFESP Guarulhos é um desses casos, a luta continuou, com um saldo de 173 estudantes entre presos e processados que, inclusive, ainda hoje lutam contra o avanço dos processos.

Na UFES, em Vitória, a luta por moradia estudantil também teve autonomia e foi reprimida com violência. Em outro episódio no mesmo local, 3 estudantes foram presos arbitrariamente durante exibição de filme dentro do campus na calada da noite. Na Fundação Santo André, hoje vários estudantes em luta passam por processos de sindicância que visam a expulsão. Uma simples manifestação pacífica em evento comemorativo na Câmara dos Vereadores de Santo André motivou uma dessas sindicâncias inclusive.

No marco da crise estrutural do capital, o Estado tem sofrido pressões para aplicar com maior rapidez os projetos da burguesia, não havendo mais tanta margem para negociações ou mediações. Hoje nas universidades é possível observar uma ofensiva mais focada, que em 2007-2008, em eliminar com rapidez os lutadores dos espaços onde projetos precisam ser aplicados, isso se expressa nos processos administrativos.

O movimento estudantil se carateriza por ser um espaço de formação da consciência política, onde experiências de resistência muito importantes são feitas e onde lutadores valiosos são formados para, muitas vezes, lutar por toda uma vida por uma sociedade diferente desta. Da mesma forma que sabemos disso, a burguesia também sabe e a tentativa de desmobilizar os lutadores já no movimento estudantil faz todo o sentido.

RECONSTRUIR PELA BASE E DEFENDER OS LUTADORES

A reconstrução do movimento estudantil passa pela rejeição aos métodos aparatistas. Defendemos que os partidos e organizações políticas tenham como prioridade a construção dos movimentos e não sua própria construção, que seria uma consequência natural de sua inserção real no movimento. As questões nacionais são de fundamental importância, mas têm dose e momento certo para serem colocadas com qualidade. É preciso tomar as demandas locais dos estudantes como prioridades e ter inserção real e útil entre eles. Colocar bandeiras nacionais a todo custo acima das vontades dos estudantes caminha na contramão disso, torna a esquerda militante alienígena ao conjunto dos estudantes e a isola, prejudicando a construção do movimento e, inclusive, dificultando sua defesa em momentos de repressão.

As dificuldades da luta por uma sociedade sem opressão e exploração são inumeráveis. Assim, a necessidade da defesa dos lutadores e da luta contra a repressão se colocam como pressuposto à sobrevivência da já árdua tarefa da esquerda revolucionária.

CONTRA A REPRESSÃO E CONTRA O CAPITALISMO

Porém, a campanha contra a repressão nas universidades e em todo lugar não deve ser meramente democrática. Repressão se combate com a livre organização dos trabalhadores e estudantes em luta para além das conquistas democráticas.

A organização dos trabalhadores contra a exploração capitalista, a lógica do lucro e todas as suas gélidas consequências, que se expressam também nas universidades, muitas vezes passam por fora da legalidade e expressam formas de organização muito mais complexas e democráticas que as costumeiras na sociedade, porém, fora das institucionalidades.

A estrutura antidemocrática das universidades, a ínfima representação estudantil nos conselhos deliberativos e consultivos e a totalidade da democracia que a burguesia pode nos oferecer não são capazes de abarcar as profundas mudanças que queremos. Precisamos romper com estas estruturas e para isso temos que estar preparados para a reação da burguesia. A defesa dos lutadores deve ser tomada como tarefa fundamental de todo revolucionário.

 

 O QUE CELEBRAR NO 20 DE NOVEMBRO, DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA?

Jônatas Barbosa, José Jânio e Rogério Azevedo

O dia 20 de novembro é a data oficializada pelo Estado brasileiro como o “Dia da Consciência Negra”. Nesse dia, nos acostumamos a ver shows com música de negro e apresentações com artistas negros dançando e representando uma série de expressões artísticas afro em todos os cantos do Brasil. Boa parte dessas comemorações é organizada pelo Estado, através dos municípios, estados e união. Várias ONGs, partidos políticos e grupos se incorporam a esses festejos. No entanto, será mesmo que essa data tem que ser comemorada da forma e com o conteúdo que tem tomado ao longo desses últimos anos?

Foi em 20 de novembro de 1695 que o líder mais conhecido do Quilombo dos Palmares (atual território pertencente ao estado de Alagoas) Zumbi, foi assassinado quando lutava pela libertação dos negros contra os senhores de escravos durante o período do Brasil colônia. Vindos dos países africanos, a mão de obra escrava serviu durante muito tempo para enriquecer a classe dominante da época.

Porém, com o desenvolvimento do modo de produção e tendo como momento predominante a mão de obra assalariada, os senhores de escravos “reconheceram” que era bem mais caro manter um escravo do que pagar salários. Aliado a isso, a luta e as revoltas do povo negro, que fugiam para os quilombos por todo o país, foram fatores determinantes para legalização do fim da escravidão. Falamos em legalidade, porque a escravidão era permitida por lei, sendo o Brasil o último país do mundo (1888) a abolir as leis que garantiam às classes dominantes escravizar os negros. Por mais de três séculos, os negros no Brasil foram tratados como coisas; meros objetos de compra e venda, e por diversas vezes, de acordo com sua serventia, descartados pelos seus donos.

A substituição da mão de obra escrava pela assalariada, não significou dizer que o capitalismo não absolvesse o racismo em benefício do seu funcionamento. Os escravos – agora “ex-escravos” e, portanto, “livres” – foram incorporados ao sistema capitalista ocupando os piores empregos em troca dos piores salários, isso quando conseguiam ser empregados. Se diminuir os custos da produção faz os lucros serem maiores, pouco importa, para os patrões, se essa diminuição de custos será a parte que vai faltar no salário da parcela dos trabalhadores que são negros. E essa baixa nos salários será aceita, de forma velada ou não, pela concorrência posta pelo modo de produção capitalista e também, agora, sendo atendida pela própria sociedade marcada historicamente pelo racismo. Ou seja, o racismo foi e é usado pelo capitalismo para obtenção de lucro em cima dos baixos salários dos trabalhadores negros.

Se antes os negros estavam nas senzalas, cozinhas e lavouras, hoje continuam ocupando as cozinhas dos brancos nos prédios das orlas e condomínios das grandes cidades; cortando cana nos canaviais de usinas sucroalcooleiras. Como benesses do capitalismo não estão mais nas senzalas e sim nas favelas. Cumprem, em sua maioria, as mesmas funções que cumpriam no passado, mas, agora, recebem os mais baixos salários do sistema capitalista e moram nos piores lugares das grandes cidades principalmente. Assim, confirmam-se os resultados da pesquisa da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), na qual se verificou que 70,2% do total de mortos pela polícia do Rio são pardas e/ou negras.

Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgados em 2003, o salário médio de um trabalhador branco é de R$ 931,00 enquanto o salário médio do negro é de R$ 428,30. Quando comparamos a questão das mulheres, temos um quadro ainda pior: a mulher branca ganha em média R$ 554,60 e a mulher negra R$ 279,70. Observando os números, podemos perceber que o homem branco recebe o triplo do salário da mulher negra. Se considerarmos que essas diferenças se encaixam apenas nos poucos negros que conseguiram, após a abolição da escravatura, se encaixar no mercado, podemos verificar como vivem aqueles que nem a essa “sorte” foram lançados.

Essa incorporação do racismo ao sistema capitalista sempre foi um problema para os partidos e organizações de esquerda. Boa parte não consegue enxergar que o racismo está umbilicalmente ligado à questão do interesse entre as classes sociais que compõem o capitalismo. Se de um lado temos a burguesia que, cada vez mais, quer tirar seu lucro em cima dos trabalhadores, esses últimos por sua vez, querem tirar maiores salários dos seus patrões para terem condições de vida melhores. Porém, é dentro da classe trabalhadora que encontramos os negros. Esses que antes do capitalismo eram escravos agora são trabalhadores “livres” que teoricamente são iguais ao resto da classe trabalhadora branca. Falamos teoricamente, porque na prática, como afirmamos acima, os negros são a parcela da classe trabalhadora mais explorada do que os já explorados trabalhadores de uma forma geral.

Por outro lado, assistimos a uma metamorfose do próprio capitalismo, em querer passar para toda a sociedade a ideia de que tomou para si a resolução definitiva do racismo. Campanhas publicitárias, sistemas de cotas, ocupação de alguns cargos de alto escalão do Estado e de grandes empresas são alguns dos exemplos dessa movimentação. Logicamente, essa atenção do capitalismo de passar a ideia de que o racismo acabou, aos poucos, através de políticas de inclusão social para os negros e a ocupação de cargos importantes por parte dos negros, somente tenta esconder a origem do racismo. Mais ainda, tentam passar a ideia de que no passado recente da história do país o que aconteceu foi a junção perfeita entre brancos, pretos e índios e que o dia 20 de novembro serve para prestarmos uma homenagem a uma das partes desse casamento “perfeito” que originou o povo brasileiro.

Dessa forma, o discurso, inclusive, dominante na maioria das universidades do Brasil, esconde que a superação do próprio racismo é impossível dentro dos marcos da sociedade capitalista.

Temos ainda, alguns poucos partidos de esquerda que tomam para si a questão racial como a questão de classe, no entanto, e sob o argumento de que precisam dialogar com a realidade, acabam tratando a questão em suas ações políticas da mesma forma fragmentada que é feita pela classe dominante. Dessa forma, é comum vermos nos espaços de auto-organização da esquerda, a separação dos próprios trabalhadores para discutir as contradições da sociedade capitalista na hora de tratar da questão racial, nos quais negros tratam da questão de negro, mulheres tratam das questões de mulheres e assim por diante.

