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Jornal 71: As nossas referências para a discussão eleitoral


2 de setembro de 2014

Está aberto o processo eleitoral no Brasil. Trata-se de mais uma luta política entre a classe trabalhadora e a burguesia, que pode servir para aumentar o controle da burguesia sobre a classe trabalhadora ou para que a classe trabalhadora tire lições políticas e avance na compreensão de que somente a luta contra o poder da burguesia e do capital pode mudar a nossa vida.

Essa luta política impõe questões fundamentais para as organizações revolucionárias  elaborarem uma tática que supere alguns desafios: 1) como conseguir dialogar com a classe trabalhadora e ganhá-la para a compreensão de que o ato de votar não é suficiente para mudarmos a vida; 2) ter uma intervenção no processo eleitoral (independente de ter candidato ou não) sem, no entanto, semear ilusões; 3) contribuir para que a classe trabalhadora faça experiência com os mecanismos de dominação da democracia burguesa e deixe de acreditar nessa farsa; 4) como fazer com que essa intervenção sirva para a organização da luta direta. E, por último, mas não menos importante: 5) como construir organizações revolucionárias para contribuir com a luta pelo poder dos trabalhadores.

Essas questões apresentam as dificuldades para os revolucionários encontrarem a tática correta, em cada momento político, e levam em conta que a separação entre sectarismo, oportunismo e capitulação é uma linha muito tênue, um pulo. E distante da política revolucionária.

Começamos por esses desafios porque nos parece que a “esquerda legalizada” (PSTU, PSOL e PCB) tem se perdido na intervenção nos processos eleitorais, se limita a apresentar-se como alternativa “administrativa” e que irá gerenciar melhor a máquina estatal. Essa lógica faz com que a crítica se restrinja  à forma de governar ou mesmo, com um cunho moral, apresenta que o problema do Congresso Nacional é a falta de idoneidade, falta de denúncia da corrupção, etc. Mas, sabemos que o problema do Estado ou do Congresso Nacional não é a quantidade de deputados de esquerda, é a sua própria função na governança do capital. Essa lógica tem como consequência secundarizar a crítica ao próprio capital como a causa dos problemas da classe trabalhadora.

 O centro da luta é por fora do parlamento

A crise estrutural do capital impõe algumas contradições  que não podem ser solucionadas e que o obriga a se reestruturar com a intensificação da produção destrutiva, elemento predominante de sua constituição. Por conta das particularidades dessa crise a possibilidade de o sistema realizar reformas (que possam melhorar a qualidade de vida da classe trabalhadora de conjunto) são diminutas.

Demarcamos essa questão porque a solução da crise não passa “por políticas de Estado” (ainda que tenham alguma importância), mas sim por uma completa reestruturação das formas de produzir e do próprio processo de tomada de decisão política. O que tem se conseguido é jogar para frente as contradições internas do funcionamento do capital. E mesmo assim, com um intervalo de tempo cada vez menor.

Dessa forma, o capital, sendo um sistema, age no interior do Estado, e fundamentalmente fora dele. Como diz Mezsáros, é uma força extraparlamentar “por  excelência”, ou seja, seu funcionamento está para além do Estado. Para vencermos o capital precisamos confrontá-lo na fonte da produção de riqueza, isto é, nas relações de produção. É fundamentalmente nesse campo que a ação dos revolucionários deve concentrar suas forças.

Assim, a atuação dos revolucionários no parlamento pode até ocorrer, mas não pode ser o centro da intervenção. Também não podemos incentivar qualquer tipo de ilusão de que por dentro do Estado burguês haverá transformação social efetiva.

Com isso afirmarmos a impossibilidade do reformismo na atual etapa histórica e a atualidade histórica da revolução. Portanto, a estratégia da luta socialista brasileira é revolucionária.

Por fim, ressaltamos que o descrédito na via parlamentar não é uma escolha, mas decorre de uma avaliação da realidade objetiva na qual o capitalismo demonstra seus limites e a incapacidade de fazer concessões à classe trabalhadora, que precisa cada vez mais se organizar e lutar para manter ou arrancar conquistas.

