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A difícil tarefa da militância feminina


3 de janeiro de 2009

Quando a mulher trabalhadora adquire consciência de classe e se propõe a lutar e desenvolver sua militância política e/ou sindical, essa militância já está sobrecarregada. Pesa sobre nossos ombros todas as atividades que a mulher trabalhadora não militante executa: responsabilidades das tarefas domésticas; responsabilidades com filhos, família, trabalho, etc.

Precisamos estar dispostas a vencer os preconceitos e discriminações, dar conta de todos os compromissos e ainda superar intolerâncias, seja na família, no ambiente de trabalho ou, algumas vezes, no interior do próprio grupo de militância.

A mulher reproduz na sociedade aquilo que a própria sociedade determinou. Nesta sociedade, cuidar da casa, dos filhos, preocupar-se com alimentação e limpeza são atributos considerados como prolongamento do ser mulher. Quando saímos para trabalhar ou para participar de compromissos com a militância, carregamos a casa e os filhos na cabeça e nos ombros. Se o filho fica na creche ou na escola, a preocupação é se terá leite suficiente para ele em casa, se vai dar tempo de comprar o que falta, lavar a louça, fazer o jantar, e assim por diante. Dificilmente quando o homem sai para trabalhar carrega as mesmas preocupações que a mulher. A emancipação da mulher, entre outras coisas, significou um acúmulo ou acréscimo de tarefas. A idéia de que isso facilitou a nossa vida é falsa. Na realidade, a construção social que determina essas funções como sendo de natureza feminina é usada para manutenção da dominação do ser humano feminino. A partir da década de 70, com a globalização econômica, cada vez mais a força de trabalho feminina serviu ao sistema capitalista que se apoderou da suposta liberdade adquirida pela mulher. Na verdade, foi a necessidade de manter o sustento da família que nos deu condições de competir profissionalmente em pé de igualdade com o homem. No entanto, passamos a sofrer ainda mais as opressões do sistema, tornando-nos um dos pilares de sua dominação. Estabeleceu-se, em muitos casos, a emancipação financeira, mas com a crueldade de recebermos em média 15% menos para igual trabalho desenvolvido por um homem.

Políticas públicas de igualdade de gênero

Os programas governamentais falam em liberdade e igualdade de direitos. Fazem propaganda de que houve avanços para a emancipação feminina. Mostram estatísticas de que as mulheres estão em maior número nas esferas de poder público. O governo Lula criou a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, no entanto, a realidade mostra que nada mudou. As Reformas prevêem cortes em direitos historicamente adquiridos, como a Licença Maternidade e o 13° Salário. Fomentam ainda mais a incidência do trabalho informal (sem carteira assinada) com a terceirização da mão de obra. Objetivam cortes em despesas com vínculos empregatícios (FGTS, PIS, INSS). Essas políticas não atingem somente as trabalhadoras, atinge toda a nossa classe, mas é sobre nós (mãe, filha, avó, etc) que recai a liderança da família com a responsabilidade do sustento e educação.

