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Reunião G20: Governos, “bem vindo ao inferno”


1 de agosto de 2017

A resistência em Hamburgo contra os países imperialistas no G20

Nos dias 7 e 8 de julho desse ano aconteceu em Hamburgo (Alemanha) a última reunião do G20, grupo que reúne a União Européia, as 17 maiores economias do mundo (exceto o Irã e a Espanha), mais a África do Sul e a Argentina, e tem como objetivo discutir questões da economia mundial e temas que a influenciam. O fato desse grupo reunir países que controlam 2/3 da população, 80% do comércio e 85% da riqueza produzida no mundo, mais a presença dos chefes de Estado e Governo dos países-membros nas suas reuniões, dão uma importância além do simbolismo aos encontros do G20.
Em Hamburgo os principais objetivos eram fortalecer o comércio internacional e firmar um compromisso com o cumprimento do “Acordo de Paris” contra o aquecimento global. Isso não foi conseguido completamente, pois os EUA influenciaram no texto do documento final, conseguindo que não constasse uma crítica enfática ao protecionismo e o apoio incondicional ao acordo ambiental, apesar de ser o único país contrário a esses pontos. Pela primeira vez o G20 não conseguiu finalizar um encontro com resultados consensuais, tornando públicas suas divergências, demonstrando, ao mesmo tempo, como Donald Trump está em desacordo com os seus principais aliados e como ainda tem força para se fazer ouvir.

Bem-vindo ao Inferno

Um aspecto mais interessante, porém, foram os protestos que ocorreram durante essa reunião de cúpula. Mais especificamente aqueles realizados por uma frente anarquista internacional que para esse evento assumiu o nome de “Welcome to Hell” (Bem-vindo ao inferno), nome que se transformou também no slogan do movimento, batizou a campanha que viabilizou suas ações e invadiu as manchetes da grande mídia internacional sobre o encontro do G20.
As informações públicas sobre essa frente anarquista (chamada por eles de “aliança”) são escassas, mas suficientes para caracterizá-la minimamente e deduzir algo sobre a sua organização e formas de atuação. Trata-se de uma aliança permanente, mas que só assume nomes (provisórios) conforme atuações específicas sejam necessárias, como a de Hamburgo. Sua organização é normalmente descentralizada e horizontal e sua estrutura pulverizada, pois é formada pelas próprias organizações que a compõem (seus membros são principalmente da Alemanha, França, Itália, Espanha, Portugal e Grécia). No caso do Welcome to Hell (WH) a organização foi centralizada na Alemanha, local do evento, principalmente porque a organização das manifestações durou alguns meses, o que poderia ser feito mais facilmente por residentes do país.
A composição das frentes e redes anarquistas não são muito rígidas, sobrepondo-se e recombinando-se conforme os interesses de seus membros, de forma que talvez não seja correto afirmar que a aliança da qual faz parte o WH seja uma dissidência formal da rede que surgiu como consequência das manifestações de Seattle (EUA), em 1999, por ocasião do encontro da OMC, mas ela própria aponta que há diferenças. O WH avalia que desde Seattle encontros de cúpula estimularam a resistência radical e ajudaram no desenvolvimento de uma “rede caótica” de grupos de tendências autonomistas, anarquistas e anti-autoritárias por toda a Europa. Com o tempo, porém, a combatividade foi se perdendo e os protestos que acompanham as reuniões de cúpula tornaram-se algo mais próximo de uma “excursão turística de manifestantes”.

Ação direta para além da cúpula

Essa aliança, portanto, se reivindica mais radical e adepta da ação direta, repudiando manifestações pacíficas. Para Hamburgo o WH não se preocupou em denunciar o G20, seus integrantes e suas práticas ou em explicar ou justificar seus objetivos, pois segundo eles “a injustiça do mundo já foi declarada mais de mil vezes”, sendo agora a vez de quem está disposto a agir. Em termos de propaganda, não se baseiam na discussão de ideias, mas na arregimentação via ação direta, meio pelo qual o movimento poderia reconhecer sua força e capacidade, primeiro passo para tornar os indivíduos aptos a assumirem o controle de sua própria existência por meio da auto-organização em estruturas coletivas – o que não pode ser conseguido por meio de textos ou manifestos. Anticapitalistas, se opõem ao reformismo, mas não falam em revolução ou se referem aos possíveis benefícios de uma nova forma de organização social, limitando-se a enumerar as formas de dominação e opressão que combatem (definem o capitalismo como uma relação de dominação e violência social) e a importância do modo de fazê-lo. Os comunicados de alguns grupos contêm afirmações contra organizações marxistas, que são colocadas entre os “idiotas da esquerda” que se satisfazem com os rituais democráticos.
Como método de divulgação essa aliança faz “chamadas internacionais”, como a convocação para os protestos em Hamburgo, que são divulgadas pelos seus grupos-membros em conjunto com as suas ações locais. Um exemplo típico de como isso se dá é o caso de um grupo anarquista espanhol que, em 7 de junho, incendiou uma agência do banco espanhol Bankia no bairro de Mirasierra, em Madrid. No texto de reivindicação da ação explicam que o ataque foi feito como parte da luta contra a gentrificação do bairro e ao mesmo tempo como retaliação à condenação de dois membros de um grupo de anarquistas expropriadores alemães (outra “chamada internacional” em vigência) e como forma de apoio às chamadas para os protestos contra o G20 em Hamburgo. A chamada internacional contra o G20 foi dada no fim do ano passado e os protestos vieram sendo organizados desde então.
Em Hamburgo o principal objetivo era trazer complicações ou constrangimentos para a realização do evento, e não impedí-lo, o que foi feito levando os protestos para as áreas interditadas à circulação da população. Iniciaram uma série de atividades em Hamburgo já na semana anterior ao encontro do G20 (entre 28/06 e 04/07), com a realização de palestras, exibição de filmes e debates, em praças públicas, cinemas e universidades. Houve a preocupação em tentar antecipar o planejamento de segurança que seria adotado pela polícia, com a indicação das áreas em que o acesso não seria permitido ou seria restrito e o número de policiais mobilizados para o dia: cerca de 20 mil, com a presença de atiradores de elite posicionados nos telhados da cidade. Informações oficiais do governo alemão estimam que ao menos 100 mil manifestantes de diversos países estiveram em Hamburgo, tendo cerca de doze mil deles se envolvido nos confrontos promovidos pelo Welcome to Hell. Somente no dia 6/7, véspera do encontro do G20 e quando se deu o principal confronto entre polícia e manifestantes, conforme o governo alemão, 160 policiais ficaram feridos, 70 pessoas foram detidas e dezenas de carros foram incendiados.
Duas semanas após Hamburgo o WH ainda não havia divulgado um balanço público das suas ações, mas promete fazer isto tão logo a avaliação interna se encerre. Por ora, o que há de concreto é que uma chamada internacional foi emitida a favor dos militantes que seguem presos na Alemanha. Liberdade imediata para todos os ativistas presos! Ação direta para além da cúpula: superar o capitalismo!