Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

Jornal 56: Março/Abril de 2013


25 de março de 2013

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Encarte – Formação política/teórica

Viva a Comuna! “Estamos aqui pela humanidade!”

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Ou leia as matérias online:

Apresentação

Esse é o jornal nº 56 do Espaço Socialista.

Os 10 anos de PT no governo federal trouxeram profundas modificações na luta de classes do país. Programas sociais, alianças com os setores mais reacionários da política brasileira, privatizações e incorporação da CUT ao estado são apenas algumas mudanças produzidas a partir da eleição de Lula em 2002. Esse é o foco do artigo sobre a situação política nacional.

Como o mês de março historicamente é lembrado como o mês da mulher trabalhadora (embora que todos os dias o sejam) apresentamos uma reflexão sobre a (falta de uma) política específica dos governos petistas para as mulheres e da necessidade de construção de um movimento de mulheres antigovernista.

A repressão aos movimentos sociais tem marcado a situação política nacional com perseguições e processos contra os lutadores. Esse método que também foi aplicado na ditadura militar demonstra como é autoritária a democracia burguesa. Nesse artigo busca-se fazer um breve balanço do golpe militar.

No artigo sobre Educação trataremos da necessidade de construção de mais uma greve nacional dos professores, em abril, convocada pela CNTE, que para além da pauta específica precisamos direcioná-la contra o projeto do capital para a Educação.

No cenário internacional, procuramos analisar a profunda crise social (desemprego, suicídios, despejos, etc) em que a Espanha está mergulhada,  demonstrando como o capitalismo arrasta os trabalhadores para a barbárie.
Esses são os temas que apresentamos aos ativistas e militantes para um debate franco.

Também apresentamos esse segundo número com periodicidade mensal do jornal Espaço Socialista,  visando melhor refletir a luta de classes e potencializar a nossa intervenção.

Segue também um importante esforço em que a cada dois meses publicaremos um encarte destinado à  formação política e teórica de ativistas e militantes do movimento social. Nessa edição segue a Comuna de Paris e suas lições.

Enfim… o jornal segue com  o mesmo caráter “novo” e em transformação sempre… como é de nosso costume!!

Leia, Critique, Sugira e divulgue!
Saudações revolucionárias!

10 anos de PT no governo: Trabalhadores não têm o que comemorar

As comemorações dos 10 anos do PT à frente do governo federal contam com atos nas principais capitais. Obviamente toda essa comemoração também é uma peça de marketing, a serviço de preparar o terreno para a largada da disputa eleitoral de 2014, onde o PT espera nada menos que a reeleição de Dilma, a maioria no Congresso e quem sabe algumas vitórias nos governo estaduais.

Para isso foi editada pelo PT, Instituto Lula e Perseu Abramo uma cartilha com milhões de cópias. Essa cartilha pinta a imagem de um país que teria deixado para trás os anos de neoliberalismo , representado pelo governo FHC-PSDB e teria ingressado no “desenvolvimentismo”, representado pelos dois mandatos de Lula e agora por Dilma – PT. O governo do PT teria conseguido driblar a crise econômica mais grave das últimas décadas, levando o país ao posto de sexta economia mundial e a um padrão de desenvolvimento sustentável e com justiça social, e a inclusão de setores sociais antes excluídos como as mulheres, negros e LGBT. Toda essa transformação teria sido resultado da liderança do PT nas pessoas do de Lula e agora de Dilma.

No entanto, olhando para os fatos e dados de conjunto, vemos que a história desses 10 anos de governo do PT é bem diferente.

Chegada do PT à presidência foi em conjunto com a burguesia e sob seu controle

O governo do PT no Brasil pode ser colocado entre os que surgiram na América latina a partir do final dos anos 90 e início dos anos 2000. Mas enquanto na Venezuela, na Argentina, na Bolívia e Equador ocorreram verdadeiras rebeliões sociais que derrubaram os governos “neoliberais puros” e levaram ao poder governos com diferentes graus de nacionalismo-burguês, por aqui as coisas foram muito mais mediadas. A saída burguesa para que houvesse a mudança conservadora se deu de forma preventiva e pela via eleitoral.

Ao final do governo de FHC, havia um desgaste do neoliberalismo puro, um aumento do número de greves e mobilizações. Os movimentos populares intensificavam as ocupações e havia dificuldades econômicas crescentes. A burguesia precisava de uma saída que se antecipasse ao problema antes que ele estourasse. Para o imperialismo era importante que o Brasil mantivesse seu papel como o grande fator de estabilidade na América Latina.

Nessa situação, a entrada do PT na presidência teve um caráter muito diferente do que teria em 89.

Em 2002, seu programa e sua prática já partiam da defesa dos interesses do capital. Sua máxima, de “crescimento econômico com distribuição de renda” deixava assentado que não propunha nenhuma ruptura com o capitalismo. O máximo a que seu projeto chegava era uma maior intervenção do estado no sentido de disciplinar alguns aspectos mais problemáticos do capital e do mercado no sentido de induzi-lo a realizar algumas necessidades sociais mínimas.

Para chegar à presidência pela via eleitoral burguesa, o PT teve que merecer a confiança do empresariado brasileiro, do imperialismo e da grande mídia. Já antes do 1º turno, em junho de 2002, Lula buscava tranquilizar a burguesia e o imperialismo com sua “Carta aos Brasileiros” na qual se comprometia a “preservar o superávit primário o quanto for necessário” para pagar os juros e a dívida pública, manter todas as “obrigações e os contratos”, não revendo nenhuma das privatizações feitas por FHC e ainda realizar as “reformas estruturais” e “apoiar o agronegócio”. Com uma carta assim, já estava claro de que lado esse governo estava e que não poderia resolver nenhum dos problemas estruturais que afetam os trabalhadores, pois para isso é necessário que se rompa com os interesses da elite e, principalmente, com o imperativo de lucratividade do capital.

Assistencialismo para dividir a classe e atacar setores mais organizados

Um dos principais aspectos que explicam a permanência do PT nesses 10 anos (e sua possível continuidade em um novo governo de Dilma) foi o de que ele buscou realizar um projeto capitalista que assegurasse a lucratividade da burguesia ao mesmo tempo em que distribuía algumas migalhas para os setores mais pauperizados, de modo a provocar uma divisão na classe trabalhadora e assim poder atacar os setores com mais direitos. Para isso o PT ampliou e criou novos programas sociais (Bolsa Família, Bolsa Escola, Luz para Todos), implementou uma forma de negociação com a classe que efetiva sua política aos poucos, nunca enfrentando a classe ou um setor de conjunto de frente (o que só fragmenta e enfraquece ainda mais a luta) e deu início a uma ligeira recomposição do salário mínimo, muito aquém porém da reivindicação histórica de salário mínimo do DIEESE (que hoje seria de R$ 2.743,69).

Dessa forma, conseguiu arrefecer a tendência de radicalização dos movimentos populares que vinha se desenvolvendo com ocupações e acampamentos nas beiras de rodovias, liderados pelo MTST e MST. Minou pouco a pouco o solo debaixo dos pés da classe trabalhadora mais organizada, criando a ideia de que eram privilegiados perante os setores mais pobres e que, portanto, podiam e deviam fazer os maiores sacrifícios. Os verdadeiros privilegiados – a banca financeira, a burguesia industrial e o agronegócio não eram mencionados como privilegiados. Os usineiros chegaram a ser elogiados por Lula.
Essa política de cooptação social e divisão da classe criou uma anestesia social de modo que o PT pôde avançar na implementação das reformas estruturais em prol da lucratividade privada.
Podemos dizer que essa proposta do PT também amarrou parte importante da burguesia ao contemplar pelo menos durante um tempo suas necessidades mais gerais (toda sua política internacional, inclusive, vai esse sentido, o que se deduz das intervenções brasileiras no Haiti, por exemplo). A banca financeira continuou lucrando como nunca, com o pagamento dos juros e amortizações da Dívida Pública sangrando o orçamento do país (neste último ano de 2012, os números indicam que quase metade do orçamento do governo federal foi consumido com o pagamento de juros e amortizações da Dívida). A burguesia do agronegócio teve sua parcela em financiamentos e isenções de impostos, facilitando suas exportações e fortalecendo-a (a ofensiva do agronegócio contra os Guarani-Kaiowás, em parte, é resultado desse fortalecimento por meio das políticas federais). A burguesia industrial, por sua vez, embora acossada pela concorrência externa, teve isenções de impostos e a certeza de que não haveria grandes perturbações dos movimentos sindicais, pois as centrais passavam a fazer parte da estrutura do governo. Acrescente-se a isso a cooptação completa da União Nacional dos Estudantes (UNE), o que garantiu a implementação de uma Reforma Universitária que precarizou e privatizou a Universidade brasileira, beneficiando assim boa parte dos capitais presentes na bancada do Congresso Nacional.

Sobre esse solo, e beneficiado por um cenário externo favorável, o PT se colocou como o gerente eficaz e mediador dos vários setores em nome dos interesses do capital de conjunto, impedindo que os trabalhadores pudessem se organizar e lutar pelas transformações necessárias no país.

O PT montou uma ampla rede de cooptação política e social ao seu redor, que vai desde setores miais pauperizados, passando pelas entidades dos movimentos sociais organizados, ONG’s e chegando a partidos da própria burguesia que vivem à sombra do Estado, fazendo, assim, com que todos se tornem cogestores do seu projeto. Ao invés de se apoiar nos movimentos dos trabalhadores para uma ruptura com o capital, o PT foi buscar sua base de apoio político primeiro junto ao PTB e logo após no PMDB, que se tornou seu aliado preferencial, além de uma ampla gama de legendas de aluguel.

