Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

Construindo o novo internacionalismo

Vivemos uma época dominada pela produção de mercadorias. A acumulação capitalista acontece em escala mundial, a uma velocidade crescente, controlada pelas corporações e os investidores transnacionais.

            A ação dessas corporações monopolistas mundializadas visa elevar a lucratividade desse setor do capital, procurando responder à crise que se abateu de modo persistente sobre esse sistema desde os anos 70. Para tanto, contam com a ajuda de agências internacionais como a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM), cuja atividade junto aos Estados Nacionais tem levado à adoção de medidas que tem o objetivo de dar maior liberdade ao grande capital, para transitar por onde lhe interesse, explorando pessoas e recursos naturais de forma ainda mais intensa.

            Os efeitos da mundialização econômica se expandem pelo tecido de sociedades e comunidades do mundo e integram seus povos em um gigantesco sistema único, voltado à extração do lucro e ao controle dos povos e da natureza. O movimento hierarquizado do capital tem retirado o acesso à produção dos meios de vida de amplas camadas populacionais, inclusive nos países ditos desenvolvidos, criando situações onde a convivência entre as elites e os setores sociais desprivilegiados tem se dado pela mediação crescente da repressão policial, tornando a vida cotidiana um fardo muitas vezes insuportável.

            Mas é de nossa resistência que queremos tratar. Neste aspecto, é necessário criar situações reais de confronto com as relações de mercado, baseadas na cooperação e na solidariedade em lugar da competição e do lucro. Na prática, significa constituir diferentes formas de organização, fundamentadas na democracia direta, capazes de responder aos problemas do cotidiano.

            Estas novas formas de organização autônoma deverão emergir de e se enraizar em comunidades locais, enquanto ao mesmo tempo pratica a solidariedade internacional, pois na medida em que o capital reafirma seu caráter mundial, temos que responder-lhe à altura.

         É preciso unidade entre as diferentes formas autônomas de organização dos povos, a fim de conformar as resistências locais no âmbito de um movimento total para a superação do capitalismo em nível mundial. A Ação Global dos Povos é, neste sentido, um dos momentos da necessária conexão entre os movimentos de base. Mas não pode ser o único. Na verdade, devem ser infinitos os momentos de interligação horizontal desses diversos movimentos populares, de acordo com os objetivos comuns a que se proponham.

            Nesse espaço de interação não há lugar para o sectarismo, pois não se trata de levar às últimas conseqüências a defesa de um programa fechado que levará a humanidade ao “mundo novo”. Mas trata-se de buscar o entendimento a partir da diferença. Abrir espaço para a diversidade cultural e nela encontrar a melhor maneira de gerir a vida, livre do mercado e do Estado.

Se queremos construir relações diretas entre as pessoas, livres da dominação do dinheiro, a hora é agora. Não podemos esperar que uma guerra civil nos coloque o poder nas mãos. O poder do povo não está acima, mas entre nós. Sendo assim, nossa revolução já está em curso; resta-nos propagar essa mudança de atitude.

(*) Os trechos em itálico foram extraídos do manifesto da AGP, aprovado na sua 2ª Conferência Mundial, realizada em agosto de 99, em Karnataka, Índia.

 

                                                            André Vasconcelos – membro do coletivo contraacorrente.

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A contra-revolução que foi longe demais

A poeira do muro derrubado em 89 vai baixando lentamente, podemos então começar a distinguir algumas correntes do  pensamento marxista em meio aos escombros da crise política desencadeada pelos acontecimentos na  antiga União Soviética e leste europeu.

As interpretações do processo são as mais variadas, não é nossa intenção nos deter sobre elas, mas buscando entender os novos posicionamentos que surgem na vanguarda militante temos que discutir o significado do que desencadeou tanta polêmica e novas elaborações.

A contra-revolução  consumada no final dos anos vinte na União Soviética pela burocracia stalinista, resultou em seis décadas de opressão. Ao se apropriar das vantagens da planificação econômica, que tirou do atraso secular o povo russo, essa burocracia conseguiu estabilizar o seu regime político, apoiada ainda num sistema repressivo brutal  contra qualquer tentativa de organização operária independente ou oposição política.

