Jornal 31: Junho/Julho de 2009
12 de maio de 2010
Leia as matérias online:
- Medidas do governo não evitam a continuidade da crise
- Todo o apoio à luta dos trabalhadores da USP
- Bancários – Por um encontro nacional que reorganize o polo combativo da oposição
- O que está por trás da política educacional?
- Fundação Santo André: chapa de esquerda, formada em convenção democrática, vence eleições do D.A.
- Epidemias e crise econômica: o capitalismo mata
- Cem dias da gestão Obama: a lógica segue a mesma
- Relação partido e movimento: um debate atual e necessário
Medidas do governo não evitam a continuidade da crise
As tendências da crise
O centro das discussões sobre a realidade atual está nos desdobramentos da crise econômica mundial. Está em curso um debate para determinar se se trata apenas de uma crise periódica, cuja superação aconteceria no curto ou médio prazo, ou de uma crise mais estrutural, que traz à tona desequilíbrios insuperáveis do sistema capitalista. Partilham da primeira opinião os ideólogos burgueses e também a esquerda reformista, que propagam a crença de que o capitalismo possa se recuperar da crise atual com “mínimos arranhões”. Para os marxistas revolucionários, a crise ainda está apenas no seu início e ainda trará importantíssimas conseqüências sociais e políticas.
O impasse teórico sobre a natureza da crise será resolvido nos próximos meses, conforme se definirem as tendências concretas da economia, em especial nos países centrais, relacionadas à produção industrial, ao nível de produtividade e emprego,à condição do dólar como moeda de reserva mundial (ameaçada pelo estratosférico déficit público estadunidense), etc. Entretanto, qualquer que seja o resultado ulterior dessas tendências, a crise já provocou enormes retrocessos nas condições de vida da classe trabalhadora mundial. Aquilo que, para a burguesia, poderá ser contabilizado como “arranhões mínimos” no funcionamento de seu sistema, já são de imediato tragédias monumentais na vida de milhões de trabalhadores, confrontados com o desemprego e a miséria.
O ataque sobre as condições de vida da classe é a única forma do capital recuperar sua taxa de lucro. As demissões, as reduções de salários e os cortes de direitos são a receita da burguesia para salvar o capital, sendo aplicados com a colaboração dos governos e burocracias sindicais do mundo inteiro. Em tese, o capital precisaria nivelar por baixo o grau de exploração da força de trabalho em escala global, forçando os trabalhadores do mundo inteiro a aceitar as condições salariais e laborais mais rebaixadas possíveis, que são aquelas já vigentes hoje na China e nos países asiáticos. Se isso ainda não foi conseguido nos países centrais, como Estados Unidos, Europa e Japão, é porque a burguesia até o momento não construiu politicamente uma correlação de forças suficientemente favorável para impor tais medidas sobre o proletariado desses países.
Em países intermediários, como o Brasil, há setores da classe trabalhadora que também estão numa condição econômica e social ligeiramente acima do nível mínimo chinês. Trata-se de uma minoria da classe, já que a maioria dos trabalhadores brasileiros vive entre o desemprego e o subemprego, o trabalho precário, terceirizado, temporário e informal, sem proteção social, sem regulamentação das condições de segurança e de saúde no trabalho, ou mesmo da duração da jornada, sem direito à organização, sindicalização ou greve;e com uma renda que mal cobre os custos de sobrevivência. Há um setor da classe, porém, que ainda está protegido por contratos de trabalho formais, previdência pública, seguridade social, legislação trabalhista, direito à organização e sindicalização, etc. Do ponto de vista do capital, esse setor é mais um alvo potencial da política geral de rebaixamento das condições de vida do proletariado global.
A situação do Brasil
Se não conseguir impor rapidamente uma derrota política brutal ao proletariado dos países centrais, ou deparar-se com uma resistência suficientemente forte, o capital poderá deslocar seu foco para os países periféricos que ainda possuem alguma margem de conquistas salariais e sociais disponíveis para serem “queimadas” na busca do nivelamento global, entre os quais o Brasil. Por enquanto, o desemprego, a redução de salários e o corte de direitos seguem avançando nos Estados Unidos, Europa e Japão, tendo provocado uma resistência mais significativa principalmente por parte dos trabalhadores europeus, que tem se mostrado insuficiente porém para barrar o processo. Em função disso, o ataque direto aos setores organizados do proletariado brasileiro ainda não é uma prioridade para a burguesia.
