Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

Política vacilante e burocratismo versus reorganização do movimento por fora dos aparatos – essa foi a tônica do II encontro americano

Política vacilante e burocratismo versus reorganização do movimento por fora dos aparatos – essa foi a tônica do ii encontro americano

Depois do sucesso ocorrido no I Encontro Americano pela Humanidade e contra o Neoliberalismo, realizado no ano de 1996 em Chiapas México, organizado pelos Zapatistas e que contou com a ampla participação democrática e um espírito de solidariedade dos povos oprimidos, esperava-se que o 20 Encontro Americano, ocorrido em Belém do Pará Brasil em dezembro de 1999, desse continuidade a esse importante processo de unificação e construção de um programa político (mínimo) que fosse capaz de organizar o movimento internacional em ações conjuntas em defesa dos direitos dos trabalhadores e de todos os que de alguma maneira tem historicamente sofrido com o preconceito, a discriminação e a opressão do sistema capitalista.

Um bom número de organizações ou representantes de movimentos organizados compuseram as 2600 pessoas credenciadas dos cerca de 24 países representados no evento. Entre as mais importantes ou que participaram ativamente podemos destacar Zapatistas do México, ELN da Colômbia, Movimiento por un Partido de los Trabajadores e CTA da Argentina, Movimento Bolivariano da Venezuela, representante do PC Cubano, PIT/CNT do Uruguai, Partido dos Trabalhadores do Brasil, PCR, PSTU, LBI, PCdoB, Movimento Hip-Hop, movimento Contra-Corrente Articulação dos Povos Indígenas do NE, MG, ES e PA, Comunidade Quilombolas, ONGs, Movimento Negro, de Mulheres, Gays, Lésbicas, entre outras.

A organização de um evento desse nível, que deveria fundamentalmente contar com a experiência dos Zapatistas e de outras organizações como a FARC, MST, CUT e os partidos políticos da esquerda socialista, acabou ficando sob responsabilidade da corrente petista Força Socialista, com grandes desvios burocráticos e sem nenhuma tradição de internacionalismo. Desenvolvendo uma política de disputa eleitoral, burocrática e sem mobilização e, atualmente, administrando a prefeitura de Belém através de aliança com a burguesia, esta corrente tomou para si a tarefa de transformar o II Encontro Americano em uma grande festa de propaganda da atual gestão petista sem um mínimo de respeito aos verdadeiros objetivos deste encontro. Desde o princípio, centralizando as decisões de organização e funcionamento do evento na cúpula do partido sem respeitar os fóruns de discussão internacional, esta corrente criou as condições objetivas para a burocratização do evento estabelecendo uma metodologia pouco participativa que acabou enfraquecendo os grupos de trabalho impossibilitando a participação da base. Além da limitação da voz e do voto nas decisões políticas que foram garantidas somente àqueles que pudessem pagar os 15 reais de inscrição.

Considerando todos esses fatores, o encontro, que deveria ser um momento de ampla unidade na luta contra o neoliberalismo e pela humanidade, teve dias de grandes conflitos internos causado pela tentativa de exclusão, por parte dos organizadores do evento, dos "sem crachás", através da utilização da polícia da prefeitura de Belém. O descontentamento de um amplo setor de estudantes, trabalhadores, anarquistas, punks, além dos representantes indígenas, devido a presença da polícia municipal no evento, a falta de diálogo e as manipulações constantes, da direção petistas, foi o estopim para que acontecesse uma rebelião e ao mesmo tempo uma ruptura com os organizadores do encontro.

A construção de um encontro alternativo contou com quase 50% dos participantes levando a uma experiência interessante de auto-organização, conseguindo estabelecer o processo democrático até então inexistente, e demonstrando que ainda existe vontade política de um amplo setor da vanguarda de se desprender dos aparelhos burocráticos sem democracia direta. Este fato político criado teve grande repercussão na mídia fazendo com que os petistas da força socialista culpassem os Anarcopunks pelo acontecido, caracterizando-os como vândalos e desordeiros.

