A trajetória do PT e o impeachment de Dilma
11 de março de 2015
Artur Bispo dos Santos Neto
Forjado em meio às lutas operárias que marcaram a década de 1980, o PT sempre teve como principal bandeira a disputa por uma posição de proa na apologia do cretinismo parlamentar, haja vista que considerava como benemérita a possibilidade de reformar o capital e elevar o capitalismo brasileiro à superação de seu estágio atrófico e hipertardio. Lula, em suas propaladas campanhas eleitorais, não se cansava de afirmar o impossível, inculcando nas massas a possibilidade de reformar o capital e asseverando que o crescimento do capitalismo significava a melhoria das condições de vida para a classe trabalhadora. E contra o capital especulativo apresentava a superioridade do capital produtivo, pois mais fábrica implicaria sempre mais empregos e melhores condições de vida da classe trabalhadora.
Nos seus anos de formação o PT busca desenvolver uma luta de posição no interior das instituições burguesas. Paulatinamente, vai logrando tanto a eleição de parlamentares quanto a conquista pela via eleitoral de determinadas prefeituras (São Paulo, Porto Alegre, Diadema, Fortaleza etc.) ao longo da década de 1980, demonstrando sua forma singular de administrar o capital. Nessa época considerava como inéditas e espetaculares as suas experiências de orçamento participativo e as concessões oferecidas a frações escassas das camadas populares, mediante sua inusitada política de cooptação e elevação de suas principais lideranças sociais e sindicais às tarefas burocráticas e subsidiárias de administração do capital. Isso não quer dizer que inexistisse em seu interior tendências que reivindicassem adesão ao pensamento marxista.
O grupo majoritário do PT, Articulação, desde seus primórdios considerava as palavras de ordem como “Governo dos Trabalhadores” ou “Partido sem patrões”, postulados pela Convergência Socialista e Movimento pela Emancipação do Proletariado (MEP), como expressões radicais e fora da realidade. É que os trabalhadores, no seu entendimento, não reuniam condições para assumir o controle da vida socioeconômica nacional. As tendências de esquerda consideravam a Articulação (Lula, Frei Beto, Jacó Bittar, Olívio Dutra, José Dirceu, Wladimir Pomar, Marco Aurélio Garcia, Djalma Bom, José Cicote, Luiz Gushiken, Devanir Ribeiro, Luiz Eduardo Greenhalg, Aluísio Mercadante, Francisco Welfort etc.) como tendência de direita. No começo da década de 1990, as tendências que apostavam na defesa de um partido dos trabalhadores contra o partido dos patrões foram afastadas ou expulsas do PT.
Ao longo da década de 1980, a recusa do grupo majoritário do PT em identificar-se com o marxismo estava amoldada à necessidade de abrigar em seu interior um coletivo extremamente heterogêneo e contraditório, que incluía católicos, ativistas do movimento sindical e popular, intelectuais e setores da classe média. A recusa do marxismo não era simplesmente de demarcar posição no interior do partido, mas se constituía como a própria essência do grupo majoritário do PT; neste, o socialismo não passava duma expressão retórica para ludibriar as ilusões dos grupos mais radicais1 alojados em seu interior. A recorrência aos jargões marxistas servia para imprimir uma direção pseudorrevolucionária à luta dos trabalhadores.
Após figurar como grupo majoritário do PT, a Articulação atuará “como tendência plenamente constituída e suficientemente experimentada nas disputas internas para encontrar outros meios de conquistar seus objetivos sempre que o consenso mínimo em torno deles fosse mais difícil ou exigisse concessões que lhes parecessem exageradas ou desnecessárias” (COELHO, 2005, p. 199). Isso implicava que o PT precisava declarar em alto e bom tom que sua sigla não consistia mais numa organização política pautada pela independência da classe trabalhadora. No entendimento dos dirigentes petistas, a candidatura de Lula à presidência denotava que a classe trabalhadora se punha em movimento não para fazer eclodir o movimento paredista, mas para assegurar a efetivação do projeto democrático e popular. Para a ala majoritária do PT, “a hora do socialismo não chegava com a Constituinte, mas ela proporcionaria espaço para o acúmulo de forças, para lutar pela democratização radical da sociedade, para inscrever direitos como o direito de greve, enfim, para propor ‘medidas que desde já ajudam a realizar a socialização da política’” (COELHO, 2005, p. 84).
Após o colapso das experiências pós-capitalistas no Leste Europeu, na Rússia e na China no final da década de 1980 e o avanço do neoliberalismo, o PT tenta adaptar-se ao quadro internacional contrarrevolucionário. Propugna a possibilidade de reformar o capital; nisso sua história se inscreve de maneira similar tanto aos partidos social-democratas quanto aos partidos socialistas e comunistas europeus. As concessões à burguesia se configuram na delimitação do “Projeto Democrático e Popular”, definido no 5º ENPT (1887), em que se acentua a “possibilidade de acordos pontuais com setores da burguesia, […], era a senha para negociar com partidos situados fora do campo ‘democrático popular’” (COELHO, 2005, p. 86).
