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Início de governo e o aumento das várias formas de violência


11 de fevereiro de 2019

Começamos 2019 buscando entender como cada parcela da classe trabalhadora sofrerá os impactos das medidas apresentadas pelo novo governo e já podemos afirmar: mulher, LGBT, negro e indígena muito têm a dizer e a resistir.

Consideramos que vivemos a crise estrutural do capital com um longo período de crise econômica global que se apresentam ainda mais agravadas para quem vive sob o patriarcado, o machismo, a homofobia e o racismo.

A nossa experiência cotidiana e em luta têm demonstrado que diante de um novo governo as políticas públicas são, quando muito, apenas examinadas, os ministérios são reformulados com novos nomes indicados, assuntos polêmicos que envolvem diretamente as nossas vidas ou corpos são levantados, enfim, muito se diz mas pouco se faz em favor das parcelas mais oprimidas da sociedade. E com o governo Bolsonaro tem sido ainda pior.

Em poucos dias de Janeiro foram registrados 107 casos de feminicídio no país, em 21 estados. São 28 assassinatos de LGBT. O número de negros assassinados, que nunca parou de crescer e encerrou 2018 com índice 23% maior que anos anteriores, nem os registros atualizados estão. No grande crime ambiental com alto número de mortes ocorrido nesse início de ano, Brumadinho, o risco é de extermínio de índios Pataxó localizados à margem do rio.

Podemos verificar aqui cada um dos agravantes desses assassinatos, além das várias outras formas de violência contra essas populações, no entanto, necessitamos considerar que o fato de sermos parte da classe trabalhadora, estarmos em um momento de intensificação da retirada de direitos e da busca desenfreada pelo lucro essa situação se agrava.

Nesse sentido, além da luta cotidiana pela sobrevivência, com o governo Bolsonaro, medidas autoritárias e retrogradas, temos que enfrentar ainda mais profundamente o aumento das desigualdades entre as pessoas, das diferenças que aumentam os preconceitos, da opressão e da intensificação da exploração a fim de não retrocedermos em conquistas e não permitirmos o avanço de ações e ideias contra a classe trabalhadora (consideradas de direita).

Bolsonaro e o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos

Com a chegada do novo governo foram cumpridas rapidamente algumas mudanças prometidas em campanha. Começaram mudando o nome do Ministério (dos Direitos Humanos; das Mulheres da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos) para esse atual, que englobou a FUNAI.

Esse ministério, com suas atribuições e pela urgência, necessitaria aplicar de imediato as políticas públicas para cada um dos setores, no entanto, iniciou com medidas que afetam negativamente a vida de mulheres, LGBTs, negros e indígenas. E com uma nova ministra, Damares Alves.

A ministra sem nenhum diálogo com a maioria das mulheres brasileiras ignorou: o alto número de mulheres assassinadas devido ao feminicídio (cometido por razão da condição do sexo feminino) e mortas devido ao aborto inseguro (permitido em casos de: gravidez resultado de estupro; risco de vida para a mulher; feto anencéfalo); ameaçou aprovar o Estatuto do Nascituro (não permite o aborto resultado de estupro) travado desde 2013 devido à luta dos movimentos de mulheres, etc.

Ignorou ainda a importância do ensino de Educação Sexual e Gênero nas escolas (como a pessoa se reconhece: mulher, homem ou nenhum deles) e insistiu no discurso da defesa de Menino veste azul/Menina rosa.

A ministra insistiu também na crítica às famílias de estudantes do SISU por autorizarem os jovens a realizar seus estudos universitários fora do estado onde moram enquanto é acusada de levar, sem autorização, criança indígena para fora do estado.

Dessa forma vão reformulando um Ministério. Têm-se uma ministra como foco num projeto de governo que – busca pôr fim ao Estado laico e impor uma religião, impor um tipo de família, negar várias formas de violência e impor uma ideologia – vai sendo construído com o objetivo de submeter a classe trabalhadora de conjunto e as populações oprimidas em específico a fim de retirar direitos, intensificar a exploração, fortalecer empresariado e agronegócio. A desinformação de várias formas tem sido um dos instrumentos para isso.

Essa desinformação que é levantada em redes sociais e respondida em notas pelo próprio Ministério contribui também para que as várias formas de violência continuem não solucionadas, fortalecendo o cotidiano do machismo, da homofobia, do racismo e do direito de propriedade (que garante posse e poder para alguns poucos) para que a maioria tenha seus direitos atacados e retirados.