A presença dos Zapatistas no encontro de forma pouco incisiva na disputas políticas existentes e suas dificuldades de tomarem uma posição revolucionária em relação a crise provocou uma grande tensão, o que levou a realização de várias reuniões de esclarecimentos, onde os Zapatistas, com uma atitude centrista, colocaram a necessidade da unidade pela unidade, sem ter uma postura crítica em relação aos acontecimentos. Pressionados por uma ampla vanguarda para que tomassem uma posição definitiva em relação às disputas acabaram concordando em apresentar aos petistas uma proposta de unificação a partir dos critérios de democracia participativa, da não tolerância de policiais no encontro, do fortalecimento dos grupos de discussão e de elaboração e do credenciamento de todos os que quisessem participar, sendo então, todos os pontos aceitos pelos representantes da Força Socialista, já extremamente preocupados com o que estava acontecendo.

Não fosse a volta da polícia municipal para os portões do local onde aconteceria a plenária final, como forma de controle político das deliberações que viessem a ser votadas, e a presença de um grande contingente de policiais no interior do evento (o que criou uma revolta por parte de estudantes sem crachá que queriam participar) o encontro Americano teria recuperado o seu objetivo fundamental. Porém, a agressão sofrida pelos estudantes da Universidade Federal do Pará André Luís Silva de Miranda e Luciana Chaves que, após terem o seu direito de participar negado por não possuírem "crachás", e mobilizarem os restantes para entrar, sendo rapidamente detidos e espancados na frente dos demais, levou a novos conflitos.

A tensão e o medo tomaram conta dos estudantes que tiveram que recuar sob a violência dos policiais até que viessem alguns dos participantes internos para socorrê-los, principalmente anarquistas e punks, que aproveitaram para denunciar a violência cometida pedindo aos representantes da mesa organizadora o direito de voz para os agredidos. O fato desse direito ter sido negado justamente no dia Internacional dos Direitos Humanos e de, nesse mesmo momento, utilizarem-se da calúnia e da mentira como única forma de isentarem-se da responsabilidade e da culpa pelo acontecido só fez aumentar a indignação e a revolta. Cercados por uma vanguarda de luta e protegidos por um pelotão de pobres mercenários (seguranças contratados) não viram outra saída senão decretar o fim do encontro Americano pela Humanidade e contra o neoliberalismo dispersando a multidão para o pão e circo que haviam preparado.

Como não poderia deixar de ser, o desdobramento dessa metodologia burocrática utilizada pelos petistas da Força Socialista no II Encontro, acabou refletindo nas deliberações política que foram aprovadas na plenária final. Estando os mesmos em maioria durante este processo, devido à distribuição de crachás em massa para a sua militância, garantiram a aprovação de uma política reformista sem estabelecer nenhum critério classista para os atos e mobilizações que serão realizados a partir desse encontro. Por exemplo, não se deliberou acerca da defesa do socialismo com única via capaz de garantir a emancipação dos povos contra a exploração capitalista, demonstrando o quanto essa corrente petista e a sua direção está distante da luta real contra o neoliberalismo. A aprovação de uma marcha dos povos oprimidos das Américas em direção ao México num período de 5 anos partindo de vários países, e o impulsionamento de um plebiscito sobre a dívida externa. Como se vê, nada concreto de fato no que se refere a atender a necessidade dos trabalhadores na América Latina hoje. Assim, este movimento corre o risco de não ter uma bandeira concreta de luta que unifique aqueles que defendem uma nova sociedade, diferente dos que acreditam na possibilidade de sensibilização dos capitalista burgueses para garantir maiores fatias de direitos sociais e renda para os pobres, ou seja, os setores reformistas, burocratas de gabinetes que vivem dos aparatos e que a muito vem negociando nos bastidores apostando na conciliação entre as classes.

Percebendo o quanto essa postura política é prejudicial para todos nós trabalhadores, estudantes, camponeses, negros, índios, mulheres e desempregados, hoje mais do nunca desesperados com a atual situação de miséria que os capitalistas historicamente tem produzido, acreditamos que temos muito a refletir acerca da necessidade urgente de construirmos uma nova forma de organização para encaminhar os nossos interesses, tendo como princípio fundamental a destruição do capitalismo e dos aparelhos e aparatos tradicionais de representação dos trabalhadores hoje tomados pelo vício e pela burocratização. A auto-organização através da democracia direta com ampla participação a partir de uma metodologia que garanta a elaboração na base, sem a tradicional hierarquização de cargos ou funções, conforme pudemos ver nesse encontro, possibilitaria uma real igualdade, solidariedade e liberdade entre os povos e um espírito de coletivismo. Isto nos daria condições objetivas de construirmos a tão sonhada sociedade sem classes e sem patrões preconizada pelos verdadeiros revolucionários de nossa história.

