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Jornal 89: Os interesses de classe e o lugar dos trabalhadores


14 de maio de 2016

Depois de tantos ataques…

Após o resultado da votação sobre a continuidade do processo de impeachment na Câmara, poucos são os que acreditam que Dilma continuará. E mesmo que continuasse, para governar minimamente, teria que se apoiar nos partidos mais à direita, como o PP de Maluf ou o PSD de Kassab.

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A escolha de aplicar a fundo o receituário neoliberal aproximou os governos petistas dos vários setores do capital (agronegócio, banqueiros, industriais, etc.) com várias medidas que os beneficiavam como as taxas menores para financiamento do agronegócio (e mais dificuldades para a agricultura familiar), o aumento da taxa de juros para os “credores” da dívida pública, a redução do IPI para as indústrias e com uma ampla oferta de crédito que beneficiava o setor da burguesia comercial.

Além dessas medidas econômicas vários direitos dos trabalhadores foram atacados (reforma da Previdência, aprofundamento da privatização na Petrobrás, dentre outros) por também serem fundamentais para a lucratividade do capital.

Essa política econômica foi bastante eficiente por um tempo, no entanto, diante do agravamento da crise econômica mundial se tornou insuficiente, principalmente por conta dos problemas na economia chinesa e do aumento da competição no mercado mundial, que exigem redução dos custos de produção das mercadorias destinadas à exportação. Lembremos que a produção de commodities (produtos agrícolas, minérios e outros) para a exportação é a base da economia brasileira.

Dilma se mostrou incapaz de garantir novas medidas de aprofundamento dos ataques à classe trabalhadora na intensidade e velocidade necessárias ao capital. Não que não tenha tentado atacar ainda mais, pois enviou ao Congresso Nacional várias propostas como as do ajuste fiscal (sempre no sentido de reduzir os gastos públicos por um lado e aumentar do outro a arrecadação à custa do trabalhador) , e a do PLP 257 (que congela salários e ameaça a estabilidade no emprego, dentre outras barbaridades).

Dilma indo…Temer vindo…

Diante dessa incapacidade e da urgência de novas medidas para o capital, a patronal já firmou posição de “trocar” o gerente de plantão. A expressiva votação do impeachment, as declarações de banqueiros, empresas do comércio, empresários da indústria e do agronegócio não deixam restar mais nenhuma dúvida.

Esse processo mostra exatamente como age o capital em relação aos políticos e partidos da ordem. Quando são úteis para os seus planos, ficam. Quando perdem a utilidade, são chutados. É isso que está acontecendo com o PT e seus apoiadores. Consequência de um caminho que escolheram lá pelos anos 90 quando optaram por construir uma plataforma de governo para o capital.

A bola da vez é Temer. Ainda que muito desgastado, com baixa popularidade e com uma maioria defendendo o seu impeachment é a aposta para a tentativa da burguesia de “estabilizar” a situação política. Por isso a maioria dos partidos, os principais economistas de direita e os vários setores do capital cerram fileiras em torno de seu nome.

Apoiado nesse processo, Temer já tem um ministério formado e um programa, chamado de Ponte para o Futuro, com respaldo de nomes como Delfim Neto, Henrique Meirelles e Armínio Fraga, considerados insuspeitos pelo mercado.

…apoiado pela direita e com um plano contra os trabalhadores…

Assim como a reforma trabalhista que ameaça os trabalhadores na França, o centro da questão para a patronal de conjunto hoje também no Brasil passa pela flexibilização das leis trabalhistas , pela retirada de direitos e pelo desmonte dos serviços públicos, setores que não podem mais ficar livres dos avanços do capital. O corte de verbas da Educação que levou à luta os secundaristas em defesa das escolas públicas, em diversos estados, é uma clara manifestação dessa tendência.

A garantia hoje da mais ampla liberdade de exploração possível é fundamental para a manutenção da taxa de lucro do empresariado e para a manutenção da reprodução ampliada do capital. Nesse sentido, a carta de intenções mais recente e que expressa as principais necessidades imediatas de um setor da classe dominante, saiu do tinteiro do PMDB. Esse documento chamado de “Uma ponte para o Futuro”, que foi publicado em outubro de 2015, mostra bem o que está por vir e também as “coincidências” com o que já vinha sendo encaminhado para a classe trabalhadora.

Com o passar dos meses, a conjuntura de crise política se desenvolveu sem que despontasse nenhuma alternativa fora do campo de conciliação de classes. E o campo conciliador (PT) se vê hoje enfraquecido e descartado.

Assim, as propostas das patronais de vertentes fortemente liberais tomaram ainda mais força para se colocarem como saídas para a retomada do crescimento econômico. Dessa forma, “Uma ponte para o Futuro” também ganhou espaço e está sendo reeditado e aperfeiçoado.