Para enfrentar a ofensiva neoliberal, Aluísio Mercadante defende como fundamental a “constituição de um amplo mercado de consumo de massas, medidas de radicalização da democracia (controle social do Estado e do mercado), planos para garantir o crescimento econômico com estabilidade, reforma do Estado”. Nessa perspectiva impunham-se as reformas previdenciária e tributária, o aprimoramento das câmaras setoriais, as privatizações e a reforma do Estado (COELHO, 2005, p. 234). E quando em 1994 a empreiteira Odebrecht, acusada de participar do esquema de fraudes no Orçamento federal, promove doações à campanha de José Dirceu ao governo paulista, Mercadante justifica: “Receber recursos de empresas, com transparência, fornecendo bônus e declarando, nada tem de imoral ou antiético […] O que houve foi um erro político por receber da Odebrecht, uma empreiteira que acusamos na CPI do Orçamento de práticas ilícitas” (apud COELHO, 2005, p. 235). Eis o inusitado prólogo do movimento que culminará nas denúncias que pautam o valerioduto ou “mensalão” e a Operação Lava-Jato. Em 1994, nota-se a inserção dos elementos que vão delinear a práxis petista nos anos posteriores. Escreve Coelho (2005, p. 235-236): “Conquistar o apoio, financeiro e político, de grupos empresariais era um procedimento inteiramente coerente com os objetivos políticos da Articulação e com os meios para alcançá-los, que exigiam arcar com os elevados custos de garantir competitividade nas disputas eleitorais”.
A partir de 1994, tornou-se expressiva a defesa do capitalismo como “face humana e social”. Dessa maneira, dissolve-se a distinção entre os valores burgueses e os valores revolucionários e constata-se uma unidade entre os projetos políticos centrados na busca de direitos no interior do capital e aqueles fundamentados na luta de classes e na centralidade do trabalho. Ao invés da contraposição de classe, agora se galvaniza a necessidade da conciliação de classe e de asseguramento dos interesses da burguesia. Escreve Coelho (2005, p. 240): “A burguesia, antes apontada como inimiga de classe, sócia do imperialismo e beneficiária do subdesenvolvimento, agora era vista como aliada estratégica para desenvolver o país”. E não se tratava de uma simples estratégia programática, mas da própria composição orgânica do PT, pois sem o apoio do capital o PT jamais poderia chegar à Presidência da República. No 10º Encontro (1995), Lula insere os empresários na legenda do PT, nos seguintes termos:
Criamos o PT para que o povo brasileiro tenha um canal político, uma legenda que represente os interesses da maioria, uma bandeira em torno da qual se mobilizam as donas de casa e os sem-terra, os operários e desempregados, negros e mulheres, estudantes e intelectuais, produtores culturais e empresários interessados na modernização do Brasil, compatível com a redução das desigualdades sociais (apud COELHO, 2005, p. 241).
Nota-se a substituição da luta de classes pela conciliação e acomodação da classe operária. Na verdade, tratava-se apenas da incorporação escrita de uma prática recorrente no interior do partido; era somente a constatação do fato. O PT nunca tinha intensificado uma forma de oposição que não fosse a oposição política na perspectiva de obter benefícios eleitorais. O PT aposta na possibilidade de organização do capitalismo; para isso entende que é preciso operar a redistribuição de renda e a “ampliação da participação popular na definição de políticas públicas, cujo motor principal seria a expansão do mercado interno e a alavancagem de um novo ciclo de desenvolvimento” (COELHO, 2005, p. 514). A conciliação de classe é o leitmotiv de suas políticas compensatórias, que não passam de imagens pálidas das políticas distributivas encetadas na época do denominado “Estado de Bem-Estar Social”. O PT simplesmente desconsidera o cenário internacional, pois a colaboração de classe é insuficiente para garantir a retomada do desenvolvimento econômico do país, a expansão do mercado interno e a distribuição de renda. Segundo Coelho, o problema do projeto desenvolvimentista do PT “dependeria de uma redução substantiva no volume de saque imperialista, cujo vetor importante é, desde os anos 80, a relação de crônica dependência com o capital rentista. Após recuar de todas as perspectivas de luta anti-imperialista, a esquerda do capital encontra-se desprovida de meios para lidar com este problema” (COELHO, 2005, p. 515). Isso era algo impossível de ser realizado, e o PT sabia e sabe perfeitamente disso. No fundo, o projeto democrático e popular do PT não passava de uma estratégia para demarcar posição perante a direita e afirmar-se como alternativa aos setores de esquerda e aos movimentos sociais e sindicais.