No mandato de Lula, incorporou as centrais sindicais de forma subordinada, através de uma série de mecanismos. O governo do PT é a expressão do abandono por parte da CUT e do partido dos referenciais socialistas, assumindo o capitalismo como o único horizonte possível.

Daí que a incorporação das centrais ao governo foi um processo muito fácil. Os mecanismos foram o acesso ao dinheiro do Imposto Sindical, do Fundo de amparo ao Trabalhador, voltado para cursos de capacitação de mão de obra, participação e colaboração nos fóruns dos vários ramos econômicos, pactos e acordos setoriais.

A criação e incorporação de milhares de ONG’s ao governo fez com que parte da classe média também pudesse se beneficiar do banquete do dinheiro público. Boa parte desse dinheiro foi desviado para o caixa 2 do PT. O esquema do Valerioduto foi apenas a ponta do iceberg, mas que que, mesmo não tendo sido desvendado por inteiro, já revelou uma prática comum à de outros partidos direitistas como o PSDB.

Para o MST o governo liberou verbas para as cooperativas e algumas terras que já haviam sido ganhas, mas ainda não entregues ao movimento. Ofereceu cargos em ministérios e secretarias para várias lideranças. Dessa forma, conseguiu que esse movimento arrefecesse sua luta e desse um prazo para o governo.

O PT pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão…

Durante todo esse tempo o maior alvo dos ataques foram os trabalhadores, particularmente o funcionalismo público. Tivemos a Reforma da Previdência de 2003, congelamento salarial, ataques à carreira, e agora mais recentemente, a política de meritocracia que apenas muda o foco e joga sobre os trabalhadores a culpa da precarização.

No que toca a sua relação com as greves, o PT não poderia ser mais exemplar para a burguesia: Quando houve manifestações como aquela contra a Reforma de 2003 ou na Greve do Funcionalismo Federal o governo não hesitou em reprimir, mandar cortar o ponto, pedir a ilegalidade das greves e punir os ativistas.

Da mesma forma que FHC, Lula chamou os funcionários públicos de folgados e ao final de seu mandato, já começava a preparar uma legislação antigreve que ia no sentido de retroceder esse direito aos tempos da ditadura militar, praticamente proibindo as greves. Os trabalhadores terão direito à greve desde que não a façam “para valer”. A repressão à pobreza e aos que lutam tem se tornado marca também no governo petista de Dilma.

A Educação e a Saúde seguiram em níveis extremamente precários. A desvinculação das receitas da saúde e educação (artifício criado por FHC a fim de cortar gastos dessas áreas) foi prorrogada pelo PT matando a possibilidade de que essas áreas pudessem apresentar qualquer melhoria. Ao contrário, ao criar o PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação) o governo aumentava os mecanismos de controle e avaliação externa e individualizada das escolas e dos professores, mas não para melhorar o atendimento e as verbas para essas escolas e sim para atribuir a culpa da crise da educação aos professores. Em complemento a tal situação, o PDE também deu rédea solta para a intromissão de empresas no interior da rede pública através das chamadas “parcerias”.

A discussão sobre os 10 % do PIB para a Educação foi adiada para 2022 e a depender dos recursos do pré-Sal, uma forma de jogar o cumprimento para um futuro distante, exatamente como outros governos fizeram no passado.

Não podemos esquecer do mensalão, que acabou de vez com o último suposto diferencial entre o PT e o demais partidos – a ética na política. A partir daí, o governo modifica sua base de apoio atraindo para ela o PMDB passando a ter uma maioria mais folgada no Congresso que lhe permite aprovar todos os projetos e cooptar quase todas as principais forças de oposição. Temos então um período de crescimento até o estouro da crise mundial e seus efeitos sobre o Brasil que se fazem sentir já no início de 2009.

A Crise e Intervenção do Estado para Salvar o Capital e atacar os trabalhadores

A partir da crise de 2009 temos a intervenção massiva do estado com trilhões de reais para salvar a lucratividade do empresariado não apenas brasileiro, mas também cooperar nos esforços de vários países convocados a ajudar o capital através do G-20, grupo dos vinte países mais ricos formado, por política do imperialismo, no sentido de socializar com países mais periféricos os esforços de contornar a crise mundial.

Dessa forma ouve o incentivo irresponsável ao endividamento geral que continua se desenvolvendo, o aumento dos gastos do Estado no sentido de impulsionar a economia em um padrão voltado para a exportação de commodities (matérias primas e alimentos), com diminuição do peso relativo da indústria. O Brasil, assim, volta-se cada vez mais para o papel de plataforma de montagem e exportações de produtos cujas peças vêm do exterior.

O horizonte futuro aponta para um esgotamento dessas medidas com a necessidade de maiores ataques sobre a classe trabalhadora, como o ACE (acordo coletivo especial) que visa o fim dos direitos trabalhistas, como férias 13º salário, pagamento de horas extras, e multa rescisória dos 40%, etc. Além disso, se avizinha uma nova reforma da previdência que tende a aumentar a idade para poder se aposentar. Dessa forma o governo do PT tende a ser cada vez mais duro com os trabalhadores. Até a Copa ou as Olimpíadas o partido parece ter fôlego para continuar vendendo suas ilusões de prosperidade, mas cada vez mais se torna visível que o projeto geral é endurecer ainda mais para cima dos trabalhadores, impulsionando, inclusive, a repressão e criminalização dos movimentos sociais em geral.

O PT não é um partido dos trabalhadores!

O PT, por sua vez, desde antes de sua chegada ao Planalto, já não era mais um partido que defendia as bandeiras históricas dos explorados e oprimidos de um ponto de vista classista.

O processo de burocratização desse partido e sua integração ao regime democrático burguês nos anos 90 fizeram com que mudasse seu conteúdo de classe. Em sua base social, a burocracia de Estado (cargos em prefeituras, mandatos de parlamentares, cargos na estrutura de estado) tem muito mais influência do que a burocracia sindical. Além disso, a integração dos seus sindicatos à gestão do capital também tinha avançado com a participação dos sindicalistas em Conselhos, Fóruns, etc junto com a burguesia e o governo. Mas o elemento mais representativo da degeneração do PT e de seus quadros é, talvez, sua integração na condição de gerente dos fundos de pensão. O PT está na direção dos maiores fundos de pensão do país, como entre muitos outros, o PREVI e a PETRO. Tudo isso o faz prisioneiro da lógica do capital financeiro e do capital em geral.

Sua transformação total em um partido burguês composto de burocratas se completou com a chegada ao planalto e na medida em que passou a ocupar milhares de cargos diretos e indiretos na gestão da máquina pública. Não nos esqueçamos que esta funciona com base nos pressupostos do capital, como defesa prioritária da lucratividade, rígida hierarquização, defesa da ordem burguesa, etc. Deste modo, não faria qualquer sentido esperar de um governo do PT qualquer medida de ruptura, nem naquele momento e muito menos agora.

Governo de frente popular ou governo burguês?

Desde as eleições de 2002, polemizamos contra a posição de correntes de esquerda que defendiam que o governo Lula seria um governo de frente popular ou mesmo que estaria em disputa um projeto democrático-popular, tal como caracterizou, por exemplo, o PSTU e a Consulta Popular, respectivamente.
Tal forma de caracterizar este governo, por um lado, ou leva, erroneamente, a uma política de exigências (a qual propôs que Lula rompesse com o FMI, não realizasse a Reforma da Previdência, etc – obviamente sem sucesso algum), ou mesmo a um apoio “crítico” ao governo.

A partir do estouro da crise em 2009, essa política de exigências descabida e a falta de um combate mais profundo (político e ideológico) ao projeto e às premissas do capital assumidas pelo PT, começou a mostrar efeitos muito mais problemáticos. Isso porque desarmava os trabalhadores para enfrentar os ataques muito maiores como as demissões e o corte de direitos. Ao centrar a política nas exigências ao governo Lula, e, posteriormente, Dilma, dá-se menos ênfase na necessidade de os trabalhadores se prepararem e confiarem em suas próprias lutas. Além disso, deixa de realizar a disputa política e ideológica com o projeto burguês de apoio ao capital defendido pelo PT.

A possibilidade de romper com a lógica do lucro, que possibilitaria que os próprios trabalhadores assumam o controle da produção e o funcionamento da sociedade como um todo, obviamente está fora de cogitação pelo PT e CUT. Mas cabe aos socialistas revolucionários apresentar e batalhar por esse referencial socialista. Deve-se alertar, no entanto, que ao centrar o foco em apelos aos governos Lula/Dilma, abre-se mão da construção dessa consciência. Os resultados foram desastrosos tanto nos casos das demissões na EMBRAER, na desocupação do Pinheirinho em São José (em que foram centrados esforços para que Dilma interviesse), como recentemente nas demissões na GM (em que também focou suas consignas em mais investimentos e em que Dilma impedisse as demissões ao invés de levantar as bandeiras da redução da jornada sem redução dos salários, da estatização da GM sob controle dos trabalhadores e uma campanha geral contra as demissões, com a proposta de greve, etc.). Não houve um trabalho nesse sentido que pudesse apontar para uma resistência à altura da dimensão das demissões e corte de direitos.

Abre-se um espaço para a esquerda, mas para ocupá-lo é preciso ter política independente

Em termos da atuação da CSP-Conlutas e até da Intersindical, as consequências são de que falta uma campanha sistemática e profunda junto aos trabalhadores no sentido de denunciar o governo Dilma e seu projeto pró-capital e contra os trabalhadores.