Essa reflexão, acerca do ocorrido no II Encontro, tem o intuito de esclarecer os fatos e ao mesmo tempo denunciar essa organização (Força Socialista), além de ratificar nosso posicionamento em defesa intransigente do socialismo, do não pagamento da dívida externa, da reforma agrária radical sobre o controle dos trabalhadores, do direito de autodeterminação dos povos, da redução da jornada de trabalho sem redução do salário, do fim da especulação financeira e da estatização do sistema financeiro, bem como das demais reivindicações da classe trabalhadora e dos povos oprimidos pelo sistema capitalista.

Saudações revolucionárias.

Gustavo Curuja – Belém-PA.

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Diplomacia e guerra: dois instrumentos de dominação do imperialismo

 

Desgaste dos estados unidos e competição imperialista

Os anos 2000 apresentaram uma novidade em relação aos anos 90: o neoliberalismo começa a perder sua força política. Os povos do mundo logo fizeram a experiência com essa política ditada por Washington e Londres e a rejeitaram, protagonizando mobilizações importantes como na Argentina, Equador, Bolívia, Venezuela e outros tantos países. Junto com essa perda de legitimidade do neoliberalismo, os Estados Unidos também perderam espaço no mundo com inúmeras manifestações de rechaço à sua política.

A perda de legitimidade do imperialismo estadunidense no mundo foi um fator importante que dificultou a implementação do projeto de dominação. Foram inúmeras dificuldades: América Latina com sucessivas rebeliões, Oriente Médio com uma feroz resistência à invasão tanto no Iraque como no Afeganistão e a rebelião dos Palestinos. Internamente, o imperialismo estadunidense também enfrentou resistências importantes que foram massificadas com a crise econômica.

O desgaste do governo Bush e a invasão a países como Iraque e Afeganistão só fizeram aumentar a oposição dos povos ao imperialismo estadunidense. Esse processo, em conjunto com as mobilizações de massas dos trabalhadores, sobretudo no continente americano, impôs limites para a política de Washington. É neste contexto que a eleição de Obama se explica: os Estados Unidos precisam mudar a sua aparência perante o mundo e se apresentar com um novo governo para recuperar o prestígio e conseguir impor sua política de dominação. A maneira de enfrentar o anti-estadunidismo é se colocar como algo novo e simular que houve mudança na política.

A atual crise econômica e a tendência à depressão também têm colocado graves problemas para as economias imperialistas, pois o seu mercado interno não é suficiente para o escoamento da produção, o que obriga cada um desses países a buscar uma maior presença no mercado mundial. Essa presença precisa ser garantida ou pelas vias diplomáticas ou pelas vias militares.

A crise de superprodução expressa uma contradição básica do capitalismo, que é o fato da capacidade de produção gerar um montante de mercadorias muito superior ao que pode ser consumido. O alto desenvolvimento de técnicas de produção faz com que esse problema se agrave, pois pode se produzir muito mais do que em qualquer outro tempo. É isso que basicamente ocorre na atual crise econômica, há uma restrição no mercado mundial.

Como um conjunto de países centrais tem uma enorme capacidade produtiva e o mercado mundial tem limites físicos (geográficos) e político-econômicos, inicia-se uma feroz competição entre os países imperialistas para ter o controle do comércio mundial. Essa competição é uma das chaves da situação política que a crise econômica fez emergir: os países imperialistas precisam (pelas leis do capitalismo) acelerar a competição e dominar a maior parte possível do comércio mundial.