A impossibilidade de implementar a imagem mirabolante do Welfare State conduz o PT, da mesma forma que a social-democracia (PSDB), ao campo do neoliberalismo. O PT tenta conciliar o discurso sedutor da necessidade de crescimento econômico com equidade social com a aplicação de medidas econômicas neoliberais. No entanto, ele assume somente a primeira parte; a segunda, esconde das massas. A crise do Governo Dilma Rousseff é expressão do dilema entre duas propostas aparentemente contraditórias, mas que servem aos mesmos objetivos: ao processo de reprodução do capital e ao aprofundamento do processo de expropriação da força de trabalho.
Para a esquerda do capital é fundamental manter as massas desorganizadas ou sob a sua tutela, pois caso perca o controle das massas, essa esquerda perde seu poder político para representar os interesses do capital. Escreve Coelho (2005, p. 517):
Se as medidas de contenção falharem diante de um ascenso reivindicativo que ela não possa controlar ou dirigir, a esquerda do capital se arrisca a perder tudo: os postos de direção nos movimentos da classe trabalhadora podem ser conquistados por forças comprometidas com o movimento que deseja brecar, e seu poder de barganha junto aos dominantes pode desaparecer junto com o seu papel de amortecedora dos conflitos.
A condição ideal da esquerda do capital é que exista uma polarização entre esquerda e direita, em que ela seja sempre o polo aglutinador da esquerda. No entanto, observa Coelho (2005, p. 517), “mesmo nesta situação hipotética, porém ela ainda teria de conviver com o risco onipresente de uma explosão reformista e desenvolvimentista e a extrema dificuldade para fazer reformas e garantir o desenvolvimento”.
É possível afirmar que nos três primeiros mandatos, a esquerda do capital (Lula e Dilma) foi bem-sucedida nesse empreendimento e que transitou com maestria na conciliação entre o projeto neodesenvolvimentista e o projeto neoliberal. Observa-se que o PT conseguiu renovar as políticas neoliberais através do discurso neodesenvolvimentista e da política de conciliação de classe, logrando reciclar o neoliberalismo e os ataques aos direitos dos trabalhadores.
A capacidade de operar no terreno da conciliação de classe faz do PT uma rubrica distinta da direita. Os governos petistas sabem como manipular as contradições e fazer desaparecer as diferenças substanciais entre as classes sociais, mediante suas políticas de cotas para negros, índios, mulheres, homossexuais etc. E enquanto seu antípoda ri da situação deplorável dos miseráveis e os entrega à sua própria sorte, os governos petistas são capazes de derramar suas lágrimas carpideiras em nome dos que sofrem danos, pronunciando discursos fúnebres sobre vítimas que eles mesmos ajudaram a promover. Assim, enquanto a ultradireita recusa os programas assistenciais e acusa os miseráveis de se aproveitarem da própria miséria, o PT elege a defesa dos miseráveis como sua bandeira de justiça e equidade social. E, indubitavelmente, esse segmento garantiu a reeleição de Dilma no segundo turno. No entanto, as suas medidas compensatórias e reparadoras não conseguem nem mesmo arranhar a superfície do sistema do capital, quanto mais promover mudanças substanciais. Assim, enquanto o PSDB e a ultradireita (Bolsonaro) espalha seu sorriso mefistofélico perante o crescimento da pobreza, desdenhando da sorte dos miseráveis, o PT verte suas lágrimas de crocodilo por esses mesmos miseráveis.
A sua sagacidade permite que num instante chore sorrateiramente pelos vitimados de uma barragem ou pelas famílias que insistem em punir os atos desumanos praticados pelos militares; no outro, o PT pode sorrir radiantemente com os capitalistas quando da inauguração de um novo banco ou dum aeroporto ou rodovia construída com verba pública, para em seguida ser privatizada. Assim, ao invés de romper o processo de privatização, o governo Lula manteve a política de privatizações de FHC, privatizando (mediante sistema de vendas ou concessões) 2,6 mil km de rodovias federais (2007), a Ferrovia Norte-Sul, os bancos do Ceará e Maranhão, as hidrelétricas Santo Antônio, Jirau, as linhas de transmissão Porto Velho (RO) e Araraquara (SP), alguns campos da bacia de petróleo do pré-sal e parte da Petrobras. Dilma, por sua vez, privatizou os Correios, os aeroportos de São Gonçalo do Amarante (RN), Guarulhos (SP), Cumbica (SP), Viracopos (SP), Juscelino Kubitschek (Brasília), Galeão (RJ), Confins (MG), os hospitais universitários, duas rodovias e o Campo de Libra (Bacia de Santos) etc.