As conseqüências para o proletariado soviético de um período tão longo de dominação burocrática  não poderiam ser mais nefastas. Foram duas gerações cultivadas no mais completo obscurantismo político e ideológico, na total ausência de iniciativa e organização política independente. A contra-revolução só se sentiria segura quando aniquilasse a consciência revolucionária e de classe do proletariado russo.

DERROTA NA VITÓRIA

Por mais que tenha se estendido ao longo do tempo, ( em parte também devido a heróica resistência e posterior vitória do povo soviético contra o nazismo que trouxeram enorme prestígio para o PC) o regime da burocracia contra-revolucionária só poderia ser transitório, sua vitória final também seria sua derrota, seu desaparecimento enquanto intermediário do capitalismo. A ausência de uma alternativa revolucionária frente a derrocada desse regime obscurantista só pode ser compreendida dessa forma: como um proletariado derrotado, desorganizado, poderia ser o dirigente político das mobilizações anti-burocráticas  levantando o programa da revolução socialista? Seria um verdadeiro milagre.

Um aspecto ainda mais grave dos acontecimentos soviéticos, é que a contra-revolução estendeu sua influência ao movimento revolucionário no mundo. Primeiro nos partidos comunistas que permaneceram atrelados a III Internacional, e mesmo as organizações marxistas que buscavam se contrapor ao stalinismo não escaparam da influência dos novos métodos dos vitoriosos.

Foi assim que o centralismo democrático, ferramenta das mais potentes para levar adiante o combate da classe trabalhadora contra o imperialismo, foi transformado em centralismo burocrático, em mandonismo, em cupulismo, em dirigismo e etc. O partido revolucionário, entidade de libertação dos trabalhadores, dos subalternos, a verdadeira universidade operária, exercício de democracia mais autêntica, construído na estratégia de fomentar o fim da diferença entre dirigentes e dirigidos, se transforma em aparato, em superestrutura política, onde a divisão de tarefas se consolida entre os guias geniais, e os simples executores. Muito distante do partido sonhado por Gramsci, que assim o definia em um artigo do L´Ordine Nuovo de 1920, “O Partido Comunista é o instrumento e a forma histórica do processo de íntima libertação pela qual o operário passa de executor a iniciador, passa de massa a dirigente e guia, passa de braço a cérebro e vontade; na formação do Partido Comunista pode-se colher o germe de liberdade que terá o seu desenvolvimento e a sua plena expansão quando o Estado Operário tiver organizado as condições materiais necessárias.”

UM RESGATE NECESSÁRIO

Se tomamos essas mudanças no movimento marxista mundial, como resultado histórico da vitória da contra-revolução, concluímos que o resgate do Partido e do seu método, o centralismo democrático,  são decisivos para recolocar o proletariado no centro da luta mundial contra o capitalismo. Mais ainda, considerando o atual estágio de centralizaçao e militarização do imperialismo, e a crescente degeneração capitalista com a violenta exclusão social, podemos prever um endurecimento cada vez maior dos embates, e a necessidade de uma verdadeira disciplina fundada na relação de confiança entre revolucionários. Os que imaginam arranhar o poder do capital com manifestações que atrasam em algumas horas encontros de organismos financeiros internacionais, são coerentes ao defender “organizações horizontais”, e que “a força do movimento  independe de quem esteja em sua direção”.