Não temos conseguido superar essa segregação interna da própria classe trabalhadora. Como resultado disso, acabamos de forma consciente ou inconsciente, agindo ou se omitindo contribuindo ou corroborando com a forma e o conteúdo das manifestações que assistimos todos os anos no dia 20 de novembro.

Quando Zumbi foi assassinado por Domingos Jorge Velho no final do século XVII, o Brasil vivia um momento de intenso embate entre senhores e escravos. A decisão de tomada por milhares de escravos naquela época de fugirem das senzalas e das fazendas de seus donos e irem morar em comunidades no alto das montanhas ao longo do território nacional não era uma luta para que hoje tivéssemos a liberdade de montarmos uma banda de pagode, uma roda de capoeira ou uma exposição de comidas afro. A luta das comunidades quilombolas era para que todos fossem iguais, brancos ou pretos.

Sem dúvida, se muitos deles estivessem vivos hoje não hesitaram em afirmar que as condições de vida dos negros são bem melhores do que naquela época. No entanto, essa expressão “é bem melhor” torna-se bastante relativo quando olhamos para uma favela de qualquer grande cidade do Brasil e vemos que a maioria esmagadora da população que ali habita é de negros; que quando queremos xingar alguém de “safado” e esse alguém é preto chamamos de “negro safado”; que quem ainda lava os pratos, faz a comida, engraxa os sapatos, estaciona os carros para os brancos continuam sendo, em sua maioria, os negros, etc.

Por isso, mais do que ser um dia para se manifestar toda a riqueza cultural dos negros, a data 20 de novembro tem que servir para manifestarmos nossos anseios por um mundo no qual não exista nenhuma forma de exploração do homem pelo homem, afinal esse era o anseio de toda uma geração representada nessa data pela figura de Zumbi dos Palmares.

 

2012: PROFESSORES ENFRENTAM PRECARIZAÇÃO E MERITOCRACIA

Alexandre Ferraz/Núcleo professores

Qual o sentido deste ano para a Educação Pública e para as lutas dos professores? Qual a sua marca distintiva? O que deixa como tendências para 2013?

Da parte dos governos, não houve mudança nos projetos educacionais no sentido de reverter as tendências vigentes. Ao contrário, temos a generalização e aprofundamento dos ataques à Educação Pública pelo sistema do capital.

INVESTIMENTO MÍNIMO X COBRANÇA MÁXIMA

Em primeiro lugar, vivenciamos o corte ou não-investimento por parte dos estados nacionais e sua negativa em oferecer Educação Pública de acordo com os interesses dos trabalhadores e seus filhos. O dinheiro da Educação é enviado para garantir a lucratividade do empresariado no contexto de crise estrutural do capital.
Ao mesmo tempo, os professores são cobrados por mais tarefas e obrigações, que alteram a natureza mesma do nosso papel e do próprio conceito de Educação.

A perda da liberdade de cátedra (liberdade de ensino-aprendizagem) com a imposição do currículo (conteúdos a serem ensinados) em base aos interesses dos setores empresariais e a uniformização do conhecimento através de caderninhos do aluno e avaliações externas, são a forma encontrada de tratar como iguais os desiguais (as escolas de centro e de periferia, os diferentes turnos, as diferentes turmas e os diferentes alunos de uma mesma turma).

Temos a aplicação da lógica empresarial, onde o aluno é considerado uma peça, cuja “qualidade” deve ser cobrada em termos de sua adequação às finalidades limitadas de formação de mão de obra precária para o sistema.

Todos os demais fatores como a formação social e cultural dos alunos, as condições de trabalho (número de alunos por turma, aulas disponíveis para preparação e correção das atividades, rebaixamento salarial, falta de estrutura nas escolas) são intencionalmente excluídos do quadro de análise.

Dentro desse projeto, tem lugar central a individualização da cobrança e punição dos professores(as), inclusive com a possibilidade futura de demissão até mesmo dos efetivos(as) por “insuficiência de desempenho”, como vem ocorrendo na Espanha, Portugal e Chicago.

As políticas de mérito consistem em conceder reajustes salariais parciais e outras “vantagens” apenas para um setor minoritário da categoria, que consegue atingir os critérios, excludentes a priori.

Agora vêm juntar-se a isso os chamados Planos de Carreira, que não passam de avaliações individuais de desempenho ao decompor e atribuir pontuação a cada uma das atividades realizadas pelos professores, resultando em evoluções mínimas e restritas a uma parte da categoria.

O alto grau de subjetividade é visível, pois essas avaliações serão feitas pelas direções das escolas.

O caráter tendencioso desse conjunto de políticas tem tido impactos em nossa categoria, seja em sua realidade objetiva (diferenciações salariais e de classificação), como em sua consciência (aumento do individualismo, dificultando as ações coletivas maiores).

Contribuiu para isso o fato de que as principais entidades da Educação, dirigidas pela corrente Articulação Sindical (PT), têm sido coniventes e até mesmo têm apoiado a meritocracia, de forma velada ou explícita.

Como parte disso, temos as provas para os professores temporários, que visam jogar os setores mais jovens contra os mais antigos da categoria e, ao mesmo tempo, a precarização dos vínculos contratuais das quais o professor temporário (categoria “O” em São Paulo) é um exemplo do que o sistema tem imposto nos vários estados e países.

NAS ESCOLAS… A PRECARIZAÇÃO E A REPRESSÃO

O quadro geral de precarização aprofunda-se com a falta de estrutura mínima nas escolas, muitas das quais estão literalmente caindo. Quando ocorrem reformas, são realizadas visando apenas interesses eleitorais, durante o ano letivo, se estendendo por diversos meses e expondo professores e alunos a condições absolutamente insalubres.

Na relação da escola com os alunos, a ênfase recai no doutrinamento, na coerção e na repressão, como forma de se evitar questionamentos à ordem de dominação. As grades, as câmeras nos corredores, nas salas dos professores e até em salas de aula, e a presença cada vez mais constante da polícia no interior das escolas mostram essa tendência.

A fim de impor essa combinação contraditória entre investimento mínimo e cobrança máxima, num ambiente cada vez mais caótico e potencialmente explosivo, o sistema apela ao autoritarismo e assédio moral de Diretorias de Ensino, supervisoras e equipes gestoras, levando à multiplicação e acirramento dos conflitos nas escolas entre direção e professores, professores e alunos, professores e pais, e professores entre si.

Cada vez mais, as escolas acumulam tensões que inevitavelmente tendem a explodir em algum momento.

Porém, à medida que todo esse projeto vai sendo implementado, também vai tomando corpo e revelando sua essência. Fica cada vez mais claro que não se trata de uma política para propiciar melhoria na Educação, apenas mais cobrança, competição, enquadramento e punição, de forma a legitimar o não investimento em Educação Pública de qualidade para todos, pois isso não interessa ao sistema capitalista e aos governos.

2012: LUTAS NOS PAÍSES CENTRAIS QUESTIONAM MATRIZ DOS PROJETOS

Em 2012, ganharam corpo as lutas do setor de Educação nos países centrais, com destaque para Grécia, Itália, Espanha, contra os cortes orçamentários a serviço de salvar o capital.

Nos EUA, vimos surgir uma das greves mais importantes e que devem prenunciar muitas outras naquele e em outros países para o próximo ano.

A Greve dos professores de Chicago não se enfrentou apenas com os cortes orçamentários, mas contra todo um projeto educacional (Reforma de Nova Yorque) que tem servido de matriz para muitos outros sistemas educacionais, particularmente da América Latina e do Brasil.

Ao mesmo tempo, ressurge o movimento pela derrubada da estrutura privatista de Educação criada no Chile por Pinochet e mantida pelos governos que o seguiram. E agora, em Buenos Aires, surge uma greve das escolas secundárias contra a Reforma Curricular, que pretende eliminar matérias técnicas no segundo grau.

O QUE ESSAS LUTAS TÊM EM COMUM?

Em primeiro lugar, começam a enfrentar-se não apenas contra as consequências, mas contra um projeto educacional maior, em que os professores são expostos à responsabilização, cobrança e monitoramento de seu trabalho e a formas precárias de contratação, ditadas pelos interesses do capital contra os trabalhadores e os serviços públicos.

Em segundo lugar, são movimentos que tendem a ocorrer em unidade com pais, alunos, apoio de outras categorias de trabalhadores e até setores empobrecidos da classe média. Em alguns lugares, são mais do que simples greves, tomam a forma de micro-rebeliões educacionais e sociais, como no México e em Buenos Aires.

Avançam para a radicalização dos métodos de luta, pois combina-se a entrada em cena uma nova geração de professores em unidade com uma juventude estudantil sem perspectivas de melhoria futura, como também pelo endurecimento dos governos, que reprimem e acirram os enfrentamentos. Isso tem resultado em um ativismo muito forte nos momentos de luta.

Essa situação ainda enfrenta desigualdades no interior das categorias, onde temos ao mesmo tempo setores acomodados, mas também outros com grande radicalização, dando origem a vanguardas mais amplas, cujas ações, se não são diretamente seguidas, possuem legitimação e respaldo em setores de massa, tornando possível um avanço que antes não existia. É o caso dos bloqueios de estradas e avenidas no Chile e no México, do enfrentamento à polícia no México e em Buenos Aires, entre outros.