A mulher no sindicato

Diante dessa situação podemos observar, como exemplo, a categoria de professores em São Paulo. Dos mais de 100.000 integrantes do quadro do magistério, 92% são professoras. Ao observarmos a atuação no sindicato (APEOESP) podemos perceber a dura luta da mulher trabalhadora. Sendo uma categoria quase que exclusivamente feminina e diante das dificuldades de militância, encontramos na direção do sindicato um número reduzido de mulheres, longe de representar proporcionalmente a sua base. Assim, os problemas enfrentados pela mulher trabalhadora são restritos a um Grupo de Trabalho. Somemos a isto as péssimas condições de trabalho nas escolas, os baixos salários e uma diretoria sindical governista e machista, para termos noção da atuação política feminina no meio educacional. Essa realidade ainda favorece os menos politizados que atentam moralmente contra companheiras que se destacam na luta e no calor dos debates. Essa prática, que deve ser severamente condenada e abolida do meio sindical, marcou o Congresso da Confederação Nacional de Trabalhadores em Educação (CNTE) realizado no mês de Janeiro em Brasília. Incapaz de defender a política de destruição da educação mantida no governo Lula, um representante da Articulação Sindical, corrente petista que está na direção estadual do sindicato há mais de 20 anos, partiu para a agressão verbal contra companheiras da CONLUTAS a fim de ofendê-las moralmente e desestabilizá-las no momento em que defendiam a criação da Secretaria de Mulheres e GLBTT na Confederação. Para a CONLUTAS/Oposição Alternativa esta Secretaria assumiria a importante tarefa de organizar e conduzir a luta da categoria contra a opressão da mulher, a exploração, o machismo e a violência sexista. No entanto, por trás da prática desse representante esconde-se o modo petista de governar, adotado nos governos e nos sindicatos cutistas em que as diversas conseqüências de atos de violência contra a mulher recaiam também sobre ela própria. Isso se confirma com a negativa da diretoria majoritária da CNTE em assinar a moção de repúdio contra os atos violentos de seu representante. E se reafirma com a negativa em assinar uma moção de repúdio contra a prisão da menina de Abaetetuba/Pará. Enquanto age assim, a atual direção restringe as ações do sindicato ao ato do 8 de março. E questões específicas como tripla jornada, creches públicas, licença gestante e tantas outras sequer são apresentadas para o debate na categoria. O que observamos até aqui é uma pequena demonstração de como a mulher trabalhadora, que decide ser militante, sobrevive nesse sistema. São situações como essas que nos fazem lutar e defender:

  1. A redução da jornada de trabalho sem redução do salário, com cotas proporcionais para mulheres negras, sem dupla ou tripla jornada;
  2. A licença gestante de 06 meses. Redução da jornada, após a volta ao trabalho, para amamentação;
  3. Creches públicas, gratuitas, com qualidade educacional. Funcionamento 24 horas e fins-de-semana. Nos locais de trabalho e estudo. Enquanto não temos essas creches exigimos o Auxílio Babá;
  4. Que durante as atividades militantes os sindicatos devam criar condições (contratar babá ou creche) para a participação de mães trabalhadoras e pais com a guarda dos filhos;
  5. Cotas proporcionais, ao número de mulheres nas categorias, nos órgãos de direção;
  6. A descriminalização e legalização do aborto;
  7. Que a mulher decida sobre o seu próprio corpo, em todos os sentidos;
  8. Carteira assinada e direitos trabalhistas a todas as mulheres trabalhadoras;
  9. Diminuição da idade de aposentadoria para todas as mulheres que trabalham dentro ou fora de casa;
  10. A abolição do padrão estético bulímico e anoréxico;
  11. União civil homossexual com direito à adoção;
  12. Uma sexualidade livre dos preconceitos religioso, de raça, de orientação sexual e não submetida ao capital;
  13. O fim da ditadura do parto normal e fórceps na rede pública de saúde e do parto cesariana nos hospitais conveniados;
  14. Um programa específico para a saúde da mulher negra para tratamento de doenças com anemia falciforme;
  15. O fim da discriminação à mulher trabalhadora nos livros didáticos;
  16. A inclusão da disciplina de orientação sexual no currículo escolar.

É com toda essa dificuldade, e por causa dela, que nós mulheres trabalhadores assumimos também a nossa militância. Não aceitamos essa realidade injusta! É isso que nos leva a lutar pela transformação da sociedade e por uma sociedade socialista!

Conforme palestra de Ivone Guebara em 16/05/97. Depto de Geografia/USP.

Moção de Repúdio ao machismo ocorrido no XXX Congresso da CNTE, Caderno de Moções. p. 25 e 26.

Caderno de Teses para o XXII Congresso Estadual da Apeoesp. Novembro de 2007. São Paulo: Serra Negra.