Não se pode falar de socialismo, de revolução e luta de classes, sem discutir organização a sério. Não temos nenhuma pretensão a descobridores ou inventores de novas teorias,  o marxismo-leninismo nos legou um arsenal suficiente, como seus discípulos nos cabe desenvolve-lo e impulsiona-lo. Em “Um Passo  em Frente, Dois Passos Atrás”, Lenin apontou os elementos fundamentais da organização que seria a dirigente do processo revolucionário de 1917 na Rússia. Esclarece confusões que vêm a tona hoje em dia, com a roupagem moderna das relações horizontais com a classe, quando definia que “Se considerarmos membros do partido apenas os aderentes às organizações que reconhecemos como organizações do partido, então as pessoas que não possam entrar diretamente em nenhuma organização do partido podem, no entanto, militar numa organização que não seja do partido, mas que esteja em contato com ele. Por conseqüência, não se trata de modo algum de deitar pela borda fora ninguém, isto é, afastar do trabalho, da participação no movimento. Pelo contrário, quanto mais fortes forem as nossas organizações do partido, englobando verdadeiros comunistas, quanto menos hesitação e instabilidade houver no interior do partido, mais larga, mais variada, mais rica e mais fecunda será a influência do partido sobre os elementos das massas operárias que o rodeiam e por ele são dirigidos. Com efeito, não se pode confundir o partido, como destacamento de vanguarda da classe operária, com toda a classe.”

O movimento extremamente progressivo  de negação das práticas espúrias do stalinismo e da influência que exerceu no movimento operário, não pode nos levar ao exagero ou ao invencionismo, mesmo porque os acontecimentos de 89 na antiga União Soviética demonstraram de forma cabal a falência do modelo fundado pela contra-revolução, parteira da restauração capitalista em curso, abrindo um novo tempo para o movimento operário, um tempo de reafirmação de nossos princípios, confirmados pelo passado e pelo presente.

Ney – militante do Coletivo Bandeira Vermelha – Rio de Janeiro, 03/07/2000.

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Sobre o critério de partido

Como os leitores que nos acompanha devem ter percebido no último número havia um artigo por  escrito em que colocava sobre o governo PTista aqui do MS este artigo provocou por parte dos companheiros do PSTU uma resposta que também esta sendo publicada neste número. O artigo dos companheiros tenta explicar porque os companheiros apoiaram e continuam a apoiar a idéia da frente dos trabalhadores para as eleições, digo continuam a apoiar porque acabaram de fechar um acordo eleitoral com o PT  para as eleições municipais que agora  se aproxima tal  política é ainda pior o que demonstra o grau e adaptação a democracia burguesa que este partido vem sofrendo pior porque se em 1998 o PT podia cumprir um papel de oposição as oligarquias e as elites papel esse mesmo na época já questionável agora é indefensável ainda mais com os partidos coligados que vai  inclusive a direita sua desculpa agora é que na ”coligação proporcional”  não esta presente os partidos burgueses.

Daí começamos a perguntar como se caracteriza um partido burguês ou operário???? Gostaríamos de perguntar aos companheiros qual é o critério  que se caracteriza o PT como partido operário ? Segundo algumas definições clássicas o PT já não é a muito tempo um partido operário . Vejamos como definir um partido operário se sua direção é uma direção burocrática que funciona como um colchão entre o movimento e o capital basta lembrar-mos da greve da Petrobrás onde Lula o máximo dirigente do partido agiu literalmente como um fura greve, sua política de defesa do capital não se pode chamar de socialista ou operária é na melhor das hipóteses e com muitas boa vontade uma política de desenvolvimento do capital, ou seja , uma ideologia burguesa reacionária que não é possível de realizar  na atual etapa de desenvolvimento do capital. A base desse partido e aqui é bom lembrar que não é só o PT mais também os chamados partidos da esquerda com mediações é cada vez menos operaria e popular e cada vez mais de funcionários do aparato sindical e agora diretamente  do estado burguês. Chegamos a uma encruzilhada para caracterizar tais partidos como operário para justificar sua política  o  PSTU  chega a brilhante  caracterização de que o PT e não só o  PT  mais inclusive o PC do B  são partidos operários porque as  massas tem confiança, continuam seguindo-os e votando nesses partidos a perguntamos em nosso pais o Getulismo teve muito mais base social no movimento operário e nem por isso o caracterizamos com sendo um movimento operário , Mussoline ídem , se ter a confiança das massas é um critério temos que dizer que todos esses populista  também são representantes da classe operária.

   O que esta em jogo na verdade é a esquerda tradicional e ai  também incluso a ultra esquerda esta empreeguinado de desvios eleitorais e no fundo estão preocupados em eleger vereadores e parlamentares e em alguns casos em não se enfrentar com a burocracia . Ao definir sua política como de exigências se denuncias na verdade fica somente na exigência nua e crua.

