Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

Uma resposta política à carta “Sobre minha entrada no PSTU e na LIT-QI”, de Rodrigo Monteiro.


24 de março de 2013

Nesta última semana, foi transformada em repercussão nacional uma Nota publicada no site do PSTU sobre a entrada de um militante (Rodrigo Monteiro, o “Fogo”) no partido, após vários meses de sua saída do Espaço Socialista (ES) (nota disponível aqui). Imediatamente somos noticiados de que militantes do PSTU têm utilizado a mencionada carta para realizar uma rebaixada campanha de ataque ao Espaço Socialista. Devido a isso e como a nota faz referência a esta organização e a posições político-teóricas (de forma distorcida) que defendemos, nos julgamos no direito de recolocar alguns fatos no seu devido lugar e também para esclarecer aquilo que a nota se esforça para confundir.

De imediato, dizemos que é lamentável que o camarada já inicie a sua militância neste partido se prestando (consciente ou inconsciente) a esse serviço. Afirmamos também que nosso método de discussão e de construção não é o de atacar rasteiramente qualquer que seja o partido ou mesmo o militante. Prestar-se a tal empreitada em nada contribui com o avanço do movimento em seu conjunto, o que, por sua vez, é ao que sempre nos prestamos. O debate político qualificado e centrado na política é o que deve interessar a qualquer revolucionário. Não nos interessa construir a própria organização desconsiderando o próprio movimento: isto só pode resultar em mais uma tragédia da Esquerda, como bem já demonstrou boa parte da experiência da Esquerda no século XX.

Uma oportunidade de fazermos um debate

Esclarecemos também que nosso debate não se envereda por um julgamento da reputação do companheiro, com o objetivo de desaboná-lo moralmente. Não é essa a nossa frente de batalha e nem é este o nosso método. Para nós, isto é um debate político e com as posições que agora o companheiro defende, o que, pelo menos para nós, não nos coloca em trincheiras diferentes.

Por que o Espaço Socialista incomoda o PSTU?

Diante do que está escrito, combinado com sua repercussão, é nítido que o objetivo maior da carta é atacar o Espaço Socialista (o PSOL aparece na carta apenas como elemento secundário e, pelo menos para ele, carta fora do baralho) e ao mesmo tempo exaltar o PSTU com frases forçadas que parecem ter sido escritas pela própria direção do partido e não por alguém que inicia sua experiência agora e após ter feito tantas críticas à mesma em sua atuação quando militante do Espaço Socialista. Uma mudança muito repentina de diagnóstico, diga-se de passagem.

Disso decorrem duas conclusões: em primeiro lugar, a preocupação do PSTU com sua própria militância e ativistas próximos, parte dos quais tem apresentado questionamentos crescentes ou simplesmente se afastado por falta de respostas à altura das necessidades que a nova situação da luta de classes tem colocado, principalmente no pós-crise de 2008. De fato, tem ocorrido um desencanto cada vez maior da militância e dos ativistas com a aplicação prática das concepções e dos métodos do PSTU na realidade. Muitos quadros importantes do movimento saíram do PSTU (…e não vimos nenhuma carta no site…) e muitos dos que entram já pegam algo pré-estabelecido.

Nesse sentido, a entrada de um ex-militante do Espaço Socialista no PSTU ajudaria a exaltar a direção e linha do partido para seus militantes de base e demais ativistas. A mensagem que se quer passar é: “olha aí a entrada de companheiros que saem de outras organizações, estamos no caminho certo, somos o verdadeiro partido revolucionário!”.

Toda esta situação combinada com a intervenção crítica do Espaço Socialista e outras correntes têm ajudado a puxar o véu e demonstrar os problemas estruturais que vêm se agravando na trajetória do PSTU e sua intervenção, tal como se apresenta, por exemplo, na própria CSP-Conlutas.

Assim, o Espaço Socialista ser citado e atacado ainda que de forma indireta expressa um reconhecimento da força das nossas posições, a ponto de começarmos a constituir um incômodo e uma humilde alternativa aos militantes da Esquerda.

Tal incômodo decorre, no entanto, de uma compreensão relacionada com um tipo especifico de organização revolucionária, com uma política também especifica para o movimento. É a já repisada política de colocar a construção do partido como a prioridade da intervenção, isso a despeito, se necessário, da própria construção do movimento e da unidade da esquerda. Se for necessário difamar subjetiva e moralmente ou mesmo destruir qualquer grupo ou organização, isto será feito para a construção do partido. Nestes termos, ser uma expressão real do movimento é algo relegado a segundo plano. É só por isso que nós “incomodamos”. E nisso, de fato, divergimos muito de boa parte das organizações. Porém, contra qualquer ilusão que ainda queira pairar, não somos precisamente nós que incomodamos, mas a própria construção de um movimento que pode ganhar cada vez mais espaço: um movimento que não capitula ao rebaixamento da consciência, ao governismo, sempre construído pela base, extremamente vivo e flexível à dinâmica da própria realidade. A prioridade do ES sempre foi e deve continuar sendo impulsionar um movimento político dos trabalhadores, controlado e guiado pelos mesmos trabalhadores.