Nenhuma ilusão na democracia burguesa

Ao partir de um aspecto correto e de uma tática que aproveite as brechas legais a “esquerda legalizada” tem se diferenciado muito pouco dos partidos da ordem. Muitas vezes parece mais do mesmo, sem sequer fazer uma denúncia radical da democracia burguesa e do próprio processo eleitoral controlado pela burguesia.

Entendemos que a intervenção da  “esquerda legalizada” no processo eleitoral poderia ser de enfrentamento à burguesia e ao capital e que possibilitaria levar para milhões de pessoas as propostas socialistas. Mas, há uma diferença importante entre: participar do processo eleitoral e nutrir ilusões por ele; ter candidatos e rebaixar o programa na tentativa de elegê-los; disputar para ganhar ou para denunciar o parlamento, a democracia burguesa e o capital.

Na verdade são os banqueiros, empreiteiros, os especuladores das Bolsas de Valores que decidem o que os eleitos deverão aprovar ou não. Precisamos contribuir para que a classe trabalhadora entenda isso.

A luta pelas liberdades democráticas

Como diz Lênin (A Revolução proletária e o renegado Kautsky): “A democracia burguesa, sendo um grande progresso histórico em comparação com a Idade Média, continua a ser sempre — e não pode deixar de continuar a ser sob o capitalismo — estreita, amputada, falsa, hipócrita, paraíso para os ricos, uma armadilha e um engano para os explorados, para os pobres”. Perder isso de vista é cair em uma armadilha que, historicamente, levou o proletariado a grandes derrotas.

Para os revolucionários ainda tem uma questão importante que é como combinar a luta contra a democracia burguesa com a luta por mais liberdades democráticas. Os regimes ditatoriais e fascistas são dificuldades para a luta revolucionária. Com todos os limites da democracia burguesa, o direito de reunião e manifestações públicas,  direito de greve e de se organizar sindical e politicamente são conquistas importantes e que permitem melhores condições de luta.

Essa não é uma combinação simples porque nessa luta não podemos deixar “brechas” para a burguesia retirar os direitos democráticos conquistadas com muita luta. Na luta pelas conquistas democráticas demonstramos os limites da democracia burguesa, contribuímos para que os trabalhadores façam a experiência e compreendam que só um poder socialista poderá propiciar a mais ampla democracia, a democracia operária.

Nesse momento de repressão, prisões, processos e outros ataques aos direitos democráticos são mais uma demonstração de que a burguesia não tem a democracia como princípio, utilizando-a só quando é útil para garantir a sua dominação. Hoje, na prática, não temos o direito de manifestação e reunião pública. Não temos liberdade de imprensa. E, em muitos casos, sequer temos as garantias constitucionais.

Posições sobre a tática eleitoral expressas nos debates internos:

Nos debates, em nossa Organização, tivemos duas posições táticas para as próximas eleições: Voto nulo e Apoio crítico às candidaturas dos partidos classistas.

A nossa compreensão de centralismo democrático apresenta a possibilidade de publicarmos posições divergentes. Entendemos que são debates do próprio movimento e as várias forças políticas e ativistas os estão fazendo. E a publicação das posições podem contribuir com os proponentes, com os militantes e ativistas para refletirmos, a luz da dinâmica da luta de classes, sobre acertos e erros nas posições.

A partir de uma decisão, por maioria, aplicaremos a política votada. O espaço democrático e a garantia de que as posições políticas serão debatidas e submetidas ao voto é, a nosso ver, uma forma de fortalecer a decisão da organização, criando um ambiente sadio e fraterno entre camaradas. É a democracia interna em sua máxima expressão.

Assim, publicamos nessa edição dois textos que expressam, em linhas gerais, os posicionamentos internos em debate.

Objetivando ampliar a reflexão sobre a questão eleitoral, também publicamos um texto de Ivo Tonet (Professor da UFAL) que, para além de seu posicionamento tático, traz questões imprescindíveis para essa reflexão.