Jornal 53: Outubro de 2012
8 de novembro de 2012
- Mais medidas de apoio aos capitalistas
- Dilma e o agronegócio: desmatamento legalizado
- Os bancos, a dívida pública e a luta dos trabalhadores
- São Paulo: a especulação imobiliária está por trás dos incêndios nas favelas
- UNE ou ANEL: eis a questão?
- A luta dos professores de Chicago e de São Paulo
- A repressão, o judiciário e a democracia brasileira
- Estados Unidos: Nem Obama nem Romney! Por uma saída dos trabalhadores!
GOVERNO DILMA/PT ADOTA MAIS MEDIDAS DE APOIO AOS CAPITALISTAS
A crise estrutural do capital é um elemento importante no sentido de impedir que o capital privado consiga, por si só, fazer grandes investimentos com força para retomada duradoura da economia. Essa é a razão de o Estado (o brasileiro e os demais) ter deslocado tanto dinheiro para ajudar os capitalistas a se salvarem. Por isso que Marx dizia que o Estado é o comitê executivo da burguesia.
Os governos Dilma e Lula, buscando governar para o conjunto do capital, adotaram um conjunto de medidas bastante eficiente para o capital: O implemento de obras de infraestrutura (estradas, portos, etc.) financiadas com dinheiro público e depois privatizadas, a isenção tributária (redução de IPI para várias linhas de produção), o aumento de fundos de proteção aos bancos, etc. Essas medidas ajudam o capital, mas possuem um custo social muito elevado.
Todas essas medidas fizeram parte do que chamamos de primeiro ciclo de proteção aos capitalistas, mas que já perderam a sua eficiência. Todos os dados (o país pode “crescer” no máximo 2%) indicam que essas medidas não tiveram força para mudar o curso da economia no Brasil.
Em edições anteriores, discutimos que o governo já está adotando, como parte de um novo ciclo, um conjunto de medidas para “alavancar a economia”: a criação de novas linhas de crédito (com juros abaixo do mercado) para as empresas, a redução dos juros para aumentar a oferta do crédito, o impulso a novas obras financiadas com dinheiro público e, agora, entrando numa fase que chamam de “tornar a indústria brasileira competitiva”. Isso nada mais é do que atacar os direitos dos trabalhadores.
Na linguagem da burguesia, competitividade significa reduzir o custo da força de trabalho, o que para nós é sinônimo de retirada de direitos e aumento da exploração sobre os trabalhadores. É esse o sentido das medidas adotadas pelo governo Dilma como a desoneração da folha de pagamento e da redução do Imposto de Renda para empresas que comprarem máquinas como bens de capital.
DESONERAÇÃO
A desoneração da folha é uma medida que altera o cálculo (e o valor) das contribuições previdenciárias. Antes a empresa recolhia 20% sobre o salário de cada trabalhador e agora passará a recolher uma porcentagem fixa sobre o faturamento bruto da empresa. São, por volta de, 40 setores da economia que contarão com esse “incentivo”.
O motivo da intensa comemoração das várias entidades patronais é que por essa forma haverá substancial redução do valor pago pelas empresas. Adivinha quem paga a diferença? Isso mesmo, o tesouro nacional, ou seja, dinheiro público. Só no ano de 2013 serão 13 bilhões de reais e nos próximos 5 anos, serão destinados aos capitalistas mais de 60 bilhões de reais.
A desoneração relativa à contribuição previdenciária tem implicações importantes, como o custeio das aposentadorias e dos benefícios previdenciários. Considerando (só como hipótese, pois há vários estudos desmentindo essa tese) o que o governo e vários economistas burgueses alegam que a previdência é deficitária (desculpa para todas as contrarreformas feitas até hoje) essa medida tem como efeito imediato o aumento do rombo, ou seja, o governo para repassar mais dinheiro e recompor o lucro da burguesia, penaliza os trabalhadores que dependem da previdência social por ocasião da aposentadoria ou de afastamento por acidente de trabalho.
Mais uma vez cai a máscara do governo. Para aumentar o rendimento dos aposentados e acabar com o fator previdenciário não tem dinheiro, mas para compensar a lucratividade da patronal tem. É mais uma inovação para transferir dinheiro público para o capital privado. Não por acaso a nota da FIESP (poderosa federação da burguesia industrial paulista) se refere a essas medidas como “positivo e vai na correta direção da redução do custo-Brasil”.
MAIS UMA CONTRARREFORMA DA PREVIDÊNCIA
O custo dessas benesses para os capitalistas, lógico, vão querer repassar para a classe trabalhadora. A se guiar por qualquer coerência, o próximo passo do governo vai ser tentar mais uma contrarreforma da previdência.
Atualmente está em vigência o chamado “fator previdenciário” adotado no governo FHC e mantido nos governos Lula e Dilma. Por essa regra “quanto maior é a expectativa de vida, menor é o fator previdenciário e, com isso, menor será o valor da aposentadoria” (Dieese). É uma forma de pressão sobre os que já reuniram as condições para a aposentadoria, pois quando aplica a regra, a primeira consequência é uma redução drástica dos rendimentos, o que obriga mais tempo no mercado de trabalho. Com isso, além de não ter o rendimento da aposentadoria, ainda continua contribuindo para a previdência social. O efeito prático é a instituição de idade mínima para se aposentar.
Agora o que está em discussão no Congresso Nacional é o fator 85/95, que introduz uma nova regra para a aposentadoria integral. Para se chegar a aposentadoria integral a soma da idade com o tempo de serviço deve alcançar um resultado de 85 para as mulheres e 95 para homens. Mais uma medida, que tem caráter de contrarreforma previdenciária e visa retirar direitos dos trabalhadores.
Por ela, na prática, haverá aumento do tempo de contribuição. Para se ter ideia, um jovem que começar a trabalhar com 17 anos só poderá se aposentar quando completar 56 anos de idade e 39 anos de contribuição (quando totalizará 95). Se quiser se aposentar antes arcará com redução similar a do fator previdenciário.
O governo está querendo, para dividir a resistência, utilizar como moeda de troca a vigência dessas medidas somente para os que entrarem no sistema a partir de agora. Isso é para iludir a classe trabalhadora, pois nada impede que daqui a 5 ou 6 anos faça valer para quem já está no sistema previdenciário. Como tarefa política é necessário que a juventude (que poderá ser a mais atingida por essa medida) se junte a classe trabalhadora para travarmos uma luta conjunta na defesa de uma previdência pública voltada para as necessidades dos trabalhadores e não dos capitalistas.
MENOS IMPOSTO DE RENDA PARA OS CAPITALISTAS
Atualmente as empresas, por ocasião do balanço, lançavam como depreciação de seus bens de capital 10% (lucro maior). Mas, a partir de agora poderão lançar 20% (fazendo com que “misteriosamente” o lucro caia). Isso consequentemente reduz o Imposto que deverá pagar sobre o lucro. Essa é mais uma forma que esse governo inventou para utilizar o dinheiro público em benefício dos capitalistas.
Com essas medidas, segundo o governo, deixará de arrecadar mais de 6 bilhões de reais nos próximos 6anos. Ou seja, reduz o imposto a ser arrecadado para aumentar o lucro das empresas.
Essa medida é um bom exemplo de como os governos capitalistas agem em momentos de crise ou mesmo diante do risco de acontecerem. Colocam todo o aparato estatal a serviço da manutenção da estrutura econômica.
Os comunistas, pelo contrário, para manter o bem estar da maior parte da sociedade, propõem reformas radicais como a introdução de, como diz o Manifesto Comunista, um “pesado imposto progressivo” de maneira que as grandes fortunas paguem mais impostos e poupem os que ganham menos, que são os trabalhadores. Assim, a qualquer ameaça de crise e a possibilidade de massacrar os trabalhadores e pobres coloca-se imediatamente a necessidade de impor à burguesia limites de reprodução de sua riqueza.
Essas medidas vão no sentido oposto daquilo defendido historicamente por partidos socialdemocratas. Ou seja, são medidas opostas aos programas de distribuição de renda para a população com menores rendimentos. Temos assim mais uma demonstração do caráter burguês neoliberal desse governo.