Assim sendo, as lutas contra todas as formas de violência e contra os ataques aos nossos direitos são também contra um projeto político que não garante os direitos básicos e humanos (à vida, liberdade, trabalho, saúde, moradia, terra, Educação, etc.) para toda a classe trabalhadora e populações indígenas que possibilitariam uma sociedade mais humana.

As mulheres da classe trabalhadora e a intensificação dos ataques

O fato de sermos mulheres da classe trabalhadora, além de todas as dificuldades acima citadas, temos também os direitos sendo retirados. Nesse momento, por exemplo, com as propostas de Reforma da Previdência há tentativas de acabar com a diferença de idade de aposentadoria. É a intensificação da exploração da classe trabalhadora em geral sendo da mulher ainda maior.

A dupla ou tripla jornada de trabalho, na média anual, que obrigou a mulher da classe trabalhadora se aposentar antes, não foi reduzida. A dupla jornada de trabalho para mulher soma cerca de 18,1 horas por semana.

Mas, mesmo assim, nessas propostas, buscam acabar com a diferença de idade de aposentadoria entre homens e mulheres, ou seja, a mulher trabalhará vários anos a mais.

Assim, buscam igualar mulher com homem na idade para aposentar e no tempo de contribuição (ambos com 65 anos de idade e 40 anos de contribuição), mesmo a mulher tendo trabalhado jornada dupla por boa parte da vida, isto é, fica quase impossível para a mulher da classe trabalhadora estar viva no tempo de se aposentar.

Podemos dizer ainda que, com a Reforma Trabalhista, parte das mulheres trabalhadoras está voltando para casa sendo levada a assumir o trabalho parcial (de até 30 horas semanais) com menos horas de trabalho renumerado e menos direitos que os homens, são 28,2% das mulheres e 14,1% para os homens.

Já está recebendo 75% do salário médio do homem, mesmo com maior nível de estudo. Está com um índice de desemprego maior de 13,6% (homens de 10,5%).

Dessa forma, a mulher está recebendo salário menor, trabalhando mais horas com menos horas remuneradas, menos direitos trabalhistas e com maior dificuldade para se aposentar. Isso tudo é ainda mais agravado para a mulher negra da classe trabalhadora.

Ainda assim, com tanto por fazer em favor da mulher trabalhadora, temos nos deparado com um governo e uma ministra autoritários e reacionários que buscam impor medidas para aprofundar ainda mais esse nível de exploração e opressão.

As LGBTs e os primeiros ataques do Governo

Ao termos contato com declarações como essas podemos sentir raiva, tristeza e angústia:

“Não vou combater nem discriminar, mas, se eu vir dois homens se beijando na rua, vou bater”.

“O filho começa a ficar assim, meio gayzinho, leva um couro e muda o comportamento dele. Olha, eu vejo muita gente por aí dizendo: ainda bem que eu levei umas palmadas, meu pai me ensinou a ser homem. A gente precisa agir”.

“O que esse pessoal tem para oferecer para a sociedade? Casamento gay? Adoção de filhos? Dizer que se seus jovens, um dia, forem ter um filho, que se for gay é legal? Esse pessoal não tem nada a oferecer.”

“Que respeitar homossexual. Eles que têm que nos respeitar”.

“O sangue de um homossexual pode contaminar o sangue de um heterossexual”.

“Sou preconceituoso, com muito orgulho”.

“Seria incapaz de amar um filho homossexual. Não vou dar uma de hipócrita aqui: prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí. Para mim ele vai ter morrido mesmo”.

“Se um casal homossexual vier morar do meu lado, isso vai desvalorizar a minha casa! Se eles andarem de mão dada e derem beijinho, desvaloriza”.

“Família gay não existe”.

“Ensinar para a criança que ser gay é normal? Não!”

“Dá nojo. Esses gays e lésbicas querem que nós, a maioria, entubemos como exemplo de comportamento a sua promiscuidade… Nós não podemos nos submeter aos escárnio da sociedade”.

“Não existe homofobia no Brasil” e “a sociedade brasileira não gosta de homossexuais”.

(Encontradas em: https://bit.ly/2HK0dqh)

E ao ter conhecimento que são declarações do Presidente da República os sentimentos de raiva, tristeza e angústia se elevam já que, além de cumprirem o papel de atacar toda a população LGBT, cumprem o papel de disseminar a homofobia.