POR AQUI TAMBÉM HÁ NOVOS DESAFIOS PARA AS LUTAS

Entendemos, portanto, que a marca fundamental deste ano foi a ampliação, nos países centrais, do questionamento dos projetos adaptados aos interesses privados das empresas e de manutenção da ordem de governos comprometidos com a transferência cada vez maior das áreas sociais para o empresariado.

Assim, podemos esperar que, daqui para a frente, as tendências não serão apenas de novos ataques, que certamente virão – até pela necessidade do sistema de prosseguir e aprofundar essas tendências acima. Teremos cada vez mais as reações de protesto, lutas cada vez mais duras no interior das escolas e redes de ensino, tendendo a se transformar em micro-rebeliões contra o modelo educacional burguês.

Em São Paulo, também tudo leva a crer que novas tensões se acumulam e se desenvolvem, dentro e fora das escolas. Um clima de insatisfação se faz sentir. Começam a se dar condições para uma campanha de denúncia e luta mais direta contra o projeto em curso como um todo, mesmo que ainda com a participação de um setor minoritário, mas cujo envolvimento pode levar a uma expansão, inclusive para além da nossa categoria.

É preciso identificar essas possibilidades de ações e campanhas para não ter posições recuadas perante os acontecimentos, como tem ocorrido diversas vezes ao longo deste ano, mesmo com setores da Oposição, particularmente o PSTU e PSOL em situações em que deixaram de se colocar, na prática, como um pólo alternativo à direção majoritária da APEOESP (Articulação Sindical).

Isso ocorre pela dificuldade dessas correntes em empalmarem com esse processo e isso não é à toa. Sua acomodação a anos de luta de “normalidade” da democracia burguesa, em um contexto de categorias que eram mais homogêneas, assim como sua adaptação (ainda que parcial) aos limites e aos privilégios nas estruturas sindicais burocratizadas, lhes tiram os reflexos, a intuição, a ousadia e a criatividade, ficando totalmente aquém das necessidades colocadas pela situação atual e pelo tipo de movimento necessário.

Como medidas práticas, é preciso buscar vínculos com nossos colegas, e também com alunos e pais, chamando-os para enfrentar esse processo de ataques dentro das escolas e nas ruas, em frente às Diretorias de Ensino, etc.

É preciso também uma Campanha Permanente contra esse projeto geral capitalista de precarização e estratificação da Educação Pública, com palestras, cartas-abertas, carros de som nos bairros, atividades político-culturais de protesto nas praças públicas e na periferia, utilizando as redes sociais, etc.

 

 

AVENIDA BRASIL – CONSTRUÇÃO DE PERSONAGENS QUE REFORÇAM A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

Iraci Lacerda e Neuza Peres

A violência, sob o capitalismo, parece tão entranhada em nosso cotidiano que pensar e agir em função dela deixou de ser um ato circunstancial, para se tornar uma forma de ver e de viver o mundo incorporada ativamente pela mídia machista, sensacionalista e a serviço da ideologia dominante. Especialmente, o mundo das grandes metrópoles – aglomerados humanos que se tornam, a cada dia, o celeiro da cultura da violência.

Contudo, quando se fala em violência, a primeira imagem que nos vem à mente é aquela que exprime agressão física, que nos atinge naquilo que possuímos ou amamos, ou seja, corpo, amigos, família e bens. Costuma ficar de lado aquela violência invisível que procura atingir profundamente o aspecto emocional e psicológico e que esconde a miséria do modo de vida burguês e alienante.

Toda essa violência, qualquer que seja sua intensidade, está presente nos bairros sofisticados e nas periferias, nos bairros da classe média e nas favelas, nos campos de futebol da várzea ou nos grandes estádios. Mas, cumpre em cada canto as suas diferenciações.

É certo que, entre a burguesia, a violência está diretamente ligada à questão da disputa pelo poder, da ganância, da vingança, do enriquecimento ilícito e independente de religiosidade, moral e bons costumes.

No entanto, é essa violência que, disseminada nos lares brasileiros, através da mídia, se soma à violência causada pela profunda dificuldade de sobrevivência da classe trabalhadora. Milhões de trabalhadoras e trabalhadores passam a viver cotidianamente a vida de cada personagem criado nas novelas televisivas e deixam de lado o seu próprio enredo, depois de longas e estressantes jornadas de trabalho.

Assim, a ideologia burguesa busca construir individualismos ao passar por cima de questões religiosas, desprezar leis e apostar que tais resultados estarão sendo colhidos entre aqueles que assistem passivamente as gritarias, mortes, agressões e mentiras presentes nas novelas, ou seja, é um tipo de violência de uma classe sobre parte considerável dos trabalhadores, que assume para si um modo de vida estranhado.

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER EM HORÁRIO NOBRE

Especialmente as novelas da Rede Globo há muito carregam, para um bom nível literário, enredos ultrapassados e semelhantes, do mal contra o bem. Personagens que tiveram situação financeira difícil na infância são construídos para se tornarem vilões sanguinários, mulheres revezam em protagonismos cruéis, dóceis ou com forte apelo sexual construídos para despertar raiva e passíveis de vingança entre a opinião pública. No caso específico de protagonismo feminino, costuma-se ter cenas explícitas de agre

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Nota da Juventude do Espaço Socialista – Pelo fim da repressão nas universidades

Como a repressão avança nas universidades brasileiras é fundamental sabermos o que está acontecendo com os estudantes em vários países (como no México e no Chile) e em diversos cantos do Brasil.

Na Unifesp, em Guarulhos, são mais de 100 estudantes processados, não sabemos ao certo quantos foram presos. Na USP, há menos de um ano, 73 estudantes foram presos, sofrem ainda processos criminais e muitos outros sofrem processos administrativos. Na Fundação Santo André a situação é parecida, cerca de 30 alunos sofreram ou ainda sofrem processos. Sindicâncias são abertas de forma arbitrária, os alunos são constantemente intimidados e a mobilização estudantil é vista como atividade criminal. Na UFES, federal do Espírito Santo, a repressão aos estudantes está na ordem do dia. A polícia tem livre acesso ao campus da Universidade e recentemente 3 estudantes foram detidos – todos faziam parte do movimento “Minha UFES, Minha Casa”, que reivindica a moradia estudantil. A permanência do trabalhador, principalmente o que luta, na universidade está cada vez mais questionada por meio de processos administrativos que visam à expulsão e processos criminais que tentam amedrontá-lo e afastá-lo da luta por outra universidade. Esses fatos não são produtos de uma coincidência, nem são fatos isolados. Estamos diante da criminalização da luta estudantil que é parte de um processo mais amplo de criminalização dos movimentos sociais.

Nós, estudantes, precisamos nos unir para enfrentarmos essa situação em cada faculdade, universidade, CAs e DCEs! Precisamos nos juntar nas lutas e aos movimentos sociais!

Reafirmamos nosso total apoio à luta contra a repressão e em defesa de todos os lutadores. Fazemos parte dos que lutam! Estamos juntos com os processados, não somos criminosos!

Defendemos um ensino público, gratuito e de qualidade. Pelo fim das perseguições, prisões e processos! Não aceitamos a criminalização do movimento estudantil e de nenhum outro movimento de luta!! Por uma educação a serviço dos trabalhadores!

Juventude do Espaço Socialista – Outubro de 2012

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Jornal 53: Outubro de 2012

 

Número 53- Outubro de 2012

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GOVERNO DILMA/PT ADOTA MAIS MEDIDAS DE APOIO AOS CAPITALISTAS

A crise estrutural do capital é um elemento importante no sentido de impedir que o capital privado consiga, por si só, fazer grandes investimentos com força para retomada duradoura da economia. Essa é a razão de o Estado (o brasileiro e os demais) ter deslocado tanto dinheiro para ajudar os capitalistas a se salvarem. Por isso que Marx dizia que o Estado é o comitê executivo da burguesia.

Os governos Dilma e Lula, buscando governar para o conjunto do capital, adotaram um conjunto de medidas bastante eficiente para o capital: O implemento de obras de infraestrutura (estradas, portos, etc.) financiadas com dinheiro público e depois privatizadas, a isenção tributária (redução de IPI para várias linhas de produção), o aumento de fundos de proteção aos bancos, etc. Essas medidas ajudam o capital, mas possuem um custo social muito elevado.

Todas essas medidas fizeram parte do que chamamos de primeiro ciclo de proteção aos capitalistas, mas que já perderam a sua eficiência. Todos os dados (o país pode “crescer” no máximo 2%) indicam que essas medidas não tiveram força para mudar o curso da economia no Brasil.

Em edições anteriores, discutimos que o governo já está adotando, como parte de um novo ciclo, um conjunto de medidas para “alavancar a economia”: a criação de novas linhas de crédito (com juros abaixo do mercado) para as empresas, a redução dos juros para aumentar a oferta do crédito, o impulso a novas obras financiadas com dinheiro público e, agora, entrando numa fase que chamam de “tornar a indústria brasileira competitiva”. Isso nada mais é do que atacar os direitos dos trabalhadores.

Na linguagem da burguesia, competitividade significa reduzir o custo da força de trabalho, o que para nós é sinônimo de retirada de direitos e aumento da exploração sobre os trabalhadores. É esse o sentido das medidas adotadas pelo governo Dilma como a desoneração da folha de pagamento e da redução do Imposto de Renda para empresas que comprarem máquinas como bens de capital.