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O nascimento de um novo movimento operário

O velho movimento operário está em crise e em crise terminal. Aquele movimento operário surgido após a segunda guerra, baseado nos grandes sindicatos, nos partidos parlamentares ditos operários e numa estratégia nacional de luta já não consegue, de nenhum modo, dar respostas aos problemas atuais. Este era um modelo próprio ao período de prosperidade do capitalismo (1945-73), no qual as organizações operárias compunham o esforço de reconstrução do capitalismo (na Europa) ou de modernização retardatária (como na América Latina). Particularmente em nosso continente, a função modernizadora (nacional-desenvolvimentista) da antiga estratégia do movimento, sob controle ou não dos velhos PCs ou outras correntes nacionalistas, baseava-se fundamentalmente na idéia de um desenvolvimento nacional independente a partir de um papel soberano do Estado, o qual deveria participar da economia, desenvolvendo-a e distribuindo rendas. Era uma função histórica semelhante ao que cumpriam, na Europa, os partidos socialistas e comunistas e suas centrais sindicais.

A mundialização da economia que nada mais é do que o controle do mercado mundial por imensas corporações transnacionais deu uma imensa liberdade de movimento ao capital, representando um poder frente ao proletariado ao qual este não pode se contrapor senão superando completamente a estratégia e os métodos de luta tradicionais. Sob este aspecto, o que está em crise não é uma ou outra experiência de luta proletária, uma ou outra corrente política: mas o conjunto do antigo movimento operário, em todos os cantos do mundo.

Como basear a luta proletária nas lutas de categorias, quando a condição para a implantação das sedes das transnacionais são precisamente os baixos salários? Como basear nos sindicatos a organização da classe, se a maioria da classe está desempregada ou em situação precarizada? Como buscar politizar as lutas proletárias e populares tendo como alvo central os governos e Estados nacionais, se o poder real hoje (inclusive no que toca à legislação trabalhista, ambiental, científico-tecnológica etc) está não mais nos Estados nacionais, mas, nas corporações monopolistas transnacionais e suas instituições (OMC, BM, FMI e acordos comerciais regionais)?

O que explica o esvaziamento das antigas formas de organização e de luta de massas, e inclusive a crise das correntes políticas, é, antes de tudo, essas mudanças na realidade e a incapacidade do movimento tradicional de corresponder às novas exigências.

O interessante, no entanto, é que, na crise, está nascendo um novo movimento operário. A manifestação em Seattle (EUA), em novembro do ano passado, durante a abertura da nova rodada do milênio da OMC é um exemplo disso. 5O mil pessoas, de diversas partes do mundo e de diversos setores sociais, atrasaram, durante duas horas, o início da reunião; presidentes e ministros de diversas partes do mundo ficaram presos nos hotéis, sem segurança para saírem; outros, só entraram no Teatro Parammount, onde se realizaria a abertura oficial do evento, pulando janelas, como ladrões de galinha; Clinton foi aconselhado a adiar a decolagem de seu avião. Nas ruas, completamente ocupadas pelas massas, as pessoas festejavam a demonstração de força popular. Uns cartazes diziam: Fechamos a OMC! Um jovem trabalhador, fotógrafo, declarava ao repórter do Le Monde Diplomatique: Viemos aqui porque não queremos mais ser tratados como coisas. Não somos mercadorias. Quem estava lá? Jovens trabalhadores, sindicalistas alternativos, ecologistas, movimentos de mulheres, movimentos de gays e lésbicas, estudantes, pescadores, pequenos agricultores, movimentos de direitos humanos… O que reivindicavam? Contra os baixos salários, o desemprego, o trabalho infantil, o trabalho escravo no Terceiro Mundo, a extinção das tartarugas… E reivindicavam contra quem? Contra a OMC que, segundo afirmavam, é o verdadeiro poder das corporações… A força do movimento foi tão grande que, durante três dias, a Prefeitura local decretou toque de recolher a partir das 18 horas! O interessante, no entanto, é que este não foi a única manifestação. No mesmo dia, 30 de novembro, os sindicalistas e ambientalistas oficiais também fizeram uma pequena, sem massa, em local e ritual acordado com as autoridades… Neste cenário, defrontaram-se claramente o novo e o velho movimento operário.