Entendemos que o conservadorismo e o fascismo, típicos de setores burgueses mais declarados, reaparecem com força em cenários de crise e isso muito nos preocupa também. Não ignoramos isso e muito menos deixamos de combatê-los nos locais de trabalho, estudo e moradia. Sentimos no dia a dia o ascenso da “onda reacionária”, que vem crescendo há alguns anos, reflexo do avanço da crise estrutural do capital e que se torna mais nítida e tem seu acirramento na conjuntura nacional.

A votação do impeachment na Câmara dos Deputados, em 17 de abril, vergonhosa e com repercussão internacional, que prestou homenagens à Ditadura Militar e mostrou toda a asquerosidade da direita conservadora colocou às claras e revelou o que já sabíamos em relação a composição desse órgão da democracia burguesa.

Infelizmente, a resposta de setores minimamente democráticos da sociedade foi ainda de nuclear-se com maior força entorno do tradicional campo de conciliação de classes, o PT, que nesse momento aparenta menos feroz em relação aos ataques à classe trabalhadora e mais democrático por não carregar os discursos de ódio.

Isso também tem levado diversos setores dos movimentos a insistirem na luta contra “a direita”, contra “o golpe” e contra o impeachment mas reduzindo a importância da luta direta contra o desemprego e a carestia, o que de certa forma é um apoio direto ou indireto ao Partido dos Trabalhadores e seu projeto de conciliação de classes com o corte dos direitos de trabalhadores e de verbas dos serviços públicos.

Sem uma reação concreta e claramente classista dos trabalhadores, a partir de suas lutas, o plano de Temer “Ponte para o futuro” tem grandes chances de representar uma “bela” amostra do que o capitalismo nos reserva no próximo período no Brasil.

E com tudo isso, chamamos os ativistas independentes que se sensibilizam com os discursos sobre democracia e contra o golpe a se somarem na construção de uma saída independente, classista e antigovernista numa Frente de Esquerda Socialista de Trabalhadores.

…e a favor do capital

Nesse momento precisamos lembrar que política não se faz com o estômago. O medo do “avanço da direita” tem levado a acreditar no “Mal menor”, quando deveríamos lutar pelo inverso, pelo avanço da esquerda e para que a classe trabalhadora assumisse o comando da luta. A experiência mostrou que nem Dilma, nem Lula e nenhum outro governo podem ser capazes de contrariar tendências internacionais do capital na busca pela manutenção das taxas de lucro e sua necessidade de intensificação dos níveis de exploração com a privatização de setores públicos, a flexibilização das leis trabalhistas e demais cortes de direitos dos trabalhadores. A luta contra o “avanço da direita” tem que ser no sentido de uma saída classista e independente que imponha a pauta dos trabalhadores.

Nesse sentido, tomamos o programa citado do PMDB como uma expressão das necessidades do capital. Entendemos que se apresenta como necessidade do capital de conjunto e não como proposta deste ou daquele partido, é um programa de classe, da burguesia, portanto, incapaz de ser ignorado por qualquer partido que assuma o controle do Estado brasileiro, inclusive um eventual governo do PT.

Ressaltamos que o modo como vão implementar os ataques aos trabalhadores é muito claro, pois demonstra o processo forçado pelo qual passamos hoje, a formação de um apoio que permite a formação de uma maioria política, mesmo que transitória ou circunstancial e que seja capaz de, em prazo curto, “produzir todas estas decisões na sociedade e no Congresso Nacional”. Separamos abaixo alguns pontos do programa que unifica setores da classe dominante:

As propostas de Temer negociadas com a burguesia

Ajuste fiscal

“um ajuste de caráter permanente” equilibrando as contas públicas, ou seja, corte nos gastos públicos (funcionalismo, programas sociais, etc). Soma-se a isso as reformas como a previdenciária.

Serviços e funcionalismo públicos

Controle sobre os serviços públicos, não contratação de funcionários e acabar com a as vinculações constitucionais (que é obrigado a gastar), como no caso dos gastos com saúde e educação.”

Constituição

“Teremos que mudar leis e até mesmo normas constitucionais.”

Isso quer dizer reforma constitucional para reestruturar a parte tributária mexendo principalmente nas despesas obrigatórias com saúde e educação que tem percentuais mínimos obrigatórios.

Previdência

“é preciso ampliar a idade mínima para a aposentadoria, de sorte que as pessoas passem mais tempo de suas vidas trabalhando e contribuindo, e menos tempo aposentados.“

A proposta é no mínimo 65 anos para os homens e 60 anos para as mulheres. Até a insuficiente a indexação o valor do salário mínimo está sob ameaça.