CUT DEFENDE O FATOR 85/95 E O ACORDO COLETIVO ESPECIAL
Há algum tempo temos feito o debate de que a relação da CUT com o Estado burguês deu um salto qualitativo prejudicial aos trabalhadores, pois não se trata mais só de apoio político ao governo, mas sim da incorporação à gestão do capital. Prova são os sucessivos acordos que a corrente majoritária faz com a patronal em várias categorias com introdução de banco de horas, aumento da jornada com a obrigatoriedade de horas extras, cota mínima de produção, etc.
Se antes eram propostas defendidas e aplicadas em empresas localizadas, agora a pelega e governista CUT está patrocinando a flexibilização da já insuficiente CLT (piorar o que é ruim) e da nova reforma previdenciária através do fator 85/95 em nível nacional para que valha em todo o país e em todas as categorias. A central está defendendo (e claro, já contou com o apoio insuspeito de alguns setores da patronal) o chamado ACE (Acordo Coletivo Especial) que consiste em abrir a possibilidade de que o negociado prevaleça sobre o que é legal.
O descaramento dessa pelegada é tanto que transformaram o ato de entrega do anteprojeto em solenidade. Queriam mostrar para a burguesia de como estão domesticados.
Pela proposta defendida pela CUT, se uma empresa conseguir “convencer” os trabalhadores poderá impor banco de horas, parcelamento de 13º salário, mudança de período de férias ou, até mesmo, como disse o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, simplesmente, acabar com direitos: “Exemplo dessa inaplicabilidade é o seu artigo 396, que garante à trabalhadora em fase de amamentação direito a dois descansos de meia hora cada durante a jornada de trabalho para amamentar o filho. Esse direito podia ser exercido na época em que as mulheres trabalhavam perto de sua casa. Hoje, no entanto, a maioria mora longe do local de trabalho, o que torna a lei sem efetividade”.
Só este exemplo demonstra o perigo representado pelo ACE. Assim, as trapaças entre dirigentes sindicais pelegos e a patronal passam a ser legais. No exemplo acima, um dirigente sindical combativo não iria “trocar” um direito “inaplicável” por outro que favorece a patronal. Um dirigente combativo deveria mobilizar a categoria para que as empresas colocassem creches, permitindo tanto que as mães e os pais ficassem próximos de seus filhos quanto garantissem o cumprimento de um direito. O cômico é que a CUT chama isso de “modernização das relações entre o capital e o trabalho” (Vagner Freitas, presidente da CUT Nacional).
A lógica é a mesma utilizada pelo governo: permitir que as empresas aumentem a competitividade. Oras, o papel de um sindicato não é aconselhar a gestão da empresa, mas sim lutar para que os trabalhadores não sejam penalizados nas crises e que sejam os capitalistas que arquem com todos os custos da crise que eles mesmos fizeram.
Em relação ao fator 85/95 (como já demonstramos acima é outro ataque aos trabalhadores) a CUT também é uma das entusiastas defensoras desse ataque aos trabalhadores.
Esses são dois exemplos de como a política da CUT está direcionada a salvar os capitalistas quando estão em dificuldades. Também têm as traições nas várias campanhas salariais em que realiza acordos rebaixados e abre mão da organização da classe trabalhadora. O melhor exemplo é o papel que a CUT está desempenhando na campanha salarial de bancários e metalúrgicos do ABC que, além de não preparar a greve, ainda cede a pequenas concessões da patronal.
A CUT, para tentar aprovar o Acordo Coletivo Especial, mente para a classe trabalhadora. Na prática ao passar a vigorar esse Acordo servirá para retirar direitos, ou seja, flexibilizar, pois a legislação existente não proíbe a ampliação de direitos, isto é, não precisaríamos de uma nova. Por exemplo: se a patronal quer pagar o 14º salário ou férias em dobro não há necessidade de haver lei nova para isso. Mas, se quiser pagar metade do 13º ou não pagar um 1/3 sobre as férias há necessidade de lei que permita as empresas fazer isso sem sofrer nenhum questionamento judicial.
É evidente que a CUT sabe disso. Mas, a defesa que faz do capital é tão ferrenha que para agradar aos seus amos capitalistas começa a lançar mão das mentiras mais absurdas.
Não reivindicamos a CLT, mas também não somos a favor que os direitos mínimos que estão contidos nela sejam retirados. A luta é necessária para que eles sejam ampliados.
Esses elementos que apontamos são parte de um processo mais geral em que a burocracia petista e a cutista estão cada vez mais a direita e conforme a crise vai dando sinais de proximidade com o país, mas se aproximam dos capitalistas, defendendo e aplicando a política de retirar da classe trabalhadora os custos para cobrir as possíveis perdas que os capitalistas terão.
DILMA E O AGRONEGÓCIO: DESMATAMENTO LEGALIZADO
O Congresso Nacional (passou primeiro pela Câmara e depois pelo Senado), dominado pelos reacionários e gananciosos ruralistas, aprovou mais uma lei que consolida a legislação pró-desmatamento. A Medida Provisória (MP) aprovada tinha sido enviada pelo governo ao Congresso Nacional como forma de “suprir” o que chamam de lacunas na legislação ambiental.
A nova Medida Provisória piora ainda mais a legislação ambiental do país.
A MP enviada para o Congresso Nacional, na verdade, foi uma manobra do governo (para parecer que estava contra os ruralistas) para rediscutir as propostas do agronegócio. Dilma estava pressionada por uma campanha que envolveu intelectuais, ambientalistas, artistas e foi obrigada a vetar alguns (indefensáveis) artigos do “novo código florestal” elaborado por Aldo Rebelo e apoiado pelos ruralistas.
Ao enviar a Medida Provisória até o mais ingênuo ambientalista sabia que o agronegócio iria recolocar as suas propostas. Dito e feito. Com uma bancada governista “descuidada” (raras vezes a base do governo se descuida, principalmente quando é para retirar direitos dos trabalhadores) e uma bancada ruralista “atenta”, a Câmara fez várias modificações na Medida Provisória: Reintroduziu a diminuição das margens dos rios que devem ser protegidas (Áreas de Proteção Permanente – APP), estabeleceu a desnecessidade da recomposição de áreas degradadas nas margens dos rios com vegetação nativa (podendo ser utilizadas madeiras comerciais como eucalipto, que é uma produção altamente destrutiva do solo) e perdoou as multas realizadas pelo IBAMA antes de junho de 2008.
Sem se preocupar em “entregar” a existência dessa manobra entre o governo e o agronegócio o senador Jorge Viana, do PT e da base aliada, foi enfático: “É o código possível. É o código que representa a composição que temos no Congresso. Acho que ele traz também muitas qualidades. A mais importante delas é que a lei brasileira segue sendo rígida como antes”. É o mesmo discurso da fascista Kátia Abreu: “Não foi 100% como eu esperava, mas tivemos grandes avanços, avanços importantes e o maior deles é a segurança jurídica que vamos ter no campo”.
O atual modelo de política econômica do país faz com que esse governo seja cada vez mais refém desse setor da economia. A porta de entrada do país no mercado mundial é a exportação de commodities, no caso brasileiro, formada principalmente por grãos. O superávit do agronegócio de janeiro a agosto de 2012 foi de US$ 45,27 bilhões. Nos últimos doze meses o volume total de exportações do setor chegou a 96 bilhões (FSP 28/09), representando sozinho quase 40% do total de exportação brasileira (afnews.com.br).
Esse peso econômico se transfere para o político. É considerado o maior lobby do Congresso Nacional – possui 25% dos deputados e 16% dos senadores – tem conseguido pautar no cenário político, praticamente, todos os seus interesses. Em 2010, 41 deputados da bancada ruralista tiveram sua campanha financiada pela Friboi – um dos maiores exportadores do país – que gastou 30 milhões. Destes, 40 votaram a favor do código do desmatamento.
Essa é a explicação, política e econômica, para um governo tão dependente desse setor na economia. É também a explicação do fato de este governo ser mais à direita.
