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2010 – Contra as saídas burguesas, apresentar uma saída dos trabalhadores


25 de abril de 2010

2010 – CONTRA AS SAÍDAS BURGUESAS, APRESENTAR UMA SAÍDA DOS TRABALHADORES!


Primeiramente, é preciso desmistificar a idéia de que a crise já tenha sido superada: embora haja uma recuperação nos setores de construção civil, exportação de matérias-primas e de serviços, a produção industrial brasileira – dado fundamental em qualquer análise econômica – teve queda de 7,4% em 2009, comparado a 2008. Foi a maior queda anual desde 1990. (http://economia.estadao.com.br/noticias/producao-industrial-tem-queda-de-7-4-em-2009,not_3375.htm).

O fôlego da retomada atual dependerá muito da economia mundial, particularmente dos países centrais, cujas economias praticamente continuam estagnadas, bem abaixo dos níveis pré-crise. As dificuldades crescentes dos países mais pobres da Europa em manter os pagamentos dos juros de suas dívidas demonstram que a situação mundial ainda não está definida no sentido de uma recuperação, o que também desautoriza a festa que a burguesia brasileira e o governo e vêm fazendo.

Trata-se de uma retomada em grande medida artificial, pois as causas estruturais da crise não foram resolvidas. Não há aumento real de poder de compra dos trabalhadores ou da classe média que possa sinalizar um novo ciclo de crescimento sobre bases sólidas.

Toda a ajuda financeira dos governos ocorreu no sentido de fornecer incentivos fiscais, crédito barato e seguro às empresas e às famílias para, com isso, incentivar o consumo e tentar recompor a taxa de lucro das empresas no curto prazo. Porém, isso gera novas contradições para um futuro não muito distante. Um exemplo é o aumento da Dívida Pública da União, que fechará 2010 entre 1,60 trilhão e 1,73 trilhão de reais. (http://br.reuters.com/article/businessNews/idBRSPE60P02I20100126).

De forma geral, houve uma explosão das operações de crédito – leia-se de endividamento – que cresceram 14,9% no Brasil, só em 2009, atingindo a soma de R$ 1,410 trilhão. Esse valor representa 45% do PIB, contra 39,7% em 2008.  (http://www.diariosp.com.br/Noticias/Economia/180/Credito+cresce+14,9%25+no+Brasil+em+2009).         Mas ao mesmo tempo, a burguesia vem implementado uma nova reestruturação produtiva, através do aumento da sobrecarga de trabalho sobre os trabalhadores que permaneceram, da redução de salários e direitos, da precarização dos vínculos de contratação, etc. Outra saída adotada é a fusão de empresas, cujos exemplos mais atuais são a compra das Casas Bahia pela Rede Pão de Açúcar, e a compra da Nossa Caixa pelo Banco do Brasil. Quantas lojas e agências poderão ser fechadas?

Assim, por mais que o estado intervenha para aquecer artificialmente a economia – e essa intervenção tem um limite –, as ações estruturais de cada empresa individualmente têm o efeito de corroer o mercado real de consumo de massas. Ao longo do tempo, essa tendência estrutural de lento crescimento/estagnação dos mercados voltará a se impor e teremos a irrupção muito mais severa da crise, agravada ainda pela crise financeira devido ao enorme endividamento que vem sendo incentivado no Brasil.

 

Os mecanismos do estado para manter e aumentar a exploração

No imediato, mesmo com a recuperação atual, sentimos o endurecimento do empresariado e do estado capitalista para com os trabalhadores em todos os aspectos. Os empregos gerados no último período registram salários menores e vínculos precários.

Isso não é produto da vontade individual deste ou daquele empresário, mas expressão da situação a que chegou o sistema capitalista. Devido à tendência de estagnação/lento crescimento da demanda real apontada acima, a competição entre as empresas acirra-se mais ainda, e também os ataques aos trabalhadores.

O Estado tenta se equilibrar entre duas tendências: de um lado, os gastos com a ajuda ao capital produtivo e, do outro, o pagamento dos juros da Dívida Pública ao capital financeiro; esse equilíbrio só pode se manter à medida que o estado se desobrigue cada vez mais dos serviços públicos destinados à imensa maioria da população, aumente as taxas públicas, mantenha congelado o salário do funcionalismo público, faça reformas como a da Previdência, ou seja, também ataque os trabalhadores.

No plano político, jurídico, ideológico e militar, cumpre ao Estado “organizar e manter o consenso”, ou seja, a idéia de que não há outra saída a não ser propiciar as melhores condições de lucratividade para as empresas como forma de impedir a quebra da economia e o desemprego. É a ideologia do “Não há Alternativa”.

A democracia burguesa tem se mostrado uma política bastante eficaz para ludibriar, cooptar e controlar os trabalhadores. Através dos ditos “mecanismos participativos”, e de instituições comprometidas até a alma com os interesses dos empresários: o capital busca a legitimidade para impor seus interesses, fazendo passar a idéia de que os seus interesses são os interesses de todos ou da maioria. Na democracia burguesa não significa que não há repressão aos movimentos sociais, mas sim que essa repressão é legalizada. Há inclusive a possibilidade de uma combinação da democracia burguesa com a escalada militarista, como no caso de Honduras, em que os golpistas buscaram se legitimar a partir de instituições como o Congresso e a Suprema Corte e, ao final, para se consolidar, recorreram às eleições, em que seu candidato venceu.