Defendemos a construção de partido(s) revolucionário(s) que sejam ferramentas de impulso à organização e luta da classe trabalhadora não apenas para a tomada do poder mas também para que os trabalhadores passem a assumir progressivamente todas as funções de regulação da sociedade em suas mãos.

Nos entendemos como parte da construção de algo maior e não temos as ilusões de que o partido por si só fará nem salvará a revolução (temos um bom acúmulo sobre as revoluções do século XX; nos negamos, e temos orgulho disso, a ser dogmáticos e repetir os erros passados).

Onde estão as diferenças com o PSTU ?

Abaixo vão algumas questões que a carta aponta como algo “grave e crônico” no Espaço Socialista e que, finalmente, a solução estaria no PSTU:

  • “a de falta de bases teóricas sólidas…”: Fez falta o companheiro dizer quais bases teóricas não temos e que o PSTU tem. Uma leitura mais atenta poderá verificar o distanciamento teórico entre as duas organizações. Do lado do PSTU, já se considera que se tem tudo (ou quase tudo) formulado teoricamente e que os desafios do século XXI (mundialização do capital, crise estrutural do capital, o momento pós-queda do muro de Berlim, reestruturação produtiva, os processos no Leste europeu, o chavismo e outros) podem ser respondidos quase tão somente com a bagagem teórica da primeira metade do século XX, tratando o marxismo como um dogma. Há muito recusamos essa forma de compreensão do marxismo. Por parte do Espaço Socialista, dizemos em alto e bom som que os conceitos de Estado operário burocrático, crise de direção, que as duas únicas (ou mais importantes) estratégias são mobilizar as massas e construir o partido não responderam aos desafios da luta de classes. Quando se depararam com a realidade de quase todo o século XX, tais concepções sucumbiram, entraram em crise e jogaram milhares de militantes em uma desmoralização política;
  • o problema “da centralização…”: é desleal o companheiro dizer que o Espaço Socialista não tem centralização. Ele próprio sabe muito bem que temos. Só que não é um centralismo imposto e ainda por uma direção formada em sua estrutura pelos mesmos quadros de décadas. Defendemos o centralismo sim, mas nos esforçamos para que ele seja de fato democrático, em que todos os militantes (ou o máximo deles) participem das decisões políticas, com direito a que o militante possa sim expor as suas diferenças… a discussão livre é fundamental para o convencimento. Aqui nem nos estenderemos. Convidamos, entretanto, os companheiros a lerem o artigo “Recuperar o conceito de centralismo democrático dos bolcheviques”, disponível aqui.
  • …sobre a “formação de quadros”…: Aqui temos certo acordo com o companheiro. Formar quadros é uma das tarefas mais difíceis que existem hoje. Ainda mais quando é uma organização formada por militantes trabalhadores. O PSTU sabe disso: são os mesmos quadros de sempre que estão na direção do partido ou da CSP-Conlutas. A grande maioria cumpre as mesmas funções há anos.

Bem sabe o companheiro que esta sempre foi e é uma das grandes preocupações que temos (repetimos: com muita dificuldade). Porém, nos negamos decididamente tanto ao teoricismo quanto ao movimentismo. Formar um “quadro” exige uma rica relação dialética de teoria e prática a qual buscamos todos os dias (nossas publicações e textos tanto nos jornais quanto em revistas, declarações, teses e site demonstram isto). Mais exemplos não faltariam para elencar aqui, o que, entretanto, extravasaria aos limites do que é essencial nesta polêmica.

É verdade que há muito a ser feito, mas temos orgulho de rejeitar a rígida hierarquia entre dirigentes e dirigidos, tão presente na maioria das organizações da esquerda, que simplesmente reproduz acriticamente a divisão social do trabalho entre os que só pensam e os que só fazem.