A competição entre as grandes potências pode resultar em luta direta por mercados, como ocorreu nas duas guerras mundiais. Essas duas guerras não foram outra coisa senão uma disputa pela partilha do mundo, ou seja, aos vencedores caberia a maior fatia do mercado. A guerra em si torna-se também uma das soluções para a superação da crise no capitalismo, pois a destruição massiva de forças produtivas cria novas possibilidades para o mercado capitalista. Ao contrário do que dizem os analistas burgueses, a solução da crise de 1929 não ocorreu pelo new deal estadunidense ou qualquer outra política, mas sim pelo resultado da Segunda Guerra Mundial, que abriu imensas possibilidades para o capitalismo. Ou seja, a “era de ouro” do capitalismo dos anos 50 e 60 se deu às custas da morte de milhões de seres humanos.

 

Estados unidos se preparam para a competição

Nenhuma classe social é homogênea, há distintas frações em seu interior. A burguesia se divide como industrial, comercial, financeira e no interior de cada uma delas há outros setores e também outros interesses. No interior da burguesia industrial há, por exemplo, o setor ligado à indústria armamentista. Entre a burguesia de um país e de outro também há interesses distintos.

Nos momentos em que há uma certa estabilidade, esses diversos setores conseguem fazer uma partilha e amenizar as contradições, ou seja, mantém uma certa unidade. No entanto, quando há uma crise essa unidade fica mais instável e surgem as disputas em que um setor precisa derrotar o outro para sobreviver. Essa disputa ocorre, por exemplo, entre a burguesia industrial e financeira ou ainda entre empresas que produzem o mesmo tipo de produto, como eletrodomésticos. Nessas disputas a insanidade da burguesia se revela. A lógica de sobrevivência da burguesia ameaça o mundo.

A essa disputa soma-se outra questão, que é o aumento da capacidade de produção. É preciso criar um mercado consumidor que seja compatível com o volume de produção. Com a crise econômica em curso – não há ninguém que não reconheça que ela é profunda e muito próxima daquela registrada na década de 20/30 – a disputa entre os diversos setores da burguesia torna-se mais intensa.

É no contexto dessa profunda crise econômica que precisamos compreender o significado da política internacional dos Estados Unidos, sob o governo Obama. Os Estados Unidos sabem que precisarão usar nessa disputa as ações da diplomacia e a pressão sobre diversos governos para conseguir acordos que garantam livre acesso para o capital estadunidense.

E essa crise, pela sua profundidade, já colocou em movimento todos os países na disputa por novos mercados. O desgaste que os Estados Unidos sofreram na América Latina e no mundo fez com que perdessem espaço e se abrisse a oportunidade para outras potências imperialistas. A França e a Rússia, por exemplo, já realizaram importantes acordos comercias na América Latina, tradicional “reduto dos Estados Unidos”. Não é uma disputa que está começando, pois a invasão do Iraque e do Afeganistão na verdade já é parte dessa disputa pela ampliação dos mercados. Com o agravamento da crise o controle sobre matérias-primas como petróleo e gás são fundamentais para reduzir custos e melhorar a posição na disputa.

Já temos discutido com bastante insistência o fato de que a crise estrutural do capital é um elemento fundamental nessa competição imperialista, porque cada saída que o capital apresenta para a crise trás em si limites e novas contradições insolúveis. Uma solução em longo prazo para o imperialismo só é possível com uma guerra que destrua as forças produtivas, condição para um novo “boom” do capitalismo. Manifesta-se o caráter destrutivo do capitalismo, que para continuar existindo tem que matar milhões de pessoas.

 

Com qual política

As armas e formas de disputa sempre são uma questão em aberto, pois dependem essencialmente da correlação de forças entre esses setores da burguesia mundial e também entre o proletariado e a burguesia. Uma guerra, ainda mais quando envolve vários países, sempre é um risco para o capitalismo (ainda que se chegue a algum momento em que, na lógica capitalista, isso se torne impossível), pois há um desgaste do regime e o perigo de que o proletariado, como ocorreu na Rússia em 1917, a transforme em uma revolução socialista.

É por isso que, geralmente, o primeiro instrumento de pressão são as gestões diplomáticas, com todo tipo de pressão política e econômica (como imposição de cotas de importação, aumento de impostos para determinados produtos, etc), mas sempre visando impor o projeto de controle do país alvo. Nesse momento, o governo Obama tem utilizado muito esse instrumento, mas, repetimos, buscando por essas vias concretizar seus interesses. Isso não quer dizer que a via militar tenha sido abandonada, pelo contrário, ela é cada vez mais uma possibilidade. A diplomacia é uma política que se combina com a ação militar. O caráter militar é na verdade a característica central do imperialismo, ou seja, não há imperialismo sem poderio militar. Nas ações diplomáticas já está representado de maneira subliminar o poderio militar de cada país.