O Brasil tem sido relativamente poupado das conseqüências mais devastadoras da crise. Depois da primeira onda de demissões, especialmente nas montadoras e setores ligados à exportação, a situação foi momentaneamente estabilizada. Isso não se deve a nenhuma virtude, competência ou demonstração de habilidade do governo de plantão, mas ao fato de que a nossa vez ainda não chegou. Antes de partir para o ataque direto contra os trabalhadores, a burguesia ainda tem uma importante carta na manga, o controle sobre o Estado, que lhe permite socializar indiretamente as conseqüências da crise.
O Estado pode endividar-se, emitir títulos, gastar reservas cambiais, ampliar o crédito, baixar os juros, fornecer dinheiro às empresas e bancos com problemas, cortar investimentos em saúde, educação e serviços públicos, reforçar os programas assistenciais para manter os mais pobres sob controle e consumindo, etc. Com pequenas variações, essas têm sido as políticas de todos os governos burgueses em face da crise, e o caso de Lula no Brasil não é exceção. Essa margem de manobra do Estado permite à burguesia brasileira administrar a crise sem que os desequilíbrios se tornem explosivos.
A Falsa Recuperação e a Propaganda Governista
O fato de que uma explosão mais grave não tenha acontecido está sendo interpretado pela propaganda governista como indício de que uma recuperação já está à vista. Os índices econômicos oficiais apresentam um cenário estável, senão róseo. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) do Ministério do Trabalho, houve uma variação positiva de 0,15% entre o número de admissões e desligamentos no primeiro quadrimestre do ano. Segundo o DIEESE, o desemprego nas principais regiões metropolitanas mais o Distrito Federal ficou em 15,3% em abril. A inflação medida pelo mesmo organismo ficou em 1,43% entre janeiro e abril de 2009.
Essa situação até que não parece ser muito ruim, considerando-se a ameaça de uma crise catastrófica que paira no horizonte. É preciso considerar porém o fato de que, segundo o mesmo DIEESE, o salário mínimo necessário (que constitucionalmente deve cobrir as despesas do trabalhador e sua família com alimentação, saúde, educação, vestuário, higiene, moradia, transporte, lazer e previdência) deveria estar na casa de R$ 1.972,64 – sendo que a remuneração média do trabalhador nas regiões metropolitanas (ou seja, onde a renda é mais alta) está em R$ 1.240,00 – e o salário mínimo oficial está em apenas R$ 465,00. Ou seja, a maior parte dos trabalhadores sobrevive com menos do que o mínimo necessário. Esse aperto imposto aos trabalhadores é o segredo para a recuperação da economia capitalista. O aperto permite aumentar a taxa de lucro num momento em que há uma diminuição da massa de mais-valia por conta das quedas na produção.
Para completar a propaganda governista, entram em cena os números das bolsas de valores, que há alguns meses têm apresentado altas significativas. O Ibovespa fechou o mês de maio aos 53.198 pontos, quase o mesmo nível de agosto de 2008 (55.680), antes da eclosão da crise. Da mesma forma, o dólar também chegou a uma cotação (R$ 1,970 em maio) praticamente idêntica à de agosto de 2008 (R$ 1,905). Os índices das bolsas são tomados como indicadores da saúde do conjunto da economia, quando na realidade indicam apenas as expectativas de lucro dos capitalistas, as quais estão momentaneamente elevadas por conta do empenho do governo em ajudar as grandes empresas. Não há uma recuperação real e duradoura, mas um simples reflexo das políticas governamentais para salvar o capital. A divulgação de que o PIB do 1º trimestre de 2009 caiu ainda mais é mais um balde de água gelada no discursodo governo.
Essa política envolve medidas como o pacote da habitação, que vai desviar dinheiro do FGTS dos trabalhadores para as construtoras em apuros, sem qualquer traço de um projeto estrutural de reforma urbanística, que envolva, além da moradia de qualidade, obras de saneamento, infra- estrutura,transporte público,equipamentos públicos de lazer, etc. Há também atos puramente demagógicos, como a troca do presidente do Banco do Brasil por um nome mais afinado com a queda dos juros, mas que está longe de representar uma mudança real na atual política de um banco de mercado, em direção a um banco verdadeiramente público e de fomento.