BENEFICIANDO O AGRONEGÓCIO
O texto aprovado (e o proposto na MP do governo) é claramente para beneficiar o agronegócio, instalado nas propriedades maiores.
O texto original da MP previa 20 metros de proteção nas margens de rios para propriedades de 4 a 10 módulos fiscais. O aprovado diminui para 15 metros a área obrigatória de proteção nas margens de rios e ainda aumenta o tamanho das propriedades (passa a ser propriedade de 4 a 15 módulos fiscais) que fazem jus a essa diminuição da área protegida.
Há outro problema nessas medidas que iguala pequenos aos médios produtores e, evidentemente, favorece esses últimos. Isso quer dizer que, agora, imóveis de quatro a quinze módulos – ou seja, pequenos e médios produtores – foram, para efeito da área de preservação, equiparados. Esse fato derruba a versão de que os deputados ruralistas estavam defendendo os pequenos produtores.
Para as propriedades maiores (latifúndio), enquanto o texto original da MP estabelecia o mínimo de 30 e máximo de 100 metros de proteção, o novo texto aprovado estabelece como o mínimo de 20 e máximo de 100 metros de proteção. E nesse caso, cabe a cada Estado regular essa área. Sabemos que em vários Estados, sobretudo das regiões centro oeste e norte, o peso político dos ruralistas é determinante.
Há ainda outros dispositivos favoráveis ao agronegócio, como a possibilidade de computar a APP no cálculo da Reserva legal, a retirada do conceito de área abandonada e subaproveitada, o reconhecimento da área de pousio (área de descanso para recuperação da terra) das atividades pecuárias e sem limite de tamanho da propriedade e, por fim, uma das mais graves, o estabelecimento do crédito de carbono em áreas de preservação permanente.
O estabelecimento do direito sobre a produção de oxigênio nas áreas de preservação e que podem ser comercializados – como crédito de carbono – com produtores, empresas e até mesmo países que têm alto índice de poluição. A área que deve ser obrigatória como parte de proteção do ecossistema ou bioma vai servir como compensação para os desmatadores. Ou seja, vai perder totalmente a sua função de preservação.
O agravante maior de toda essa mudança é que pode permitir aos latifúndios improdutivos a classificação de produtivos (em função da atividade econômica) e, uma das coisas, dar fundamento jurídico (não de justiça) para escaparem da reforma agrária. Áreas sem produção ganham status de produtivas.
OS BANCOS, A DÍVIDA PÚBLICA E A LUTA DOS TRABALHADORES.
Daniel Delfino
Os bancos são um dos setores mais poderosos do capitalismo brasileiro. Entra governo, sai governo, muda o plano econômico, com hiperinflação ou estabilidade dos preços… em todos os cenários os bancos mantiveram seus lucros. Boa parte desses lucros vem da especulação com os títulos da dívida pública.
O governo arrecada dinheiro para pagar seus compromissos com vencimento no curto prazo vendendo títulos de longo prazo, pagando juros elevados aos compradores desses títulos. Com isso, a dívida pública brasileira aumenta como uma bola de neve. Desde a desregulamentação neoliberal na década de 1990 e também ao longo da gestão do PT na década de 2000, a dívida só fez aumentar. A dívida era de R$ 62 bilhões em janeiro de 1995, correspondente a 10% do PIB, e passou para R$ 2,7 trilhões, ou 60% do PIB em junho de 2012 (Correio da Cidadania, 14/09).
Recentemente o governo reduziu a SELIC, que regulava os juros dos títulos da dívida, de 11% para 7,5%, entre dezembro de 2011 e agosto de 2012. Entretanto, o custo das operações com títulos ficou em 12,88% em julho, porque os novos títulos passaram a ter juros pré-fixados, superiores à SELIC (idem). Títulos pré-fixados correspondem a 37% do total da dívida (relatório mensal da Dívida Pública Federal – DPF – disponível em http://www.tesouro.fazenda.gov.br/divida_publica/downloads/kit_divida.pdf). Os títulos da dívida brasileira são um dos negócios mais seguros e rentáveis no mundo, e os bancos brasileiros bem sabem disso.
Os bancos estão entre os maiores compradores desses títulos, juntamente com seguradoras, fundos de pensão, investidores estrangeiros e donos de grandes fortunas. As instituições financeiras detêm 28,8% da dívida pública (relatório da DPF). “A dívida interna do Banco Central com o mercado financeiro (por meio das chamadas “Operações de Mercado Aberto”), que somava R$ 414 bilhões em junho, e está quase toda nas mãos dos bancos” (http://www.ihu.unisinos.br, 02/08)
O lucro dos bancos se compõe da venda de “produtos” (seguros, títulos de capitalização, previdência privada, etc.), operações de crédito (empréstimos) e operações de tesouraria (nome que se dá às operações com títulos). Segundo o BC, 101 instituições financeiras lucraram 25,693 bilhões de reais entre janeiro e junho deste ano (Veja, 17/09).
A LUTA DOS TRABALHADORES BANCÁRIOS
Como dissemos, os bancos seguiram tendo lucros enormes ao longo dos governos do PT. A relação entre os bancos e o governo do PT é tão profunda que se estende até o movimento sindical da categoria bancária. Os sindicatos de bancários do país são controlados pela Contraf-CUT, controlada pelo PT. Há décadas a CUT pratica um sindicalismo de conciliação de classe, que não enfrenta de fato a patronal. Na categoria de bancários, foi abandonada a luta pela estabilidade no emprego. Com isso, os trabalhadores dos bancos privados ficam a mercê dos gestores, que podem demití-los ao menor sinal de descontentamento ou tentativa de enfrentamento. Fragilizados pela falta de estabilidade, os trabalhadores desse setor se ausentam das lutas e greves da categoria. Com o passar dos anos, passaram a ver o sindicato como algo externo, que não depende de sua participação. Um clube de convênios, em que a diretoria cutista se perpetua graças à relação assistencial com esse setor, que forma a ampla maioria da categoria.
No setor de bancos públicos, por sua vez, as perdas salariais já chegam a 90% no Banco do Brasil e 100% na Caixa Econômica Federal. A luta pela reposição das perdas, bem como por uma série de questões específicas (isonomia entre funcionários novos e antigos, e entre os bancos incorporados, plano de cargos e salários, jornada de 6hs para comissionados, pagamento de substituições, saque nos fundos de pensão, sucateamento dos planos de saúde, etc.), foi abandonada pelo sindicalismo cutista. Para atender a essas questões, seria preciso enfrentar o governo federal, que é do PT. Logo, os sindicalistas bancários da CUT preferem rifar os interesses dos trabalhadores e obedecer ao patrão, o governo do PT. Anos seguidos de traição fizeram com que os trabalhadores dos bancos públicos se decepcionassem com o movimento sindical e reduzissem também a sua participação.
POR UM OUTRO PROJETO PARA OS BANCOS
Ainda existe uma boa adesão numérica às greves nos bancos públicos. Entretanto, os trabalhadores não comparecem aos piquetes, assembleias e atividades de greve. É a chamada “greve de pijama”, em que os trabalhadores não vão trabalhar, mas também não participam do movimento, porque não acreditam na direção cutista. A greve virou uma espécie de “férias coletivas”, em que os trabalhadores se ausentam do serviço, porque não suportam mais as condições de trabalho: sobrecarga de serviço, assédio moral, cobrança de metas, estresse, adoecimento físico e psicológico. Entretanto, não há como modificar essas condições de trabalho sem modificar todo o projeto dos bancos públicos: ao invés de especular com títulos da dívida e concorrer com os bancos privados na venda de “produtos”, os bancos públicos deveriam funcionar como bancos sociais, fornecendo crédito barato para os trabalhadores, para a agricultura familiar, para obras públicas que beneficiem os trabalhadores, etc.
Mas para isso, seria preciso travar uma luta política global contra o governo e seu projeto. Seria preciso unificar as lutas dos trabalhadores bancários com o restante da classe trabalhadora, tendo como meta a estatização do sistema financeiro, sob controle dos trabalhadores.