Tanto a caracterização de um governo de frente popular quanto a de um governo com um projeto democrático-popular em disputa ancora-se na avaliação de que as organizações dos trabalhadores dividem, no governo, o poder com a burguesia. De acordo com essa visão, um governo assim é mais suscetível a pressões por parte dos movimentos e, por isso, devem focar sua política em exigências ao mesmo. Outra justificativa para a recusa em atacar o governo Dilma e realizar a crítica de seus fundamentos perante os trabalhadores é o alto índice de popularidade que tem acompanhado o PT ao longo de seus mandatos. Só que com essa concepção que rebaixa a política revolucionária em função do nível de consciência atual das massas, tudo o que resta é conformismo, é se dobrar perante a realidade exploratória. Este modo de proceder não ajuda a educar as massas e nem fazer avançar sua consciência. Além disso, abre-se mão de construir uma alternativa junto a setores importantes, ainda que minoritários, para posteriormente, quando com o agravamento das condições econômicas se ampliarem os ataques, alavancar setores mais amplos.

Por outro lado, a popularidade dos governos do PT não pode ser o principal elemento a ser considerado. Não se pode capitular à consciência atrasada dos trabalhadores nesse aspecto. Qual é o papel da organização revolucionária se não for provocar a reflexão, ajudando as massas a superarem seu atraso em relação às necessidades da situação?

Apostar na mobilização de setores mesmo que minoritários das massas e da vanguarda de forma a avançar em experiência, consciência, unidade e organização da esquerda classista e de luta é fundamental para quando houver os processos de maior ataque aos trabalhadores.

Desde a entrada do PT no governo, é um fato que a esquerda tem aproveitado muito pouco o espaço de independência que tem se aberto com as lutas que agora enfrentam não apenas os patrões, mas também o próprio Partido dos Trabalhadores.

Para nós do Espaço Socialista, o governo do PT é um governo burguês neoliberal (ainda que com características que o diferenciam de outros neoliberais clássicos) no qual os trabalhadores e suas organizações (mesmo as burocráticas) não possuem influência decisiva na política econômica e social geral. Podem, no máximo, forçar mediações em aspectos secundários do projeto, mas não a mudança de sua tônica.

Do ponto de vista da política revolucionária, o foco tem que ser a denúncia do governo do PT e seu projeto, como um projeto em prol dos patrões e do aumento da exploração dos trabalhadores. Deve existir uma campanha permanente no sentido de denunciar os vários aspectos – não apenas sindicais, mas também ligado à questão de gênero, racial e ambiental, dos ataques que o governo do PT vem realizando sobre a classe e demonstrar a necessidade de que os trabalhadores vão às lutas para defender seus direitos e para, principalmente, apontar um novo rumo, socialista, para o país e sociedade em geral.

A necessidade da construção de um novo projeto para o país

A incorporação completa do PT, da CUT e da UNE à ordem institucional burguesa coloca o desafio de construir novas ferramentas de transformação efetiva que não se percam no caminho. Para isso são necessárias algumas definições fundamentais:

A necessária ruptura com o capitalismo e sua ordem institucional. Não é possível enfrentar nenhum dos problemas profundos que afetam os trabalhadores e a humanidade em geral sem romper com a lógica de funcionamento da sociedade baseada no lucro e na propriedade dos meios de produção alienados dos trabalhadores. É preciso uma nova sociedade em que os trabalhadores assumam o controle dos meios de produção e distribuição da riqueza social, os convertam para produção das necessidades coletivamente discutidas e decididas em equilíbrio com o meio ambiente.

Essa ruptura não ocorrerá pela via das eleições burguesas. É preciso resgatar os ensinamentos históricos e atuais para dizer em alto e bom tom que as instituições do Estado burguês não servem para os trabalhadores exercerem seu poder. Será necessária uma revolução política e social que destrua o Estado burguês e coloque em seu lugar os organismos de luta da classe trabalhadora, sejam eles os sindicatos, as associações, os sovietes (conselhos), comitês de fábrica, etc. Não se pode pensar em uma transformação social que ocorra por reformas ou de maneira gradual, pois está provado que a burguesia não tolerará alterações graduais na sociedade, recorrendo à cooptação e, quando esta não for possível, aos golpes.

Tampouco a saída está simplesmente em que um partido iluminado que assuma o poder. Os trabalhadores precisam de um poder coletivo seu em que reorganizem a produção de alto a baixo em base a critérios sociais e democráticos e não os imperativos de lucratividade do capital. Pra isso deve se apostar desde já nas lutas e nos organismo de luta direta dos trabalhadores. A construção dos partidos e organizações revolucionárias deve se dar dialeticamente ligada a esse processo e a serviço dele e não como um fim em si mesmo como tem sido feito pela maioria da esquerda.

O Golpe Militar de 1964 e as lições da derrota

Daniel Menezes

 

O contexto do Golpe

Em 31 de março de 2013 se completam 49 anos do golpe militar de 1964. O golpe estabeleceu uma ditadura militar que durou até 1985 e deixou sequelas que até hoje marcam a vida do país. No início da década de 1960, o Brasil vivia um momento de profundas mudanças. Milhões de pessoas se mudavam para as cidades, as fábricas se multiplicavam, milhões de crianças e jovens entravam para a escola, o que não havia acontecido com a geração de seus pais. A autoimagem do país era muito positiva e difundia-se o mito do “país do futuro”. Eram os anos da inauguração da nova capital, Brasília (1960), do cinema novo, da bossa nova e do bicampeonato mundial de futebol (1958 e 1962).

Era também um momento de intensificação da luta de classes, com grandes mobilizações operárias, camponesas e estudantis. Uma greve geral em 1962 apresentou diversas reivindicações sociais e políticas e conquistou o 13º salário, que se mantém até hoje. As ligas camponesas no nordeste organizavam os trabalhadores rurais na luta pela reforma agrária e contra os abusos seculares dos latifundiários. Os Centros Populares de Cultura (CPCs) da UNE levavam teatro e cinema engajado à população, na tentativa de influenciar politicamente os trabalhadores por meio da cultura.

As facções da classe dominante e o golpe

No campo da burguesia, estava em curso uma disputa entre dois setores. De um lado, o setor liderado pelo então presidente João Goulart (apelidado Jango), herdeiro político de Getúlio Vargas, praticava uma política nacional-desenvolvimentista, que procurava levar o Brasil a ser uma potência capitalista, com algum grau de independência em relação ao imperialismo, impulsionando a indústria nacional e algumas concessões aos trabalhadores. De outro lado, havia o setor conservador e abertamente pró-imperialista da burguesia, composto por latifundiários e empresários diretamente associados ao capital estrangeiro, hostis a qualquer concessão aos trabalhadores.

As mobilizações populares levaram o governo João Goulart mais à esquerda. O presidente pronunciou um comício sobre as reformas de base na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, em 13 de março de 1964, que foi tomado como um claro sinal de radicalização. Diante disso, aceleraram-se os preparativos para o golpe. Em 31 de março, a cúpula das forças armadas mobilizou as tropas e as ruas das capitais amanheceram tomadas por tanques de guerra. Não houve resistência ao golpe. A ditadura cassou mandatos parlamentares, fechou sindicatos, prendeu militantes, aposentou intelectuais, exilou artistas. Apenas a UNE continuou funcionando por algum tempo, até 1968.

A importância da estratégia e da independência dos trabalhadores

Parte da responsabilidade dessa derrota cabe à principal organização política dos trabalhadores, o Partido Comunista Brasileiro (PCB), que tinha grande influência nos sindicatos e dirigia a UNE. A estratégia do PCB era de apoiar a fração nacionalista da burguesia nacional, contra o setor mais reacionário e o imperialismo. O pressuposto dessa estratégia era de que o Brasil ainda precisaria passar por uma revolução burguesa, antes de se pensar em transição ao socialismo. Em função desse apoio, não havia a preocupação com a independência política dos trabalhadores. Não foram desenvolvidos organismos capazes de lutar pelo poder, pois a suposição é de que essa não era uma tarefa dos trabalhadores.

Desde o início do século XX, Trotsky já havia demonstrado, na teoria da Revolução Permanente, que a burguesia dos países periféricos é incapaz de realizar as tarefas da revolução burguesa (como a reforma agrária e outras) e essa tarefa caberia ao proletariado. Na luta para concretizar essas tarefas, o proletariado precisaria impulsionar medidas de ruptura com o capitalismo, como nacionalizações e expropriações, sendo seguido pelas classes populares, avançando para uma revolução socialista. Sendo assim, a tarefa dos socialistas seria desenvolver a consciência dos trabalhadores para a luta pelo poder, com total independência em relação a líderes burgueses e pequeno burgueses.

As lições da derrota dos trabalhadores no golpe de 1964 são vitais para a construção de uma estratégia revolucionária no século XXI. Não se pode confiar em lideranças burguesas e burocráticas, cujos exemplos nos dias de hoje são figuras como Hugo Chávez, pois essas lideranças, por mais radical que seja o seu discurso, nos momentos decisivos, abandonam a luta e deixam o poder livre para a burguesia e o imperialismo. E as vítimas são os trabalhadores, massacrados pela repressão. Não há outro atalho para a revolução que dispense os socialistas da tarefa indispensável de organizar os trabalhadores de forma independente e desenvolver sua consciência num rumo anticapitalista e socialista.

A repressão e os saudosistas da ditadura

O Brasil é o único país da América Latina que não julgou e condenou os autores dos crimes da ditadura, as mortes e torturas de opositores. O fim do regime militar se deu por meio de um acordo, que manteve o Estado sob controle dos mesmos setores da burguesia que se beneficiaram da ditadura. Além de não condenar a cúpula do aparato militar, foi mantida uma cultura repressiva e conservadora no judiciário e na polícia. O Brasil é um dos poucos países do mundo que tem uma polícia militar, a PM, uma polícia aquartelada, sob comando dos governos estaduais, criada na própria ditadura, como uma espécie de exército para combater um inimigo interno, o próprio povo.