O segundo mandato de Dilma Rousseff começa com o anúncio do processo de privatização da Caixa Econômica Federal. A listagem das empresas privatizadas atesta como a esquerda do capital fala uma coisa e faz outra, como ela age em plena consonância com a direita do capital (PSDB e consortes). Cumpre observar que metade das empresas contempladas nos dez leilões destinados às concessões de rodovias e aeroportos, entre 2012 e 2013, foi ganha pelas construtoras envolvidas na Lava-Jato (Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, OAS, UTC e Odebrecht). Todas elas têm um amplo histórico de corrupção e suborno, não há como negar que estão envolvidas até a medula no processo de formação de caixa dois para alimentar as campanhas de candidatos da esquerda e da direita do capital. Paralelo pode ser encontrado na história das instituições financeiras, como revelaram as “denúncias do mensalão”. Tais denúncias atestam o envolvimento de Dilma e Lula, e denotam que eles deveriam não apenas ser afastados como irem para a cadeia, por formação de quadrilha e roubo ao erário.
Essa práxis reiterativa serve para explicar por que em nenhum instante a esquerda do capital salientou a possibilidade de rever o processo de privatização orquestrado pelos governos FHC e Collor, pois ela mesma sempre defendeu programaticamente a privatização; no entanto, procurou esconder isso das massas. Da mesma maneira, em nenhum momento a esquerda do capital imaginou a possibilidade de auditar a dívida pública, pois a sua palavra de ordem é efetuar cortes no orçamento público, desconsiderando acordos estabelecidos. Enquanto o governo federal gasta R$ 169 bilhões com servidores ativos e aposentados, 25 bilhões para o Programa Bolsa Família ele destina quase R$ 890 bilhões para o pagamento do serviço da dívida pública. Lula e Dilma destinaram, entre 2003 e 2014, mais de 8,8 trilhões para o pagamento da dívida pública. Enquanto destina 7,7% do Orçamento da União para as áreas de educação e saúde, o referido governo destina 42% para os banqueiros, sem contar as distintas políticas de renúncia fiscal e subsídio aos banqueiros e empresários.
Os três mandatos do PT na Presidência da República revelam como a forma petista de governar destaca-se pela sua capacidade de constituir uma teia de relações que envolvem e prendem as organizações sociais ao processo de reprodução do capital. Entre esses tentáculos destacam-se as concessões do capital aos movimentos sociais do campo e da cidade, mediante a liberação de verbas e o financiamento de inúmeras atividades. Entre as ações realizadas pelos movimentos sociais em parceria com o governo federal, o diretor do Instituto Lula e ex-ministro da Casa Civil, Luís Dulci, menciona as grandes marchas realizadas para Brasília, como a “Marcha das Margaridas” e os “Gritos da Terra”, e ainda, as inúmeras atividades estaduais realizadas pelo MST e consortes, como os assentamentos e as “Paradas Gay”. Para Luís Dulci, o governo Lula financiou a realização de 63 conferências nacionais, que mobilizaram mais de 4,5 milhões de pessoas (PASSA PALAVRA, 2015, p. 3). O aparato do Estado foi posto em curso a serviço dos interesses dos “trabalhadores”, quando na verdade tratava-se de constituir uma teia de influência que prendia as organizações sociais aos interesses do governo e à necessidade de garantir a governabilidade do governo Lula. É contra o fantasma da ameaça de crescimento da extrema-direita que se coloca a necessidade das organizações populares e dos movimentos sociais apoiarem o governo do PT. É nesse contexto que ganha expressividade o discurso do PT como o mal menor tanto nas eleições de 2014 quanto perante a possibilidade de crescimento da campanha pelo impeachment de Dilma em 2015.
O problema é que por trás do discurso do Instituto Lula e dos apologistas do cretinismo parlamentar subsiste o próprio legado histórico construído pela legenda petista ao longo dos seus 35 anos de existência. Nele se encontra farta documentação e reportagem de como passou mais de duas décadas a adular a burguesia nacional e internacional e como, para garantir a preservação do status quo, teve de dormir com aqueles que outrora negava. De forma que passou a considerar Fernando Collor, Maluf, José Sarney e Renan Calheiros como amantes belos e singelos. Assim, a pureza de sua “bela alma” juvenil foi completamente contaminada e maculada pelas práticas orgiásticas e dionisíacas das atividades parlamentares. Como sua alma pertence completamente ao capital, cada denúncia proferida de sangria dos cofres públicos serve somente para lançar seu sorriso sarcástico, pois aprendeu a desdenhar de todas as denúncias (valerioduto e Operação Lava-Jato)2. O PT se acha submerso no pântano lamacento da pilhagem da riqueza produzida pela classe operária, porquanto inscreveu sua história com a mesma tinta das classes que aparentemente dizia combater.