  • Sobre ser uma “… organização partidária de fato…”. Neste caso, temos aqui um claro rebaixamento do debate. É também de conhecimento do companheiro que, para nós, a discussão sobre a necessidade de construção de organizações revolucionárias há muito está superada. A questão é que tipo de organização faz-se necessária: burocrática ou democrática? Com a eternização da direção ou com rodízio e controle da base? Que busque a práxis ou que seja simplesmente praticista? Que tenha como prioridade o desenvolvimento da consciência da classe trabalhadora ou a disputa pelo aparato? Que se construa a despeito do movimento ou que seja uma expressão (ainda que diferenciada) do próprio movimento? Essa é a discussão. Fazemos então um convite ao PSTU: vamos fazer um debate realmente profundo sobre essa questão e fugir do lugar comum?
  • Sobre os problemas que “…foram rapidamente se apresentando como um grave e crônico problema na organização”. Se o companheiro os apresentassem como fragilidades, seríamos capazes de dizer que concordamos com ele porque não nos vemos como A organização revolucionária e somos cientes das nossas fragilidades. Lutamos, porém, todos os dias para vencê-las. Mas cabe uma pergunta ao companheiro: se ele realmente acha que entra em “Uma organização que erra e assimila seus erros de forma marxista” (carta de entrada no PSTU) por que não fez referência aos erros deste partido?

Ficamos curiosos em saber a posição do companheiro sobre a capitulação ao governismo em Belém, a posição política pelo “NO” na Venezuela que era a mesma posição do imperialismo por ocasião plebiscito, a posição de “frente única” (mesmo que seja os gusanos ou Yoani) com todos que estão contra os Castros, o boicote primeiro ao comitê de luta contra o desemprego, depois ao comitê de apoio a ocupação do MTST de Santo André e agora ao ato antigovernista das mulheres no ABC no último dia 09 de março, a aliança com militantes do PMDB na eleição da Apeoesp em Santo André, a participação na mesa do pacto social com a patronal da construção civil, a recusa em adotar medidas antiburocratização na CSP- Conlutas….Ou será que tudo isso não é importante?

  • Quando ainda no ES “…fui convencido a tentar uma batalha interna na busca por construir uma organização partidária mais sólida. Infelizmente nem cheguei perto. Em parte, por minhas próprias debilidades, mas muito, por me encontrar numa organização imediatista e pouco audaciosa, que por falta de acúmulo e precisão analítica não consegue romper com os limites do movimentismo e autonomismo para se construir enquanto partido marxista de fato, ou seja, enquanto partido revolucionário…”.

Sabe bem o companheiro que se tivesse escolhido ser um militante do Espaço Socialista teria toda a liberdade de dar a batalha interna por suas posições. Conhece muito bem como poderia ter agido e impulsionado o debate. Um militante que se omite aos “desafios impostos pela conjuntura atual” deve repensar a sua práxis. Os militantes do Espaço Socialista têm liberdade de fazer as discussões. Sabes que não toleraríamos tão somente ultrapassar a barreira de classe. O ES não tem, em sua trajetória, casos de expulsão de camaradas que têm posição política diferente, ao contrário do PSTU (um dos últimos casos públicos de que tivemos notícia foi a expulsão de um militante – o “Socialista Livre” – que criticou o papel burocrático que o partido desempenhou no congresso da CSP-Conlutas).

Não é irrelevante que, em momento algum, o companheiro Fogo não apresente qualquer acusação de que métodos burocráticos o tenham impedido de apresentar suas posições. Isso é uma demonstração de como funcionamos: não há perseguição às posições políticas divergentes, não há manobras para não se fazer a discussão. Nesse sentido, faz-se necessário esclarecermos: o companheiro Fogo não saiu da militância do ES para entrar no PSTU, como quer passar a carta: o companheiro efetiva e progressivamente (segundo ele mesmo por problemas de ordem pessoal), primeiro, suspendeu qualquer militância de sua parte para, só depois de meses, sair formalmente do ES. O companheiro nos comunicou de sua saída, por e-mail, em 05 de dezembro de 2012; portanto, 3 meses antes da sua “entrada” no PSTU (e o congratulamos por isso, por não ter abandonado a militância revolucionária!).

  • Sobre o movimentismo: Ou não sabe o que é movimentismo, ou está de má-fé, ou não conhece de fato o tipo de política que o PSTU aplica, ou é tudo isso junto. Ou ainda, o que é pior, opõe à construção de um movimento pela base a construção do “partido revolucionário”, o que significaria relegar a segundo plano as próprias experiências e métodos da classe trabalhadora no processo rumo à revolução, porque, afinal, há um partido (claro, o PSTU) para fazer a revolução.

Assim é e procura ser o Espaço Socialista: sempre em construção, democrático, centralizado, luta pela construção de uma práxis revolucionária, luta pela formação de militantes pensantes e críticos, luta pela recomposição teórica do marxismo, têm pautado sua atuação no antigovernismo (não participa de chapa e nem de atos com setores governistas que não representem efetivas lutas do movimento), luta por um sindicalismo de base antiburocrático e pela construção de um movimento político dos trabalhadores.
A todos aqueles que queiram construir uma organização com essas características, que luta para superar a miséria do cotidiano e da Esquerda em geral, o convite está feito.

Espaço Socialista,
março de 2013