A ESTRANHEZA DE TANTOS ACIDENTES: sobre os incêndios nas favelas paulistanas
Pedro Guerra
Desde o começo do ano, foram mais de 30 incêndios na cidade de São Paulo e arredores. Por se tratar de regiões em processo de valorização econômica surge a suspeita de serem incêndios criminosos, com o intuito de destruir as favelas e substituí-las por empreendimentos imobiliários. Mas antes do caso específico, façamos algumas considerações gerais.
Vivemos num sistema socioeconômico dos mais terríveis. A classe trabalhadora, afora sofrer com a exploração econômica de extração da mais-valia do seu trabalho, ainda sofre outras formas de exploração: Todo tipo de preconceitos, sexismos, racismos, discriminações e segregações. Ocorre, ainda, a segregação física, em especial com os mais pobres, na ocupação do espaço urbano. Sem recursos, a população empobrecida se vê forçada a viver em ocupações clandestinas, precarizadas, com graves riscos envolvidos, desde o contágio por doenças decorrentes da falta de saneamento até os desmoronamentos e os incêndios.
A existência das favelas deixa claramente exposto o cinismo do discurso jurídico burguês. A cidadania – cuja essência é conservadora – é uma via de mão única, ou seja, só beneficia a burguesia, não sendo feita para amparar a classe trabalhadora. É preciso estar atento a isso.
Ainda que as conquistas jurídicas sejam importantes – e o são, pois promovem acúmulo de forças e experiências aos militantes populares – o direito não está acima da luta de classes. Pelo contrário, o direito é um instrumento burguês de opressão.
Se seguirmos a hipócrita ideologia jurídica, ficam sem resposta as questões: se são todos iguais perante a lei, por qual razão uma pequena parte da população vive bem e uma maioria vive de forma precarizada? Se existe, no capitalismo, igualdade e liberdade por que uma enchente ou um incêndio para poucos é apenas um tormento e para muitos é a ruína absoluta?
Assim o é, pois, o direito e a cidadania são duas ilusões burguesas que precisam ser combatidas nas reflexões da classe trabalhadora. Os trabalhadores apenas são cidadãos na medida em que devem se submeter ao regime de trabalho capitalista, dispondo do seu tempo e energia em relações de produção desequilibradas.
No capitalismo, a maioria, a qual produz a riqueza social, não se beneficia da própria riqueza produzida. A isonomia ou igualdade jurídica só vale como forma de camuflar a exploração do contrato de trabalho. Assim, o direito e a cidadania devem ser etapas da revolução, mas que saibamos a ocasião de esmagar o discurso jurídico e afirmar o poder popular.
De 2008 até hoje, foram quase 500 incêndios na capital paulista. Uma média de dez incêndios mensais. Os números impressionam por si sós, haja vista o drama inquestionável das muitas famílias. Porém, causa indignação o fato de que se tratar de regiões com crescente valorização econômica e a denúncia de se tratar de incêndios criminosos.
A título de exemplo, entre janeiro de 2008 e novembro de 2011, a região de Campos Elísios, onde, em setembro último, pegou fogo na Favela do Moinho, a valorização imobiliária cresceu em aproximados 183%. No mesmo período, o Jaguaré, bairro onde ficavam as incendiadas Favelas do Leão e do Areião, destruídas em janeiro desse ano, teve valorização de 132%. O Jabaquara passou por valorização imobiliária de 129% no período mencionado, quando no último agosto a Favela Alba foi destruída pelas chamas. Os números continuam. O Campo Belo, onde existia a Favela do Piolho, incendiada em março de 2012, a valorização foi de 114%. A Favela Presidente Wilson ficava no bairro do Ipiranga, cuja valorização imobiliária foi de 106%. Mais informações podem ser obtidas nos “sites” http://fogonobarraco.laboratorio.us/# e http://www.terra.com.br/economia/infograficos/valorizacao-imoveis-sao-paulo/.
Em 2005, a “gestão-relâmpago” de Serra, entre tantas outras barbaridades, fez o desfavor de extinguir um programa de combate a incêndio nas favelas oriundo da antiga gestão petista.
Assim, as fragilizadas habitações ficaram ainda mais expostas aos perigos de uma ocupação irregular. E Kassab, atual prefeito, mesmo com a lei aprovada em 2010 para retomada do programa de prevenção aos incêndios nas favelas, deu continuidade à negligência, não implantando qualquer política pública efetiva nesse sentido. Todavia, apenas a ausência de um programa de combate aos incêndios nas favelas não explica tantas ocorrências dessa natureza.
Com o crescimento econômico e o aumento da renda em alguns setores e do sistema de crédito, algumas capitais brasileiras, como São Paulo, têm vivido um surto crescente de empreendimentos na construção civil. Dessa forma, o capitalismo, que é um sistema sem outra ética que não o desenvolvimento ao máximo dos lucros, atropela qualquer um em seu caminho.
Com as ocupações irregulares, há um empecilho no xadrez das empreiteiras: os seres humanos que não têm onde morar. Homens, mulheres, crianças, idosos… com sonhos e aspirações como todos os outros humanos. Mas, também com o destino infeliz de terem nascido numa sociedade injusta, excludente e brutal. Para a burguesia que se queimem os barracos, pois, só se importa com os pobres quando lhes servem de empregadas, garçons, babás, porteiros e todo tipo de trabalhador braçal, muitos com pouca instrução. No mais, quer distância dos pobres. Metaforicamente podemos dizer que os bairros ricos representam a Casa Grande e os bairros pobres, a Senzala.
As instituições estatais que se arrogariam a competência para apuração dos fatos, como a polícia, bombeiros e Ministério Público, nada fazem. Aliás, cabe a observação de que os últimos governos estaduais têm se cercado do que há de mais reacionário nos altos escalões do serviço público, o que tem sido bastante conveniente com a crescente onda conservadora no estado de São Paulo.
A burguesia tem lá seus “charmes” na hora de fazer política. Assim, diante da pressão popular, e em nome da cidadania, é obrigada a ceder direitos, pois não seria “civilizado” um governo desatento a uma pretensão popular. Não seria “charmoso”, portanto, simplesmente, negar direitos. Diante de tantos incêndios, com seu consequente drama popular, a prefeitura, em 2010, com uma nova lei para prevenção a incêndios, afirma ter retomado o plano, ainda que sem implementá-lo na prática. Isso é um absurdo! É uma maneira de se aviltar a inteligência do povo!
Então, o que fazer? A classe trabalhadora, organizada e decidida, deve denunciar as arbitrariedades sofridas, fazendo ecoar, ao máximo, sua voz.
Precisamos organizar manifestações e panfletagens nas ruas e pela internet. Precisamos levar as denúncias aos advogados populares, a fim de que a batalha forense, ainda que limitada, seja mais um canal de divulgação das lutas. E, por fim, precisamos criar forças populares de autodefesa com a finalidade de vigilância dos limites de cada ocupação, repelindo energicamente qualquer um que tentar novamente provocar incêndios.
UNE OU ANEL – EIS A QUESTÃO?
Grupo Além do Mito (AL)
Nota: Publicamos esta contribuição do Coletivo Além do Mito a respeito dos rumos do movimento estudantil, que para os companheiros deve ir além do debate UNE x ANEL. Entendemos que o artigo traz elementos pertinentes para fugir dessa mera escolha e pensar novos enfoques. Entretanto, a exemplo de edições anteriores, as publicações de outros coletivos e suas conclusões são de sua responsabilidade não refletindo necessariamente a posição do Espaço Socialista.
Após o Congresso Nacional de Estudante (CNE), em 2009, no qual se fundou a Assembleia Nacional dos Estudantes Livre (ANEL), nunca tinha se apresentado em Alagoas a necessidade, tão premente, de responder à questão acerca da construção ou não dessa entidade como nos últimos meses. Identificamos que as razões do fenômeno mencionado já apontam para a resposta a ser dada a esse questionamento, ainda que ambas não se esgotem e que podemos estender esta breve análise ao resto do país, reservando as particularidades de cada estado.