A organização da manifestação de Seattle se deu a partir das iniciativas dos movimentos que compõem a AGP (Ação Global dos Povos). A AGP é uma articulação mundial, que congrega de forma horizontal e não-hierárquica, movimentos autônomos dos cinco continentes; sua estratégia principal é a unificação na ação e na reflexão dos movimentos de base que, independentes dos Estados e poderes econômicos, se baseiem na democracia direta e na ação direta tendo como alvo o combate mundial ao poder do capital transnacional. Antes dessa manifestação de Seattle, já havia impulsionado a manifestação de fevereiro de 98, em Genebra, durante a reunião do G-7, e, em 18 de junho do ano passado, um dia de luta internacional contra os centros do capital financeiro. A sua próxima atividade é o chamado a realizar em 1º de maio próximo uma nova Ação Global Contra o Capitalismo.

O que há de novo nessa experiência é tanto uma nova estratégia, como novos métodos de organização e ação. Uma estratégia anticapitalista que é inseparável do internacionalismo; um método de luta baseado na ação direta, que é inseparável da autonomia das formas de organização de base. Fundamentalmente, o que esta nova experiência demonstra é a possibilidade de ultrapassarmos positivamente o corporativismo e o nacionalismo, como também a idéia de que a força do movimento depende de quem está na sua direção. Essas novas formas de movimento, no centro e na periferia do movimento, está buscando se basear na auto-organização, numa relação horizontal, sem a velha divisão de trabalho entre dirigentes e dirigidos, especialistas e executantes. Busca ultrapassar a idéia do combate econômico centrado no salário e demonstra que o domínio da economia sobre a vida humana é que é o problema, e problema que se manifesta em todas as áreas da vida social: os direitos humanos, a cultura, a opressão sobre as mulheres, o trabalho infantil, a crise ecológica… como também sobre o desemprego, os baixos salários, os direitos trabalhistas. Está questionando, portanto, o próprio mercado: a mercantilização da vida, das pessoas, da cultura… E não tem mais a ilusão de que o poder está nos Estados nacionais: como tornou-se visível, o Estado não pode mais ser a via pela qual busquemos a emancipação da humanidade; do que se trata, como diz o manifesto da AGP, é colocar nas mãos dos povos os poderosos meios de vida que hoje estão nas das corporações, estabelecendo relações igualitárias e solidárias, sem o objetivo de lucro.

Será que conseguiremos aprender com as novas experiências, nós que viemos de uma tradição marxista que privilegiou sempre as formas tradicionais do movimento operário? Nós que, a despeito do nosso internacionalismo professado, buscamos sempre basear nossos esforços numa estratégia de luta pela tomada do poder de Estado nacional? Nós que sempre acreditamos que o central era nos catapultarmos como direção dos trabalhadores e construirmos nossas próprias organizações dirigentes? Será que não está na hora de estabelecermos uma relação horizontal com o restante da classe, tendo em vista contribuirmos para a sua auto-organização? Não estará na hora de buscarmos dar essa contribuição através das múltiplas formas que o próprio movimento espontâneo da classe está nos apontando: o trabalho de cultura proletário, grupos operários autônomos, organizações autônomas dos precarizados etc? Enfim, não estará na hora de compreendermos na sua radicalidade a afirmação de que a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores?

João Emiliano- militante do Contra a Corrente Fortaleza- CE.

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Luta de categoria ou luta unitária dos explorados?

 

( considerações sobre a greve dos professores de São Paulo)

A greve dos profissionais da educação da rede estadual por 43 dias, que ocorreu no mesmo período que a greve dos trabalhadores da saúde, universidades, ETE´s e paralisação dos metroviários, foi  marcada por uma dura realidade: a falência do padrão de lutas de categoria corporativas e centradas na reivindicação salarial ou na melhoria da carreira.

