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Sobre a criação do Estado Palestino – Pedro Guerra


10 de outubro de 2011

 Este texto é uma contribuição individual, não necessariamente expressa a opinião da organização e por este motivo se apresenta assinado por seu autor.

Sobre a criação do Estado Palestino

O mundo parou para ouvir o discurso de Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina, na Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque, no último dia 23. Perante a Assembleia Geral, o líder palestino demandou o reconhecimento da Palestina enquanto Estado-membro da ONU. Acreditamos que o surgimento do Estado palestino não encerre, por si só, a violência e o caos no Oriente Médio. Faz-se necessário o fim do imperialismo estadunidense (também europeu, em menor escala), por meio da aliança com o governo de Israel, no Oriente Médio. E o fim do imperialismo implica na luta dos povos, em diversas frentes amplas, contra o capital. Assim, não será uma medida jurídica (surgimento de um Estado) que trará justiça aos palestinos. Todavia, ainda que parcial, o surgimento de um Estado palestino implica numa vitória, haja vista a possibilidade de algumas iniciativas auto-afirmativas do povo palestino.

A hipótese mais concreta não é o surgimento de um Estado palestino membro da ONU, mas sim um mero Estado observador. É o mesmo “status” do Vaticano. Não sendo membro, o futuro Estado palestino não terá assento na Assembleia Geral, portanto, não terá direito a voto e nem a participar dos Conselhos e Comissões. Assim o é haja vista a necessidade de aprovação de novos membros por todos os participantes do Conselho de Segurança (CS). O CS é expressão concreta da instrumentalização da ONU pelo imperialismo: seus integrantes (França, Inglaterra, EUA, Rússia e China, principais protagonistas e, de umam certa forma, vencedores da Segunda Guerra Mundial. Alemanha, Itália e Japão, outros protagonistas relevante, porém derrotados, estão fora do restrito grupo) possuem poder de veto exclusivo em questões de maior importância. Ou seja, basta a oposição de um deles apenas, sem necessidade, portanto, da vontade da maioria, para que seja obstada alguma medida de maior importância, como o ingresso de novos membros. Os Estados Unidos já prometeram barrar o ingresso da Palestina. Que seja mais importante o poder político-econômico dos países, mas se a ONU fosse uma legítima representante dos Estados e seus povos, não se permitiria a barbaridade da desigualdade de direitos entre seus integrantes. Israel e Europa também se apressaram em fazer oposição ao pleito palestino, mesmo que tal postura lhes custe ainda maior desgaste político internacional. O mundo tem olhos atentos às questões do Oriente Médio e a opinião pública vai no sentido de se permitir a soberania palestina.

A criação de um Estado observador já oferece algum campo de manobra política palestina. Juridicamente, se for criado, o Estado palestino poderá assinar diversos estatutos das Nações Unidas, inclusive com a possibilidade de acionamento internacional da tutela dos direitos humanos. Em tese, seria possível, por exemplo, fazer lideranças israelenses se sentarem no banco dos réus do Tribunal Penal Internacional (TPI), tendo em vista que, então, as ações armadas de Israel se dariam contra a população no território de um país soberano, caracterizando, portanto, intervenção militar. Ou, em outra hipótese, seria possível se postularem indenizações contra Israel em face das muitas agressões até hoje ocorridas. São “táticas forenses” com efeitos provavelmente ínfimos. Os próprios Estados Unidos promovem, impunemente, ataques a diferentes povos em diversas partes do planeta e é muito certo que seu aliado, Israel, não será tão importunado. Como expusemos, medidas jurídicas podem assumir certa repercussão estratégica, entretanto, apenas a luta dos povos efetivamente gera as grandes transformações.

De toda forma, revolucionários que somos, analisamos com o pessimismo da razão e o otimismo da vontade. A constituição da Palestina, mesmo que apenas um Estado observador, e a aplicação das “táticas forenses” serão, considerando-se ser a única e breve conquista ao alcance, outra grande frente de exposição das arbitrariedades israelenses. Da conquistas jurídicas às lutas políticas, as colônias israelenses em território palestino devem ser colocadas à prova, bem como o muro que sufoca comunidades palestinas. Os postos militares de Israel devem ser constantemente hostilizados, da mesma forma que a opinião pública internacional deve ser alertada sobre os milhares de presos palestinos (inclusive mulheres e crianças) nos porões israelenses. Por fim, Jerusalém não pode ficar sob exclusiva gestão israelense, devendo a mesma ser compartilhada entre os povos que a reinvindicam, historicamente, como sua capital.

Em conclusão, ainda que não surja com “status” pleno de membro ativo das Nações Unidas, a criação de um Estado para os palestinos significa, sim, um avanço para a democratização do Oriente Médio. Porém, a leitura crítico-marxista mais sagaz nos faz entender que, ainda que importantes, não bastam as conquistas jurídicas para o povo palestino. É preciso concentração nas conquistas políticas concretas, afastando o Estado hostil de Israel, promovendo a libertação dos territórios ocupados e entregando a gestão dos mesmos aos próprios palestinos, por meio de suas organizações.

 

Pedro Guerra é militante do ESPAÇO SOCIALISTA