DESONERAÇÃO

A desoneração da folha é uma medida que altera o cálculo (e o valor) das contribuições previdenciárias. Antes a empresa recolhia 20% sobre o salário de cada trabalhador e agora passará a recolher uma porcentagem fixa sobre o faturamento bruto da empresa. São, por volta de, 40 setores da economia que contarão com esse “incentivo”.

O motivo da intensa comemoração das várias entidades patronais é que por essa forma haverá substancial redução do valor pago pelas empresas. Adivinha quem paga a diferença? Isso mesmo, o tesouro nacional, ou seja, dinheiro público. Só no ano de 2013 serão 13 bilhões de reais e nos próximos 5 anos, serão destinados aos capitalistas mais de 60 bilhões de reais.

A desoneração relativa à contribuição previdenciária tem implicações importantes, como o custeio das aposentadorias e dos benefícios previdenciários. Considerando (só como hipótese, pois há vários estudos desmentindo essa tese) o que o governo e vários economistas burgueses alegam que a previdência é deficitária (desculpa para todas as contrarreformas feitas até hoje) essa medida tem como efeito imediato o aumento do rombo, ou seja, o governo para repassar mais dinheiro e recompor o lucro da burguesia, penaliza os trabalhadores que dependem da previdência social por ocasião da aposentadoria ou de afastamento por acidente de trabalho.

Mais uma vez cai a máscara do governo. Para aumentar o rendimento dos aposentados e acabar com o fator previdenciário não tem dinheiro, mas para compensar a lucratividade da patronal tem. É mais uma inovação para transferir dinheiro público para o capital privado. Não por acaso a nota da FIESP (poderosa federação da burguesia industrial paulista) se refere a essas medidas como “positivo e vai na correta direção da redução do custo-Brasil”.

MAIS UMA CONTRARREFORMA DA PREVIDÊNCIA

O custo dessas benesses para os capitalistas, lógico, vão querer repassar para a classe trabalhadora. A se guiar por qualquer coerência, o próximo passo do governo vai ser tentar mais uma contrarreforma da previdência.

Atualmente está em vigência o chamado “fator previdenciário” adotado no governo FHC e mantido nos governos Lula e Dilma. Por essa regra “quanto maior é a expectativa de vida, menor é o fator previdenciário e, com isso, menor será o valor da aposentadoria” (Dieese). É uma forma de pressão sobre os que já reuniram as condições para a aposentadoria, pois quando aplica a regra, a primeira consequência é uma redução drástica dos rendimentos, o que obriga mais tempo no mercado de trabalho. Com isso, além de não ter o rendimento da aposentadoria, ainda continua contribuindo para a previdência social. O efeito prático é a instituição de idade mínima para se aposentar.

Agora o que está em discussão no Congresso Nacional é o fator 85/95, que introduz uma nova regra para a aposentadoria integral. Para se chegar a aposentadoria integral a soma da idade com o tempo de serviço deve alcançar um resultado de 85 para as mulheres e 95 para homens. Mais uma medida, que tem caráter de contrarreforma previdenciária e visa retirar direitos dos trabalhadores.

Por ela, na prática, haverá aumento do tempo de contribuição. Para se ter ideia, um jovem que começar a trabalhar com 17 anos só poderá se aposentar quando completar 56 anos de idade e 39 anos de contribuição (quando totalizará 95). Se quiser se aposentar antes arcará com redução similar a do fator previdenciário.

O governo está querendo, para dividir a resistência, utilizar como moeda de troca a vigência dessas medidas somente para os que entrarem no sistema a partir de agora. Isso é para iludir a classe trabalhadora, pois nada impede que daqui a 5 ou 6 anos faça valer para quem já está no sistema previdenciário. Como tarefa política é necessário que a juventude (que poderá ser a mais atingida por essa medida) se junte a classe trabalhadora para travarmos uma luta conjunta na defesa de uma previdência pública voltada para as necessidades dos trabalhadores e não dos capitalistas.

MENOS IMPOSTO DE RENDA PARA OS CAPITALLISTAS

Atualmente as empresas, por ocasião do balanço, lançavam como depreciação de seus bens de capital 10% (lucro maior). Mas, a partir de agora poderão lançar 20% (fazendo com que “misteriosamente” o lucro caia). Isso consequentemente reduz o Imposto que deverá pagar sobre o lucro. Essa é mais uma forma que esse governo inventou para utilizar o dinheiro público em benefício dos capitalistas.

Com essas medidas, segundo o governo, deixará de arrecadar mais de 6 bilhões de reais nos próximos 6anos. Ou seja, reduz o imposto a ser arrecadado para aumentar o lucro das empresas.

Essa medida é um bom exemplo de como os governos capitalistas agem em momentos de crise ou mesmo diante do risco de acontecerem. Colocam todo o aparato estatal a serviço da manutenção da estrutura econômica.

Os comunistas, pelo contrário, para manter o bem estar da maior parte da sociedade, propõem reformas radicais como a introdução de, como diz o Manifesto Comunista, um “pesado imposto progressivo” de maneira que as grandes fortunas paguem mais impostos e poupem os que ganham menos, que são os trabalhadores. Assim, a qualquer ameaça de crise e a possibilidade de massacrar os trabalhadores e pobres coloca-se imediatamente a necessidade de impor à burguesia limites de reprodução de sua riqueza.

Essas medidas vão no sentido oposto daquilo defendido historicamente por partidos socialdemocratas. Ou seja, são medidas opostas aos programas de distribuição de renda para a população com menores rendimentos. Temos assim mais uma demonstração do caráter burguês neoliberal desse governo.

CUT DEFENDE O FATOR 85/95 E O ACORDO COLETIVO ESPECIAL

Há algum tempo temos feito o debate de que a relação da CUT com o Estado burguês deu um salto qualitativo prejudicial aos trabalhadores, pois não se trata mais só de apoio político ao governo, mas sim da incorporação à gestão do capital. Prova são os sucessivos acordos que a corrente majoritária faz com a patronal em várias categorias com introdução de banco de horas, aumento da jornada com a obrigatoriedade de horas extras, cota mínima de produção, etc.

Se antes eram propostas defendidas e aplicadas em empresas localizadas, agora a pelega e governista CUT está patrocinando a flexibilização da já insuficiente CLT (piorar o que é ruim) e da nova reforma previdenciária através do fator 85/95 em nível nacional para que valha em todo o país e em todas as categorias. A central está defendendo (e claro, já contou com o apoio insuspeito de alguns setores da patronal) o chamado ACE (Acordo Coletivo Especial) que consiste em abrir a possibilidade de que o negociado prevaleça sobre o que é legal.

O descaramento dessa pelegada é tanto que transformaram o ato de entrega do anteprojeto em solenidade. Queriam mostrar para a burguesia de como estão domesticados.

Pela proposta defendida pela CUT, se uma empresa conseguir “convencer” os trabalhadores poderá impor banco de horas, parcelamento de 13º salário, mudança de período de férias ou, até mesmo, como disse o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, simplesmente, acabar com direitos: “Exemplo dessa inaplicabilidade é o seu artigo 396, que garante à trabalhadora em fase de amamentação direito a dois descansos de meia hora cada durante a jornada de trabalho para amamentar o filho. Esse direito podia ser exercido na época em que as mulheres trabalhavam perto de sua casa. Hoje, no entanto, a maioria mora longe do local de trabalho, o que torna a lei sem efetividade”.

Só este exemplo demonstra o perigo representado pelo ACE. Assim, as trapaças entre dirigentes sindicais pelegos e a patronal passam a ser legais. No exemplo acima, um dirigente sindical combativo não iria “trocar” um direito “inaplicável” por outro que favorece a patronal. Um dirigente combativo deveria mobilizar a categoria para que as empresas colocassem creches, permitindo tanto que as mães e os pais ficassem próximos de seus filhos quanto garantissem o cumprimento de um direito. O cômico é que a CUT chama isso de “modernização das relações entre o capital e o trabalho” (Vagner Freitas, presidente da CUT Nacional).

A lógica é a mesma utilizada pelo governo: permitir que as empresas aumentem a competitividade. Oras, o papel de um sindicato não é aconselhar a gestão da empresa, mas sim lutar para que os trabalhadores não sejam penalizados nas crises e que sejam os capitalistas que arquem com todos os custos da crise que eles mesmos fizeram.

Em relação ao fator 85/95 (como já demonstramos acima é outro ataque aos trabalhadores) a CUT também é uma das entusiastas defensoras desse ataque aos trabalhadores.

Esses são dois exemplos de como a política da CUT está direcionada a salvar os capitalistas quando estão em dificuldades. Também têm as traições nas várias campanhas salariais em que realiza acordos rebaixados e abre mão da organização da classe trabalhadora. O melhor exemplo é o papel que a CUT está desempenhando na campanha salarial de bancários e metalúrgicos do ABC que, além de não preparar a greve, ainda cede a pequenas concessões da patronal.

A CUT, para tentar aprovar o Acordo Coletivo Especial, mente para a classe trabalhadora. Na prática ao passar a vigorar esse Acordo servirá para retirar direitos, ou seja, flexibilizar, pois a legislação existente não proíbe a ampliação de direitos, isto é, não precisaríamos de uma nova. Por exemplo: se a patronal quer pagar o 14º salário ou férias em dobro não há necessidade de haver lei nova para isso. Mas, se quiser pagar metade do 13º ou não pagar um 1/3 sobre as férias há necessidade de lei que permita as empresas fazer isso sem sofrer nenhum questionamento judicial.