O CNE representava o passo mais organizativo do processo de reorganização do ME. Para que o que se crie seja realmente novo – e não uma reatualização do velho – é indispensável construir novas bases, novos princípios. Ou, como deixamos bem claro: “As tarefas postas para o Congresso envolviam, pois, o debate acerca de uma gama de temas que, muito além da necessidade de uma Nova Entidade, envolviam também os princípios que norteavam a reorganização, seus métodos, bandeiras políticas, concepções de mundo, de educação e mesmo de ME.” (Para onde foi a reorganização?, 2009).
Desde sua fundação, nenhuma grande luta foi travada pela ANEL onde não tivesse o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU), aliás, ela não existe onde não há o partido. A construção recente da ANEL/Alagoas representa bem isto – a necessidade da construção de uma entidade nacional vem à tona quando o partido volta a se reestruturar no estado.
Cabe aqui relembrar um dos principais argumentos do PSTU para se fundar uma nova entidade em 2009: “precisamos de uma nova entidade para potencializar as lutas que estão decorrendo do ascenso do ME nacional”. Ao que parece, esta tarefa não foi o que se pode verificar nos últimos anos.
A ANEL configura uma entidade representativa dos estudantes em nível nacional, que depois de concebida vem buscar sua legitimação na base. Então, como pode uma entidade que não tem seu reconhecimento no seio estudantil ser representativa? O debate de seus militantes quase sempre forja uma conjuntura não existente. Não temos uma base que reclame uma entidade de porte nacional somente porque a UNE não serve mais para fazer luta.
Uma vez criada a Entidade que defende as bandeiras mais acertadas possíveis, o PSTU acha que o que falta é divulgar a ANEL dentro de atos, através de listas de e-mails, em falas em público e no convite para seu Congresso. Como se os estudantes estivessem todos plenamente conscientes do que devem fazer e maturado todo o debate pertinente a uma reorganização só o que falta é que alguém chegue e apresente uma Entidade nova que balance as bandeiras corretas – e nesse momento, como em um passe de mágica, os estudantes se sintam tão identificados que o processo de lutas, em pouco tempo, começa a eclodir.
Desta mesma forma, O PSTU tenta forjar a realidade criando a falsa polêmica UNE x ANEL. Tal realidade é forjada com ideias “mortas” ao colocar a centralidade do problema da reorganização repousada sobre essa falsa questão. Uma vez consolidada a superação formal da UNE – já que a superação material ainda é tarefa da reorganização -, o PSTU pressupõe a superação plena da UNE e torna sinônimo ANEL e reorganização. A postura do partido é passada aos militantes da ANEL que a reproduzem em grande escala, dando certo ar de veracidade e legitimidade, pois aparentemente afasta do PSTU a responsabilidade de ter criado a polêmica, pintando tal falsidade como “o discurso dos próprios estudantes”.
Diante do que foi exposto, deve-se destacar que estamos operando uma discussão de entidade fundada em bases distintas daquela levada a cabo pelo PSTU, setor hegemônico do ANEL. Essa distinção se evidencia quando percebemos que a partir do momento no qual o partido leva a frente um projeto de reorganização materializado na ANEL, indicando a radicalidade de suas bandeiras, sua autonomia financeira e a democracia interna enquanto elementos que a distingue da UNE, compreendemos que sua análise da reorganização fundamenta-se em parte da realidade e dos sujeitos que nela atuam.
Ou seja, há uma falha metodológica realizada pelo partido quando lê a conjuntura olhando apenas as entidades que nela habitam, quando enxergam apenas a expressão formal da imbricação real de aspectos subjetivos e objetivos, sem levar em conta a gama de elementos articulados que dá base a essa superestrutura. Nessa linha o PSTU continuará identificando as vitórias da entidade sempre que esta ocupar um espaço que antes estava “vazio”, sempre que ela for o vetor responsável por colocar algo onde antes não existia nada. Ou melhor, sua própria criação é enxergada enquanto vitória, pois anteriormente não havia uma entidade de caráter nacional que defendesse a luta contra a reforma universitária, por exemplo.
Contudo, a questão que precisa ser respondida por todos os setores que fazem parte desse processo é: quanto à experiência dos dois anos da ANEL acumulou para o movimento de negação/superação, de rompimento, não apenas com a UNE, mas com tudo que ele representa?
Diante disso, é perceptível que o novo ainda não está pedindo passagem, na verdade ele possui sérias dificuldades para aprender a falar. Seu antigo idioma continua a lhe perturbar, suas palavras, na nova língua, precisam ser traduzidas a partir da velha, quando não ocorre de serem cognatas. Ele permanece incapaz de formular frases autonomamente, sob a lógica da nova língua e, por isso, não consegue superar o velho…
A ANEL não é o produto final da reorganização e sim um de seus frutos. Dirigem-se a nós como se a questão fosse construir a UNE ou construir a ANEL, mas a questão correta é construir a UNE ou estar comprometido com o processo de reorganização. Não nos sentimos forçados a construir a ANEL quando esta não atende às necessidades dos estudantes, que em nossa opinião é participar e reconhecer o ME, e, através da base, fazer movimento de práticas e condutas diferenciadas daquelas que todos nós queremos combater.
A tarefa ainda é reestruturar as bases para um Novo Movimento Estudantil, estreitar ao máximo nossas concepções, redefinir nosso posicionamento, clarear nosso objetivo, ou seja, elevar a consciência dos estudantes para que assim torne, objetivamente, possível uma entidade de representação dos estudantes em âmbito nacional.
Dessa forma, ratificamos o nosso compromisso frente aquilo que desde o CNE defendíamos: Reorganizar o ME nacional. Ainda que a passos curtos, estamos conseguindo mostrar na prática o quanto, o maior setor da reorganização, esteve e está equivocado, dentre outras coisas, no que se refere a sua tese de que ‘quem não está na ANEL não faz luta e/ou está fora do processo de reorganização’. Mero joguete de palavras, diante da realidade objetiva nas universidades do país.
Diversos grupos que ficaram desnorteados após o CNE vêm ressurgindo. Outros, pela própria experiência, com práticas do velho movimento naturalizadas como novas, formam-se em algumas universidades. E estes, começam a se articular entre si.
A tarefa é árdua, longa e, às vezes para alguns, parece ser impossível. No entanto, reafirmamos a urgência em unificarmos os setores comprometidos nessa defesa, tanto nacionalmente quanto em cada estado do país. Este primeiro passo é importante para esse momento defensivo que estamos vivenciando na esquerda como um todo.
Texto na integra em: www.grupoalemdomito.blogspot.com
A GREVE DOS PROFESSORES DE CHICAGO E AS SUAS SEMELHANÇAS COM A LUTA DOS PROFESSORES EM SÃO PAULO E NO BRASIL
Cláudio Santana/Núcleo Professores
Dadas as vantagens concedidas aos empresários, banqueiros, construtoras e empreiteiras, através da desoneração da folha de pagamentos, isenções fiscais, empréstimos com juros irrisórios e do papel assumido pelos governos no sentido de garantir a lucratividade destes e o funcionamento da economia capitalista em crise, os serviços públicos (Saúde, Educação, Moradia, Transporte Coletivo Público) vêm adquirindo um funcionamento cada vez mais precário.
A situação se agrava a cada dia, pois o recorrente uso do dinheiro público para atender aos interesses dos patrões transformam os cofres públicos numa “torneira que jamais será fechada”. Por conta disso, os investimentos nos serviços sociais essenciais são cada vez menores, já que a prioridade dos governos não é atender aos interesses dos trabalhadores e seus filhos.
Com isto, o funcionalismo público – que sofre com as péssimas condições de trabalho, intensificação do trabalho e com a sua não valorização profissional – acaba reagindo com greves e paralisações em todas as partes do mundo e do Brasil. Isso se expressou nas greves do funcionalismo federal e dos Professores de diversos estados brasileiros.