Salários e benefícios previdenciários

“O fim de todas as indexações, seja para salários, benefícios previdenciários e tudo o mais”. Os reajustes serão definidos no orçamento . Os benefícios sociais deixarão de o salário mínimo como referência

Programas sociais

O bolsa família e outros programas sociais não resolvem a situação de miséria e da fome da população. Sempre fomos muito críticos a eles pela insuficiência, mas, no entanto, nunca defendemos o fim deles. Tal é a situação de miséria que é a única forma de as pessoas comerem. Pelo projeto de Temer até mesmo esses programas podem ser extintos.

Privatização

“Participação mais efetiva e predominante do setor privado na construção e operação de infraestrutura” (…) “Uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos e retorno a regime anterior de concessões na área de petróleo”. Ou seja, vai aprofundar as privatizações.

Leis trabalhistas

Na área trabalhista, permitir que as convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais, salvo quanto aos direitos básicos;

http://pmdb.org.br/wp-content/uploads/2015/10/RELEASE-TEMER_A4-28.10.15-Online.pdf

Mais uma vez, a alternativa dos trabalhadores

Quando a patronal trata de crescimento econômico/PIB não quer dizer melhorar a vida da classe trabalhadora. Pelo contrário, maior crescimento econômico para a burguesia significa mais exploração sobre os trabalhadores.

Por isso que os trabalhadores, do outro lado da trincheira, precisa se unir com um programa e com ações práticas para não se perder no debate de falsas alternativas.

É urgente avançarmos também em formas organizativas para construir a alternativa dos trabalhadores que, a nosso ver, passa por construir plenárias de base para organizar as lutas e elaborar um programa para resolver a crise a partir das nossas necessidades e que nos permita enfrentar a crise em cada local de trabalho, estudo e moradia.

Essa forma de organização também é importante para combatermos o avanço do conservadorismo, do machismo, da lgbtfobia, do racismo e todas as manifestações fascistas que temos presenciado, pois não têm como serem combatidos pela atuação no parlamento burguês. Somente a luta direta da classe trabalhadora, com ampla democracia operária e com a consciência da necessidade da independência de classe poderemos avançar nesse sentido.

Organizarmos a resistência contra os ataques do capital, a oposição de direita reacionária e se preparar para uma ofensiva socialista é a nossa única saída!

O perigo da proposta de eleições gerais

Com o agravamento da crise, vários setores discutem qual a saída. No campo da esquerda, uma das propostas mais polêmicas é a defesa de novas eleições, defendida pelo PSTU.

Entendemos que essa proposta é um equívoco completo. Seria uma forma de legitimar um novo governo nas urnas com força para impor planos de ajustes contra os trabalhadores. É um absurdo organizações de esquerda fazerem essa defesa, pois é uma saída dentro dos marcos do regime e com o agravante de a direita estar bem fortalecida neste momento, certamente fará uma maioria bem consistente no Congresso e continuará se legitimando para os ataques.

Por outro lado, até mesmo setores da burguesia, do PT e do governo Dilma defendem a realização de novas eleições. Ainda que essa proposta tenha perdido força nos últimos dias (Lula se colocou contra) continua como “uma carta na manga” se o “plano Temer” não der certo.

Opinamos que o centro da política da esquerda deve ser o de fortalecer os espaços de organização de unidade da luta da classe trabalhadora, apostando na construção de uma saída a partir dos interesses dos trabalhadores e não do capital.

Plenária de Base em SP/ABC é um exemplo a seguir

Cerca de 70 pessoas, entre trabalhadores e trabalhadoras, estudantes universitários e secundaristas se organizaram para pensar saídas para a crise (a partir dos interesses dos trabalhadores) e organizar um enfrentamento aos ataques da patronal e dos governos. Após os debates sobre a conjuntura política e a situação dos trabalhadores, com a exposição de todas as posições políticas, votamos um programa e ações concretas para enfrentarmos a crise na região (Leia Relatoria da Plenária).

Uma decisão importante foi a de construir a PLENÁRIA POPULAR, DE JOVENS E TRABALHADORES que fará materiais e ações para discutir o programa aprovado com os trabalhadores.

Esse número de pessoas poderia ser muito maior se as correntes de esquerda, como PSTU (que nem participou) e outras correntes tivessem construído de fato e convocado para a Plenária.

Outra decisão importante foi a convocação de uma próxima Plenária Popular de Jovens e Trabalhadores, no dia 21 de Maio, na UFABC, para a qual propomos que as forças de esquerda construam e participem.

De nossa parte seguiremos batalhando pela construção de formas organizativas para impulsionar a luta antigovernista, classista e anticapitalista.. Seguiremos também na construção da unidade da esquerda e dos que lutam contra o capital. Acesse e curta a página da Plenária. Leia as resoluções aprovadas: Link pagina da plenária