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Jornal 74: O Estado Islâmico e as bombas “humanitárias” do imperialismo


27 de novembro de 2014

O mais novo pretexto para as potências imperialistas intervirem, bombardearem e saquearem o povo árabe chama-se: Estado Islâmico. As cenas de decapitação de jornalistas e relatos de enterrar “YAZIDIS” (minoria religiosa com elementos pré-cristãos, cristãos e islâmicos) são considerados fatos suficientes para justificar novos bombardeios “cirúrgicos” e a presença de tropas ocidentais aliadas aos Estados Unidos e Grã Bretanha na região. Mas quem são, como se organizam, o que querem e principalmente contra quem luta o movimento conhecido por Estado Islâmico?

A ORIGEM

O fenômeno político e social expresso pelos jihadistas do Estado Islâmico não começou com a violência perpetrada contra jornalistas ocidentais, minorias religiosas e nem com o anúncio da criação de um Califado(1) https://br-mg6.mail.yahoo.com/neo/launch?action=showLetter&umid=2_0_0_1_8897174_ADLsw0MAABRfVC7pnQ3W%2BODQ7GQ&box=Inbox&src=hp&referer=hsrd.yahoo.com&.rand=1351935391 – _ftn1entre a Síria e o Iraque. Qualquer compreensão menos superficial do conflito deve considerar a longa história de disputas ocorridas na Ásia, norte da África e sua relação com o conjunto da Europa, bem como o desenvolvimento e a combinação dessas regiões no mercado mundial pré-capitalista, a atual fase de crise global do capitalismo, os acordos entre as potências imperialistas e sua influência na região. Mas, devido aos limites do presente texto, iremos nos concentrar no atual fenômeno da Jihad(2) como ferramenta das potências imperialistas para impor seus interesses sobre os trabalhadores árabes e saquear suas riquezas.
Podemos iniciar a reflexão sobre a estreita relação entre a família Bush, as corporações de petróleo, as monarquias árabes e o próprio Osama Bin Laden com o filme FAHRENHEIT 9/11 (https://www.youtube.com/watch?v=3VP39M3F03YO) e por RAMBO III; eles demonstram o empenho do governo estadunidense em criar, treinar e financiar os fundamentalistas afegãos contra a ocupação soviética. Iniciava-se então a 1ª Jihad, com a proposta de expulsar do Afeganistão as tropas soviéticas e seu estado laico, educação universal e demais costumes considerados ocidentais e infiéis.
A 1ª Jihad terminou em vitória contras as tropas soviéticas, significando a consolidação de uma lógica de combate de guerrilha uniformizada por uma interpretação do islamismo (Wahhabismo (3)) aparelhada da moderna tecnologia militar estadunidense. Significou também o fortalecimento do milionário árabe-saudita Osama Bin Laden como principal líder de uma rede de recrutamento de combatentes e recursos financeiros em prol da construção de estados islâmicos que adotem a Sharia (4) e costumes legalmente homofóbicos e machistas.
O recrutamento de jovens pela causa jihadista se nutre das contradições da atual fase de crise global do capitalismo. Nesta etapa, o avanço tecnológico aplicado à industria armamentista, a comunicação e a conectividade mundial, a globalização de mercados, somados ao vazio existencial provocado pelo consumismo enquanto sentido de vida e único estímulo de convivência social encontram terreno fértil entre a juventude (inclusive a não árabe) superexplorada.
Se atualmente testemunhamos a decadência das condições de vida na Europa e EUA e os ataques contra as conquistas dos trabalhadores desses países para sustentar o lucro das corporações transnacionais, podemos perceber que no horizonte de amplas camadas da juventude só existe trabalho precarizado e violência e onde não cabe qualquer perspectiva de vida digna. Podemos entender também como o vazio existencial encontra na mensagem religiosa e no financiamento árabe alento e sentido para se dispor a pegar em armas e ser útil à causa que pensam ter escolhido.

OS TALEBÃS E A EXPERIÊNCIA AFEGÃ

O funcionamento em rede experimentado durante a 1ª Jihad foi aperfeiçoado e a vitória contra o famoso exército soviético serviu de poderosa arma de propaganda sobre a visão de mundo fundamentalista, do estado teocrático, do ressurgimento da imposição dos costumes religiosos sobre as mulheres e homossexuais. A disponibilidade de território seguro para instalação de campos de treinamento e doutrinação de recrutas encontrou no Afeganistão, durante cinco anos no governo Talebã, terreno fértil para se desenvolver. De célula política organizada em rede, a Al-Qaeda transformou-se em fonte de inspiração de um movimento internacional jihadista. Sob a doutrina religiosa fundamentalista e conectados à rede mundial de computadores, difundiu-se a concepção de que qualquer fiel, em qualquer parte do mundo, pode ser um combatente independente a serviço da visão de mundo islâmica construída pelas monarquias da Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Qatar e Kuait (aliados dos EUA e financiadores de redes terroristas, segundo site wikileaks).