Queremos ressaltar dentro desse quadro, a greve dos Professores de Chicago, buscando as semelhanças com a nossa luta contra os ataques dos governos brasileiros – de Dilma à Alckmin, passando pelos demais governadores e prefeitos Brasil a fora. Ressaltamos essa greve não só pelo fato de suas demandas serem idênticas às nossas, mas também pelo fato de o modelo de Educação implantada em Chicago – baseado na Reforma Educacional de Nova York – ter sido copiado e adotado em boa medida pelos governos sem distinção no Brasil, fazendo parte também do modelo de Educação defendido pelos bancos, ONG’s e empresas, em suas ingerências na Educação Pública.
O MODELO DE EDUCAÇÃO IMPLANTADO EM CHICAGO
O modelo educacional adotado em Chicago foi pioneiro na implantação de iniciativas que foram colocadas em prática em Nova York e, em outras cidades e distritos estadunidenses, intituladas de Reforma Educacional de Nova York.
Esse modelo consiste, principalmente, em:
– Monitoramento, responsabilização e cobrança por resultados;
– Vias alternativas de contratação e seleção de professores, diretores e coordenadores, sobretudo não sindicalizados;
– Participação do setor privado – tanto pela prestação de consultorias como pela administração direta de unidades escolares;
– Banco de dados com o rendimento dos alunos;
– Bonificação e promoção por desempenho, ou seja, a aplicação de avaliações de desempenho e mérito.
Vale ressaltar que esse modelo começou a ser implantado nos Estados Unidos, sobretudo, nos anos 1970, o que mostra uma relação direta com a incidência de modo mais claro e evidente dos problemas econômicos e sociais oriundos da crise estrutural do capital. A cidade de Nova York estava passando por uma onda de violência latente provocada pelo desemprego. Notem o que ocorreu na Educação Pública:
“Os piores anos do sistema escolar aconteceram nas décadas que se seguiram à crise fiscal de 1975. Cerca de 4.500 professores foram demitidos entre os 15 mil funcionários demitidos pelo Conselho de Educação, e os que permaneceram tiveram seus salários reduzidos em 19%”. (A Reforma Educacional de Nova York: Possibilidades para o Brasil. p.13)
Os Professores reagiram com greves em várias cidades, inclusive, a última greve, de Professores de Chicago, ocorreu nesse período.
POR QUE OS PROFESSORES DE CHICAGO ENTRARAM EM GREVE?
A paralisação dos professores de Chicago foi a primeira na cidade em 25 anos. Também foi a primeira greve do gênero em uma grande cidade dos Estados Unidos em seis anos, e não é de se estranhar as razões atuais da greve dos professores de Chicago, pois a tal proclamada Reforma Educacional de Nova York culpa, responsabiliza, fragiliza, vulnerabiliza e intensifica o trabalho diário do professor diante de problemas de ordem estrutural.
De um modo geral, vejam algumas reivindicações dos Educadores de Chicago:
– Em defesa da educação pública;
– Contra as reformas e cortes no orçamento do ensino público;
– Por um novo contrato coletivo de trabalho;
– Contra a forma como os professores são avaliados.
Não poderia ser diferente. Já que:“Aqueles que persistentemente fracassam em fazê-lo são substituídos(…)” e “As escolas com o pior desempenho são fechadas e seus prédios, ocupados por novas escolas e novos quadros de funcionários” (A Reforma Educacional de Nova York: Possibilidades para o Brasil. p.23)
QUEM SÃO OS INTERESSADOS PELA IMPLANTAÇÃO DA REFORMA DE NOVA YORK NO BRASIL?
No Brasil, os principais interessados são aqueles que querem garantir a sua lucratividade com os subsídios governamentais e obter mais lucros a partir da privatização escancarada ou velada da Educação Pública, a partir da prestação de consultorias e do gerenciamento de projetos – expansão das Escolas de Tempo Intergral em São Paulo –, fornecimento de materiais e de livros didáticos, uniformes, dentre outras inserções no serviço público.
Nesse sentido, o movimento “Todos Pela Educação”, que conta com a participação de grupos empresariais e ONG´s – Fundação Roberto Marinho, Fundação Itaú Social, Instituto Ayrton Senna, Fundação Bradesco, Grupo Gerdal etc – representam esses interesses.
A Educação nos moldes do modelo importado permite que os bancos, as empresas e as empreiteiras recomponham as suas taxas de lucro e ganhem ainda mais dinheiro com a privatização do Ensino Público.
Nesse sentido, a Fundação Itaú Social, com a coordenação técnica do Instituto Braudel de Economia Mundial, lançou em 2009, o Programa Excelência em Gestão Educacional, que tem como objetivo principal divulgar A Reforma Educacional de Nova York e suas possibilidades para o Brasil.
O Instituto Braudel de Economia Mundial tem como presidente do Conselho Diretor, Rubens Ricupero, a mesma pessoa que, no auge da primeira disputa presidencial entre Lula e FHC (1994), disse – enquanto esperava para ser entrevistado no estúdio da TV Globo para o Jornal Nacional – ao jornalista Carlos Monforte, que vinha aproveitando-se do cargo para promover ativamente a candidatura de Fernando Henrique. “(…) Eu não tenho escrúpulos, o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde”, disse Ricupero.
AS SEMELHANÇAS COM O QUE OCORRE EM SÃO PAULO E NO BRASIL
Em São Paulo, a rede estadual de ensino do estado de São Paulo se reestruturou, sobretudo, na gestão Serra, mas não parou por aí. Com base na Reforma Educacional de Nova York, como já dissemos, o governo federal juntamente com governos estaduais e municipais, aplicam em todo o país medidas importadas de Nova York.
O achincalhamento, o ataque à auto-estima, a perda da autonomia, a retirada de direitos, o não reconhecimento do direito de greve o questionamento da estabilidade dos Professores, fazem parte de uma ofensiva dos governos para implantar esse modelo e fazer com que os professores aceitem uma atuação profissional desqualificada.
O regime de contratação precária dos professores temporários, o assédio moral e o autoritarismo nas escolas visam colocar o funcionamento da Educação Pública brasileira em consonância com o modelo contra o qual os Professores de Chicago se rebelaram.
AUMENTO DO CONTROLE SOBRE O TRABALHO DO PROFESSOR
O que sofremos enquanto educadores é parte de uma ofensiva maior, vinculada a uma sociedade capitalista em crise estrutural. Nesse caso, os ataques são cada vez mais agressivos e de ordem global, pois as margens para concessão se restringem e tornam-se raras ou ulas, com situações de perdas crescentes. A reação dos trabalhadores cresce, mas cresce também o controle.
A Reforma Educacional de Nova York busca atender a esse objetivo.
“Quando um sistema não consegue enfrentar manifestações de dissenso e, ao mesmo tempo, é incapaz de lidar com suas causas, surgem nesses períodos da história não só figuras e soluções ilusórias, mas também os ‘realistas’ da rejeição repressiva de toda crítica” (Mészáros, in A Crise Estrutural do Capital. p.61)
DEVEMOS COMBINAR A NOSSA LUTA SINDICAL COM A LUTA POLÍTICA POR UMA EDUCAÇÃO EMANCIPADORA
Se o ataque é global, temos que responder também de modo global. Nesse sentido, a luta por uma educação pública que atenda aos interesses dos trabalhadores e seus filhos deve ser combinada com a luta pela transformação da sociedade.
As nossas reivindicações, dado o ataque global que sofremos de um sistema capitalista em crise, não podem mais ser tratadas de modo imediatista e fragmentado.
Nós trabalhadores, devemos sempre defender uma Educação Pública que seja um importante instrumento de luta contra a sociedade mercantil, a alienação e a intolerância.
Precisamos fortalecer os vínculos coletivos nas escolas e trabalharmos com os pais e os alunos.
Uma educação que seja uma alavanca essencial na luta pela emancipação humana contra a barbárie capitalista, e pelo desenvolvimento contínuo da consciência socialista!
Por uma Sociedade Socialista!
A REPRESSÃO, O JUDICIÁRIO E A DEMOCRACIA BRASILEIRA
Thiago Arcanjo
Sem sombra de dúvidas, apesar da aparência de um país estável, o Brasil vive hoje um profundo endurecimento do regime democrático-burguês como um todo.