Outro mecanismo bastante utilizado tem sido o assistencialismo, com o objetivo de acomodar e desmoralizar o setor mais pauperizado, dotado de maior explosividade, opondo-o aos demais setores da classe trabalhadora, para os quais a política é de endurecimento, como no caso dos funcionários públicos, dos correios, bancários, etc. Através das inúmeras formas de assistencialismo, também se coopta as direções e ativistas mais dinâmicos que poderiam se constituir num problema para o governo e o sistema. Esse foi o caso das inúmeras “Bolsas”, PROUNI, etc.

Já para os movimentos que alcançam maior conflitividade, a política é de repressão direta, como por exemplo a luta dos camelôs, dos movimentos dos atingidos pelas enchentes, das ocupações e ações do MST nas fazendas do agronegócio, entre outros. Nas favelas, a ordem é a mesma: controle e repressão sobre qualquer movimento que venha a ameaçar o funcionamento normal do consumo, do turismo, dos lucros.

 

CUT, FORÇA e CTB: Defendendo o capital, contra os trabalhadores

 É preciso frisar que todas essas ações, tanto dos empresários como do estado, têm contado com a ajuda direta ou indireta das direções do movimento, particularmente da CUT e da Força Sindical. Sua postura tem sido a de defender as parcerias com os empresários, via acordos de flexibilização de salários e direitos, isenções de impostos para as empresas e o incentivo ao endividamento geral como se fossem políticas positivas. Assim, as empresas demitem e/ou precarizam os contratos, mostrando que esse tipo de acordo só interessa aos empresários. Essas direções abriram mão de qualquer perspectiva de ruptura e superação da lógica do capital e do lucro. Assumindo para si o horizonte do capitalismo como o único possível, realmente há muito pouco a se fazer e cai-se, mais cedo ou mais tarde, no discurso de que os trabalhadores e os capitalistas são parceiros e que, quando um ganha, todos ganham, o que é uma grande mentira.

À falta de uma perspectiva de luta e socialista da classe trabalhadora, a burguesia que opera no Brasil consegue descarregar parte do peso da crise econômica sobre esta, impedindo momentaneamente uma grande recessão ou mesmo uma depressão.

 

Combate político e ideológico à lógica do capital

Portanto, o maior desafio que está colocado para o próximo período é o de ser parte e intervir na base dos vários movimentos e fóruns de luta e de reorganização da classe trabalhadora, no sentido da reconstrução de uma saída de luta e socialista desde a vanguarda até setores de massa, apresentando uma crítica profunda dos vários mecanismos de dominação dos trabalhadores aplicados pela burguesia e seu estado. Não basta apenas ficar repetindo que o governo Lula é traidor, como fazem a maioria das organizações da esquerda. É preciso demonstrar os fundamentos que o levam a agir assim, as contradições desses fundamentos e, a partir daí, apresentar uma saída crítica-prática, e não apenas um amontoado de palavras de ordem, sem relação com a realidade dos trabalhadores.

A intervenção da esquerda neste ano terá alguns desafios importantes: em primeiro lugar, é preciso denunciar a euforia enganosa de que agora tudo vai ficar bem e que o Brasil é o país do futuro. É preciso lembrar que o espaço reservado para o Brasil dentro da divisão mundial do trabalho é basicamente o de fornecedor de matérias-primas e de uma plataforma de exportação na América Latina. Esse papel não é nem de perto suficiente para alçar o Brasil à condição de país de primeira grandeza no mundo. Além disso, mesmo que a economia brasileira venha a se desenvolver, isso não significa que haverá melhores condições de vida para os trabalhadores. O padrão capitalista de desenvolvimento que está sendo implantado é extremamente explorador dos trabalhadores e destruidor do ambiente. A Copa em 2014 e as Olimpíadas em 2016 são muito mais despesas para o Estado do que investimentos do capital. Os empregos gerados serão temporários e mal remunerados. Um bom exemplo foi a realização do Pan no Rio de Janeiro, que de nada serviu para melhorar a situação dos trabalhadores e, ao contrário, os problemas sociais se agravaram, aumentando o poder de ação do tráfico e a repressão da polícia sobre os moradores das comunidades de periferia.

Com relação às campanhas salariais, o maior desafio é impulsioná-las para além dos limites imediatistas e corporativistas, no sentido de que busquem uma ponte entre suas demandas e as dos demais trabalhadores, apontando saídas mais gerais para aspectos estruturais da sociedade como a educação, a saúde, o emprego, a Previdência, o ambiente, os transportes, a violência, o racismo, a opressão da mulher, etc.