A importância de uma alternativa ideológica
É importante destacar todas as falácias do governo para se contrapor ao discurso dos representantes de Lula no interior do movimento dos trabalhadores, as correntes do PT e seus satélites, que dirigem burocraticamente os principais organismos da classe, como CUT, UNE, MST, pastorais sociais, etc., impedindo os trabalhadores de entrar em luta. Os setores lulistas apresentam o discurso de que a ação do Estado pode livrar o Brasil da crise. Em função disso, defendem Lula e apontam o PT como suposta alternativa contra a ameaça da direita, o PSDB, DEMos e demais oportunistas, que trariam a volta das privatizações e outros ataques contra os trabalhadores.
Que a direita seja uma ameaça é um fato real, mas não é real que Lula e o PT sejam alternativas. Lula governa desde 2003 para a burguesia, os bancos, os latifúndiários, as grandes empresas e o capital internacional, que obtiveram lucros como nunca antes. O governo Lula seguiu pagando a dívida externa fraudulenta, privatizando patrimônio público, retirando direitos dos trabalhadores, reprimindo suas lutas, destruindo o meio ambiente, sucateando os serviços públicos, compactuando fisiologicamente com setores corruptos e conservadores, etc.; e ampliou em escala colossal o assistencialismo, que proporciona alívio temporário para a miséria, mas não muda estruturalmente a situação dos miseráveis.
Em 2002 e no 2º turno de 2006 o Espaço Socialista defendeu o voto nulo nas eleições, como forma de indicar a necessidade de uma alternativa política e ideológica para organizar a classe trabalhadora brasileira. O PT e os organismos que dirige não são essa alternativa. Tornaram-se parte integrante da gestão burguesa da economia e do Estado. Em tempos de crise, o papel dessas burocracias como instrumento dos interesses burgueses e obstáculos para as lutas dos trabalhadores se torna ainda mais acentuado. Os sindicatos ligados à CUT e demais centrais pelegas assinam acordos de demissão, rebaixamento de salário e retirada de direitos. A direção do MST impede as ocupações de terras. A UNE apóia o sucateamento das universidades públicas. Essas direções demonstram assim seu compromisso com a defesa da ordem burguesa e a exploração capitalista.
Por um encontro nacional dos trabalhadores e um programa socialista contra a crise
Em função dessa política das direções dos principais organismos da classe, torna-se urgente discutir novas alternativas de organização. No período recente, a Conlutas tem se destacado por agrupar a vanguarda combativa do movimento sindical e popular. Entretanto, seu peso ainda é muito limitado. Está em discussão no movimento a possibilidade de unificação entre a Conlutas e a Intersindical, que também agrupa alguns sindicatos que romperam com a CUT. As direções dessas duas centrais realizaram um seminário em São Paulo (19,20 e 21 de abril) de onde tiraram inclusive um calendário que aponta para um possível congresso de unificação no início de 2010.
Somos a favor da construção de uma alternativa orgnizativa para a classe trabalhadora. Por isso defendemos a realização de um Encontro Nacional dos Trabalhadores para discutir a reorganização da classe. Entretanto, esse processo não pode seguir sendo discutido a partir das cúpulas das centrais. É preciso levar o debate para as bases da classe trabalhadora. Esse Encontro seria precedido de plenárias regionais, com convocação e agitação nas bases, nas portas de fábrica, faculdades e colégios, locais de grande concentração popular, etc. Também é preciso que Conlutas e Intersindical rompam com sua política de atos unificados com a CUT e demais centrais pelegas, como o de 30/ 03, que ao invés de apresentar uma alternativa, serviram apenas para confundir os trabalhadores.
Mais do que um simples debate sobre a possível unificação da Conlutas e Intersindical, é preciso discutir que tipo de alternativa organizativa os trabalhadores necessitam. É preciso discutir formas de impedir que uma nova central seja burocratizada e aparelhada como a CUT foi pelo PT, estabelecendo formas democráticas de funcionamento, com decisão nas instâncias de base, rodízio dos dirigentes, transparência nas finanças, cuidado com a formação teórica e política dos ativistas e dos trabalhadores.