A 2ª INVASÃO DO IRAQUE E A 2ª JIHAD

Embora Sadam Hussein fosse considerado inimigo pelos jihadistas, devido a sua defesa do estado laico e adoção de costumes ocidentais, a preparação da 2ª Guerra do Iraque significou a invasão da terra sagrada islâmica por infiéis ocidentais e marcou os EUA como principal inimigo do Islã, justificando o “ataque preventivo” jihadista sobre território estadunidense em 2001. Começava a 2ª Jihad e toda a geração nascida na década de noventa sofreu a influência da espetacular ação militar em território estadunidense, a 2ª desde a independência (a 1ª foi infligida por Pancho Villa no início do século XX). O culto ao terrorismo fundamentalista como vertente política e a visão de mundo islâmica fomentada pelas monarquias árabes ganhou novo alento.
As intervenções militares intercontinentais impulsionadas pela Guerra Antiterror e a Doutrina do Eixo do Mal causaram, por um lado, perdas entre os quadros da Al-Qaeda, mas por outro espalhou sementes de suas células por todo o norte da África. Para impor seus interesses contra Kadhaffi, os EUA permitiram o armamento de grupos jihadistas na Líbia, e para ter influência sobre o petróleo sírio e derrotar Bashar Al Assad armaram diretamente forças rebeldes que na prática faziam parte do antigo Exército Sírio Livre do Iraque e Síria, atualmente Estado Islâmico.

A PRIMAVERA ÁRABE, O ESTADO ISLÂMICO E A 3ª JIHAD

Os interesses dos EUA no Oriente Médio e no norte da África sempre contaram com apoio das monarquias sunitas (5) do Golfo Pérsico, mas a partir da derrota de Saddam Husein (líder sunita, mas que não impunha o estado teocrático) e decomposição dos governos de coalizão que o sucederam, as monarquias sunitas intensificaram a colaboração com as correntes fundamentalistas e as células herdeiras da rede Al-Qaeda.
A crise capitalista que estourou em 2008 na Europa mandou de volta para casa dezenas de milhares de imigrantes de diversos países norte africanos. Esses imigrantes, que passaram tempos trabalhando precariamente e enviando recursos para suas famílias, encontraram seus países como o deixaram para emigrar. No Egito, a ditadura seguia em mais de 30 anos, desemprego, miséria, ausência de mínimas liberdades democráticas e brutal repressão policial era a marca de que o petróleo continuava enriquecendo as mesmas classes.
O jovem tunisiano, Mohamed Bouazizi, que ateou fogo ao próprio corpo para protestar contra as condições de vida, acendeu também o rastilho de pólvora sob o qual estava acomodado velhas e rígidas estruturas econômicas, sociais e políticas do mundo árabe.
Para contornar as reivindicações por melhores condições de vida, trabalho, educação, igualdade de gêneros e liberdades democráticas,ao mesmo tempo que mantêm controle sobre as riquezas petrolíferas, as monarquias árabes se utilizaram dos sentimentos religiosos das massas para canalizar insatisfações e esperanças seculares. Aproveitando-se da miséria a que submetem a juventude árabe e do vazio existencial provocado pelo capitalismo ocidental, o jihadismo consegue canalizar toda a insatisfação popular em nome da construção de um pretenso Estado Islâmico de fronteiras móveis, regido pela Sharia, homofóbico, machista e que utiliza a linguagem da violência para se comunicar.
Financiado pela tributação do território com 8 milhões de habitantes, com a exploração do petróleo que controlam e com a colaboração dos reis e emires árabes, o Estado Islâmico segue cumprindo sua dupla missão: 1) impedir que as reivindicações e instrumentos de luta dos trabalhadores surgidos na Primavera Árabe se consolidem, destruam o aparato repressivo e privilégios das monarquias árabes e coloquem o petróleo a serviço das necessidades dos povos árabes; 2) aumentar a área de influência das monarquias sunitas, destruir toda a influência liberal na política e costumes árabes, impondo a Sharia. Enquanto isso, as potências imperialistas se utilizam desse pretexto para intervir na região (ora de um lado, ora de outro), saquear as riquezas árabes, desenvolver o complexo industrial militar e disseminar o ódio entre os trabalhadores do mundo, estimulando rivalidades religiosas.
Só a unidade entre os trabalhadores árabes e a superação da crise de alternativa socialista promoverá o projeto político capaz de utilizar a riqueza que brota do solo árabe para atender às reais necessidades de seu povo, e poderá combater a miséria, o desemprego e a ignorância que alimentam o fanatismo de todas as vertentes, inclusive a religiosa.
 O petróleo árabe pertence ao seu povo!
 Contra a barbárie fundamentalista religiosa!
 Nenhuma unidade com o imperialismo!
 Pela unidade da juventude trabalhadora árabe!

Notas:
(1) Forma islâmica de governo que representaria a unidade e liderança política do mundo islâmico, onde o Califa ocupa a posição de chefe de Estado e representa a continuidade da autoridade política do profeta islâmico Maomé.
(2) Termo propagandeado pela grande mídia ocidental como “guerra santa”, mas que em sua concepção original refere-se a “empenho, esforço, mediante vontade pessoal para alcançar a verdadeira fé.
(3) Movimento revivalista iniciado pelo árabe saudita Muhammad Ibn Abd al-Wahhab (1703-1792); prega a purificação do islamismo para devolvê-lo às suas raízes do século VII, através de purga de práticas inovadoras.
(4) Sistema de leis religiosas islâmicas para regular todos os aspectos da vida social, supostamente revelada de Deus, portanto perfeita, eterna e obrigatória para os indivíduos e para o estado.
(5) Facção islâmica fundada na sunna, as práticas do profeta Maomé. Defende que o sucessor do profeta deve ser escolhido entre os fieis.estado islu00E2mico