A obra de arte do PT está em plena sintonia com os tempos hodiernos, em que nada de grande pode ser realizado sem o apoio do capital. A sua alma não lhe pertence, mas pertence ao capital, que o encheu de louros e fortuna. Assim, plasmado pela corrupção pode afirmar num tom feérico e fáustico: “esta é uma época em que já não é possível realizar uma obra de modo piedoso, correto, com recursos decentes. A Arte deixou de ser exequível sem a ajuda do Diabo e sem fogos infernais sob a panela…” (MANN, 1994, p. 672). Apesar de o estranhamento em relação à classe operária ser completo, o PT insiste em manter seu pé esquerdo no interior das organizações operárias e dos movimentos sociais; mas o seu pé revela muito mais asco e sujeira, denotando existir “algo de podre no reino da Dinamarca”.
O segundo mandato de Dilma demonstra os limites para persistir na conciliação do discurso neodesenvolvimentista com a prática neoliberal. A crise econômica internacional impõe a redução das taxas de crescimento do país e suscita dificuldades à manutenção das políticas compensatórias ou de redistribuição de renda. Isso implica a impossibilidade de oferecer uma face humana para o capital. Com isso cai o véu da separação entre esquerda e direita do capital, pois o governo Dilma faz tudo que o PSDB faria. A inexistência de desenvolvimento econômico implica a débâcle do programa petista de governar, pois nenhuma concessão pode ser feita à classe trabalhadora e as políticas compensatórias reparadoras terão de ser reduzidas para ampliar as taxas de acumulação do capital.
Acerca do impeachment de Dilma
A campanha orquestrada de impeachment da presidente é indubitavelmente organizada pela direita e visa aprofundar os ataques aos interesses da classe trabalhadora. A campanha é produto dos reflexos da crise econômica internacional no interior da economia brasileira, pois é notório o processo de desaquecimento da economia e o aguçamento do processo de falência das diversas empresas relacionadas ao setor industrial. Apesar do incentivo fiscal do governo e do rebaixamento do valor da força de trabalho, a indústria brasileira não tem nem mesmo conseguido preservar sua posição no mercado interno, ante a avalanche dos produtos asiáticos.
Para assegurar suas posições econômicas, o governo precisa cortar gastos que afetam tanto o direito dos trabalhadores quanto os benefícios fiscais concedidos aos empresários (MP da desoneração fiscal), preservando os interesses dos grandes banqueiros. A política de austeridade do novo governo implica o corte imediato de 30% das verbas destinadas à educação e impõe a necessidade de nova reforma da Previdência (fórmula 85 anos para as mulheres x 95 anos para os homens) e a votação do PL 4.330/04, que amplia o processo de terceirização e flexibilização das relações de trabalho. O capitalismo nos trópicos somente consegue se autorreproduzir recorrendo ao trabalho escravo ou semiescravo; não são poucos os empresários e as empresas acusadas da prática do trabalho escravo na atualidade. A lei está sendo gestada para atender a essa realidade.
A crise tem afetado de forma particular também a classe média; esta imagina que o impeachment solucionará seus problemas imediatos, quando na verdade as propostas da direita do capital (PSDB e consortes) intentam aprofundar os ataques aos trabalhadores assalariados. Assim, a implementação de um governo que suspenda as políticas compensatórias não resultará na recuperação do poder aquisitivo da classe média ou da pequena burguesia, pois somente pretende retirar mais ainda dos miseráveis para entregar aos banqueiros. A classe média está impossibilitada de enxergar qualquer saída que não seja aprofundar ainda mais o estado em que se encontra. Assim, ela serve aos interesses que, em última instância, não são os seus, mas do grande capital. Impossibilitada de apostar num processo revolucionário, ela serve aos interesses do capital e apressa os passos para a sua proletarização.
As organizações de direita possuem um espaço significativo no interior das classes intermediárias; não é à toa que se irradiam e crescem no interior da sociedade valores reacionários e conservadores, que mimetizam os preceitos axiológicos que animaram a “Marcha da Família com Deus e a Propriedade Privada”. Com isso, os bucaneiros do capital aparecem atacando os direitos das mulheres, fazendo a apologia do regime militar, defendendo a sacrossanta propriedade privada, bem como a família e a religião. Entre eles se destacam Bolsonaro, Feliciano, Lobão, Eduardo Cunha etc.
Embora não se possa desconsiderar a possibilidade de a campanha do impeachment ganhar volume e possibilidade de efetivação, pelo forte papel desempenhado pelos meios de comunicação de massa, isso de maneira alguma altera a condição do governo Dilma. O impeachment não suscita a luta de classe, porque o projeto do PT e do governo Dilma Rousseff representa a subordinação do trabalho ao capital, e não o contrário. Por isso os acenos de Lula para a classe trabalhadora não passam de uma farsa que pretende tão somente garantir a governabilidade. Os acenos visam somente fortalecer o governo Dilma, para que este possa recuperar a popularidade perdida.