Por último, se é correto dizer que a crise não chegou ao Brasil com todo seu impacto, também é fato que já causou estragos em vários setores, que sofreram demissões em massa (Embraer, Vale), reduções de salários, cortes no orçamento para despesas de pessoal de vários governos estaduais e municipais. Essa primeira onda da crise já provocou respostas por parte dos trabalhadores. Nos últimos meses aconteceram greves importantes, como a dos ferroviários do Rio, trabalhadores da USP e da Sabesp, dos funcionários técnicos da Caixa Econômica Federal, de várias categorias de servidores públicos, estaduais e municipais, em especial da educação, em vários estados do norte e nordeste (Pará, Roraima, Piauí, Paraíba e Ceará).
Essas greves sinalizam a existência de uma disposição de luta por parte dos trabalhadores. É preciso avançar a partir dessas lutas isoladas, localizadas, parciais, economicistas, para uma luta da totalidade da classe contra a totalidade do sistema capitalista. Isso exige por parte das direções combativas a construção de uma alternativa organizativa que traga uma perspectiva de classe, em que os trabalhadores vejam a si mesmos como protagonistas de sua história, e reconheçam na burguesia e seus governantes de plantão os adversários. Para isso é preciso construir um programa socialista contra a crise, que questione não apenas os ataques conjunturais de que estamos sendo vítimas, mas a própria ordem capitalista, com suas crises, misérias e violências.
- Não às demissões! Estabilidade no emprego e reintegração dos demitidos!
- Redução da jornada de trabalho sem redução dos salários!
- Estatização sob controle dos trabalhadores e sem indenização das empresas que demitirem, ameaçarem fechar ou se transferirem!
- Reestatização da Vale e demais empresas privatizadas sob controle dos trabalhadores , sem indenização e com readmissão dos demitidos!
- Não pagamento das dívidas públicas, interna e externa , e investimento desse dinheiro num programa de obras e serviços públicos sob controle dos trabalhadores, para gerar empregos e melhorar as condições imediatas de saúde, educação, moradia, transporte, cultura e lazer . Fim da remessa de lucros para o exterior!
- Estatização do Sistema Financeiro sob controle dos trabalhadores!
- Reforma agrária sob controle dos trabalhadores. Fim do latifúndio e do agronegócio. Por uma agricultura coletiva, orgânica e ecológica voltada para as necessidades da classe trabalhadora!
- Cotas proporcionais para negros e negras nos empregos gerados!
- Por um governo socialista dos trabalhadores baseado em suas organizações de luta!
- Por uma sociedade socialista!
Todo o apoio à luta dos trabalhadores da USP
No dia 5 de maio teve início a greve dos servidores técnico-administrativos da USP, categoria que reúne 15 mil trabalhadores, organizados pelo Sintusp, sindicato combativo filiado à Conlutas.
A greve faz parte da campanha salarial da categoria, que tem como principal reivindicação econômica um reajuste de cerca de 17% referente a perdas acumuladas. A greve também se faz em torno da defesa da universidade pública e da livre organização dos trabalhadores, o que se materializa em uma série de outras reivindicações:
- Fim da Univesp (Universidade Virtual do Estado de São Paulo), projeto de educação à distância, sem aulas presenciais, com o conteúdo sendo transmitido via internet. O objetivo desse projeto é fornecer uma pseudo-formação universitária de segunda linha para setores da população que não podem ingressar na Universidade, maquiando as estatísticas de ensino superior com uma falsa ampliação. Além disso, o projeto ataca a carreira docente da Universidade, pois desobriga o Estado de contratar professores na quantidade necessária para prover um ensino de qualidade.
- Aumento das verbas destinadas à manutenção da Universidade. Os governos estaduais e o governo federal têm reduzido as verbas destinadas à educação para desviar o dinheiro público para as grandes empresas capitalistas atingidas pela crise mundial.
- Fim da tentativa da reitoria da USP de obrigar cerca de 5 mil funcionários (um terço do quadro funcional) a prestar novo concurso, sob ameaça de demissão. Muitos dos servidores ameaçados já estão na Universidade há mais de vinte anos.
- Fim dos processos judiciais e multas contra o Sintusp e o DCE (Diretório Central dos Estudantes) e fim dos 50 processos administrativos e sindicâncias contra servidores e alunos. Essas medidas repressivas são uma represália ao movimento de 2007, que teve seu auge na ocupação do prédio da reitoria que reverteu os projetos do governo Serra que retiravam a autonomia financeira e administrativa da Universidade. Na ocasião, o Sintusp apoiou a luta dos estudantes. A resposta da reitoria foi a demissão ilegal do diretor da entidade, Claudionor Brandão, em 2008. Uma das pautas centrais do movimento é a reintegração de Brandão.