Os métodos desenvolvidos na época da ditadura para perseguir opositores políticos, os esquadrões da morte e a tortura, são hoje aplicados diariamente pela polícia (militar e civil) para se apropriar de uma parte da renda dos negócios criminosos. Sob o pretexto de reprimir o crime, a polícia que atua nos bairros periféricos mata e tortura impunemente, especialmente quando as vítimas são negros.

Essa polícia que se associa ao crime e age de forma criminosa também tem outra função, reprimir grevistas e manifestantes. Em todos os governos pós-ditadura, e também nos do PT, as lutas sociais são tratadas como caso de polícia. Militantes são mortos, presos, torturados, no campo e na cidade, com a conivência do judiciário, que por sua vez proíbe greves, aplica multas aos sindicatos, inocenta os patrões e condena os trabalhadores. Nos últimos anos, com a crise mundial do capitalismo rondando o Brasil, o governo do PT e os governos locais dos demais partidos estão todos determinados a empurrar os efeitos da crise para debaixo do tapete. Não é permitido discordar do discurso que vem de todos os lados, do governo, da mídia, das burocracias sindicais, etc., de que o país está progredindo. Quem ousa discordar, e fazer alguma coisa a respeito, fazer greves, ocupações, manifestações, críticas, mostrando que apesar de todo o discurso o povo vai mal como no tempo da ditadura, precisa ser tratado como uma ameaça à segurança nacional.

Em outras palavras, os governos do PT aplicam os mesmos métodos repressivos da ditadura, em plena “democracia”. Vivemos uma ditadura do capital, dos bancos, do agronegócio, das grandes indústrias, que contam com o PT para silenciar as lutas. É preciso denunciar essa ditadura disfarçada e também aqueles que, de maneira cada vez menos disfarçada, se atrevem a defender o golpe de 1964 (que foi chamado de “revolução” pelos seus autores), defender os crimes dos militares, defender a volta da ditadura, defender os métodos autoritários da repressão. A volta de ideias fascistas e de ultradireita é um sintoma da gravidade da crise e do perigo que se aproxima. Antes que essas ideias se tornem uma força material, é preciso urgentemente lutar por uma outra ideia: a emancipação dos trabalhadores, por obra dos próprios trabalhadores!

O feminismo precisa ser classista e antigovernista

Iraci Lacerda

… “A proletária não tem nada em comum, naquilo que se refere a seus interesses econômicos decisivos, com as mulheres das outras classes. Assim, a emancipação da proletária não será obra das mulheres de todas as classes, será unicamente obra do conjunto do proletariado, sem distinção de sexo.” Clara Zetkin (Congresso de Gotha, 1896).

A união, ou seja, a organização das mulheres trabalhadoras passa por uma dura realidade no Brasil hoje e não nega o passado de duras lutas entre reformistas e revolucionárias pelo mundo afora.

Desde o Manifesto Comunista, 1848 – que apresenta o questionamento à família burguesa e demonstra as bases da servidão doméstica passando pela I Internacional, 1864, que conclui que a causa da opressão da mulher é econômica e que para aboli-la é necessário transformar a sociedade – até os dias de hoje observamos o quanto as organizações de esquerda ainda não respondem às necessidades de uma luta classista e, logo, antigovernista.

Feminismo para quê e para quem?

O desenvolvimento da luta por conquista de direitos, entre os revolucionários, é marcado pela II Internacional, 1889 – em que, além de conquistas gerais da classe trabalhadora, a mulher trabalhadora também lutou por questões democráticas como direito ao voto, igualdade político e direito à filiação partidária. No entanto, observou-se nitidamente que essas conquistas eram insuficientes para a emancipação da mulher que necessitava trabalhar.

A luta contra a opressão não pode esperar a revolução

Uma das mais importantes tarefas para os lutados revolucionários é caminhar ao lado de mulheres que lutam para que a classe trabalhadora de conjunto tome para si a tarefa de virar esta sociedade de ponta cabeça, sem que se ignore o massacre diário que sofrem as mulheres trabalhadoras. Isso foi demonstrado com a Revolução Russa, 1917.

Enquanto uma parcela (mencheviques) lutava por uma democracia burguesa e pela união de todas as mulheres por uma república democrática, outra parcela (bolcheviques) lutava contra a situação humilhante em que a mulher trabalhadora estava submetida.

Ainda hoje contamos com importantes conquistas da Revolução, que foram espalhadas pelo mundo, como o direito ao divórcio e a pensão alimentícia.

As resoluções da III Internacional, de 1919, expressam a polêmica sobre a luta da mulher trabalhadora divergir das necessidades da mulher burguesa.

Concluiu-se que a relação da trabalhadora com o feminismo burguês e as alianças de classe debilitam a nossa organização e as forças da classe trabalhadora de conjunto. Entendeu-se que a união deve ser de todas e todos os explorados e não das forças feministas de classes opostas, pois nos processo amplos ou radicais de luta o feminismo burguês soube sempre de que lado ficar.

Entendemos que no Brasil, em nenhum momento, viveu-se um processo revolucionário, sequer, parecido com o russo, mas podemos observar esse brevíssimo recorte histórico para buscar compreender a necessidade da luta classista, ou seja, a necessidade de unidade e de organização da mulher trabalhadora para essa luta.

Das reivindicações conquistadas com a luta revolucionária e espalhadas pelo mundo muitas ainda não alcançamos por aqui, mesmo com uma mulher na presidência: o direito ao aborto legal e gratuito, o ataque às causas da prostituição com a melhora das condições de vida e de trabalho, o estabelecimento de salário igual para trabalho igual, a criação de condições para a libertação do trabalho doméstico por meio da socialização das tarefas, etc.

Essas conquistas básicas já poderiam fazer parte do nosso cotidiano se a “inverdade” da 6ª economia mundial não precisasse de 10 anos de PT no governo e de Dilma para impor sobre as mulheres trabalhadoras o fim de direitos trabalhistas (amamentação, pré-natal (ACE), etc.) e um pastor evangélico para a Comissão de Direitos Humanos – para atender os interesses da burguesia conservadora.

A ilusão no governo e o atraso na consciência

Enquanto isso temos movimentos organizados como as centrais sindicais que defendem diretamente o governo (Força Sindical, CUT, CTB), bloqueiam as lutas, elaboram projetos para que Dilma atenda com tranquilidade a burguesia e para a classe trabalhadora apresentam campanhas, CPMIs, cartilhas, etc. para não saírem do papel.
Esses movimentos buscam organizar as mulheres com uma visão policlassista das lutas, ou seja, de que lutamos contra as mesmas injustiças e de que somos todas iguais nessa sociedade democrática.
Por outro lado, temos também as centrais sindicais de esquerda (CSPConlutas e Intersindicas) que aplicam, mesmo sem lutas, a política de exigir do governo Dilma que a situação da classe trabalhadora mude de verdade. Com essa mesma política buscam organizar para as lutas as mulheres que trabalham, no entanto, contribuem para que se estabeleça uma profunda confusão e a ilusão de que os governos da burguesia poderão conceder algo para a classe trabalhadora sem intensas lutas e sem que essas lutas estejam totalmente atreladas à transformação social.

Dessa forma, não consideram a história da luta da mulher trabalhadora e desprezam a realidade de avanço dos movimentos de direita e da igreja num momento em que se caminha rapidamente para criminalização dos movimentos sociais como instrumento de contenção das lutas que estão sendo gestadas por uma situação de crise mundial.

Sem confusão e sem ilusão! A nossa luta é oposta à burguesia!

A CSP-Conlutas, em seu último Congresso, aprovou, por maioria, a construção de um ato unificado com essas várias centrais sindicais no Dia Internacional de Luta da Mulher. Ou seja, além de aplicar a política de exigência ao governo Dilma adotou, na prática – embora o discurso não tenha sido alterado – a unidade policlassista. Ou seja, além de representar um imenso retrocesso para as lutas das trabalhadoras e da classe de conjunto perdeu a oportunidade, mais uma vez, de tornar-se a referência de luta anticapitalista para as organizações de esquerda e para as mulheres trabalhadoras que estão na luta e já não acreditam mais nesse governo.

Em São Paulo, no próprio ato o bloco do Movimento de Mulheres em Luta (MML) era apenas um figurante entre vários outros.

Ainda é possível fazer algo para retomar o caminho da luta classista

Descontentes com os rumos políticos que a direção majoritária da CSP-Conlutas tem aplicado algumas organizações, inclusive de outros estados, têm insistido na luta classista e antigovernista junto aos trabalhadores.

Aprovamos em nossas organizações e entidades atos e manifestações do Dia Internacional de Luta da Mulher que desmascarassem o governo Dilma, os governos estaduais e suas políticas próburguesia.

No ABC paulista, o I Encontro do Movimento de Mulheres em Luta, em 2012, que reuniu trabalhadoras de diversas categorias, foi contrário à construção de um ato policlassista e unificado com o governismo como indicado pela Central.

Sendo assim, nesse 9 de março, em Santo André com a organização do Sindicato dos Professores da rede estadual (APEOESP) – reunimos os movimentos de esquerda, oposições sindicais, movimento por moradia (MTST), movimentos contra o aumento das passagens, maioria do MML Regional, etc. na realização de um ato unificado contra o machismo e a violência contra a mulher, antigovernista e anticapitalista e pelas reivindicações imediatas da mulher trabalhadora. Mas não contamos com a participação do PSTU que é a direção majoritária da CSP-Conlutas e do MML nacional. É possível e necessário retomar o histórico caminho da luta classista.