Isto acontece de modo extremamente particular em nossa sociedade: vivemos um momento da cidadania do crédito, em que se compram com mais facilidade que no passado as mais diversas bugigangas; ao mesmo tempo, as mesmas pessoas se importam cada vez menos com a política institucional: a elas importa que os “políticos” não atrapalhem seus planos de consumo. Um outro aspecto aparentemente contrário a tais características é que, de fato, a exploração do trabalho aumentou no Brasil (o que se pode sentir pelo o aumento dos ritmos do trabalho nos mais diversos setores produtivos), bem como se acentuaram graves e já antigos problemas da sociedade brasileira; enumeremos alguns: espaço urbano caótico, falta de moradia, falta de reforma agrária, insuficiência da locomoção no espaço, desemprego, precarização das relações de trabalho, corrupção que favorece e cria o crime organizado etc..
Tudo isto, ocorre, por assim dizer, sob a direção de um processo político-institucional que une, por um lado, ideologia dominante, legitimadora desse Brasil que “dá certo”, e, por outro, grandes “ações” do Estado no todo da sociedade, buscando, em tese, dar unidade e controlar de alguma maneira essa mesma sociedade. Essas ações do Estado, no entanto, dá-se de diversas maneiras. Podemos citar aqui alguns exemplos disso: impulsionamento a uma ideologia do “crescimento”, que nada diz sobre “crescimento para quem” ou mesmo em que termos de qualidade de vida se dá esse crescimento; intervenções na economia para assim “salvar os capitais”, transferindo o orçamento público à burguesia; e, por fim, ações violentas, legais ou não, que violentam principalmente o povo “pobre, preto e periférico”, como forma de manter esta “ordem” e impedir que humano nenhum seja obstáculo ao bom funcionamento dessa ordem.
Todas essas ações, porém, ainda que tenham o Poder Executivo como o Poder mais evidenciado, contam com as ações também essenciais do Legislativo e Judiciário. Nesse sentido, o Legislativo muito mais do que simplesmente legislar e fiscalizar o Executivo, funciona, na prática, como uma correia de transmissão do Executivo, apoiando-o, de modo geral, através do mecanismo da corrupção (os mensalões são exemplos disso) e da troca de favores. Além disso, esse mesmo Legislativo, dada a muito mal realizada separação dos Poderes no Brasil, funciona simplesmente como o Estado, como a Autoridade local, um certo tipo de coronelismo, com maior ou menor intensidade a depender da localidade a qual esteja inserido.
Como resultado desse funcionamento nada digno das promessas de um Estado “honesto e de organizado”, a descrença do povo em seus “representantes” é escancarada, o que se manifesta através do corrente “todo político é ladrão”, “todo político é igual”. Se pensarmos ainda mais que o Brasil vive desde sua redemocratização um período extremamente instável da economia mundial, um momento que se caracteriza pela saída da lama da ditadura e pela entrada no caos da globalização mundial, podemos concluir que o desafio de controlar uma sociabilidade tão cheia de problemas é ainda maior, o que é agravado pelo funcionamento do Executivo e do Legislativo tal como acima exposto.
Eis, então, que surge o Poder Judiciário como candidato a salvador da pátria, como o Poder imparcial, como o Poder que, em tese, teria a possibilidade de remediar, de dar um jeitinho em toda essa confusão político-institucional. Entretanto, longe de ser isso, o que a realidade nos mostra é que sua função, no geral e apesar de a grande mídia por vezes tentar dizer o contrário, é de ratificação e aprofundamento desse projeto político-institucional mais geral que acabamos de apresentar.
Seu papel, porém, cumpre-se de modo um tanto diferenciado quando comparado com os outros poderes. Mas, no geral, segue desempenhando a função de punir os mais pobres e explorados, acobertando, por outro lado, os corriqueiros abusos policiais e os crimes de colarinho branco. Continuando nesse tipo de exemplo, podemos também dizer que o mesmo Judiciário é aquele que mantém os pobres presos ilegalmente ou por condutas insignificantes. Para se ter uma idéia de como isso é largamente praticado, 80% da população carcerária (além de ser justamente aquela que é “pobre, preta e periférica”) decorre de pequenos crimes contra o patrimônio ou por pequeno tráfico de drogas; desses 80%, quase metade ainda não foi condenada (os dados são do “Manifesto pelo fim dos Massacres”, disponível no site da Rede 2 de Outubro. http://rede2deoutubro.blogspot.com.br/).
Mas a seletividade de classe das decisões do Judiciário não pára por aí. Além de ser corriqueiro o conluio com figurões da classe dominante, bem como por manter relações escusas com o próprio Legislativo e Executivo, o Judiciário desempenha cada vez mais hoje a função de limitar e verdadeiramente combater as lutas em geral da classe trabalhadora. Exemplo disso é o direito de greve que tem sido reiteradamente questionado: as decisões, quando dizem permitir a greve, cada vez mais exigem que o percentual de trabalhadores que não podem parar seja maior. Na prática, as decisões judiciais tendem a dizer o seguinte para os trabalhadores: “vocês podem fazer greve, desde que 100% do efetivo (ou quase isso) esteja trabalhando”.
Obviamente, o Judiciário não é assim porque simplesmente “quer ser assim”. É isso sim, mas é também muito mais. O que de fato se passa mais profundamente é que o Estado brasileiro segue hoje uma política de tentar conter (sempre obedecendo critérios de classe) os efeitos de uma sociabilidade que ele mesmo impulsiona, visto que os problemas que o Estado brasileiro hoje enfrenta decorrem, em muito, justamente de sua intervenção no todo da sociedade. Nesse contexto, dada a própria decadência de representatividade do Legislativo e do Executivo, bem como da própria complexidade incontrolável que a vida social no mundo de hoje tende a ganhar, o Judiciário passa a judicializar cada vez mais as relações sociais, passando ele, então, a assumir cada vez mais a repressão como propriamente uma política de Estado.
De instrumento a ser o último ao qual se recorre, a força passa cada vez mais a ser o instrumento primeiro, afetando, pois, principalmente aqueles que são “pobres, pretos e periféricos” e a classe trabalhadora no geral.
ELEIÇÕES ESTADUNIDENSES: NEM OBAMA, NEM ROMNEY!
POR UMA ALTERNATIVA DOS TRABALHADORES!
Daniel Delfino
Em 2008, a chegada ao poder de um negro chamou a atenção do mundo inteiro, como uma espécie de messias que salvaria os Estados Unidos e o mundo da crise e dos odiados neoconservadores da era Bush. Mas a gestão Obama serviu apenas para comprovar que os dois partidos, Democrata e Republicano, são na verdade as duas alas de um partido único, o partido do capital. O governo dos Estados Unidos, qualquer que seja o presidente eleito, está a serviço da burguesia imperialista mais poderosa do mundo, dos setores mais concentrados, brutais e sórdidos do capital mundial: a indústria armamentista, as empresas petrolíferas, as companhias farmacêuticas, as cadeias de varejo transnacionais, as montadoras e maquiladoras, e o campeão entre esses, o mercado financeiro. As guerras e invasões imperialistas, o plano de se apropriar do petróleo do Oriente Médio, o apoio a Israel, o apoio a todos os governos corruptos, autoritários e anti-operários do mundo, a cobertura às transnacionais estadunidenses para extrair mais-valia de centenas de países às custas do sofrimento dos trabalhadores; são deveres fixos de qualquer presidente estadunidense, os quais Obama cumpriu à risca.
BALANÇO DA GESTÃO OBAMA
Recém-chegado ao poder, Obama tratou de montar um governo bi-partidário (mesmo contando com ampla maioria no legislativo eleita em 2006), em nome de reconstruir a unidade do país para enfrentar a grave crise, preservando figuras chave da gestão anterior, como Ben Bernanke à frente do FED (banco central), Robert Gates (comandante das guerras de Bush) no Pentágono e sua adversária Hillary Clinton como secretária de estado (equivalente a ministro de relações exteriores). Esses nomes garantiam a continuidade da política imperialista, enquanto Obama fazia o papel midiático de “showman”, servindo como testa de ferro do governo.