Na década de 30, portanto no período da depressão econômica, em um momento em que a Alemanha fazia uma forte ofensiva comercial para a região, os Estados Unidos lançaram para a América Latina a “política da boa vizinhança”, que consistia em ter como centro de suas relações com os países do continente americano as negociações diplomáticas. Ao contrário do discurso do governo estadunidense, essa política não representava uma mudança no conteúdo, mas tão somente na forma em que foram adotadas novas armas e novos mecanismos de pressão. O caso mais famoso foi a imposição de cotas de importação para o açúcar cubano, que era a única fonte de renda de Cuba e tinha os Estados Unidos como o principal cliente. Também se destaca o fato de que, quando a diplomacia não era suficiente para garantir a dominação, a tática militar entrava em ação, como foi a invasão da República Dominicana, e mais tarde da Baia dos Porcos em Cuba, assim como as dezenas de golpes militares que foram patrocinados pelos Estados Unidos.

Outro elemento que contesta a versão de que o novo governo estadunidense dá mais destaque para a diplomacia é a presença de forças militares de ocupação no Iraque e Afeganistão e sucessivos ataques militares a várias regiões do Paquistão. A promessa de redução de parte do contingente militar no Iraque não muda essa caracterização. Em primeiro lugar porque, pela ação militar, conseguiuse constituir no Iraque um governo extremamente servil aos Estados Unidos. E segundo, no Afeganistão houve aumento do efetivo militar. O recente anúncio de que os Estados Unidos vão priorizar a ação política em relação ao Irã é outra balela, pois a simples presença de milhares de soldados nas fronteiras é na prática um elemento que desequilibra qualquer negociação.

Esses são apenas alguns dos elementos que comprovam que a diplomacia é apenas uma (e não a mais importante) das táticas utilizadas e que o aparato militar é elemento fundamental na política do governo Obama. A própria proposta de negociação com o Irã é mais uma jogada, pois como pode haver negociações com a presença de tanques, mísseis e milhares de soldados na fronteira?

O importante é compreendermos que a diplomacia na política dos Estados Unidos está a serviço de uma política de dominação do mundo e não de “formas respeitosas” de relação com outros países. As conferências entre Estados, as reuniões, os tratados, enfim toda a política da diplomacia dos Estados Unidos tem um objetivo muito bem definido que é submeter outros países aos seus interesses.

Não pode restar nenhuma dúvida para os trabalhadores de que a principal política do governo Obama, assim como foi de Bush, é a política belicista. A diplomacia é parte dessa política de expansão dos seus domínios, é um complemento da força bélica.

 

O poder militar dos estados imperialistas

Não é possível falar de Estados imperialistas sem falar de poder bélico. Toda crise provoca um acirramento na disputa pelo mercado mundial, em que o avanço de um significa que o outro tem que recuar. Daí a importância do poder bélico, que é, em última instância, o que decide a correlação de forças em nível mundial.

Nenhuma crise do capital, ainda mais as parecidas com a atual, é resolvida no âmbito da política ou da economia, instrumentos que permitem no máximo adiá-las. Uma característica do conceito de crise estrutural é que sua solução (ainda que pela própria lógica do capital outras crises sempre virão) passa por impor uma derrota histórica ao proletariado mundial, submetendo-o a um regime de trabalho baseado na superexploração em escala mundial. Essa correlação de forças só pode ser alcançada com uma guerra generalizada.

O poder e o forte armamento dos Estados imperialistas visam assim pelo menos três objetivos, que são a manutenção de seu poder na relação com outros Estados, o controle do proletariado e a preparação para possíveis conflitos armados, que são fatos comuns na sociedade capitalista. As disputas políticas e econômicas não raro se resolvem militarmente. Assim, a indústria militar passa a ter nesses países um papel central também na esfera da política.