Desde o início da greve a reitoria se recusava a negociar com os representantes dos trabalhadores. Mas no dia 01/06 a truculência chegou ao auge com o pedido da reitora Suely Vilela de que a tropa de choque da PM invadisse o campus da Cidade Universitária para reprimir os piquetes, sobre o pretexto de supostos “danos ao patrimônio público”. Trata-se de uma medida ilegal, já que o estatuto da Universidade garante a sua inviolabilidade e proibe o aparato policial de adentrar ao campus.
A invasão da PM provocou imediata reação de outros setores da comunidade acadêmica. Os docentes (que se organizam numa entidade separada, a Adusp, filiada ao Andes-Sindicato Nacional) e os estudantes realizaram um ato de protesto em conjunto no dia 02/06. Nas assembléias do dia 04/06, professores e estudantes também entraram em greve, em solidariedade aos funcionários. Trata-se de uma greve fortemente política, de apoio aos trabalhadores e de repúdio ao autoritarismo da reitoria e do governo estadual.
O governo Serra, em plena vigência da democracia burguesa, se comporta de forma tão ou mais agressiva que a ditadura militar. A última invasão da Polícia na USP, para reprimir a greve dos funcionários ocorreu há 30 anos, em plena ditadura militar, quando se iniciava a organização popular do movimento contra a ditadura. Em 2007, com a reitoria ocupada pelos estudantes, o governo Serra não se atreveu a enviar a polícia ao campus.
Agora, em 2009, o movimento dos trabalhadores, estudantes e professores se choca frontalmente contra a política de Serra e Lula de destruição da educação pública, sucateamento dos serviços públicos em geral, arrocho salarial dos servidores. Essa política é central tanto para o PSDB como para o PT, pois trata- se de um projeto da burguesia brasileira e mundial, que visa esvaziar as funções do Estado e desviar os recursos públicos para o socorro ao capital, seriamente ameaçado pela crise estrutural.
Devido à sua importância, o movimento está sendo duramente atacado, o que demonstra a disposição da burguesia de usar a força para reprimir movimentos que contestem os aspectos centrais de sua política. A imprensa burguesa, por sua vez, cumpre mais uma vez o papel nefasto de desinformar a população e apresentar os setores em luta como “vândalos, arruaceiros, bandidos”, tentando colocar a opinião pública contra o movimento.
Por fim, no dia 09/06, um ato conjunto de trabalhadores, estudantes e professores, com apoio de caravanas de outros campi e de representantes de outras entidades, visando forçar a reabertura das negociações, foi alvo de uma violenta repressão da polícia. Cenas de guerra foram vistas no campus da USP, com uso de bombas de gás lacrimogêneo, bombas de efeito moral, espancamento e prisão de manifestantes, entre os quais Claudionor Brandão.
O Espaço Socialista se solidariza com a luta de trabalhadores, estudantes e professores e colocará todas as suas forças numa campanha de apoio à greve e às suas reivindicações.
Também estamos impulsionando uma campanha de apoio, com abaixo assinado em outras categorias, panfletagens, atos e reuniões de solidariedade, moções, etc.
- Fora a Polícia Militar do campus!
- Fora Suely Vilela, Paulo Renato, serra e seu autoritarismo!
- Não à Univesp e à precarização da formação universitária!
- Pela revogação de todos os processos administrativos e judiciais envolvendo lideranças do movimento!
- Pela reintegração de todas as lideranças do movimento, incluindo o diretor do SINTUSP, Claudionor Brandão!
- Fora as fundações privadas, que se aproveitam da estrutura da universidade como balcão de negócios!
- Por uma universidade pública, gratuita e de qualidade para todos
Bancários – por um Encontro Nacional que reorganize o polo combativo da oposição
O Movimento Nacional de Oposição Bancária (MNOB) surgiu da histórica greve nacional de 30 dias em 2004, como um pólo aglutinador da vanguarda do movimento grevista, sendo composto por lutadores, piqueteiros, líderes que ajudaram na mobilização até o último dia de greve.
Inicialmente, o MNOB abrangia todos os setores que eram contra os banqueiros e contra o governo Lula. Como punição aos grevistas, foi “instituído” desde então o desconto dos dias parados nos bancos federais. Isso deixou claro de que lado estavam Lula e o PT.