O movimento contrário ao impeachment não pretende despertar as massas de seu sono de classe, mas simplesmente manipular a consciência das massas no sentido de continuar alimentando as ilusões com o PT e o governo instituído. No fundo, o movimento anti-impeachment não tem como intuito despertar as massas e impulsioná-las para a luta, mas servir como freio das lutas realmente classistas e que pretendam radicalizar suas posições em defesa do trabalho. Não é à toa que a campanha anti-impeachment é organizada pela burocracia sindical e pelo aparato das organizações sociais alimentadas e agraciadas com recursos governamentais.
O discurso da necessidade de interceptar o mal maior representado pela direita e que exige a constituição de uma frente nacional ampla e irrestrita não passa de uma estratégia para ludibriar as massas. Este discurso foi bem-sucedido no segundo turno das eleições presidenciais e serviu para reconduzir Dilma Rousseff à presidência, uma vez que se difundiu a ameaça que representava o PSDB no processo de cerceamento dos direitos trabalhistas. Foi amplamente propagada a possibilidade de aguçamento da violência no campo com o cerceamento do processo de suspensão das inúmeras linhas de crédito abertas para os agricultores sem terra assentados pelo Governo Federal. Além disso, a possibilidade de cortes de financiamento da Caixa Econômica para subsidiar programas como Minha Casa Minha Vida para pessoas dos movimentos sem teto, bem como os cortes nos programas assistenciais, como Bolsa Família etc. No entanto, todas essas políticas sociais compensatórias estão sendo questionadas, e algumas serão suspensas.
O discurso do PT como o mal menor é uma falácia e busca assegurar a dominação do capital sobre o trabalho. Ao invés de contrapor-se à possibilidade de retirada dos direitos dos trabalhadores, a agenda econômica de Dilma passa claramente pelo ataque direto ao trabalho, pois essa é a única maneira de assegurar os interesses do capital. Somente por meio da ampliação do processo de expropriação de mais-trabalho é possível ao capital garantir a sua sobrevivência. O capital não pode assegurar sua reprodução de outra maneira, porque acumulação de riqueza é acumulação de mais-valia. A tarefa do Estado é garantir esse processo de expropriação. As primeiras medidas de Dilma visam manter o processo de expansão e acumulação do capital; para isso os direitos dos trabalhadores serão atacados com a aprovação do PL 4.330/04 e da lei que regulamenta o direito de greve do funcionalismo público (ambos em tramitação).
Por isso que o PT precisará tanto de Joaquim Levy e Armando Monteiro quanto da Miss Motosserra Kátia Abreu, pois a natureza do desenvolvimento do capital brasileiro sempre esteve assentada na produção agrícola para a exportação como elemento fundamental para produzir os excedentes necessários à compra dos produtos manufaturados. A superexploração da força de trabalho sempre foi a peculiaridade do capitalismo dos trópicos; por isso a classe operária não deve se escandalizar se uma vez ou outra precisar usar de alguns tratores para passar por cima de suas miseráveis moradias ou se uma vez ou outra precisar passar a motosserra em alguns corpos humanos, como passam anualmente em milhões de árvores; afinal, o exercício do governo exige o sacrifício de algumas vidas. Uma vez ou outra será preciso fazer alguns despejos e massacres para assegurar a existência da sacrossanta propriedade privada; para isso se necessita investir ainda mais nos aparatos de segurança. Não se pode esquecer que foi o governo Lula que criou, em 2004, a Força Nacional, uma tropa nacional de elite preparada para coibir os “distúrbios civis” e exterminar os jovens desempregados. No entanto, nada disso deve escandalizar as almas puras que acreditam no PT, pois é preciso ser mais duro com aqueles que querem desestabilizar o sistema e impedir o cumprimento da agenda positiva (Proifes, Reuni, Ebserh, PL 4.330/04, Lei Anti-Greve, Privatização da Caixa Econômica Federal, Contrarreforma da Previdência, Privatização da Petrobrás etc.) dos petistas.
Essas medidas serão reiteradas sempre que a vanguarda operária (estudantil etc.) tentar aguçar a luta de classes, porquanto a recorrência ao aparato policial é necessária para demonstrar os estreitos limites da liberdade destinada à classe trabalhadora. A criminalização dos movimentos sociais será sempre recorrente para denotar que o périplo trilhado pela classe operária e pelos movimentos sociais está plenamente prefigurado pelos representantes do capital. Os ministros chefes da Casa Civil, do Incra, da Funai e dos programas sociais existem para mostrar o caminho que cada um dos movimentos sociais deve trilhar. Para isso será sempre possível destinar alguma soma dos recursos governamentais. Tanto o MST e o MTST quanto a CUT conhecem bem esse caminho, e devem servir de exemplo aos demais movimentos sociais. Daí por que essas organizações devem ocupar papel de proa na luta contra o impeachment de Dilma.