É evidente que a CUT sabe disso. Mas, a defesa que faz do capital é tão ferrenha que para agradar aos seus amos capitalistas começa a lançar mão das mentiras mais absurdas.
Não reivindicamos a CLT, mas também não somos a favor que os direitos mínimos que estão contidos nela sejam retirados. A luta é necessária para que eles sejam ampliados.

Esses elementos que apontamos são parte de um processo mais geral em que a burocracia petista e a cutista estão cada vez mais a direita e conforme a crise vai dando sinais de proximidade com o país, mas se aproximam dos capitalistas, defendendo e aplicando a política de retirar da classe trabalhadora os custos para cobrir as possíveis perdas que os capitalistas terão.
 

 

DILMA E O AGRONEGÓCIO: DESMATAMENTO LEGALIZADO  

O Congresso Nacional (passou primeiro pela Câmara e depois pelo Senado), dominado pelos reacionários e gananciosos ruralistas, aprovou mais uma lei que consolida a legislação pró-desmatamento. A Medida Provisória (MP) aprovada tinha sido enviada pelo governo ao Congresso Nacional como forma de “suprir” o que chamam de lacunas na legislação ambiental.

A nova Medida Provisória piora ainda mais a legislação ambiental do país.

A MP enviada para o Congresso Nacional, na verdade, foi uma manobra do governo (para parecer que estava contra os ruralistas) para rediscutir as propostas do agronegócio. Dilma estava pressionada por uma campanha que envolveu intelectuais, ambientalistas, artistas e foi obrigada a vetar alguns (indefensáveis) artigos do “novo código florestal” elaborado por Aldo Rebelo e apoiado pelos ruralistas.

Ao enviar a Medida Provisória até o mais ingênuo ambientalista sabia que o agronegócio iria recolocar as suas propostas. Dito e feito. Com uma bancada governista “descuidada” (raras vezes a base do governo se descuida, principalmente quando é para retirar direitos dos trabalhadores) e uma bancada ruralista “atenta”, a Câmara fez várias modificações na Medida Provisória: Reintroduziu a diminuição das margens dos rios que devem ser protegidas (Áreas de Proteção Permanente – APP), estabeleceu a desnecessidade da recomposição de áreas degradadas nas margens dos rios com vegetação nativa (podendo ser utilizadas madeiras comerciais como eucalipto, que é uma produção altamente destrutiva do solo) e perdoou as multas realizadas pelo IBAMA antes de junho de 2008.

Sem se preocupar em “entregar” a existência dessa manobra entre o governo e o agronegócio o senador Jorge Viana, do PT e da base aliada, foi enfático: “É o código possível. É o código que representa a composição que temos no Congresso. Acho que ele traz também muitas qualidades. A mais importante delas é que a lei brasileira segue sendo rígida como antes”. É o mesmo discurso da fascista Kátia Abreu: “Não foi 100% como eu esperava, mas tivemos grandes avanços, avanços importantes e o maior deles é a segurança jurídica que vamos ter no campo”.

O atual modelo de política econômica do país faz com que esse governo seja cada vez mais refém desse setor da economia. A porta de entrada do país no mercado mundial é a exportação de commodities, no caso brasileiro, formada principalmente por grãos. O superávit do agronegócio de janeiro a agosto de 2012 foi de US$ 45,27 bilhões. Nos últimos doze meses o volume total de exportações do setor chegou a 96 bilhões (FSP 28/09), representando sozinho quase 40% do total de exportação brasileira (afnews.com.br).

Esse peso econômico se transfere para o político. É considerado o maior lobby do Congresso Nacional – possui 25% dos deputados e 16% dos senadores – tem conseguido pautar no cenário político, praticamente, todos os seus interesses. Em 2010, 41 deputados da bancada ruralista tiveram sua campanha financiada pela Friboi – um dos maiores exportadores do país – que gastou 30 milhões. Destes, 40 votaram a favor do código do desmatamento.

Essa é a explicação, política e econômica, para um governo tão dependente desse setor na economia. É também a explicação do fato de este governo ser mais à direita.

BENEFICIANDO O AGRONEGÓCIO

O texto aprovado (e o proposto na MP do governo) é claramente para beneficiar o agronegócio, instalado nas propriedades maiores.

O texto original da MP previa 20 metros de proteção nas margens de rios para propriedades de 4 a 10 módulos fiscais. O aprovado diminui para 15 metros a área obrigatória de proteção nas margens de rios e ainda aumenta o tamanho das propriedades (passa a ser propriedade de 4 a 15 módulos fiscais) que fazem jus a essa diminuição da área protegida.

Há outro problema nessas medidas que iguala pequenos aos médios produtores e, evidentemente, favorece esses últimos. Isso quer dizer que, agora, imóveis de quatro a quinze módulos – ou seja, pequenos e médios produtores – foram, para efeito da área de preservação, equiparados. Esse fato derruba a versão de que os deputados ruralistas estavam defendendo os pequenos produtores.

Para as propriedades maiores (latifúndio), enquanto o texto original da MP estabelecia o mínimo de 30 e máximo de 100 metros de proteção, o novo texto aprovado estabelece como o mínimo de 20 e máximo de 100 metros de proteção. E nesse caso, cabe a cada Estado regular essa área. Sabemos que em vários Estados, sobretudo das regiões centro oeste e norte, o peso político dos ruralistas é determinante.

Há ainda outros dispositivos favoráveis ao agronegócio, como a possibilidade de computar a APP no cálculo da Reserva legal, a retirada do conceito de área abandonada e subaproveitada, o reconhecimento da área de pousio (área de descanso para recuperação da terra) das atividades pecuárias e sem limite de tamanho da propriedade e, por fim, uma das mais graves, o estabelecimento do crédito de carbono em áreas de preservação permanente.

O estabelecimento do direito sobre a produção de oxigênio nas áreas de preservação e que podem ser comercializados – como crédito de carbono – com produtores, empresas e até mesmo países que têm alto índice de poluição. A área que deve ser obrigatória como parte de proteção do ecossistema ou bioma vai servir como compensação para os desmatadores. Ou seja, vai perder totalmente a sua função de preservação.

O agravante maior de toda essa mudança é que pode permitir aos latifúndios improdutivos a classificação de produtivos (em função da atividade econômica) e, uma das coisas, dar fundamento jurídico (não de justiça) para escaparem da reforma agrária. Áreas sem produção ganham status de produtivas.

 

OS BANCOS, A DÍVIDA PÚBLICA E A LUTA DOS TRABALHADORES.

Daniel Delfino

Os bancos são um dos setores mais poderosos do capitalismo brasileiro. Entra governo, sai governo, muda o plano econômico, com hiperinflação ou estabilidade dos preços… em todos os cenários os bancos mantiveram seus lucros. Boa parte desses lucros vem da especulação com os títulos da dívida pública.

O governo arrecada dinheiro para pagar seus compromissos com vencimento no curto prazo vendendo títulos de longo prazo, pagando juros elevados aos compradores desses títulos. Com isso, a dívida pública brasileira aumenta como uma bola de neve. Desde a desregulamentação neoliberal na década de 1990 e também ao longo da gestão do PT na década de 2000, a dívida só fez aumentar. A dívida era de R$ 62 bilhões em janeiro de 1995, correspondente a 10% do PIB, e passou para R$ 2,7 trilhões, ou 60% do PIB em junho de 2012 (Correio da Cidadania, 14/09).

Recentemente o governo reduziu a SELIC, que regulava os juros dos títulos da dívida, de 11% para 7,5%, entre dezembro de 2011 e agosto de 2012. Entretanto, o custo das operações com títulos ficou em 12,88% em julho, porque os novos títulos passaram a ter juros pré-fixados, superiores à SELIC (idem). Títulos pré-fixados correspondem a 37% do total da dívida (relatório mensal da Dívida Pública Federal – DPF – disponível em http://www.tesouro.fazenda.gov.br/divida_publica/downloads/kit_divida.pdf). Os títulos da dívida brasileira são um dos negócios mais seguros e rentáveis no mundo, e os bancos brasileiros bem sabem disso.

Os bancos estão entre os maiores compradores desses títulos, juntamente com seguradoras, fundos de pensão, investidores estrangeiros e donos de grandes fortunas. As instituições financeiras detêm 28,8% da dívida pública (relatório da DPF). "A dívida interna do Banco Central com o mercado financeiro (por meio das chamadas “Operações de Mercado Aberto”), que somava R$ 414 bilhões em junho, e está quase toda nas mãos dos bancos" (http://www.ihu.unisinos.br, 02/08)

O lucro dos bancos se compõe da venda de “produtos” (seguros, títulos de capitalização, previdência privada, etc.), operações de crédito (empréstimos) e operações de tesouraria (nome que se dá às operações com títulos). Segundo o BC, 101 instituições financeiras lucraram 25,693 bilhões de reais entre janeiro e junho deste ano (Veja, 17/09).


A LUTA DOS TRABALHADORES BANCÁRIOS

Como dissemos, os bancos seguiram tendo lucros enormes ao longo dos governos do PT. A relação entre os bancos e o governo do PT é tão profunda que se estende até o movimento sindical da categoria bancária. Os sindicatos de bancários do país são controlados pela Contraf-CUT, controlada pelo PT. Há décadas a CUT pratica um sindicalismo de conciliação de classe, que não enfrenta de fato a patronal. Na categoria de bancários, foi abandonada a luta pela estabilidade no emprego. Com isso, os trabalhadores dos bancos privados ficam a mercê dos gestores, que podem demití-los ao menor sinal de descontentamento ou tentativa de enfrentamento. Fragilizados pela falta de estabilidade, os trabalhadores desse setor se ausentam das lutas e greves da categoria. Com o passar dos anos, passaram a ver o sindicato como algo externo, que não depende de sua participação. Um clube de convênios, em que a diretoria cutista se perpetua graças à relação assistencial com esse setor, que forma a ampla maioria da categoria.

