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A História … é outros 500!


25 de abril de 2010

Com a comemoração eufórica dos 500 anos do Descobrimento do Brasil, os meios de comunicação e mídia não produzem somente uma falsificação da nossa história, mascaram todo o processo de invasão e ocultam a real situação de exploração, discriminação, preconceito, violência social, destruição de todos os valores humanos e coletivos que sofremos.

A outra marca da campanha Brasil – 500 Anos é seu clima de otimismo conformista sobre o futuro. É o que está embutido na idéia de que o Brasil é um país jovem (?), globalizado, integrado ao primeiro mundo e rumo ao desenvolvimento, o que poderia ser constatado na disseminação de computadores, celulares, TV´s a cabo, turismo, que povoa os sonhos e a vida dos que ainda podem consumir.

Mas, se formos ver, esse otimismo conservador não tem a menor base na realidade dos milhões que vivem do seu trabalho, hoje mais explorados, inseguros e infelizes do que nunca.

O desemprego estrutural bate novo recorde e o rebaixamento dos salários e direitos são a tônica no Brasil como em toda América Latina. Com o emprego de novas tecnologias, terceirizações, etc a super-exploração dos capitalistas ocorre sobre um número menor de trabalhadores com jornadas e ritmos extenuantes e nos mostra uma face bem mais monstruosa do que vemos na telinha ou nos sambas-enredos do Carnaval.

O aumento da discriminação e segregação dos negros, problemas como as drogas, chacinas executadas por grupos de extermínio ou diretamente pela polícia vão se tornando cada vez mais normais.

Quanto ao que restou das comunidades indígenas, o capitalismo lhes impõe a adaptação às suas regras ou a morte, o que já está levando à destruição completa de identidades e tradições muito ricas, mas sem valor para o capital.

Um menor olhar crítico também basta para deixar qualquer um perplexo com as catástrofes urbanas e camponesas (enchentes, desabamentos, poluição ambiental, desmatamentos, efeito estufa, destruição da camada de ozônio) criadas pela civilização do capital. Projetar nosso pensamento para o futuro nos faz sentir um calafrio…A barbárie está batendo à nossa porta!

Sendo assim, toda a euforia dos meios de comunicação a respeito da situação e das perspectivas do Brasil e do mundo só pode corresponder aos interesses dos grandes empresários que tentam passar a imagem de que aqui tudo está bem. No momento em que os 10 mais ricos controlam 50,6% da renda nacional (maior taxa de concentração do mundo).

Como todo rico emergente, procuram festejar o hoje e não pensar nem nos outros seres humanos, nem no amanhã. Presos à sua própria realidade de parasitas, comemoraram o aniversário de um processo de conquista e pilhagens, passando a idéia de que os seus êxitos de dominação são de todos. Querem nos contaminar com suas idéias e valores.

Essa farsa pode ser até eficaz por um período, até que venham os próximos momentos de agravamento da crise econômica hoje varrida para debaixo do tapete.

Hoje, as classes dominantes podem comemorar principalmente o fato de que os trabalhadores e demais explorados brasileiros das diversas etnias e origens não desenvolveram ainda uma alternativa unificada e internacionalizada de resistência e muito menos um projeto de sociedade alternativa ao capitalismo.

Mas, a história não deu sua última palavra. Atravessado por contradições insolúveis e sem oferecer qualquer perspectiva de um futuro digno, esse sistema não é indestrutível como procura se apresentar.

O movimento subterrâneo de experiências e descontentamento se desenvolve e em toda parte vemos que os explorados se recusam a perecer sem lutar. Ainda que desorientada, nossa classe começa a reagir, inventando diversas formas de resistência e organização (os sem-terra, o movimento Hip-Hop, as lutas dos camelôs, dos perueiros, dos caminhoneiros, lutas essas que já não se enquadram nos esquemas sindicais envelhecidos e corrompidos.

Devemos reconhecer que, ao estarmos deste lado, as tarefas não são nada fáceis. Mas não podemos cair no desânimo ou no conformismo. Tão pouco o desespero e o imediatismo conduzirão a bons resultados. É preciso livrarmo-nos dessa herança escravista. Não podemos levar mais 500 anos para mudarmos o rumo de nossa história.

Pensar e lutar por uma saída frente a atual da situação dos explorados e oprimidos exige estudo e atuação nas diversas formas de resistência que se constituíram e ainda sobrevivem contra o processo de dominação e exploração que se implantou no país nesses 500 anos.

As lutas dos indígenas para sobreviverem e dos negros com sua recusa a viverem como escravos; as experiências comunitárias como os quilombos, aldeias indígenas; as lutas dos imigrantes por melhores condições de trabalho e remuneração; as insurreições como a Cabanagem, Canudos, a Balaiada, etc; as lutas da jovem classe operária influenciada pelas idéias libertárias do anarquismo italiano, etc… as experiências das comunidades e guerrilhas camponesas pela terra; a resistência contra a ditadura militar; as lutas sindicais dos anos 70 e 80,etc. As lutas das mulheres pelo fim regime patriarcal, das comunidades camponesas e tantos outros que surgiram nesses anos todos de dominação constituem um imenso patrimônio, geralmente menosprezado pelas esquerdas.

Hoje, cabe aos novos movimentos que se colocam em cena, se coordenarem e atuarem sobre os trabalhadores industriais e de outros setores fortes da economia, no sentido de influenciá-los com suas bandeiras. Também será necessário que os segmentos tradicionais da classe que vive do seu próprio trabalho, por sua vez, estabeleça a unidade com todos esses setores, incorporando suas reivindicações e várias de suas experiências.

A expropriação das máquinas, técnicas e ciências desenvolvidas pelo capitalismo, transformando-as e colocando-as sob a gestão direta e coletiva dos trabalhadores, direcionando o seu uso para o bem estar humano e não para o lucro, é a única forma de assimilar os progressos desenvolvidos sob o capitalismo e fazer com que os estragos humanos e ambientais provocados por esses 500 anos sejam revertidos.

Por outro lado é necessário combatermos o nacionalismo desenfreado e estabelecermos vínculos na direção dos outros países e povos da América Latina, que também são fruto de uma mesma cultura de dominação. Seria necessário retomar a idéia de uma Segunda Libertação latino-americana, desta vez a libertação da dominação capitalista.

Ao nosso ver, duas tarefas hoje se destacam nessa direção:

  • A participação social nas lutas e experiências da classe trabalhadora como seus aliados e impulsionadores e não como seus guias; como seus interlocutores e não como seus mestres; lutando para ajudar a produzir a consciência e uma saída de classe e não como transmissores de uma suposta consciência que julgamos possuir.
  • O reagrupamento internacional dos revolucionários que ganha sentido como forma de multiplicarmos a força e influência das idéias anticapitalistas, socialistas e libertárias com o objetivo de se construir sínteses e não dogmas.

Na verdade o projeto Brasil, 500 anos é a tentativa mais violenta de demonstração de uma nação sem conflitos às custas da falsificação da história e do ocultamento da dura realidade da nossa classe.

500 anos de extermínio e etnocídio;

389 anos de massacre ao negro e a cultura afro;

111 anos de exploração da classe trabalhadora e imposição da cultura capitalista.

Não podemos negar a nossa história, mas, podemos mudar o seu rumo!

Alex e Ira (ABC).