Após a posse de Bolsonaro a população LGBT ficou à espreita sabendo que os ataques institucionais viriam, visto que nas ruas os eleitores e defensores do presidente já haviam começado a pôr em prática sua LGBTfobia. Se antes batiam e matavam LGBTs, agora, esses ataques vêm com orgulho, gritos de “Viva Bolsonaro” e com o apoio de instituições burguesas que não os reprimem.

Assim, as notícias de retirada de direitos LGTBs não são surpresas. Com a publicação da Medida Provisória n°870 de 01/01/2019 e a alteração de Ministério de Direitos Humanos para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos não se incluiu a população LGBT para o desenvolvimento de políticas públicas e diretrizes. E, de fato, nunca estivemos.

Continuamos sem uma Secretaria específica para atender essas questões, que sempre foram diretamente atendidas pelo Conselho Nacional de Combate à Discriminação. E, com o caráter reacionário e conservador desse governo, certamente esse Conselho não manterá as ações.

Dessa forma, logo de início observamos que não se tratava apenas de “torcer contra ou a favor” a esse governo, afinal, em seu Plano de Governo durante a candidatura sequer mencionou a palavra LGBT, se tratava urgente e necessário conhecer o seu posicionamento político sobre a questão LGBT. E aí, entendemos sim ser necessário estarmos diretamente contra esse governo para, justamente, defendermos as necessidades dessa população.

Seu posicionamento LGBTfóbico tem tanta repercussão e fortalecimento desses preconceitos que em Santa Catarina, já no início desse ano, o governador Carlos Moisés vetou o Projeto de Lei 48/2017 que prevê o uso do nome social e o reconhecimento dos gêneros travesti e transsexual no âmbito da administração pública do estado. Os argumentos utilizados são técnicos/jurídicos e buscam esconder seu caráter transfóbico. No entanto, várias entidades já recorrem na Justiça dessa decisão.

A ministra também já mostrou que LGBTs não terão vez nesse governo e que não se trata só de direcionar a padronização de roupas. Com isso vai muito além, quer controlar corpos e afetos, impor o padrão cisheteronormativo, impedir a diversidade sexual e de gênero.

As consequências disso também vão muito além, são o não respeito à diversidade e a legitimidade da violência contra a população LGBT, que só crescem no país como colocamos no início do texto, enquanto há o aumento da impunidade aos agressores.

Isso tudo também faz aumentar a taxa de suicídio de LGBTs, que cada vez mais tendem a ter dificuldades de se localizarem nessa sociedade repressora. Ou mesmo, há a marginalização e precarização das condições de vida, que impossibilitam o acesso aos serviços como saúde, Educação, moradia e emprego. Enfim, parte da população LGBT é eliminada das mais diversas formas.

Destacamos também que, ainda sob polêmicas, a renúncia de Jean Wyllys ao cargo de deputado federal deu-se pela violência que sofreu desse governo. Ao ser o primeiro deputado federal assumidamente gay e defensor dessa causa, foi a personalidade mais atacada por fake news nas redes sociais. Somado a isso estão as ameaças de morte que sofreu junto com a família e a homofobia institucional que tem sofrido constantemente no Congresso Nacional, principalmente por Bolsonaro e aliados. Denunciamos a falta de apoio e segurança suficientes para se manter no Brasil e repudiamos o posicionamento de Jair Bolsonaro ao debochar do parlamentar após a notícia de renúncia.

Dessa forma, concluímos que, de fato, além de não haver tranquilidade desde o início, realmente não podemos contar com governo autoritário e reacionário. E, com a saída de um deputado federal LGBT de esquerda por graves ameaças, a parcela da classe trabalhadora LGBT isenta de qualquer privilégio corre muito mais riscos de sofrer com dura violência, com a retirada de direitos e com a falta de acesso aos serviços públicos.

Se a certeza é de que sofreremos muitos ataques, só nos resta lutar!

Os problemas que afetam a nossa sobrevivência estão no nosso dia a dia, para enfrenta-los necessitamos da consciência de que, além de não aceitarmos esse governo, temos que nos organizar no nosso local de trabalho, de estudo ou moradia e nos unirmos para adotarmos medidas que não permitam o reforço das desigualdades, dos preconceitos, da intensificação da exploração, etc. Não podemos perder direitos e retroceder em nossas conquistas. Que os capitalistas percam lucros!

Em 2019 completam 50 anos da resistência de Stonewall, quando LGBTs enfrentaram a polícia e realizaram a primeira Marcha LGBT no mundo. Porém hoje, vemos muita dificuldade de manter as lutas organizadas. O movimento de conjunto está disperso e os diversos coletivos não buscam aglutina-lo.