Este ano, nos dias 5 e 6 de junho, haverá a realização do CONCLAT – “Congresso Nacional da Classe Trabalhadora” – que poderá fundar uma nova Central de Luta, como alternativa de luta à CUT e demais centrais governistas. A tarefa central aí será, não apenas fundar uma nova central, mas acima de tudo uma nova concepção de atuação sindical que supere os limites atuais e esteja à altura dos desafios colocados pelo capitalismo de hoje. É preciso superar o sindicalismo imediatista, característico da maioria das correntes de esquerda, sob pena de não se conseguir sequer defender as conquistas existentes. É preciso debater com a classe trabalhadora a necessidade da ruptura com a lógica do lucro e a construção de uma outra sociedade, em base a um compromisso com as necessidades reais da maioria da população, definidas democraticamente. Outras lutas importantes são contra a burocratização – o que exige permanente ação de formação para que os trabalhadores venham a ocupar os espaços de decisão nas entidades –, bem como a adoção de medidas que dificultem o processo de burocratização, como rodízio, fim dos privilégios, controle sobre os mandatos, etc. Enfim, é preciso um novo sindicalismo, uma re-educação da própria esquerda atual.

 

Construir um movimento político dos trabalhadores pela base!

Outro fato importante, e que já está influenciando a realidade brasileira, são as eleições de 2010. Por trás de toda a disputa presidencial entre PT e PSDB, esconde-se a unidade de ambos os setores em torno do mesmo projeto para o país: a manutenção da inserção subordinada do país à lógica do capitalismo globalizado. Ambos defendem a manutenção dos compromissos com o capital financeiro, as isenções de impostos para as empresas, o corte dos direitos sociais, a entrega dos recursos naturais ao capital privado, etc. A única disputa é se a burocracia política, de estado e sindical representada pelo PT continuará abocanhando uma parte da renda do estado, ou se a burguesia propriamente dita ficará com tudo, ao administrar o país sem a intermediação da burocracia.

Já a tarefa da esquerda, muito mais do que buscar qualquer viabilidade por dentro da lógica eleitoral, é a de uma crítica profunda aos fundamentos do modelo de economia e de sociedade que está sendo implementado no Brasil e suas conseqüências. Mais do que qualquer coisa, é preciso disputar a consciência de amplos setores para um programa de ruptura com a lógica capitalista e a apresentação de uma alternativa socialista para o país e a sociedade.

Outro pilar de sustentação dessa atuação tem que ser a unidade da esquerda de luta, que essa unidade ocorra pela base e esteja enraizada nos movimentos sociais. Nesse ponto, não podemos deixar de dizer que as duas principais correntes, tanto o PSOL quanto o PSTU começaram mal.

O PSOL insistiu até o último momento em uma Frente com o PV de Marina Silva, um partido que diz defender a natureza, mas incoerentemente tem em seu programa a defesa da “livre iniciativa” e da “economia de mercado”. Quando, por fim, o PV demonstrou que em seu arco de alianças cabe até o PSDB, como no Rio de janeiro, o PSOL não teve mais como sustentar essa tentativa e a partir daí passou a defender uma candidatura própria em coligação com outros partidos da esquerda, candidatura essa que será definida em março, em sua conferência.

Já o PSTU, apesar de dizer que defende uma Frente Classista e Socialista dos Trabalhadores, assim que percebeu o movimento de aproximação do PSOL com o PV, preferiu já lançar seu pré-candidato – Zé Maria. Ao nosso ver, isso caracteriza uma concepção equivocada, em que o partido decide tudo e os ativistas e demais trabalhadores só entram na hora de fazer campanha e/ou votar…

Ora, do que se trata é justamente da constituição de algo muito mais amplo, um movimento político dos trabalhadores, que tenha sua expressão eleitoral, mas que essa expressão seja definida a partir de debates e fóruns os mais amplos possíveis, por exemplo, plenárias e debates abertos a todos que queiram construir essa alternativa unitária que seja a expressão política das necessidades imediatas e históricas dos trabalhadores, nas lutas e nas eleições.

Sem essa “alma” que só pode ser a empolgação dos ativistas e trabalhadores como sujeitos de sua própria representação política, essa pré-candidatura também não tem ainda entusiasmado a vanguarda, o que confirma que o lançamento ocorreu de forma precipitada e a partir de cima.

É preciso superar a lógica divisionista na esquerda, bem como fazer com que as decisões da base sejam superiores que as das cúpulas. É preciso constituir urgentemente e a partir da base um movimento político dos trabalhadores, que apresente uma saída socialista pra a sociedade nas lutas e também nas eleições.

É preciso uma explicação marxista para as recentes manifestações (violentas) da natureza. A idéia que tem prevalecido é a da burguesia, mas essa sempre esconde a verdade. Estamos nos propondo a iniciar esse debate no movimento e para isso apresentamos alguns textos à reflexão dos militantes e ativistas. Eles têm como centro a relação do capitalismo com a natureza. Partimos do aspecto antropológico e filosófico da relação entre trabalho alienado e natureza. Passamos nos textos a seguir pela explicação das conseqüências sociais dos desastres naturais, abordamos a incapacidade da burguesia resolver esses problemas (a conferência de Copenhague) e analisamos também o problema do trânsito nas grandes metrópoles, uma das manifestações mais irracionais do uso capitalista dos recursos.