No setor de bancos públicos, por sua vez, as perdas salariais já chegam a 90% no Banco do Brasil e 100% na Caixa Econômica Federal. A luta pela reposição das perdas, bem como por uma série de questões específicas (isonomia entre funcionários novos e antigos, e entre os bancos incorporados, plano de cargos e salários, jornada de 6hs para comissionados, pagamento de substituições, saque nos fundos de pensão, sucateamento dos planos de saúde, etc.), foi abandonada pelo sindicalismo cutista. Para atender a essas questões, seria preciso enfrentar o governo federal, que é do PT. Logo, os sindicalistas bancários da CUT preferem rifar os interesses dos trabalhadores e obedecer ao patrão, o governo do PT. Anos seguidos de traição fizeram com que os trabalhadores dos bancos públicos se decepcionassem com o movimento sindical e reduzissem também a sua participação.


POR UM OUTRO PROJETO PARA OS BANCOS

Ainda existe uma boa adesão numérica às greves nos bancos públicos. Entretanto, os trabalhadores não comparecem aos piquetes, assembleias e atividades de greve. É a chamada “greve de pijama”, em que os trabalhadores não vão trabalhar, mas também não participam do movimento, porque não acreditam na direção cutista. A greve virou uma espécie de “férias coletivas”, em que os trabalhadores se ausentam do serviço, porque não suportam mais as condições de trabalho: sobrecarga de serviço, assédio moral, cobrança de metas, estresse, adoecimento físico e psicológico. Entretanto, não há como modificar essas condições de trabalho sem modificar todo o projeto dos bancos públicos: ao invés de especular com títulos da dívida e concorrer com os bancos privados na venda de “produtos”, os bancos públicos deveriam funcionar como bancos sociais, fornecendo crédito barato para os trabalhadores, para a agricultura familiar, para obras públicas que beneficiem os trabalhadores, etc.

Mas para isso, seria preciso travar uma luta política global contra o governo e seu projeto. Seria preciso unificar as lutas dos trabalhadores bancários com o restante da classe trabalhadora, tendo como meta a estatização do sistema financeiro, sob controle dos trabalhadores.

 

A ESTRANHEZA DE TANTOS ACIDENTES: sobre os incêndios nas favelas paulistanas

Pedro Guerra

Desde o começo do ano, foram mais de 30 incêndios na cidade de São Paulo e arredores. Por se tratar de regiões em processo de valorização econômica surge a suspeita de serem incêndios criminosos, com o intuito de destruir as favelas e substituí-las por empreendimentos imobiliários. Mas antes do caso específico, façamos algumas considerações gerais.

Vivemos num sistema socioeconômico dos mais terríveis. A classe trabalhadora, afora sofrer com a exploração econômica de extração da mais-valia do seu trabalho, ainda sofre outras formas de exploração: Todo tipo de preconceitos, sexismos, racismos, discriminações e segregações. Ocorre, ainda, a segregação física, em especial com os mais pobres, na ocupação do espaço urbano. Sem recursos, a população empobrecida se vê forçada a viver em ocupações clandestinas, precarizadas, com graves riscos envolvidos, desde o contágio por doenças decorrentes da falta de saneamento até os desmoronamentos e os incêndios.

A existência das favelas deixa claramente exposto o cinismo do discurso jurídico burguês. A cidadania – cuja essência é conservadora – é uma via de mão única, ou seja, só beneficia a burguesia, não sendo feita para amparar a classe trabalhadora. É preciso estar atento a isso.

Ainda que as conquistas jurídicas sejam importantes – e o são, pois promovem acúmulo de forças e experiências aos militantes populares – o direito não está acima da luta de classes. Pelo contrário, o direito é um instrumento burguês de opressão.

Se seguirmos a hipócrita ideologia jurídica, ficam sem resposta as questões: se são todos iguais perante a lei, por qual razão uma pequena parte da população vive bem e uma maioria vive de forma precarizada? Se existe, no capitalismo, igualdade e liberdade por que uma enchente ou um incêndio para poucos é apenas um tormento e para muitos é a ruína absoluta?

Assim o é, pois, o direito e a cidadania são duas ilusões burguesas que precisam ser combatidas nas reflexões da classe trabalhadora. Os trabalhadores apenas são cidadãos na medida em que devem se submeter ao regime de trabalho capitalista, dispondo do seu tempo e energia em relações de produção desequilibradas.

No capitalismo, a maioria, a qual produz a riqueza social, não se beneficia da própria riqueza produzida. A isonomia ou igualdade jurídica só vale como forma de camuflar a exploração do contrato de trabalho. Assim, o direito e a cidadania devem ser etapas da revolução, mas que saibamos a ocasião de esmagar o discurso jurídico e afirmar o poder popular.

De 2008 até hoje, foram quase 500 incêndios na capital paulista. Uma média de dez incêndios mensais. Os números impressionam por si sós, haja vista o drama inquestionável das muitas famílias. Porém, causa indignação o fato de que se tratar de regiões com crescente valorização econômica e a denúncia de se tratar de incêndios criminosos.

A título de exemplo, entre janeiro de 2008 e novembro de 2011, a região de Campos Elísios, onde, em setembro último, pegou fogo na Favela do Moinho, a valorização imobiliária cresceu em aproximados 183%. No mesmo período, o Jaguaré, bairro onde ficavam as incendiadas Favelas do Leão e do Areião, destruídas em janeiro desse ano, teve valorização de 132%. O Jabaquara passou por valorização imobiliária de 129% no período mencionado, quando no último agosto a Favela Alba foi destruída pelas chamas. Os números continuam. O Campo Belo, onde existia a Favela do Piolho, incendiada em março de 2012, a valorização foi de 114%. A Favela Presidente Wilson ficava no bairro do Ipiranga, cuja valorização imobiliária foi de 106%. Mais informações podem ser obtidas nos "sites" http://fogonobarraco.laboratorio.us/# e http://www.terra.com.br/economia/infograficos/valorizacao-imoveis-sao-paulo/.

Em 2005, a "gestão-relâmpago" de Serra, entre tantas outras barbaridades, fez o desfavor de extinguir um programa de combate a incêndio nas favelas oriundo da antiga gestão petista.

Assim, as fragilizadas habitações ficaram ainda mais expostas aos perigos de uma ocupação irregular. E Kassab, atual prefeito, mesmo com a lei aprovada em 2010 para retomada do programa de prevenção aos incêndios nas favelas, deu continuidade à negligência, não implantando qualquer política pública efetiva nesse sentido. Todavia, apenas a ausência de um programa de combate aos incêndios nas favelas não explica tantas ocorrências dessa natureza.

Com o crescimento econômico e o aumento da renda em alguns setores e do sistema de crédito, algumas capitais brasileiras, como São Paulo, têm vivido um surto crescente de empreendimentos na construção civil. Dessa forma, o capitalismo, que é um sistema sem outra ética que não o desenvolvimento ao máximo dos lucros, atropela qualquer um em seu caminho.

Com as ocupações irregulares, há um empecilho no xadrez das empreiteiras: os seres humanos que não têm onde morar. Homens, mulheres, crianças, idosos… com sonhos e aspirações como todos os outros humanos. Mas, também com o destino infeliz de terem nascido numa sociedade injusta, excludente e brutal. Para a burguesia que se queimem os barracos, pois, só se importa com os pobres quando lhes servem de empregadas, garçons, babás, porteiros e todo tipo de trabalhador braçal, muitos com pouca instrução. No mais, quer distância dos pobres. Metaforicamente podemos dizer que os bairros ricos representam a Casa Grande e os bairros pobres, a Senzala.

As instituições estatais que se arrogariam a competência para apuração dos fatos, como a polícia, bombeiros e Ministério Público, nada fazem. Aliás, cabe a observação de que os últimos governos estaduais têm se cercado do que há de mais reacionário nos altos escalões do serviço público, o que tem sido bastante conveniente com a crescente onda conservadora no estado de São Paulo.

A burguesia tem lá seus "charmes" na hora de fazer política. Assim, diante da pressão popular, e em nome da cidadania, é obrigada a ceder direitos, pois não seria "civilizado" um governo desatento a uma pretensão popular. Não seria "charmoso", portanto, simplesmente, negar direitos. Diante de tantos incêndios, com seu consequente drama popular, a prefeitura, em 2010, com uma nova lei para prevenção a incêndios, afirma ter retomado o plano, ainda que sem implementá-lo na prática. Isso é um absurdo! É uma maneira de se aviltar a inteligência do povo!

Então, o que fazer? A classe trabalhadora, organizada e decidida, deve denunciar as arbitrariedades sofridas, fazendo ecoar, ao máximo, sua voz.

Precisamos organizar manifestações e panfletagens nas ruas e pela internet. Precisamos levar as denúncias aos advogados populares, a fim de que a batalha forense, ainda que limitada, seja mais um canal de divulgação das lutas. E, por fim, precisamos criar forças populares de autodefesa com a finalidade de vigilância dos limites de cada ocupação, repelindo energicamente qualquer um que tentar novamente provocar incêndios.

 

UNE OU ANEL – EIS A QUESTÃO?