Os revolucionários e militantes anticapitalistas devem contrapor-se às bandeiras assentadas no impeachment, sejam elas favoráveis ou contrárias, porque não passam de disputas em torno do cretinismo parlamentar. Trata-se de uma disputa de direção do controle da classe trabalhadora. A questão que se coloca é quem reúne as melhores condições de assegurar a dominação do capital sobre o trabalho, ou seja, quem pode desferir os ataques mais certeiros contra a classe operária. A direita do capital aposta mais nas medidas repressivas que nas ações coercitivas; a esquerda do capital aposta mais nas ações persuasivas. Mas coerção e persuasão fazem parte do léxico de ambas. É a possibilidade de convivência amigável com os aparatos repressivos do Estado que conduz a esquerda não petista à convivência harmoniosa com a esquerda petista, preferindo Dilma a Aécio. Em nome da preservação do estado de direito burguês e das liberdades afirmadas pela burguesia, a esquerda não petista prefere a esquerda do capital. Com isso se abandonam a crítica revolucionária e a práxis revolucionária, e se sucumbe ao reformismo. O PT é o partido da reforma do capital e o partido da ordem. A única coisa que ele pode fazer é se apresentar como o mal menor; ele deve sempre explorar a possibilidade do pior, por isso deve chegar para os trabalhadores e propor: Vocês preferem o estado de direito ou a ditadura militar? Vocês preferem a liberdade burguesa ou a ditadura burguesa expressa no fascismo? Vocês preferem o capitalismo ou o “derramamento de sangue” duma Revolução. Ele nunca vai dizer para a classe operária que ela tem a opção de escolher o capital (fascismo ou democracia burguesa) ou o socialismo. Para o PT não existe alternativa ao capital, pois o capitalismo é a melhor de todas as sociedades possíveis. O PT vai sempre oferecer para a classe trabalhadora a opção: “algemas de ouro ou algemas de ferro”. Quer se iludir quem imagina que o PT pode passar disso.
A campanha pró-impeachment pode servir para afastar a possibilidade de continuidade do PT no governo no próximo mandato e expulsar o espectro Lula em 2018. O tamanho das denúncias envolvendo Dilma depende do tamanho das manifestações populares, se crescerem as manifestações pró-impeachment crescerão também as provas que atestam o caráter corrupto e corruptor do atual governo. Por sua vez, a saída de Dilma do governo não deve implicar a entrega da presidência para o PMDB de Michel Temer, de Cunha e Renan Calheiros; estes também estão envolvidos na Operação Lava-Jato, segundo denúncias do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, da mesma maneira como está envolvida frações menores da cúpula do PSDB. Indubitavelmente, todos os presidentes (Sarney, Collor, FHC, Lula e Dilma) do Brasil deveriam estar atrás das grades, como na Argentina. A pilhagem e o saque do erário são a palavra de ordem de todos eles (governos civis e militares). Em verdade, o impeachment é muito pouco para a representação máxima do poder, como também o é para os parlamentares e as distintas “personificações do capital”.
É preciso salientar que a saída do governo Dilma, se acontecer, não resultaria do fato de este ter se colocado do lado dos trabalhadores; por isso os trabalhadores não deverão sair em sua defesa, mesmo que a CUT e o MST, enquanto correias de transmissão do PT, tentem apresentar um quadro classista para o impeachment. Todas as posições do governo Dilma claramente se colocam do lado do capital e contra o trabalho. Por isso o debate sobre o impeachment não interessa aos revolucionários, porque não representa a possibilidade de mudanças substanciais. O que interessa aos revolucionários é um processo revolucionário e uma luta que conduza à derrubada completa do poder instituído para controlar o trabalho.
O governo do PT é tão corrupto e tão destrutivo aos interesses da classe trabalhadora quanto os governos do PSDB, do PMDB etc. Um governo corrupto e inimigo dos trabalhadores não merece nenhum apoio dos revolucionários e dos setores anticapitalistas. Os revolucionários devem afirmar categoricamente: Fora todos (PT, PMDB, PSDB, STF, etc.) e prisão para todos os representantes do capital! Porque vivem do roubo e da pilhagem do trabalho alheio. Abaixo o parlamento burguês e as instituições burguesas. Somos pela revolução como única forma de eliminação do poder corrupto da burguesia. Enquanto existir burguesia e enquanto existir capital, haverá a corrupção parlamentar e a exploração do trabalho. Chega de medidas paliativas e de mudanças superficiais. Devemos lutar por mudanças estruturais. Por isso somos por uma revolução social e política que conduza a uma forma de produção organizada e controlada pelos trabalhadores associados, livres e universais.