Somente a luta consciente, da classe trabalhadora unida, mulheres e homens, sem nenhuma crença na burguesia ou nos seus governos derrubará falsas lideranças e terá a força necessária para impor o fim da sociedade de injustiças em que a mulher trabalhadora precisa ser oprimida e humilhada para sustentá-la.

Greve nacional de professores: lutar contra o projeto educacional do capital

Núcleo Professores

 

Nos dias 23, 24 e 25 de abril, a CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – está convocando uma greve nacional, como parte da Semana Nacional em Defesa da Escola Pública.

Diversos sindicatos de professores Brasil a fora estão convocando greves que vão além da convocatória da CNTE, que inclusive já secundarizou o Piso Nacional e sua Jornada.

É importante expressar a defesa da Escola Pública, mas devemos ir além do discurso, das práticas políticas viciadas e de interesses políticos particulares.

Este artigo expressa o nosso ponto de vista em relação à greve nacional, a possível greve dos professores da rede estadual de São Paulo e nossa atuação política durante esse processo de mobilização.

Um projeto educacional do capital aplicado por governos do PT ao PSDB

As reformas ocorridas na Educação Pública brasileira estão relacionadas com a reorganização e reestruturação do processo produtivo. No entanto, as mudanças educacionais praticadas no país nem sempre revelavam quais interesses representavam, pois os grandes grupos econômicos – nacionais e transnacionais – defendiam seus interesses a partir da atuação de organismos internacionais – FMI, Banco Mundial, UNESCO, CEPAL e ILPES –, encarregados de defender reformas no campo da Educação.

O atual projeto educacional em prática no país, diferentemente de outros momentos, desnuda e escancara a participação direta de redes de empresários e banqueiros – “Todos Pela Educação”, “Parceiros da Educação”– na formulação de políticas públicas para a Educação Pública e na aplicação prática dessas políticas.

A cooptação de profissionais da Educação pelos interesses privados para respaldar suas ações, a criação de sistemas de avaliação de resultados e aprendizagem – Enem, Saresp, Enade, Ideb, Idesp, dentre outros –, o monitoramento, responsabilização e cobrança cada vez mais individualizada por resultados, os regimes precários de contratação de professores, a participação do setor privado, tanto pela prestação de consultorias como pela administração direta de unidades escolares, e a bonificação e promoção por desempenho, resultam do aprofundamento da atuação desses grupos no campo educativo público.

O uso da truculência e do assédio moral para quebrar a resistência dos professores e dos alunos

Como se trata de um projeto que retira direitos e a autonomia, questiona a estabilidade e o direito de greve, e intensifica o trabalho, os professores que têm estabilidade acabam resistindo mais. As greves e manifestações massivas da categoria de professores têm sido o principal obstáculo à implementação de projetos de precarização e pró-empresariais dos sucessivos governos na Educação, pois embora não consigam impedi-los totalmente, têm levado a atrasos e mediações na implementação do projeto geral. Além disso, há todo um conjunto de formas de resistência por escola ou individuais, que vão desde paralisações de escolas, atuação em reuniões de Conselho de Escola até a simples resistência individual na aplicação de um projeto que todos sentem que não vai no sentido de melhorar o ensino. Para os governos é fundamental quebrar essa resistência geral dos professores, e isso se dá em parte pelos mecanismos de premiação, mas cada vez mais pelos de coerção e castigo.

A truculência e o assédio moral, dentre inúmeras ações autoritárias, são a marca desse projeto, pois é necessário quebrar qualquer empecilho à sua implantação. É um projeto que não aceita questionamentos.

O achincalhamento e o ataque à autoestima visam fragilizar e vulnerabilizar o professor, impedindo com isso a sua reação. Presenciamos nas escolas uma espécie de “intolerância institucionalizada”.

A intolerância atinge também os alunos, sobretudo os de periferia que recebem tratamento diferenciado. Na periferia das grandes cidades, as escolas assumem um papel importante de contenção social para permitir a liberdade de consumo de outros setores que podem consumir. As escolas se assemelham a presídios e carecem da infraestrutura mínima, que existe em escolas centrais, para dar visibilidade à política educacional, sendo tratadas como exemplos que dão certo quando se quer trabalhar.

Nessas escolas de centro, justamente por servirem de exemplo, a cobrança sobre a elevação dos índices é ainda maior sobre os professores.

Por trás do discurso de responsabilidade social, pretende-se abrir caminho para privatização

Há uma campanha intencionada na mídia que coloca os problemas das escolas como se fossem problemas de incapacidade administrativa, de incompetência de funcionários públicos acomodados e que a Educação cumpre com a sua responsabilidade social.

Trata-se de uma pressão que se dá tanto pelo convencimento via mídia – propaganda na tv e rádio, principalmente –, como pela pressão física de equipes gestoras cooptadas que objetiva abrir caminho para a privatização da Educação Pública. O Projeto de Educação de Tempo Integral do governo de São Paulo expressa esse interesse.

A greve nacional pode ser uma oportunidade para defendermos a nossa proposta de Educação Pública
Sabemos que com a marcação da Greve por cima, sem a devida discussão e preparação democrática nas várias categorias, a Articulação Sindical pretende uma luta limitada, com o objetivo central de desgastar a imagem dos governos ligados ao Bloco PSDB, DEM, etc.

Sabemos também que a greve tende a ser travada na medida em que começar a questionar a política educacional do governo federal, cujo projeto geral é o mesmo aplicado pelos governos nos estados, diferindo apenas em aspectos secundários.

Entretanto, nós que somos dos setores de Oposição dentro da CNTE e da maioria dos sindicatos estaduais, inclusive na APEOESP, não devemos nos levar apenas por esses fatores. Há toda uma situação complicada dentro das escolas que é preciso expressar para o conjunto da sociedade, além de mostrar que os problemas não são localizados, mas fazem parte justamente desse projeto maior.

A Greve Nacional da Educação pode se transformar em um momento importante para fazer a denúncia do projeto de Educação Pública que está se implantando no país, e que esse modelo de Educação privilegia apenas interesses de empresas, bancos, ONG’s e institutos, e não o interesse geral dos trabalhadores.

Podemos esclarecer aos trabalhadores e seus filhos que esses interesses privados pretendem sucatear ainda mais a Educação.

Sob o argumento de que o calendário foi jogado de cima para baixo e que o objetivo da greve é apenas desgastar o PSDB, visando às eleições de 2014, as maiores correntes de oposição ao pólo governista, o PSTU incluso, viram as costas para as demandas reais dos professores, não dando ênfase à discussão e preparação dos professores da vanguarda para a Greve. Isso é muito grave, pois pode fazer com que a ArtSind apareça como único setor de luta a chamar a Greve, e seja quem atraia os setores novos de vanguarda, mesmo que não muito amplos, nas suas mãos.

Além disso, deixa a Oposição à direita da ArtSind na questão da greve, não contribuindo para que os professores vejam na Oposição o pólo de luta necessário para unir a categoria.

Mesmo não havendo as condições para uma greve massiva, sabemos que algum nível de paralisação e de mobilização haverá, devido à tendência ao caos nas escolas.

Assim, o PSTU, que dirige a Oposição na CNTE em vários estados, perde mais uma vez a oportunidade de enfrentar e se diferenciar do governismo na luta, que é onde se percebe melhor as diferenças, e não no discurso.
Nós do Espaço Socialista e da corrente sindical Renovar Pela Luta, mesmo com todas as críticas à ArtSind, chamamos à discussão e preparação da Greve Nacional, para nela defendermos o nosso projeto de Educação Pública e avançarmos nas formas de organização de base nas escolas, junto aos alunos e pais.

Na greve, os setores de Oposição devem lutar para assumir a direção do movimento e enfrentarmos juntos com os professores as direções burocráticas dos sindicatos.
As correntes de Oposição e ativistas devem fazer essa discussão na greve, sem negligenciar e nem virar as costas a esse debate.

Espanha: Crise econômica avança para crise social

Thiago Calheiros

 

A Crise social…

Considerando que a crise social hoje instaurada na Espanha já dura desde 2008 e que não há perspectiva alguma de sair dessa situação em curto prazo, podemos dizer que a sociedade espanhola, juntamente com Grécia e Portugal, representa um dos maiores símbolos do conjunto de ajustes que o capital precisa impor nesse e nos próximos anos. Assim sendo, podemos dizer também que em uma, relativamente, “nova forma de viver” veio para ficar na Espanha.

Mas essa nova forma de viver parece ainda não ocasionar uma convulsão social generalizada; aliás, em boa parte da Espanha, a sensação das pessoas é como se estivessem passando por uma mera instabilidade, algo passageiro e bem breve. Mais do que isso, o que se detecta também é que a exacerbação do individualismo e a falta de perspectiva de um outro projeto de sociedade, aliados também com uma grande indústria de entretenimento,  fazem com que as contradições mais graves e catastróficas teimem em não irromper a naturalidade do quotidiano tão frequentemente quanto deveriam. Em verdade, um certo clima de entorpecimento tão típico de nosso tempo aliado a alguma esperança no próprio Estado de bem-estar social fazem com que todos vivam uma “situação sabidamente catastrófica como se não fosse grave”!