As Paradas LGBTs pelo Brasil, apesar de manterem um caráter progressista em seus lemas, se têm mostrado como um “carnaval fora de época” despolitizado ou como mais espaço para exploração e Pink Money (uso das bandeiras LGBTs para obtenção de lucros). Com alguma exceção há falas de enfrentamento e de resistência, que denunciam toda política reacionária, preconceituosa, homofóbica e de retirada de direitos.

Os movimentos de mulheres também têm realizado diversas mobilizações em defesa da vida, de direitos contra o patriarcado, o machismo e todas as formas de violência. Em um período recente tivemos o protagonismo das lutas com movimentos como o “Ni Una a Menos” na Argentina e o “Ele Não” no Brasil, além de greves gerais na Argentina e na Polônia.

Portanto, seguirmos na luta, tomarmos as ruas, contra o governo Bolsonaro, pela união da classe trabalhadora contra a retirada de direitos e contra a Reforma da Previdência é fundamental para construirmos e fortalecermos esses movimentos. É fundamental para construirmos o próximo Dia Internacional de Luta da Mulher, 8 de março, e a Marcha LGBT. É fundamental para construirmos a Greve Geral de toda a classe trabalhadora!

Lutar com independência de classe contra o machismo, racismo e homofobia

Ao pensarmos esse novo Ministério, então, lembramos que Bolsonaro – eleito em contexto de aprofundamento da crise, o mais reacionário desde o fim da Ditadura Militar e da redemocratização sob o slogan “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” – elegeu-se defendendo publicamente o fim da “ideologia de gênero”, a criminalização de movimentos sociais, o fim dos “coitadismos de gays, mulheres, negros e nordestinos”, etc. Portanto, indicando uma situação para a classe trabalhadora de conjunto e setores oprimidos em particular.

No entanto, lembramos também que por mais de uma década o Partido dos Trabalhadores (PT) esteve à frente da máquina do Estado-burguês e, dentre muitas outras questões, não criminalizou a LGBTfobia. Entendemos que não foi erro ou negligência, foi uma política consciente para evitar o enfrentamento a esses setores à direita e reacionários do Congresso e da sociedade.

Quando tentou desenvolver políticas públicas para essas parcelas da classe trabalhadora foi pressionado, cedeu e recuou. Um exemplo foi o material produzido pelo projeto “Escola sem Homofobia”, popularizado pelos setores de direita de forma pejorativa como kit gay, que teve vetadas a impressão e distribuição às instituições de ensino, pela presidente Dilma em 2011, após anos dedicados à elaboração. Com isso, esses setores não só se fortaleceram como difundiram o projeto “Escola Sem Partido” por todo o país.

Dessa forma, mais do que nunca se faz necessária a organização e a unidade da classe trabalhadora de conjunto e dos setores oprimidos em particular para combatermos o machismo, o racismo, a homofobia e enfrentarmos governos sem repetir erros e sem depender da burguesia para a nossa sobrevivência.

Contra a falta de políticas públicas favoráveis, contra qualquer medo provocado por ações de governos bolsonaristas ou capituladores (que entregam ou negociam em favor próprio) necessitamos nos organizar e, de forma coletiva, fazermos o medo mudar de lado para, como trabalhadores e trabalhadoras, assumirmos as lutas de forma independente.

Para nos contrapormos ao projeto burguês autoritário, comunidade LGBT, mulheres e demais oprimidos devemos combater unidos, forjarmos um movimento político e um projeto social que busquem liquidar não somente com esse governo, mas com todo o projeto da burguesia baseado na intensificação da exploração e na opressão humanas para manter seus lucros de qualquer modo.

Participarmos de um coletivo de esquerda, organização ou partido é condição básica para construirmos essa união, uma vida política ativa, reunir pessoas para a luta contra a opressão e a intensificação da exploração, para a formação, segurança, fortalecer os laços de camaradagem e de independência de classe.

É importante e urgente nos reconhecermos como parte da classe trabalhadora e mantermos a nossa independência para lutarmos contra o machismo, o racismo e a homofobia pois, a história tem mostrado que os capitalistas/burguesia necessitam dessas várias formas de opressão para intensificar a exploração.

O nosso fortalecimento é para que nenhum governo retire nossos direitos e a nossa própria condição de existir! A nossa luta é por uma sociedade humana, socialista!