De 2004 em diante, o MNOB sofreu um progressivo esvaziamento, como reflexo do próprio esvaziamento das greves e das lutas da categoria desde então. Além disso, muitos companheiros independentes, integrantes de correntes políticas minoritárias ou de coletivos locais também se afastaram, devido à discordância com a forma como a corrente política majoritária do MNOB (PSTU) conduzia o movimento. De modo geral, a linha política já vinha “pronta”, tendo sido decidida pelo partido em seus fóruns internos e trazida ao movimento para ser executada pelos demais. Os panfletos, por exemplo, já surgem escritos, cabendo aos demais apenas distribuí-los.
Outro fator que contribuiu para o esvaziamento do movimento foi a falta de organicidade da Oposição. As reuniões só ocorriam quando o PSTU decidia que poderiam ocorrer (houve inclusive casos de reuniões desmarcadas sem aviso aos demais integrantes que não eram do partido).
Além de se enfrentar com os banqueiros, o governo e a Articulação na direção oficial do movimento, a categoria teve que lidar também com os problemas internos de organização da Oposição, que apesar de lutas heróicas, não conseguiu reverter os ataques que a categoria vem sofrendo em seus vários seguimentos.
Numa crise econômica como a atual, os patrões e os governos estão cada vez mais unidos para jogar nas costas dos trabalhadores o ônus da bancarrota capitalista. O atual estágio de esfacelamento da Oposição, numa conjuntura de crise como essa, recoloca na ordem do dia a unidade dos lutadores. Nesse sentido, é necessário organizar um Encontro Nacional da Oposição Bancária, aberto à participação de todos os bancários que tenham claro que os nossos inimigos são os governos, a Articulação e os banqueiros.
A unidade a ser construída precisa se pautar por uma nova metodologia, que corrija os problemas que causaram o esvaziamento do MNOB ao longo dos anos. É preciso que haja democracia na definição da política, uma Coordenação eleita com mandato e tarefas definidas, organicidade nas atividades, prestação de contas regulares, etc. É preciso que os fóruns do movimento sejam respeitados e que o MNOB não seja propriedade deste ou daquele partido.
Proposta de encontro do PSTU: mais do mesmo
A discussão sobre o Encontro está ocorrendo nos fóruns do MNOB, tendo sido indicado o início do mês de julho como data provável de sua realização. No último period, o PSTU tem defendido um Encontro de dois dias. No primeiro dia seriam discutidas ações conjuntas com as várias oposições. No segundo, haveria uma discussão apenas com os setores que atualmente se identificam como MNOB, para tratar de sua reorganização interna. O problema é que o MNOB se reduziu praticamente a militantes do PSTU, de forma que uma reorganização do MNOB nesses moldes continuaria aquém das necessidades da categoria. Os bancários precisam da unidade das oposições para ter condições de lutar contra o controle da Articulação sobre as campanhas salariais. Por isso, é preciso reorganizar uma Oposição Nacional que agrupe todos os coletivos e militantes independentes que tenham atuação combativa na categoria e que se coloquem como oposição aos banqueiros, ao governo e à Articulação.
Nós, do Espaço Socialista, defendemos um Encontro de caráter aberto, democrático e que sirva para construir uma Nova Oposição, uma Frente Nacional de todas as forças de oposição, de caráter mais plural e de base, como foi um dia o MNOB na sua fundação em Caetés-MG 2004.
O que está por trás da política educacional?
Cláudio Alves
É importante compreendermos, desvendarmos e denunciarmos o papel e a função que a escola cumpre e deverá cumprir, do ponto de vista dos governos capitalistas em todas as suas esferas de administração (municipal/estadual / federal) , a fim de lutarmos por um outro tipo de sociedade e, conseqüentemente, de escola. A Educação pública torna-se a cada dia um mecanismo de controle social e distancia-se cada vez mais da possibilidade de provedora da emancipação humana. Dessa forma, tem sido necessário alienar e reprimir o professor, impondo-lhe a lógica da atividade produtiva para colocar em prática o projeto estatal burguês.
A educação como mecanismo de controle social e ideológico
A escola pública desde sempre tem sido o lugar de reprodução da cultura dominante. No entanto, procurava-se encobrir esse papel social e ideológico. Atualmente, mais do que nunca, se defende abertamente esse papel como se a cultura dominante fosse natural “correta, universal e todas que se afastam de seus padrões são inferiores, primitivas, desprezíveis e deficientes”. Dessa forma faz-se necessário, do ponto de vista dos governos, abolir livros didáticos que seguem uma linha mais crítica, satanizar autores marxistas e fornecer assinaturas de revistas (Nova Escola) que defendem abertamente a política dominante e sobretudo a “adaptação” do professor.