Torna-se impossível saber com certeza qual foi a adesão ao movimento, tanto pela sua oscilação constante, quanto pela utilização manipulatória – pelo governo e pelo sindicato (APEOESP) – dos números da paralisação. As estimativas em momentos de crescimento falavam de 50% com muita desigualdade, principalmente entre o interior do estado, onde a adesão foi maior, e a região da capital e ABCD em que a greve foi um fiasco.

Nos últimos 10 dias as assembléias regionais e até a estadual já expressavam o fim da greve com o esvaziamento quase total e o retorno ao trabalho de quase todos os professores.

A intransigência do governo Covas – ao se recusar a negociar com os professores, ao colocar a tropa de choque para impedir ou intimidar as assembléias, nas diversas provocações ao movimento e, depois da greve, em descontar os dias parados e impor um calendário de reposição – expressa o interesse em preservar acima de tudo a garantia da manutenção das remessas de juros da dívida externa e a necessidade de manter as escolas como instrumento de contenção social.

Essa intransigência do governo de São Paulo, que também se demonstrou na desocupação em Guaianazes, se enquadra numa ofensiva nacional (prisão e assassinato de sem-terras) e até mundial de repressão aos movimentos sociais. Essa repressão se impõe com mais facilidade sobre os movimentos isolados, ao não serem capazes de despertar as energias dos imensos contingentes de proletários, cuja participação poderia mudar totalmente o rumo dos acontecimentos.

A DECADÊNCIA DO ENSINO PÚBLICO E DO MOVIMENTO SINDICAL…

 

Nas escolas enfrentamos desde os problemas com a falta de materiais pedagógicos, passando pelo despreparo e desmoralização de muitos profissionais até a acomodação com a crescente violência instalada ao nosso redor, o desânimo,  o baixo nível de ensino e falta de perspectiva e de interesse aos estudos de nossos jovens.

Nos últimos quatro anos foram demitidos mais de 60 mil professores e aumentou a fragmentação da categoria (efetivos, estáveis, ACT’s, substitutos, eventuais, monitores, etc). Milhares de novas demissões estão previstas para o próximo ano com a Reforma do Ensino Médio. Desenvolve-se uma campanha permanente de incentivo à competição entre escolas e professores, sobre quem pesa, além de tudo, o mecanismo da avaliação anual de desempenho.      

O desemprego e a fragmentação das categorias, a mundialização da produção e dos movimentos de capitais financeiros são os fatores objetivos que levaram as lutas de categoria à decadência. Foram reações dos empresários e governos de diversos países no sentido de aumentar a exploração e a dominação sobre os trabalhadores, dificultando sua resistência.

Mas, não podemos nos esquecer da ação e da ideologia desenvolvidas pelas direções sindicais que foi de aceitar e até implementar junto com  os empresários e o governo  suas principais políticas.

A perda de referências e alternativas geradas por essas mudanças enfraqueceram as antigas formas de luta. Acentuaram-se então o individualismo e a ideologia de que só resta nos submeter e aceitar, “se não, é pior”.

O padrão anterior, de lutas de categoria, que se desenvolveu nos anos 70 e 80, também teve como problemas a adaptação e dependência frente ao poder de Estado. Os sindicatos foram criados à imagem e semelhança do estado e neles predominam relações centralizadoras, burocráticas e corrompidas.

Mesmo que esse tipo de movimento e de estrutura, com todos os problemas, tenham obtido conquistas nas décadas anteriores, mostram-se completamente ultrapassados e impróprios para enfrentar os desafios atuais.

No caso dos professores e do funcionalismo público, também foi reproduzida a relação impositiva com os alunos e pais. Isso tudo se expressa quando uma greve é decretada e conduzida de cima para baixo, não considerando os diretamente afetados (professores, pais e alunos).