Para se ter uma ideia do que se passa hoje na Espanha, em fevereiro desse ano o desemprego bateu a marca dos 26% da população em condições de trabalho; entre os jovens, tal marca é ainda mais trágica: 50% dos jovens com idade de até 25 anos estão desempregados; a perspectiva do FMI para a economia da Espanha em 2013 é de diminuição de 1,5% do PIB (em 2014 a expectativa é de outra queda de 0,8%); para completar o cenário em que o dinheiro está bem mais escasso para a população como um todo, hoje, em razão da crise, há mais de 600 casas de escambo (troca de objetos sem a intermediação do dinheiro), frente às poucas dezenas que haviam em 2007.
Em termos de dados sociais gerais, destaca-se a taxa de suicídio: em 2012, principalmente em razão do desemprego e dos despejos amplamente realizados em decorrência do estouro da bolha imobiliária, a taxa de suicídio cresceu 25%. A Educação pública sofre um processo de privatização forte, fazendo com que haja uma hierarquização por renda da população no que diz respeito ao acesso à universidade de qualidade; os funcionários públicos foram também afetados no corte de seus direitos (em 2012 já não receberam o pagamento extra de natal – o equivalente ao nosso 13º – e já têm seus salários congelados pelo terceiro ano consecutivo); até a siesta (tradicional descanso de algumas horas após o almoço) sofreu ataque do governo espanhol, vez que aprovou, no ano passado, um conjunto de medidas que visam ampliar o horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais.

Em meio a tal cenário e dado o alto índice de desemprego e das precárias condições de vida em geral, aumenta o preconceito com estrangeiros representantes de força de trabalho barata, tal como os latino-americanos; além disso, o próprio contexto da crise acirra um quadro de tensionamentos de nacionalismos de cunho fascista, principalmente em regiões de cultura fortemente diferenciadas, como a Galícia, o país Basco e a Catalunha, apesar de também se colocarem alternativas à Esquerda.

Obviamente que toda essa decadência do capitalismo na Espanha tem explicação e motivações. Primeiro deve-se dizer que o próprio Estado e os bancos são mesmo os grandes catalisadores de tal processo. Mas assim só o são não por acaso, mas por causas precisas.

Vale dizer, sobretudo, que o próprio desenvolvimento espanhol se deu sobre uma base não tão sólida e um tanto “artificial”, dada a política do Euro, que injetara grandes quantias de dinheiro que foram destinadas ao aumento do poder do consumo dos cidadãos espanhóis e também destinadas, em tese, para a modernização de sua infraestrutura (o que, no entanto, nunca foi feito de modo sólido).

Resultante de tal política do Euro, a Espanha tornou-se um país com grande poder de consumo, mas de baixa competitividade em relação a países como a Alemanha, França e Inglaterra, o que só fez crescer em um ritmo avassalador a dívida pública, dado o permanente déficit comercial.

Mas, mesmo que assim seja, tal crise social espanhola não resultou de meras decisões de governos e bancos. Em verdade, esta foi a solução dada para uma situação histórica em que o próprio capital industrial se tornara não tão lucrativo quanto o capital financeiro, o que fez com que o domínio de uma mecanismo lucrativo para alguns poucos capitais, insustentável em longo prazo, se consolidasse, fazendo crer que um certo mecanismo de que dinheiro poderia simplesmente gerar mais dinheiro passasse a ser o regente da economia e de toda a sociedade. Estamos falando, pois, da financeirização da economia. Ou seja: se, por um lado, os bancos e o Estado espanhol merecem toda a culpa possível; por outro, a crítica de fato mais radical e profunda deve pôr em xeque a própria forma de viver que impõe o capitalismo, uma forma de viver que tem no dinheiro e na mercadoria, na produção e consumo irracionais, seu fundamento; assim sendo, sob este prisma, os bancos e o próprio estado mais não são do que fantoches de uma sociabilidade que se move por objetivos cegos.

Quem e como têm lutado…

Assim, temos, pois, de um lado, os bancos que são a todo o momento salvos da falência (no ano de 2012 foi aprovado um plano de concessão de 100 bilhões de euros) e que, ao mesmo tempo, não dá trégua à população já em maus lençóis; junto desse, temos ainda o Estado, que aplica o plano de austeridade sobre a população, cortando e precarizando os direitos sociais em geral. De outro lado, entretanto, na situação espanhola, ainda não temos nenhum antagonista mais ou menos consolidado que possa dar respostas à altura das que são necessárias. Mesmo assim, exemplos que romperam consistentemente o silêncio do aparentemente natural cotidiano foram as manifestações do movimento Puerta Del Sol, mais intensamente em 2011, e a mobilização de greve de mais de 8 mil trabalhadores da mineração das Astúrias, em 2012. Ambos os exemplos, para além das próprias vitórias ou derrotas imediatas, cumprem a função de ser o início de uma reorganização da população para a luta. Nesse sentido, podemos dizer que temos um terreno crescentemente fértil para fazer germinar em médio/longo prazo uma construção de um referencial alternativo ao próprio capitalismo.

Diante de uma situação como essa, podemos afirmar que, enquanto a população espanhola não reunir, enquanto classe, forças materiais e ideológicas para lutar por um projeto socialista, a burguesia seguirá aplicando as políticas ao seu alcance, que não são capazes de resolver os problemas econômico-sociais em geral, vez que são estruturais e não é esse seu propósito. Para garantir, pelo menos por um curto prazo, a sobrevida dos capitais fictícios tão dominantes na Espanha (a grande ascensão do Banco Santander na década de 90 é só um exemplo disso), a burguesia precisa retirar as concessões que foram feitas aos trabalhadores. Esse é o sentido das políticas que estão em curso na Espanha e no mundo inteiro, o que também nos mostra a inviabilidade de um pedido por um capitalismo mais humanizado e com uma democracia “real”.

Nesse contexto, considerando que não vivemos apenas uma crise periódica, mas uma crise estrutural do capitalismo temos uma situação que força a todas as classes sociais a reelaborar os seus projetos de sociedade e, por isso, as lutas contra os efeitos nefastos do capitalismo têm também de se renovar.

Os sindicatos e os movimentos sociais em geral que se limitam a lutar por questões imediatas, melhores salários e pequenas reformas não vão conseguir sequer defender as atuais condições de vida (como, aliás, têm acontecido com as lutas dos trabalhadores da mineração e de todo o movimento Puerta Del Sol) se não conseguirem construir mobilizações e processos de luta massivos, unitários e com pauta totalizante.

Esses processos de luta, por sua vez, para serem vitoriosos, necessariamente vão se chocar frontalmente com os interesses da própria continuidade da ordem capitalista. É, portanto, esse o desafio que está colocado para os trabalhadores e para o povo em geral, na Espanha e no mundo inteiro.

Desse modo, apontamos, como tendência geral da correlação de forças, o fato de que as lutas contra-hegemônicas seguirão acontecendo, ainda que de modo fragmentário. No entanto, também apontamos a partir da crise de alternativas socialistas e do papel reformista e corporativista das direções político-sindicais de muitos desses processos, que é pouco provável que elas adquiram um caráter de ofensiva num curto prazo; ou seja, as lutas continuarão se estabelecendo tão somente como defesa em relação às medidas do projeto de ajuste que o capital desfere.

O que defender…

Sabemos que os capitalistas não vão acatar qualquer medida que seja e que possa significar avanço significativo na vida da população em geral. Entretanto, problemas estruturais pedem soluções estruturais. Por isso, cabe aos revolucionários explicar a todos as diferenças entre as medidas adotadas pelos capitalistas e as propostas dos socialistas, a fim de estabelecermos uma correlação de forças favorável, que permita aos trabalhadores e à população em geral impor medidas que proporcionem dignidade a quem realmente produz a riqueza e dela necessita para viver.

Trata-se, assim, de fazer despertar a luta de todo um povo também em defesa de todos, pondo fim ao sacrifício da esmagadora maioria em favor de uns poucos. A luta e a vitória dessas propostas não são somente questão de fazer predominar um grupo ou uma classe sobre outra, mas uma questão da própria sobrevivência e integridade de todo um país.

Assim, como medidas urgentes e imediatas parecem-nos bastante razoáveis as seguintes palavras de ordem e propostas:

– Em defesa dos empregos, salários, benefícios, direitos e condições de vida dos trabalhadores, contra as políticas de “austeridade” e os cortes nos gastos públicos, que favorecem a população em geral;
– Contra as políticas de ajuste ditadas pelo capital financeiro, contra as privatizações dos serviços públicos e contra a política de socorro aos bancos;
– Pelo respeito das diferenças étnico-culturais dos povos espanhóis;
– Repartição de todo o trabalho disponível entre todos os trabalhadores, por meio da redução da jornada sem redução dos salários.

Encarte – Formação política/teórica

Viva a Comuna! “Estamos aqui pela humanidade!”

Virgínio Gouveia e Thiago Arcanjo

Datada de 18 de março de 1871 e com uma duração de 72 dias, a Comuna de Paris, primeira experiência avançada de autogestão humana da história, completa 142 anos em março de 2013. Este momento propicia uma ocasião para refletirmos acerca das contribuições, avanços e limites desse evento no que diz respeito aos rumos hoje trilhados pela humanidade. No atual momento da ainda presente estagnação da classe trabalhadora brasileira, apesar da situação política mundial que tem se modificado ainda que timidamente, e no contexto em que a humanidade como um todo se encontra na encruzilhada posta pela profunda crise econômica que se arrasta há anos, nós do Espaço Socialista, enquanto organização revolucionária, escrevemos este pequeno encarte no sentido de contribuir com a formação de todos aqueles que lutam por uma sociedade emancipada.

Qual a importância da Comuna?

A Comuna de Paris foi a primeira tentativa dos trabalhadores de governarem a si próprios. Mesmo sendo uma tomada de poder que durou pouco tempo – exatamente 72 dias. Nem por isso, deixa de se configurar, sem sombras de dúvidas, como um acontecimento de magnitude universal para a humanidade. Esse primeiro exemplo de autogestão dos trabalhadores cravou-se como evento ímpar na história dos últimos séculos.