Referências bibliográficas
COELHO, Eurelino. Uma esquerda para o capital: crise do marxismo e mudanças nos projetos políticos dos grupos dirigentes do PT (1979-1998). Tese de Doutorado. Universidade Federal Fluminense, 2005.
MANN, Thomas. Doutor Fausto. Trad. Herbert Caro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994.
PASSA PALAVRA. A saída de Gilberto Carvalho e a “Frente de Esquerda” do PT. O que os anticapitalistas têm a ver com isso? Endereço eletrônico: http://passapalavra.info/?s=gilberto+carvalho&x=12&y=7. Acessado em 16 de fevereiro de 2015.
1 Para o PT, “a construção de uma sociedade socialista, de um ‘novo modo de vida, implica relações novas e diferentes de produção e, portanto, diferentes e novas relações sociais e políticas’. A construção do socialismo passaria pela combinação entre ações mobilizadoras populares, vitórias eleitorais, ações institucionais e governamentais, grandes campanhas cívicas, batalhas culturais e ideológicas, e permanente e forte pressão popular” (COELHO, 2005, p. 228). A débâcle das experiências pós-capitalistas, o avanço das políticas neoliberais e a derrota nas eleições de 1994 conduziram o grupo majoritário do PT ao abandono completo do socialismo, pois: “Não tem mais sentido a afirmação pura e simples do socialismo: é preciso dar novo conteúdo ao nosso projeto, atualizando às novas relações sociais, política, econômicas e culturais; construindo novos referenciais e novos modelos de análise, capazes de dar conta da complexidade que as relações econômicas e sociais hoje envolvem; é preciso recriar novas formas de organização e relações sociais e econômicas” (COELHO, 2005, p. 231-232). Para Luiz Gushiken, tornava-se imperativo fazer uma reformulação da crítica ao capitalismo, ultrapassando o velho maniqueísmo entre socialismo e capitalismo, privatização e estatização, pois “é óbvio que deve existir a propriedade privada, mas também é óbvio que ao Estado cabe exercer o controle e a regulamentação […]. O mercado deve existir, mas suas leis cegas e descontroladas não podem impor as necessidades dos indivíduos e nações” (apud COELHO, 2005, p. 233).
2 A Polícia Federal indicia, em março de 2014, 46 investigados da Operação Lava-Jato. Entre eles o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Além destes, estariam envolvidos 46 deputados federais, 12 senadores (entre eles, Renan do PMDB, Fernando Collor do PTB, Gleisi Hoffmann do PT, João Pizzolatti do PP etc.), o vice-governador da Bahia, um governador,etc. Além de políticos, também estariam envolvidos no esquema empresas como OAS, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão, Engevix Engenharia, Mendes Junior, Iesa, UTC-Constran, Arxo etc. Por sua vez, as empresas envolvidas na Lava-Jato afirmam haver doado cerca de R$ 109 milhões às candidaturas de Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB). Além de corrupção ativa, pesa sobre os suspeitos os crimes de lavagem de dinheiro, fraude a licitações etc. As denúncias de corrupção se estendem ao processo de compra da refinaria de Pasadena (EUA) e a desvio de recursos na construção da refinaria de Abreu e Lima (PE). As inúmeras denúncias de lavagem de dinheiro, fraude a licitações e corrupção conduziram ao afastamento de toda a diretoria da empresa, incluindo Graça Foster (Presidente da estatal), no início de fevereiro de 2015. No entanto, a própria presidenta integra o grupo de responsáveis pelos desmandos da empresa, haja vista que ela figurou tanto como membro do Conselho de Administração quanto na administração da Petrobrás. O suborno, a corrupção e a lavagem de dinheiro envolvem somas astronômicas; são milhões e milhões de reais que, somados, chegam a bilhões de reais. Somente na compra de Pasadena, o suborno chega a 1,5 bilhão de dólares. Alberto Youssef refere 15 contratos em que as empreiteiras vencedoras dos contratos de licitações com a Petrobras pagam propinas para os representantes das estatais. As denúncias de corrupção contra a esquerda do capital quase conduzem à débâcle do governo Lula. Da mesma forma que as denúncias do valerioduto foram verdadeiras, as denúncias da Lava-Jato também são procedentes. Na primeira, ficou claro como o Ministro da Casa Civil, José Dirceu, operava na compra de votos para aprovar as políticas governamentais e ampliar a base aliada no Congresso com as sobras fraudulentas da campanha do presidenciável petista de 2002. A história desvela as habilidades petistas no submundo da corrupção, do suborno e da fraude. Entre os envolvidos no mensalão se destacam: Vicentinho, Benedita da Silva, José Dirceu, Emídio de Souza, José Mentor, Delúbio Soares, Marcos Valério, Freud Godoy (segurança pessoal de Lula), Daniel Dantas (banqueiro), Banco Rural, Visanet, Banco do Brasil etc.