Uma vez após outra, Obama foi desautorizado por seus subordinados, que desmentiam suas declarações e o reduziam ao ridículo. Os trilionários pacotes de salvamento dos bancos e instituições financeiras, iniciados já no final da gestão Bush, tiveram continuidade e foram ampliados. Os executivos dos bancos resgatados com dinheiro público presentearam a si mesmos com bônus milionários, em meio ao ódio popular, e Obama não fez mais do que lhes passar um sermão sem qualquer consequência prática. As investigações sobre os crimes dos “falcões” da era Bush em suas guerras e também dos financistas responsáveis pela crise terminaram em pizza.
Todas as promessas de campanha foram sucessivamente descumpridas: a retirada das tropas do Iraque (onde permanecem contingentes significativos e também mercenários) foi um simples deslocamento para o Afeganistão; o fechamento dos centros de tortura em Guantánamo (Cuba) não aconteceu; a reforma da saúde pública nunca foi nada além de um paliativo; e a mais importante de todas, a retomada do crescimento e dos empregos, ficou só no marketing. As grandes empresas e o mercado financeiro voltaram a ter lucros, mas isso não melhorou a situação dos trabalhadores.
PIORA A SITUAÇÃO DOS TRABALHADORES
Ao contrário das promessas eleitorais, a miséria avança nos Estados Unidos. Segundo os dados do livro “The rich and the rest of us” (Os ricos e o resto de nós), de Tavis Smiley e Cornel West, “Num país com cerca de 300 milhões de habitantes, 150 milhões estão em pobreza ‘persistente’ ou perto da pobreza (…). Cerca de 14 milhões de pessoas estão oficialmente desempregadas – neste número não são contabilizados os cidadãos que já desistiram de buscar emprego. Estes são alguns dos piores índices em mais de 50 anos. Enquanto isso, apenas 400 cidadãos extremamente ricos possuem a riqueza de 150 milhões de pessoas no país.” (Opera Mundi, 26/09). Os pobres ficaram mais pobres e os ricos mais ricos.
Desde o início da crise econômica em 2008, milhões de trabalhadores vêm perdendo seus empregos, suas moradias (por não poder pagar as hipotecas), seus planos de saúde, vendo-se dependentes dos programas de seguro-desemprego e saúde pública para se alimentar e sobreviver. Cenas antes comuns apenas no chamado “terceiro mundo”, tornaram-se comuns nos Estados Unidos na era Obama: acampamentos de sem-teto nas redondezas das grandes cidades, bairros inteiros transformados em favelas, vendedores ambulantes, pedintes e mendigos nas ruas, doentes morrendo por não poder pagar pelo atendimento hospitalar, crianças desnutridas, etc. O governo Obama não é capaz de reverter esse empobrecimento, e nem tampouco o será o seu adversário republicano, que já declarou publicamente que não governará para os pobres.
CRUEZA DO CANDIDATO REPUBLICANO
O atual adversário de Obama, Mitt Romney, é um típico homem de negócio, um grande burguês que representa os conservadores de perfil tradicional. Romney tenta vender uma imagem de gestor competente e critica a política econômica de Obama, propondo um receituário estritamente neoliberal para tirar o país da estagnação: corte de impostos dos ricos e corte de gastos sociais com os pobres. Para Romney, 47% dos eleitores democratas jamais votariam nele porque dependem do Estado, o que em linguagem coloquial equivaleria a dizer que são vagabundos. Essa declaração escandalosa, emitida num evento para arrecadar fundos para a campanha e vazada na internet, é inteiramente condizente com o conteúdo explícito do programa do candidato, mas pode custar a eleição a Romney.
A resposta de Obama foi pronta: no programa de David Letterman o candidato à reeleição disse que “um presidente precisa governar para todos”. A declaração de Romney expunha de forma distorcida a existência da divisão de classes (pobres X ricos, vencedores X perdedores). A resposta de Obama esconde a divisão de classe (o país é de todos). Romney expõe a divisão de classe, com um viés de direita, defendendo a necessidade de mais ataques sobre os trabalhadores. Obama esconde a divisão de classe, para não provocar reações pela esquerda, ou seja, para impedir que haja mobilização dos trabalhadores contra os ataques, que seguirão sendo feitos de qualquer forma.
No atual momento, a burguesia estadunidense prefere não dar motivos explícitos para a mobilização dos trabalhadores e agir de maneira mais sub-reptícia. Para isso, o perfil de Obama parece ser o mais indicado. A escolha da burguesia em torno de qual seria o gestor mais adequado para o momento deve ser o fator decisivo para as eleições. Conta também o fato de que Obama é o candidato preferido fora dos Estados Unidos. Uma pesquisa realizada em 32 países mostra Obama com 51% da preferência contra 12% de Romney (UOL, 17/09).
QUALQUER QUE SEJA O PRESIDENTE, UM INIMIGO DOS TRABALHADORES
O respaldo do presidente perante determinados países também é importante num momento em que é preciso obter alguma unidade para enfrentar a crise mundial. Entretanto, popularidade de Obama à parte, a unidade será bastante difícil de obter na prática, na medida em que uma das políticas dos Estados Unidos para sair da crise tem sido a ofensiva para reverter o saldo negativo na balança comercial. Uma nova rodada de “alívio quantitativo” foi anunciada em setembro, autorizando o FED a emitir até US$ 40 bilhões por mês, por meio da compra de títulos, para estimular o mercado. Isso vai ter como efeito a desvalorização do dólar perante outras moedas, favorecendo as exportações estadunidenses. Imediatamente, isso provocou protestos de outros países exportadores e temores de uma guerra cambial de desvalorizações.
A guerra comercial precipitada pelos Estados Unidos está por trás dos conflitos entre países exportadores, que vêem suas economias patinando em plena crise mundial. É o caso da recente escalada entre China e Japão, que pouco tem a ver com um punhado de ilhas e mais com as dificuldades de ambas as economias. Da mesma forma, o filme ofensivo aos muçulmanos é uma provocação para fazer com que a nova onda de protestos nos países árabes desfaça a simpatia do mundo inteiro pela primavera árabe: os muçulmanos devem voltar a ser vistos como fanáticos e bárbaros que não respeitam a “liberdade de expressão”. Isso prova que, como qualquer presidente, Obama defenderá os interesses da burguesia estadunidense, externa e internamente.
A NECESSIDADE DE UMA ALTERNATIVA INDEPENDENTE
A vitória de Obama em 2008 foi obtida com uma importante votação dos jovens, dos negros e dos latinos, tradicionalmente os trabalhadores mais explorados nos Estados Unidos. A gestão Obama não melhorou em nada a vida desses setores, que mesmo assim mantém a esperança no candidato democrata. A maior parte dos sindicatos, controlados pela burocracia da central sindical AFL-CIO, colaboraram com o governo Obama, assinando acordos de demissão e redução de salários. Em troca, os dirigentes do UAW, sindicato dos trabalhadores das montadoras, ganharam ações e se tornaram sócios da GM quando a empresa foi “reestruturada” pelo governo Obama em 2009! Historicamente, os sindicatos contribuem financeiramente com os democratas e isso se repete em 2012.
Apesar das seguidas demonstrações de obediência ao capital por parte dos democratas, há uma camada de intelectuais, artistas e celebridades que apoiam Obama, com a justificativa de que seu governo está mais “à esquerda” que o dos republicanos… Nesse momento é preciso dizer com todas as letras: Obama é inimigo dos trabalhadores estadunidenses e do restante do mundo, assim como o candidato republicano! Ao invés de votar nos candidatos democratas ou republicanos, os trabalhadores estadunidenses precisam confiar apenas nas suas forças. Só a luta muda a vida, como demonstraram os professores de Chicago e vários outros trabalhadores que têm feito greves por todo o país, de forma ainda incipiente. Também existe luta de classes nos Estados Unidos, e para sair da derrota, os trabalhadores precisam construir seus próprios instrumentos e organismos de luta, independentes das duas alas do partido do capital.