A relação dos governos com a indústria de armas é tanto econômica como política. É econômica porque são os Estados – que detém o monopólio das armas – que sustentam esse ramo da indústria capitalista. E é política porque a indústria de armas é quem muitas vezes impõe posições belicistas aos Estados. Para se ter idéia da relação orgânica entre Estado e indústria bélica, nos Estados Unidos o Pentágono tem escritório permanente dentro das empresas bélicas, ou seja, funcionários do Estado trabalham dentro das empresas. Também é comum que oficiais de alta patente das forças armadas, quando se aposentam, passem a ocupar postos de direção nas empresas bélicas.

Nessa perspectiva, os Estados têm verdadeiros arsenais de destruição, capazes de jogar pelos ares cada grão de areia que existe no mundo. Na economia capitalista a produção só se efetiva se houver consumo, e como o consumo de armas depende de guerras, torna-se fundamental para a sobrevivência econômica dessa indústria a existência de guerras.

 

O poder militar dos Estados Unidos

Como sempre o discurso é um e a prática é outra. Os dados desmentem facilmente o discurso mentiroso de Obama. Os países imperialistas, em especial os Estados Unidos, são verdadeiras máquinas de guerra. O anúncio do orçamento dos Estados Unidos para o ano fiscal de 2010 (que se inicia em outubro) é uma demonstração cabal, uma vez que destina nada menos do que 664 bilhões de dólares para os gastos militares.

O exército dos Estados Unidos é formado por cerca de três milhões de homens e mulheres, o que representa 1,5% da população dos EUA. Segundo o jornal Brasil de Fato, os Estados Unidos possuem 725 bases militares espalhadas pelo mundo e por volta de 500 mil soldados servindo fora de suas fronteiras, sem falar nos que estão no Iraque e no Afeganistão. As despesas militares passaram de 345 bilhões de dólares em 2001 para 528,7 bilhões em 2006, e agora os recém-anunciados 664 bilhões. Os gastos militares desse país são tão gigantescos que correspondem a 45% de todos os gastos militares do mundo.

Por trás dessa política de Estado (que já é condenável) estão as bilionárias empresas da indústria bélica. Das dez empresas líderes do setor no mundo, seis são estadunidenses. São cerca de 3% do PIB destinados para a defesa. Após a invasão do Iraque e Afeganistão, empresas como Am General, Armor Holdings e Oshkosh Truck, que fornecem veículos militares, aumentaram seus faturamentos em 40%. O controle das empresas é tamanho que várias áreas das forças armadas foram privatizadas, como a administração dos quartéis, sua segurança, abastecimento, etc. Isso sem falar na investidura de funções militares para as milícias. O seu poder não é só econômico, é sobretudo político, com influência em cargos importantes na hierarquia de decisões de Estado.

Com esses dados é possível destacar duas questões fundamentais: a primeira é que a política belicista não é deste ou daquele governo, mas é uma política de Estado e isso significa que Obama vai continuar com a política belicista de Bush. O diferencial é que no governo Obama a diplomacia ganha mais peso, mas como já dissemos, não substitui, e sim reforça a ação militar sobre os povos do mundo. A segunda questão é que esse mesmo Estado está sob controle das empresas do setor de armas e conseqüentemente todas as decisões dos governantes atendem a esses interesses.

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Boletim 19 – Declaração do Espaço Socialista contra os ataques a Gaza

 No dia 27 de Dezembro de 2008 as Forças Armadas de Israel (cinicamente denominadas Força de Defesa) lançaram um ataque contra a população palestina de Gaza, primeiro por meio de bombardeios aéreos, seguidos logo depois por uma invasão por forças de infantaria. Os ataques provocaram até agora, segundo a imprensa burguesa, mais de mil mortes e milhares de feridos. Mas, pelo poderio bélico do exército israelense e pelo seu desejo de sangue, o número de mortos na realidade o número deve ser bem maior. Os ataques atingem pesadamente a população civil, destruindo residências, escolas e hospitais (inclusive da ONU), matando indistintamente homens, mulheres, crianças e idosos. O pretexto alegado para o ataque seria a repressão aos combatentes do Hamas, cujos ataques ao sul de Israel com mísseis caseiros provocaram a morte de 5 civis. Na realidade, foi o exército de Israel quem rompeu o cessar-fogo de seis meses, recusando-se a levantar o bloqueio contra Gaza e atacando integrantes do Hamas no dia 4 de Novembro, data das eleições estadunidenses.