Karl Marx, por sua vez, em um texto intitulado A Guerra civil na França, diria que a Comuna era “a forma política afinal descoberta para levar a cabo a emancipação econômica do trabalho”. Assim, a Comuna foi a primeira representação da própria classe trabalhadora como um sujeito autônomo do Estado e independente de uma classe dominante. E mais, demonstrou de modo incisivo que a produção é o momento predominante da construção da história humana, e que, devido justamente a isso, somente o controle consciente da produção poderia possibilitar a emancipação da sociedade.

A história não é algo que passa por cima da vida dos trabalhadores, mas, ao contrário, é construída por meio de suas próprias vidas; os trabalhadores fazem a história, mas não a fazem quando estão dormindo ou sonhando. Ela se inicia quando cada indivíduo acorda, escova os dentes, toma seu café da manhã, pega uma condução, chega ao trabalho e compõe um coletivo de proletários que produzem comida, roupa, meios de condução e outras infinidades de mercadorias, sem as quais não existiria nossa sociedade.

A questão que colocamos, e que a retomada da experiência da Comuna nos ajudará a responder, é: se tudo o que existe na sociedade é fruto da atividade dos trabalhadores, por que será que os próprios trabalhadores não têm poder sobre o que eles mesmos produzem? Quais são os mecanismos sociais essenciais que mantêm tal forma de sociedade?

Por meio da necessidade de se produzir o que se necessita de fato consumir; por meio de uma progressiva unificação nas mesmas pessoas das funções de quem coordena a produção, de quem produz e de quem consome; pela possibilidade real de controle dos próprios trabalhadores; pela tomada do poder político pelos produtores; por meio de uma organização social que não tem a necessidade de patrões; a Comuna se configurou como um exemplo clássico do caráter antagônico entre a forma Comuna e a forma Estado. Ela representa um ensaio de libertação da humanidade, de exemplo da ação coletiva da classe trabalhadora, se estabelecendo como uma forma de sociedade totalmente diferente da existente até então. E bem distinta também da sociedade atual onde milhões de trabalhadores no mundo todo são obrigados a vender sua força de trabalho em fábricas, bancos, salas de aula, etc. Ao invés dos trabalhadores de Paris venderem sua força de trabalho para a manutenção de suas vidas, a Comuna mostrou realmente a possibilidade e a necessidade da tomada de poder, da tomada das rédeas da história por parte dos operários, se constituindo como o primeiro governo operário da história. Nesse seu aniversário de 142 anos, pretendemos, assim, honrar e resgatar a importância histórica da Comuna de Paris, demonstrando a atualidade de suas causas mais profundas e de suas propostas.

O desenvolvimento da luta dos trabalhadores no século 19

Com a ascensão do capitalismo no século 19 – industrialização, bancos, comércios, formação de mercados, etc – e com o significativo aumento das forças produtivas, houve a ascensão de uma nova classe social: os trabalhadores das indústrias capitalistas, os operários. Como consequência direta, criaram-se nesse contexto novas relações sociais entre os donos das indústrias (capitalistas) e os trabalhadores das fábricas (explorados) que compunham o cotidiano destas indústrias.

Dessa relação entre burgueses e trabalhadores, surgiram na Europa no início do século 19 dois movimentos: os ludistas e os cartistas. Ambos lutaram contra a ofensiva do capitalismo sobre os operários. O Ludismo foi um movimento que lutou contra o avanço das máquinas e a progressiva substituição da força de trabalho humana… objetivava assim lutar contra o desemprego. Em 1811, na Inglaterra, o movimento operário estourou, ganhando uma dimensão significativa. Esses trabalhadores que “quebravam” as máquinas ficaram conhecidos como ludistas, pois o principal líder do movimento se chamava Ned Ludd.

Mesmo assim, ainda nesse momento em torno da década de 1830 e 1840, os trabalhadores continuaram sofrendo várias transformações na esfera do trabalho. Nessa quadra histórica, a cada década surgiam novas formas da ofensiva da expansão e intensificação da exploração por parte dos capitalistas sobre os operários. Essa ofensiva se configurou com jornadas de trabalho que chegavam a 18 horas; com um grande número de desempregados que eram obrigados a aceitar uma remuneração baixíssima; com uma situação que terminava por introduzir outros membros da família para dentro do chão de fábrica – assim, mulheres e crianças trabalhavam recebendo um terço do que um trabalhador masculino ganhava naquela época. O inchaço urbano, fruto do desenvolvimento do setor industrial, transformou as cidades em um ambiente permanentemente calamitoso, onde a falta de higiene fazia surgir a cada momento novas doenças e epidemias.

Dessas dificuldades sofridas pelos trabalhadores, surgiu o Cartismo. Esse foi um dos primeiros movimentos a reivindicar a participação da classe trabalhadora na política parlamentar, exigindo a criação de leis que beneficiassem os trabalhadores. Exigindo melhores condições no ambiente fabril e redução da jornada de trabalho, um conjunto de reformas foi pleiteado, o que ficou conhecido como Carta do Povo.

Entre 1846 e 1848, o capitalismo sofre aquilo que é típico de sua própria existência: as crises! E aqui começava a ficar evidente o caráter irracional da produção capitalista: pode-se produzir, há quem precise de tais produtos, mas eles não podem ser fabricados! Tudo isso porque, no capitalismo, tudo só circula se houver dinheiro. Não havendo este, no capitalismo, não há problema em existir toneladas de alimentos sendo jogadas fora e uma imensidão de pessoas famintas!

Tal crise teve inúmeras consequências negativas para a classe trabalhadora. Seguida pela redução significativa do consumo das mercadorias industrializadas, houve uma demissão massiva de trabalhadores nas grandes cidades. Devido a tal contexto, originou-se aquilo que ficou conhecido como Primavera dos Povos. Apesar de se espalhar por várias regiões da Europa, a Primavera dos Povos logo imediatamente conheceu a fúria repressora da burguesia.

Nesse contexto, o alto grau de desenvolvimento do capitalismo na década de 1850 o elevou a um patamar expansivo tão intenso, a ponto de torná-lo definitivamente internacional. Assim sendo, a luta da classe trabalhadora não poderia mais se restringir ao caráter local, precisando também dar uma resposta internacional às mazelas produzidas pelo capitalismo sobre a classe. É nesse sentido que se organizou pela primeira vez na história a AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores) em 28 de setembro de 1864, em Londres/Inglaterra, e perdurou até 1876. Um dos seus principais membros foi o conhecido revolucionário Karl Marx, que escreveu diversos documentos para a organização, incitando a solidariedade fraterna entre os trabalhadores de todo o mundo e a necessidade da construção de um partido dos trabalhadores independente.
A relação contraditória entre classe trabalhadora e burguesia gerou consequentemente o aparecimento, expansão e desenvolvimento qualitativo e quantitativo das organizações dos trabalhadores no século 19. Desse modo, consideramos que a Comuna foi fruto do acúmulo prático-teórico do movimento operário desse século. Temos, assim, na Comuna um exemplo singular da síntese dos diversos aprendizados da classe trabalhadora.

As causas da Comuna de Paris

Estudiosos burgueses fiéis à classe dominante costumam caracterizar os grandes feitos da classe trabalhadora, ora como loucura – que pode tornar-se loucura coletiva –, ora como fruto de um complô secreto e extremista, de uma conspiração secreta. Por sua vez, a Comuna não ficou isenta dessas explicações. Grandes nomes da cultura francesa do século 19 a explicaram publicamente tal como: “parte louca” da França, em contraposição ao campesinato, sua “parte sã … sensata, ponderada …”.

Mas, afinal de contas, qual a causa imediata da Comuna? A Guerra Franco-Prussiana!

Em meados do século 19, por volta do dia 19 de junho de 1870 a França até então reconhecida no mundo todo pelos feitos da revolução francesa de 1789, entrou em conflito armado com a Prússia – região que se transformou no que hoje é a Alemanha. Tal guerra ficou conhecida como Guerra Franco-Prussiana. Por um lado, a França liderada por Napoleão III tinha o objetivo de recuperar seu prestígio interno e externo frente às perdas político-diplomáticas. Por sua vez, a Prússia naquele momento era uma superpotência militar, política e econômica, e a sua entrada no conflito tinha como pano de fundo o processo de Unificação da Alemanha, nessa época liderada por Bismarck.

A guerra desenrolou-se de 1870 a 1871, tendo a Prússia saído vitoriosa do conflito. Esse acontecimento foi extremamente negativo para a França derrotada, pois o país fora obrigado a ceder várias vantagens à Prússia. O fim da guerra foi selado pelos dois países envolvidos com o Tratado de Frankfurt, realizado em 10 de maio de 1871. Entre os acordos, a França foi obrigada a ceder parte de suas províncias e teve que pagar uma indenização de guerra de cinco bilhões de francos.

Evidentemente, as desvantagens da humilhante derrota francesa nesse conflito pesaram sobre as costas da classe trabalhadora. Além de ser a esmagadora maioria morta em combate, dos trabalhadores também foram retirados por parte do governo francês direitos de trabalho, passando então a vivenciar uma ainda mais dura exploração e repressão por parte do governo parisiense. Diante disso e da aberta crise política no interior da própria classe dominante, grupos políticos constituídos de trabalhadores e com métodos dos próprios operários, começaram a se mobilizar politicamente para a tomada do poder.