Grupo Além do Mito (AL)

Publicamos esta contribuição do Coletivo Além do Mito

a respeito dos rumos do movimento estudantil, que para
os companheiros deve ir além do debate UNE x ANEL.
Entendemos que o artigo traz elementos pertinentes
para fugir dessa mera escolha e pensar novos enfoques.
Entretanto, a exemplo de edições anteriores, as publicações
de outros coletivos e suas conclusões são de sua
responsabilidade não refletindo necessariamente a posição
do Espaço Socialista.

 

Após o Congresso Nacional de Estudante (CNE), em 2009, no qual se fundou a Assembleia Nacional dos Estudantes Livre (ANEL), nunca tinha se apresentado em Alagoas a necessidade, tão premente, de responder à questão acerca da construção ou não dessa entidade como nos últimos meses. Identificamos que as razões do fenômeno mencionado já apontam para a resposta a ser dada a esse questionamento, ainda que ambas não se esgotem e que podemos estender esta breve análise ao resto do país, reservando as particularidades de cada estado.

O CNE representava o passo mais organizativo do processo de reorganização do ME. Para que o que se crie seja realmente novo – e não uma reatualização do velho – é indispensável construir novas bases, novos princípios. Ou, como deixamos bem claro: “As tarefas postas para o Congresso envolviam, pois, o debate acerca de uma gama de temas que, muito além da necessidade de uma Nova Entidade, envolviam também os princípios que norteavam a reorganização, seus métodos, bandeiras políticas, concepções de mundo, de educação e mesmo de ME.” (Para onde foi a reorganização?, 2009).

Desde sua fundação, nenhuma grande luta foi travada pela ANEL onde não tivesse o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU), aliás, ela não existe onde não há o partido. A construção recente da ANEL/Alagoas representa bem isto – a necessidade da construção de uma entidade nacional vem à tona quando o partido volta a se reestruturar no estado.

Cabe aqui relembrar um dos principais argumentos do PSTU para se fundar uma nova entidade em 2009: “precisamos de uma nova entidade para potencializar as lutas que estão decorrendo do ascenso do ME nacional”. Ao que parece, esta tarefa não foi o que se pode verificar nos últimos anos.

A ANEL configura uma entidade representativa dos estudantes em nível nacional, que depois de concebida vem buscar sua legitimação na base. Então, como pode uma entidade que não tem seu reconhecimento no seio estudantil ser representativa? O debate de seus militantes quase sempre forja uma conjuntura não existente. Não temos uma base que reclame uma entidade de porte nacional somente porque a UNE não serve mais para fazer luta.

Uma vez criada a Entidade que defende as bandeiras mais acertadas possíveis, o PSTU acha que o que falta é divulgar a ANEL dentro de atos, através de listas de e-mails, em falas em público e no convite para seu Congresso. Como se os estudantes estivessem todos plenamente conscientes do que devem fazer e maturado todo o debate pertinente a uma reorganização só o que falta é que alguém chegue e apresente uma Entidade nova que balance as bandeiras corretas – e nesse momento, como em um passe de mágica, os estudantes se sintam tão identificados que o processo de lutas, em pouco tempo, começa a eclodir.

Desta mesma forma, O PSTU tenta forjar a realidade criando a falsa polêmica UNE x ANEL. Tal realidade é forjada com ideias “mortas” ao colocar a centralidade do problema da reorganização repousada sobre essa falsa questão. Uma vez consolidada a superação formal da UNE – já que a superação material ainda é tarefa da reorganização -, o PSTU pressupõe a superação plena da UNE e torna sinônimo ANEL e reorganização. A postura do partido é passada aos militantes da ANEL que a reproduzem em grande escala, dando certo ar de veracidade e legitimidade, pois aparentemente afasta do PSTU a responsabilidade de ter criado a polêmica, pintando tal falsidade como “o discurso dos próprios estudantes”.

Diante do que foi exposto, deve-se destacar que estamos operando uma discussão de entidade fundada em bases distintas daquela levada a cabo pelo PSTU, setor hegemônico do ANEL. Essa distinção se evidencia quando percebemos que a partir do momento no qual o partido leva a frente um projeto de reorganização materializado na ANEL, indicando a radicalidade de suas bandeiras, sua autonomia financeira e a democracia interna enquanto elementos que a distingue da UNE, compreendemos que sua análise da reorganização fundamenta-se em parte da realidade e dos sujeitos que nela atuam.

Ou seja, há uma falha metodológica realizada pelo partido quando lê a conjuntura olhando apenas as entidades que nela habitam, quando enxergam apenas a expressão formal da imbricação real de aspectos subjetivos e objetivos, sem levar em conta a gama de elementos articulados que dá base a essa superestrutura. Nessa linha o PSTU continuará identificando as vitórias da entidade sempre que esta ocupar um espaço que antes estava “vazio”, sempre que ela for o vetor responsável por colocar algo onde antes não existia nada. Ou melhor, sua própria criação é enxergada enquanto vitória, pois anteriormente não havia uma entidade de caráter nacional que defendesse a luta contra a reforma universitária, por exemplo.

Contudo, a questão que precisa ser respondida por todos os setores que fazem parte desse processo é: quanto à experiência dos dois anos da ANEL acumulou para o movimento de negação/superação, de rompimento, não apenas com a UNE, mas com tudo que ele representa?

Diante disso, é perceptível que o novo ainda não está pedindo passagem, na verdade ele possui sérias dificuldades para aprender a falar. Seu antigo idioma continua a lhe perturbar, suas palavras, na nova língua, precisam ser traduzidas a partir da velha, quando não ocorre de serem cognatas. Ele permanece incapaz de formular frases autonomamente, sob a lógica da nova língua e, por isso, não consegue superar o velho…
A ANEL não é o produto final da reorganização e sim um de seus frutos. Dirigem-se a nós como se a questão fosse construir a UNE ou construir a ANEL, mas a questão correta é construir a UNE ou estar comprometido com o processo de reorganização. Não nos sentimos forçados a construir a ANEL quando esta não atende às necessidades dos estudantes, que em nossa opinião é participar e reconhecer o ME, e, através da base, fazer movimento de práticas e condutas diferenciadas daquelas que todos nós queremos combater.

A tarefa ainda é reestruturar as bases para um Novo Movimento Estudantil, estreitar ao máximo nossas concepções, redefinir nosso posicionamento, clarear nosso objetivo, ou seja, elevar a consciência dos estudantes para que assim torne, objetivamente, possível uma entidade de representação dos estudantes em âmbito nacional.

Dessa forma, ratificamos o nosso compromisso frente aquilo que desde o CNE defendíamos: Reorganizar o ME nacional. Ainda que a passos curtos, estamos conseguindo mostrar na prática o quanto, o maior setor da reorganização, esteve e está equivocado, dentre outras coisas, no que se refere a sua tese de que ‘quem não está na ANEL não faz luta e/ou está fora do processo de reorganização’. Mero joguete de palavras, diante da realidade objetiva nas universidades do país.

Diversos grupos que ficaram desnorteados após o CNE vêm ressurgindo. Outros, pela própria experiência, com práticas do velho movimento naturalizadas como novas, formam-se em algumas universidades. E estes, começam a se articular entre si.

A tarefa é árdua, longa e, às vezes para alguns, parece ser impossível. No entanto, reafirmamos a urgência em unificarmos os setores comprometidos nessa defesa, tanto nacionalmente quanto em cada estado do país. Este primeiro passo é importante para esse momento defensivo que estamos vivenciando na esquerda como um todo.

Texto na integra em: www.grupoalemdomito.blogspot.com

 

A GREVE DOS PROFESSORES DE CHICAGO E AS SUAS SEMELHANÇAS COM A LUTA DOS PROFESSORES EM SÃO PAULO E NO BRASIL

Cláudio Santana/Núcleo Professores

Dadas as vantagens concedidas aos empresários, banqueiros, construtoras e empreiteiras, através da desoneração da folha de pagamentos, isenções fiscais, empréstimos com juros irrisórios e do papel assumido pelos governos no sentido de garantir a lucratividade destes e o funcionamento da economia capitalista em crise, os serviços públicos (Saúde, Educação, Moradia, Transporte Coletivo Público) vêm adquirindo um funcionamento cada vez mais precário.

A situação se agrava a cada dia, pois o recorrente uso do dinheiro público para atender aos interesses dos patrões transformam os cofres públicos numa “torneira que jamais será fechada”. Por conta disso, os investimentos nos serviços sociais essenciais são cada vez menores, já que a prioridade dos governos não é atender aos interesses dos trabalhadores e seus filhos.

Com isto, o funcionalismo público – que sofre com as péssimas condições de trabalho, intensificação do trabalho e com a sua não valorização profissional – acaba reagindo com greves e paralisações em todas as partes do mundo e do Brasil. Isso se expressou nas greves do funcionalismo federal e dos Professores de diversos estados brasileiros.

Queremos ressaltar dentro desse quadro, a greve dos Professores de Chicago, buscando as semelhanças com a nossa luta contra os ataques dos governos brasileiros – de Dilma à Alckmin, passando pelos demais governadores e prefeitos Brasil a fora. Ressaltamos essa greve não só pelo fato de suas demandas serem idênticas às nossas, mas também pelo fato de o modelo de Educação implantada em Chicago – baseado na Reforma Educacional de Nova York – ter sido copiado e adotado em boa medida pelos governos sem distinção no Brasil, fazendo parte também do modelo de Educação defendido pelos bancos, ONG’s e empresas, em suas ingerências na Educação Pública.