A população de Gaza, cerca de 1,5 milhão de habitantes, se comprime num exíguo território de 360 km², e ao longo dos últimos anos tem sido vítima de constantes incursões armadas do exército israelense, que tem feito das chacinas uma rotina diária. Como se não bastasse isso, a economia da região tem sido asfixiada pelo bloqueio israelense. Os palestinos sobrevivem praticamente às custas da ajuda humanitária internacional. As instalações elétricas e de tratamento de água tem sido sistematicamente destruídas por Israel. Faltam comida, remédios e água potável. Hospitais, escolas e prédios públicos também tem sido atacados e as instituições da sociedade palestina estão em colapso.

O governo do primeiro-ministro israelense Ehud Olmert está paralisado por denúncias de corrupção e enfrentará eleições em fevereiro. Nada melhor para desviar a atenção do público do que mais uma guerra contra os povos árabes.  Desde sua criação Israel desobedeceu dezenas de resoluções da ONU e zombou do direito internacional e das regras democráticas mais elementares, apoiado no seu poderio militar e no respaldo dos Estados Unidos.

A guerra atual também satisfaz a cúpula das Forças Armadas, humilhadas pela derrota frente ao Hizbolá na guerra que devastou o sul do Líbano em 2006. A política israelense é controlada por uma camarilha militar. Os setores da população israelense que são contra a ocupação dos territórios palestinos são socialmente marginalizados e politicamente impotentes. Ex-generais ocupam quase todos os postos importantes na administração civil e estão em todos os partidos. O serviço militar por dois anos é obrigatório para ambos os sexos.  Com uma população de menos de 7 milhões de habitantes, Israel possui um dos maiores e mais bem armados exércitos do mundo, graças também ao apoio incondicional dos Estados Unidos. O recém-eleito presidente estadunidense Barack Obama já sinalizou em sua campanha que manterá esse apoio incondicional.

A constituição de Israel como um Estado teocrático, em que a cidadania é garantida por filiação religiosa e o expansionismo ilimitado é interpretado como um dever religioso fundado na Bíblia, obedeceu aos interesses dos Estados Unidos de criar um enclave no Oriente Médio, região rica em petróleo. A formação de um tal Estado não teve nada a ver com a luta dos judeus contra o anti-semitismo que os perseguiu durante séculos e que teve sua culminação no Holocausto perpetrado pelos nazistas. Hoje Israel conduz seu próprio Holocausto contra a população palestina.

Os 1,5 milhão de palestinos que vivem em situação de miséria e degradação em Gaza são parte dos mais de 4 milhões de palestinos expulsos de suas terras desde a formação de Israel em 1948 e obrigados a viver como párias e mendigos em campos de refugiados no Líbano e na Jordânia. Nesses mais de 60 anos os palestinos tem sido expulsos de suas terras, privados do acesso à água e às condições elementares de vida. Seus líderes tem sido encarcerados, torturados e mortos. Os palestinos tem sido sistematicamente descritos pela mídia como fanáticos e terroristas, enquanto Israel, uma ditadura militar governada por religiosos de extrema-direita, é apresentado como farol da democracia no Oriente Médio.

Israel e seu mandante, os Estados Unidos, posam de defensores da democracia, mas se recusam a reconhecer o Hamas, que foi democraticamente eleito para administrar os territórios palestinos. Ao invés disso, reconhecem como dirigente dos palestinos o empresário Mahmoud Abbas (que fornece cimento para a construção dos muros israelenses na Cisjordânia), do corrupto partido Fatah. O imperialismo e a mídia querem fazer do Hamas o culpado pelas mortes. Para isso contam com a colaboração dos governos burgueses dos países árabes, em especial do Egito e da Arábia Saudita, marionetes servis do imperialismo, opressores ferozes de seus povos e temerosos da ascensão de grupos radicais islâmicos.

Nós do Espaço Socialista discordamos da linha política do Hamas e de outros grupos e governos fundamentalistas islâmicos, bem como discordamos do terrorismo como método de luta. Como socialistas, consideramos que apenas a mobilização e a auto-organização dos trabalhadores pode trazer uma solução para o povo palestino. Entretanto, reconhecemos o direito dos palestinos à resistência armada e repudiamos a agressão israelense. O governo de Israel repete os nazistas e a luta dos palestinos em Gaza repete a luta dos judeus no gueto de Varsóvia.