Ao insistir na questão salarial, como eixo da pauta,  ao invés das condições de ensino, mesmo depois de perder essa votação em assembléia, a direção do sindicato e parte da “oposição” prejudicaram nosso movimento em três aspectos: deram ao governo e à imprensa burguesa o argumento para limitarem nossa luta à  reposição dos 54%; jogaram parte da população contra o movimento e contrariaram os professores, que entraram em greve visando centralmente a luta contra o corte de aulas (Reforma do Ensino Médio) e a precarização geral do ensino.

BUSCANDO NOVOS CAMINHOS…

Com tudo isso, hoje os problemas que nos afligem são muito maiores do que o salário. A luta a ser travada necessita romper com as fronteiras da luta de categoria  colocando-se como luta da classe trabalhadora, tendo como primeiro passo a união das comunidades (professores, alunos, pais e demais trabalhadores). 

A total degradação do ensino público, que é também da saúde pública, do transporte e da moradia que atendem aos trabalhadores, desempregados e seus filhos nos empurram aos guetos e ao aprofundamento da miséria na periferia.

É necessário um novo padrão de luta e organização que permita e desenvolva as iniciativas de romper com a passividade e a representatividade em cada escola e bairro. 

A união de professores, alunos e pais numa luta pela ocupação democrática do espaço da escola, tanto no cotidiano das aulas como nos finais de semana; as iniciativas de auto-organização como oficinas de Hip-Hop (rap, grafite, street dance) teatro, capoeira, etc são importantes para desenvolver o senso de solidariedade e consciência de classe em nossas comunidades.

O desenvolvimento dessas e de outras práticas comunitárias e solidárias pode se constituir como ponto de apoio para novas lutas contra a degradação do ensino público, pelo aumento das verbas e  pelo direito de decidirmos coletivamente sobre o seu uso.    

Com a extensão desse movimento se desenvolverão novas formas de intercâmbio e coordenação entre as comunidades e com outros movimentos sociais.     

Assim, estaremos ao mesmo tempo lutando contra o capitalismo e buscando construir os germes de uma nova sociedade.

 

Iri, Alex, Neu e Re – ( ABC- SP )

 

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Acumulação flexível e educaça flexível

Objetivamos mostrar a intrínseca relação entre as transformações no capitalismo e o papel atribuído à educação. Essa análise leva em consideração o “grau de controle que logrou deter a grande burguesia sobre as crises cíclicas do capitalismo” (consciência adquirida a partir de 1929) como também a substituição dos sistemas de organização do trabalho taylorista e fordista pelo toyotista. Partimos das mudanças ocorridas na organização do trabalho provocadas pelo avanço tecnológico a partir dos anos 1970. O avanço tecnológico alterou o padrão produtivo e introduziu a acumulação flexível, substituindo o taylorismo e o fordismo pelo toyotismo.

A acumulação flexível, como resultado da taxa decrescente do lucro e, consequentemente, da dificuldade da realização do capital, aumentará exponencialmente a taxa de exploração dos trabalhadores, e ainda assim não inverterá ou evitará a diminuição da taxa de lucro, pois se trata de uma crise no seio da estrutura de funcionamento do sistema capitalista.

Por isso, a diminuição do emprego, dos salários e das condições de trabalho não são  fatos esporádicos no capitalismo, e sim parte do movimento do capital.

O desemprego deixa de ser um fator de crise e converte-se “… agora em um dos elementos do processo de controle das crises que aciona o mecanismo de desaquecimento da economia como forma de mantê-la ajustada às relações sociais vigentes, comandadas pelos interesses do sistema financeiro internacional.” (SAVIANI, Dermeval.In: Capitalismo, Trabalho e Educação, p.22)

 

O papel atribuído a educação

A educação passa a se submeter diretamente às condições de funcionamento da economia capitalista, pois o trabalho pedagógico articula-se com o processo do trabalho capitalista, se constituindo no toyotismo “em forma de disciplinamento para a vida social e produtiva no capitalismo.”