A tomada do poder da cidade de Paris pelos communards franceses entrou para a história como o primeiro episódio internacional em que a classe operária assumia o governo através de suas próprias lideranças e de seus próprios métodos de organização. Assim, a Comuna de Paris, como foi chamado o governo provisório revolucionário, instaurado em 18 de março de 1871, se configurou como uma resposta da população parisiense à capitulação do governo de Napoleão III aos alemães, após a derrota na Guerra Franco-Prussiana.

Comuna versus Estado

Como consequência direta dos dois fatores já citados acima por nós, quais sejam: 1) A Guerra Franco-Prussiana e 2) O desenvolvimento da luta dos trabalhadores no século 19, a Comuna de Paris criou sua própria identidade com a proclamação de um governo autônomo e popular, caracterizando-se como uma administração municipal, eleita pelo povo, constituída por conselheiros municipais eleitos por sufrágio universal nos diferentes bairros de Paris. E, com representantes e métodos de luta fincados na classe trabalhadora, todos os mandatos eram revogáveis a qualquer tempo. Ou seja, ao invés de se decidir de 3 em 3 anos, ou 6 em 6 anos, quais seriam os representantes da classe dominante a exercer o poder político “representando” o povo no parlamento, o voto agora cumpriria a função de, a partir da organização das comunas em cada bairro de Paris, deliberar as atividades dos trabalhadores ao seu próprio serviço.

Assim, a questão que surge de forma imediata e inevitável é a da relação da classe trabalhadora com o Estado e com suas instituições de modo geral, tal como a relação com o parlamento. O parlamentarismo para a classe trabalhadora constitui-se simplesmente em escolher para um determinado tempo um representante da classe dominante que irá esmagar a classe trabalhadora. Esta é, por assim dizer, a verdadeira identidade do parlamentarismo burguês. Essa definição serve (mesmo com suas óbvias diferenças) não somente para as monarquias parlamentares, mas também para as repúblicas as mais “democráticas” como as do mundo atual. É devido a essa compreensão que a Comuna de Paris, de modo imediato, derrubou a guarda nacional. Na sequência, a abolição do exército permanente foi a ação inicial e necessária, como condução primeira para manter as conquistas posteriores, promulgando, assim, medidas bem planejadas e executadas, tais como:

· Proclamação da independência de todos os municípios franceses;
· Criação de pensões para mães e viúvas dos guardas nacionais;
· Libertação das prostitutas públicas que viviam em condições de servidão pessoal;
· Igualdade civil entre mulheres e homens;
· Supressão do exército permanente e substituição pelo povo armado;
· Supressão de todas as despesas de representação;
· Supressão dos privilégios pecuniários dos funcionários;
· Redução de “todos” os ordenados administrativos ao nível do “salário operário”;
· Tentativa de criar o “ensino gratuito, laico e obrigatório;
· Separação entre igreja e Estado (“considerando que a liberdade de consciência é a primeira das liberdades”);
· Organização e desenvolvimento do ensino profissional;
· Toda propriedade da igreja passou a ser patrimônio nacional;
· Fechamento das casas de penhores e créditos;
· Obrigação de que a Caixa de Penhores restituísse certos objetos (roupas, móveis, livros, etc.) e instrumentos de trabalho penhorados (entre 12 e 25 de maio, foram restituídos 41.928 itens).
· Ordenação de uma tabulação estatística das fábricas que haviam sido fechadas pelos seus proprietários e elaboração de planos para a reabertura dessas fábricas por seus ex-empregados, que deveriam ser organizados em sociedades cooperativas.

A Comuna também não descuidou do terreno do simbólico: derrubou a Coluna de Vendôme (cujo bronze provinha de canhões tomados ao inimigo por Napoleão); substituiu a bandeira tricolor pela bandeira vermelha; queimou a guilhotina e decidiu pela demolição da Capela Expiatória erguida à memória do rei Luís XVI (deposto e executado pela Revolução Francesa, por traição); reconheceu os direitos políticos dos estrangeiros; implantou o sufrágio universal e com mandatos revogáveis a qualquer tempo;

Assim, a Comuna significou não a mera substituição de uma classe por outra, mas a tomada de poder por parte da classe trabalhadora para a instauração de uma sociedade que se propunha a abolição das classes. Como sublinhou Marx: “A revolução em França deve tentar, antes de tudo, não passar para outras mãos a máquina burocrática e militar – como se tem feito até aqui –, mas quebrá-la”. Isto é, em especial, a experiência da Comuna nos ensina que não é suficiente a classe operária possuir a máquina estatal para colocá-la a seu serviço. Mas, além disso, é radicalmente necessário: destruí-la. Pois, diferente da máquina estatal, a Comuna se estabeleceu como uma assembleia “não parlamentar, mas trabalhadora”, cumprindo também a função de legislar e executar, o que só se tornou possível pelo controle consciente da produção pelos próprios produtores. Estamos, então, diante de uma situação real que pôs ao homem a necessidade de desenvolver características multidimensionais: a ele era necessário legislar, executar, decidir, produzir, distribuir, etc.

Se isso que acabamos de dizer é verdade, então a Comuna constituiu-se como o primeiro ensaio da classe trabalhadora daquilo a que Marx chamou de Ditadura do Proletariado. Essa expressão, se entendida fora de um determinado contexto, ganha feição de regime autoritário, assustador, desumano, similar ao que vivemos no Brasil entre 1964 e 1985, ou ao que ficou conhecido como “socialismo real”. Entretanto, não é disso que estamos falando. Ditadura do Proletariado significa aqui tão somente a primazia temporária de uma classe no controle de um “Estado” em definhamento (esse “Estado” já não mais significa um instrumento perene de uma classe sobre a outra, como é o Estado burguês, mas uma situação certamente excepcional que explicita a progressiva reabsorção das forças do Estado burguês nas mãos dos trabalhadores); ou seja, não se trata de arbitrariedade ou autoritarismo: trata-se sim de uma situação mais democrática que a democracia, afinal, a maioria (os pobres e explorados) finalmente pode decidir tudo a todo momento; em verdade, não se deve falar nem em democracia propriamente dita, vez que a própria política como âmbito separado do restante da sociedade tende a desaparecer.

Assim, quando falamos que encontramos em Marx a expressão Ditadura do Proletariado e que ela serve para caracterizar a Comuna, isso significa que estamos falando da tomada violenta e controle do poder estatal realizados pela classe trabalhadora e seus aliados. A Comuna rompeu com uma máquina burocrática de um Estado para tornar-se uma forma de democracia mais ampla. A democracia, de burguesa que era, tornou-se operária com a ascensão da Comuna. O Estado burguês – esse aparato de força orientado a oprimir a classe operária – modificou-se para uma forma de organização que não mais caberia chamá-la por Estado.

Ironicamente, essa expressão Ditadura do Proletariado não é invenção de Marx, mas tem sua origem num revolucionário francês representante do socialismo utópico – conhecido de Marx quando esse residiu na França. Blanqui (1805-1881) tinha uma grande influência nas organizações revolucionárias secretas surgidas na França em meados do século 19, como resistência proletária frente ao avanço avassalador do capital industrial daquela época. Por outro lado, no Manifesto do partido comunista (1848), Marx apresenta os objetivos da classe operária da seguinte forma: “constituição dos proletários em classe, derrubada da dominação burguesa, conquista do poder político pelo proletariado”. Num momento diferente (1864), já em uma passagem dos Estatutos da AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores), Marx define como tarefa da classe proletária: “o progresso da classe trabalhadora e sua completa emancipação”.

Assim, é importante destacar que a Comuna não somente significou um rompimento radical com o aspecto político do Estado burguês, mas, inevitavelmente, também significou o “rompimento” com o modo de produção capitalista e a substituição para uma forma de produção baseada em trabalho associado, tendo os trabalhadores no processo de gestão/execução desse modo. Ou seja, ela substituiu – mesmo que em escala municipal e em um curto espaço de tempo – a forma capitalista de se produzir a riqueza social concentrada na mão da burguesia, o que modifica não somente quem controla a produção, mas a própria forma de produzir e o quê produzir.
Primeiro evento revolucionário da fase industrial do capitalismo, animada pelas ideias socialistas e um determinado nível de consciência de classe, colocou em xeque a predominância do capital enquanto modelo único de modo econômico social possível da humanidade. A Comuna alimentou os corações daqueles que sonham com um mundo verdadeiramente humano, com a possibilidade real, e sua necessidade tão real quanto, da construção de um mundo radicalmente novo. Comungou vitórias de um “governo operário”, tais como a democracia proletária e a efetivação de seu internacionalismo, isto é, a Comuna teve um caráter de República Universal.
Todas as forças tomadas do Estado com a promulgação da Comuna foram progressivamente restituídas à sociedade, o que significa um profundo abalo num dos fundamentos da sociedade capitalista: a divisão trabalho intelectual/braçal e o domínio do primeiro sobre o segundo. Pois a produção e distribuição da riqueza social, por meio das quais o Estado e toda a casta de capitalistas se sustentavam, foram absorvidas pela tomada de poder dos operários com a constituição da própria Comuna. Todo histórico de luta da classe trabalhadora, de enfrentamento com a burguesia e com o Estado burguês indicou que o Estado, em todos seus enfrentamentos com o operariado, fora sentenciado a desaparecer. Por vários fatores, a sua existência (do Estado) ainda é notória em nossa história. Contudo, a única forma possível de transição do Estado para a sua própria ausência, será o “proletariado organizado como classe dominante”.

SOBRE A COMUNA DE PARIS, VEJA TAMBÉM:
A Guerra Civil na França, de Karl Marx.
José Paulo Netto – A Comuna de Paris e a Ditadura do Proletariado (vídeo disponível em http://www.youtube.com/watch?v=NjjWnGFwPJk)