A solução dos problemas do povo judeu não está na formação de um Estado Nacional baseado na expulsão e massacre de outro povo. Essa falsa solução transformou o povo judeu, antes elemento de progresso e cultura, em instrumento da barbárie. O povo judeu, que produzia gênios humanistas e cosmopolitas como Marx, Einstein e Freud, depois da criação de Israel passou a produzir monstros como Ariel Sharon, que não deve nada em crueldade aos carrascos nazistas. O nacionalismo e as guerras apenas beneficiam as classes dominantes. São sempre os trabalhadores e o restante do povo que morrem e sofrem, seja nas trincheiras, seja como vítimas dos danos colaterais.

Uma coisa é o povo judeu no mundo inteiro, os trabalhadores judeus, seu passado, sua cultura, sua luta, a tragédia do Holocausto; outra coisa é a burguesia judia e seu Estado de Israel, uma entidade política que não foi criada no vazio, mas construída sobre a base da expulsão, massacre, tortura e degradação de outro povo, que não tem o objetivo de proteger os judeus que para lá foram atraídos, mas de cravar uma adaga no coração do Oriente Médio a serviço da burguesia internacional, em especial estadunidense, judia e não-judia, ligada ao complexo industrial-militar e ao setor petrolífero.

A burguesia judaica estadunidense, que controla parte das finanças e da mídia do principal país imperialista, continuará tranquilamente instalada em Wall Street e em Hollywood, beneficiando-se da pilhagem capitalista do restante do mundo, promovendo uma guerra na qual os outros irão morrer e sofrer, explorando sentimentos religiosos e promessas bíblicas em pleno século XXI. A solução dos problemas dos trabalhadores do mundo inteiro não está nas guerras entre povos por falsos pretextos como religião e territórios, mas na guerra de classes contra a burguesia, pela destruição do capitalismo e pela emancipação humana de todas as formas de alienação.

Não somos contra o povo judeu, somos contra a burguesia e o capitalismo mundial. Somos a favor dos trabalhadores, sejam eles judeus, muçulmanos ou cristãos, na Palestina e no restante do mundo. O Estado de Israel é uma armadilha para os próprios trabalhadores judeus, obrigados a viver em guerra constante contra seus vizinhos palestinos e árabes. Só pode haver paz na região para os trabalhadores judeus e palestinos por meio da derrubada desse Estado e de sua ditadura militar-religiosa e pró-imperialista. Isso só pode acontecer por meio de uma revolução socialista conduzida pelos trabalhadores judeus e palestinos. Defendemos portanto o fim do Estado de Israel e a formação de um Estado palestino laico e multi-étnico, governado por organizações dos trabalhadores judeus e palestinos.

Exigimos o fim dos ataques israelenses a Gaza, o fim do bloqueio econômico aos territórios palestinos. Defendemos o direito dos palestinos de se auto-organizarem e se defenderem da agressão israelense.

O governo Lula, coerente com seu caráter burguês e pró-imperialista, mantém uma ocupação no Haiti por tropas brasileiras tão criminosa quanto a de Gaza por Israel. O governo brasileiro criou um incidente com o Equador para proteger as transnacionais brasileiras associadas ao capital imperialista naquele país. Entretanto, esse mesmo governo se recusa a romper com o Estado terrorista de Israel, que promove crimes contra a humanidade em Gaza. Os trabalhadores brasileiros precisam ser solidários aos seus irmãos no mundo inteiro e isso significa se colocar contra o governo Lula. Os trabalhadores precisam se mobilizar para exigir a retirada das tropas brasileiras do Haiti, a ruptura das relações diplomáticas com Israel, o fim dos acordos comerciais do Mercosul com aquele país, e também construir a mais ampla defesa e solidariedade internacional para com o povo palestino.

Fora as tropas isralelenses da Palestina!

Fora as tropas estadunidenses do Iraque e do Afeganistão!

Por uma Palestina laica, multi-étnica e socialista!

Por uma Federação Socialista dos Povos do Oriente Médio!

Espaço Socialista, Janeiro de 2009

 

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