O MODELO DE EDUCAÇÃO IMPLANTADO EM CHICAGO

O modelo educacional adotado em Chicago foi pioneiro na implantação de iniciativas que foram colocadas em prática em Nova York e, em outras cidades e distritos estadunidenses, intituladas de Reforma Educacional de Nova York.

Esse modelo consiste, principalmente, em:
– Monitoramento, responsabilização e cobrança por resultados;
– Vias alternativas de contratação e seleção de professores, diretores e coordenadores, sobretudo não sindicalizados;
– Participação do setor privado – tanto pela prestação de consultorias como pela administração direta de unidades escolares;
– Banco de dados com o rendimento dos alunos;
– Bonificação e promoção por desempenho, ou seja, a aplicação de avaliações de desempenho e mérito.
Vale ressaltar que esse modelo começou a ser implantado nos Estados Unidos, sobretudo, nos anos 1970, o que mostra uma relação direta com a incidência de modo mais claro e evidente dos problemas econômicos e sociais oriundos da crise estrutural do capital. A cidade de Nova York estava passando por uma onda de violência latente provocada pelo desemprego. Notem o que ocorreu na Educação Pública:

“Os piores anos do sistema escolar aconteceram nas décadas que se seguiram à crise fiscal de 1975. Cerca de 4.500 professores foram demitidos entre os 15 mil funcionários demitidos pelo Conselho de Educação, e os que permaneceram tiveram seus salários reduzidos em 19%”. (A Reforma Educacional de Nova York: Possibilidades para o Brasil. p.13)

Os Professores reagiram com greves em várias cidades, inclusive, a última greve, de Professores de Chicago, ocorreu nesse período.

POR QUE OS PROFESSORES DE CHICAGO ENTRARAM EM GREVE?

A paralisação dos professores de Chicago foi a primeira na cidade em 25 anos. Também foi a primeira greve do gênero em uma grande cidade dos Estados Unidos em seis anos, e não é de se estranhar as razões atuais da greve dos professores de Chicago, pois a tal proclamada Reforma Educacional de Nova York culpa, responsabiliza, fragiliza, vulnerabiliza e intensifica o trabalho diário do professor diante de problemas de ordem estrutural.

De um modo geral, vejam algumas reivindicações dos Educadores de Chicago:
– Em defesa da educação pública;
– Contra as reformas e cortes no orçamento do ensino público;
– Por um novo contrato coletivo de trabalho;
– Contra a forma como os professores são avaliados.

Não poderia ser diferente. Já que:“Aqueles que persistentemente fracassam em fazê-lo são substituídos(…)" e "As escolas com o pior desempenho são fechadas e seus prédios, ocupados por novas escolas e novos quadros de funcionários” (A Reforma Educacional de Nova York: Possibilidades para o Brasil. p.23)

QUEM SÃO OS INTERESSADOS PELA IMPLANTAÇÃO DA REFORMA DE NOVA YORK NO BRASIL?

No Brasil, os principais interessados são aqueles que querem garantir a sua lucratividade com os subsídios governamentais e obter mais lucros a partir da privatização escancarada ou velada da Educação Pública, a partir da prestação de consultorias e do gerenciamento de projetos – expansão das Escolas de Tempo Intergral em São Paulo –, fornecimento de materiais e de livros didáticos, uniformes, dentre outras inserções no serviço público.

Nesse sentido, o movimento “Todos Pela Educação”, que conta com a participação de grupos empresariais e ONG´s – Fundação Roberto Marinho, Fundação Itaú Social, Instituto Ayrton Senna, Fundação Bradesco, Grupo Gerdal etc – representam esses interesses.

A Educação nos moldes do modelo importado permite que os bancos, as empresas e as empreiteiras recomponham as suas taxas de lucro e ganhem ainda mais dinheiro com a privatização do Ensino Público.

Nesse sentido, a Fundação Itaú Social, com a coordenação técnica do Instituto Braudel de Economia Mundial, lançou em 2009, o Programa Excelência em Gestão Educacional, que tem como objetivo principal divulgar A Reforma Educacional de Nova York e suas possibilidades para o Brasil.

O Instituto Braudel de Economia Mundial tem como presidente do Conselho Diretor, Rubens Ricupero, a mesma pessoa que, no auge da primeira disputa presidencial entre Lula e FHC (1994), disse – enquanto esperava para ser entrevistado no estúdio da TV Globo para o Jornal Nacional – ao jornalista Carlos Monforte, que vinha aproveitando-se do cargo para promover ativamente a candidatura de Fernando Henrique. “(…) Eu não tenho escrúpulos, o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde”, disse Ricupero.

AS SEMELHANÇAS COM O QUE OCORRE EM SÃO PAULO E NO BRASIL

Em São Paulo, a rede estadual de ensino do estado de São Paulo se reestruturou, sobretudo, na gestão Serra, mas não parou por aí. Com base na Reforma Educacional de Nova York, como já dissemos, o governo federal juntamente com governos estaduais e municipais, aplicam em todo o país medidas importadas de Nova York.

O achincalhamento, o ataque à auto-estima, a perda da autonomia, a retirada de direitos, o não reconhecimento do direito de greve o questionamento da estabilidade dos Professores, fazem parte de uma ofensiva dos governos para implantar esse modelo e fazer com que os professores aceitem uma atuação profissional desqualificada.

O regime de contratação precária dos professores temporários, o assédio moral e o autoritarismo nas escolas visam colocar o funcionamento da Educação Pública brasileira em consonância com o modelo contra o qual os Professores de Chicago se rebelaram.

AUMENTO DO CONTROLE SOBRE O TRABALHO DO PROFESSOR

O que sofremos enquanto educadores é parte de uma ofensiva maior, vinculada a uma sociedade capitalista em crise estrutural. Nesse caso, os ataques são cada vez mais agressivos e de ordem global, pois as margens para concessão se restringem e tornam-se raras ou ulas, com situações de perdas crescentes. A reação dos trabalhadores cresce, mas cresce também o controle.

A Reforma Educacional de Nova York busca atender a esse objetivo.
“Quando um sistema não consegue enfrentar manifestações de dissenso e, ao mesmo tempo, é incapaz de lidar com suas causas, surgem nesses períodos da história não só figuras e soluções ilusórias, mas também os ‘realistas’ da rejeição repressiva de toda crítica” (Mészáros, in A Crise Estrutural do Capital. p.61)

DEVEMOS COMBINAR A NOSSA LUTA SINDICAL COM A LUTA POLÍTICA POR UMA EDUCAÇÃO EMANCIPADORA
Se o ataque é global, temos que responder também de modo global. Nesse sentido, a luta por uma educação pública que atenda aos interesses dos trabalhadores e seus filhos deve ser combinada com a luta pela transformação da sociedade.

As nossas reivindicações, dado o ataque global que sofremos de um sistema capitalista em crise, não podem mais ser tratadas de modo imediatista e fragmentado.

Nós trabalhadores, devemos sempre defender uma Educação Pública que seja um importante instrumento de luta contra a sociedade mercantil, a alienação e a intolerância.

Precisamos fortalecer os vínculos coletivos nas escolas e trabalharmos com os pais e os alunos.
Uma educação que seja uma alavanca essencial na luta pela emancipação humana contra a barbárie capitalista, e pelo desenvolvimento contínuo da consciência socialista!

Por uma Sociedade Socialista!

 

 

A REPRESSÃO, O JUDICIÁRIO E A DEMOCRACIA BRASILEIRA

Thiago Arcanjo

Sem sombra de dúvidas, apesar da aparência de um país estável, o Brasil vive hoje um profundo endurecimento do regime democrático-burguês como um todo.

Isto acontece de modo extremamente particular em nossa sociedade: vivemos um momento da cidadania do crédito, em que se compram com mais facilidade que no passado as mais diversas bugigangas; ao mesmo tempo, as mesmas pessoas se importam cada vez menos com a política institucional: a elas importa que os “políticos” não atrapalhem seus planos de consumo. Um outro aspecto aparentemente contrário a tais características é que, de fato, a exploração do trabalho aumentou no Brasil (o que se pode sentir pelo o aumento dos ritmos do trabalho nos mais diversos setores produtivos), bem como se acentuaram graves e já antigos problemas da sociedade brasileira; enumeremos alguns: espaço urbano caótico, falta de moradia, falta de reforma agrária, insuficiência da locomoção no espaço, desemprego, precarização das relações de trabalho, corrupção que favorece e cria o crime organizado etc..

Tudo isto, ocorre, por assim dizer, sob a direção de um processo político-institucional que une, por um lado, ideologia dominante, legitimadora desse Brasil que “dá certo”, e, por outro, grandes “ações” do Estado no todo da sociedade, buscando, em tese, dar unidade e controlar de alguma maneira essa mesma sociedade. Essas ações do Estado, no entanto, dá-se de diversas maneiras. Podemos citar aqui alguns exemplos disso: impulsionamento a uma ideologia do “crescimento”, que nada diz sobre “crescimento para quem” ou mesmo em que termos de qualidade de vida se dá esse crescimento; intervenções na economia para assim “salvar os capitais”, transferindo o orçamento público à burguesia; e, por fim, ações violentas, legais ou não, que violentam principalmente o povo “pobre, preto e periférico”, como forma de manter esta “ordem” e impedir que humano nenhum seja obstáculo ao bom funcionamento dessa ordem.

Todas essas ações, porém, ainda que tenham o Poder Executivo como o Poder mais evidenciado, contam com as ações também essenciais do Legislativo e Judiciário. Nesse sentido, o Legislativo muito mais do que simplesmente legislar e fiscalizar o Executivo, funciona, na pr&aacu

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