Esse disciplinamento “configura-se como uma transformação intelectual, cultural, política e ética, uma vez que tem por objetivo o desenvolvimento de uma concepção de mundo tão consensual quanto seja possível, tendo em vista as necessidades de valorização do capital.” (KUENZER, Acácia Zeneida. In: Trabalho, Educação e Capitalismo, p.82)

O que se pretende é formar “um povo manso e resignado, respeitoso e discreto, um povo para quem os patrões sempre tenham razão.” Ou seja, “um povo ideal para uma burguesia que só aspira resolver sua própria crise.” (PONCE,  Aníbal. In: Educação e Luta de Classes, p.173)

O disciplinamento é necessário uma vez que a educação assume, de acordo com as necessidades do mercado, o princípio da flexibilidade como condição para produção segundo a demanda. “Isso gera a necessidade não mais de produzir estoques de mão-de-obra com determinadas competências para responder às demandas de postos de trabalho – cujas tarefas são bem definidas -, mas para formar trabalhadores e pessoas com comportamentos  flexíveis, de modo que se adaptem, com rapidez e eficiência, a situações novas, bem como criarem respostas para situações imprevistas.” (KUENZER, Acácia Zeneida. In: Trabalho, Educação e Capitalismo, p. 87)

E não apenas isso, forma-se uma mão-de-obra que ora pode ser utilizada, ora pode ser parcialmente descartada ou totalmente descartada, de acordo com as necessidades do mercado, ou seja, mão-de-obra flexível.

Dessa forma, a escola deverá formar alunos com um repertório, ou seja, com competências e habilidades que possibilitem-no fazer escolhas. Uma aprendizagem para a inserção no mundo produtivo e solidário, e que se adapte a essa lógica flexível.

Além disso, o disciplinamento procura eliminar a existência de classes sociais e da luta de classes. Com a terminologia de parceiros sociais, a escola esconde o que sempre pretendeu a burguesia: ocultar a existência de classes sociais e da luta de classes para não ocorrer uma reação por parte dos trabalhadores contra a precarização econômica, e para aceitarem a “realidade como ela é”, evitando qualquer possibilidade de mudança.

 

Exclusão incluente e inclusão excludente

O toyotismo na educação e no trabalho tem como um dos objetivos o aprofundamento da separação entre trabalhadores e dirigentes, e entre trabalho intelectual e trabalho instrumental. Também entra em cena um processo de “exclusão incluente”, em que verificamos a exclusão do trabalhador do mercado formal, com direitos assegurados e a inclusão em condições de trabalho precárias. Dessa forma, os trabalhadores são desempregados e reempregados com salários rebaixados, muitos contratados por empresas terceirizadas, desempenhando a mesma função e ganhando menos ou indo para a informalidade. Com isto, o setor reestruturado se alimenta e mantém sua competitividade através do trabalho precarizado.

Essa lógica, do ponto de vista da educação, produz uma outra lógica na direção contrária, a “inclusão excludente”. Ou seja,“as estratégias de inclusão nos diversos níveis e modalidades da educação  escolar aos quais não correspondem os necessários padrões de qualidade que permitam a formação de identidades autônomas intelectual e eticamente, capazes de responder e superar as demandas do capitalismo; ou, na linguagem toyotista, homens e mulheres flexíveis, capazes de resolver problemas novos com rapidez e eficiência, acompanhando as mudança e educando-se permanentemente.” (KUENZER, Acácia Zeneida. In: Trabalho, Educação e Capitalismo, p. 92)

Atribui-se à educação a função de corrigir as distorções e contradições geradas pela lógica de funcionamento do modo de produção capitalista, amenizando a precarização econômica, bem como conter socialmente, sobretudo nas periferias, os descartados pelo sistema para garantir liberdade de consumo.

Com base nisso, é necessário lutarmos por uma educação que rompa com a lógica de funcionamento do modo de produção capitalista.

 Por isso, defendemos:

– A luta por uma Educação pública de qualidade sob o controle dos trabalhadores deve ser combinada com a luta pelo fim do capitalismo e por uma sociedade socialista!

– A Educação deve ser tratada em todos os níveis, como um bem coletivo, um dos instrumentos de transformação social e como um espaço de produção de conhecimento e desenvolvimento humano!

– Ensino público laico e gratuito em todos os níveis!

– Uma escola emancipadora de todo tipo opressão e que desenvolva a consciência socialista!

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