Os cursos de “formação de professores” e suas terminologias servem para reforçar a ideologia dominante e não levam a lugar algum na em relação à qualidade da educação estatal. Aliás, conforme M. H. S. Patto (Fala Professora) os ternos usados dizem muito. Veja: “recilar, reciclagem designam, na Física, um conjunto de transformações que levam um sistema a um estado final igual ao inicial; treinar, treinamento são frequentemente usadas como sinônimos de adestramentos de homens e animais em alguma habilidade mecânica; aperfeiçoar, aperfeiçoamento trazem estampada a ideia de perfeição e de emendar os próprios defeitos, tarefa humanamente impossível, sobretudo nas condições de vida e de trabalho do professor numa realidade social como a nossa”.
É tentando implementar esse tipo de “formação” que a burguesia paulista e o governo buscam conciliar dois de seus objetivos fundamentais: dominar as mentes e sangrar os cofres públicos.
A tentativa de fazer o professor se enquadrar e a sua condição operária
A tentativa de enquadrar o professor para que reproduza uma ideologia que não é sua e para conter os problemas dentro das escolas se dá através em conjunto com a retirada de direitos, responsabilizaçã o do professor pelo fracasso escolar, com o achatamento salarial e pela repressão política (ofensiva do governo contra professores sindicalizados e controle de sua prática cotidiana).
Aproximando a condição do professor ao do operário do século XIX podemos entender a análise de Marx (Manuscritos Econômicos e Filosóficos) quanto ao processo de alienação: “um sentimento de sofrimento em vez de bem estar, não desenvolve suas energias mentais e físicas, ficando fisicamente exausto e mentalmente deprimido”. Dessa forma, assistimos a proletarização do professor com a falta de realização em seu trabalho, com o excesso de trabalho, , com a desmotivação, com a perda da autonomia de cátedra e consequentemente uma espécie de bloqueio sobre a atividade criativa do pensamento.
Essa relação entre o regime cansativo de trabalho, falta de perspectiva, o achatamento salarial e a falta de autonomia identificada com a tragicidade descrita por Paulo Freire “é marcada pela desesperança que se instala no momento em se perde a hipótese do amanhã em que o amanhã não é mais que repetição, cedência talvez diferente, mais sempre repetição, de um presente terrível, cuja razão de ser mais profunda não é apreendida”.
A tentativa de desmoralizar o professor da rede pública fundamenta-se nesses pilares para atingir os serviços públicos e todo o funcionalismo além de buscar isola-lo de toda atividade política.
O isolamento do professor
Um outro aspecto importante que retrata a situação do professor da rede pública – que o afasta da participação dos sindicatos, das lutas políticas por melhores condições de trabalho e por questões salariais – é o seu isolamento nas escolas e em suas salas de aulas. Esse isolamento reduz sua relação com os professores da própria escola e alunos de modo que as saídas para os problemas passam a ser buscadas individualmente ou no âmbito da própria escola. Ou seja, os problemas e as soluções deixam de ser tratadas coletivamente.
O professor observa essa dinâmica, depara-se com publicações que rendem fortunas à iniciativa privada e envergonham, mas ainda não consegue romper a barreira do isolamento. Um exemplo disso foi a falta de reação em relação aos Projetos de Lei 19 e 20 encaminhados pelo governador à Assembléia Legislativa que objetivam acabar com a estabilidade e estabelecem as condições de “frente de trabalho” na Educação. Outro exemplo pode ser a proposta de reforma do Ensino Médio em que o governo federal contribui para aumentar o desemprego no setor e reduzir ainda mais a qualidade da aprendizagem.
Um processo de reorganização das lutas no setor da Educação precisa romper a barreira do município, estado e união. Somente a unidade dos professores juntamente com a comunidade escolar poderá garantir um outro objetivo para a Educação no país. Além disso, é fundamental redobrar os esforços para envolver todos os trabalhadores na luta por uma Educação de qualidade para os nossos filhos superando as lutas sindicais e imediatistas.
É necessário que nós trabalhadores tratemos a Educação em todos os níveis, como um bem coletivo e um dos instrumentos de transformação social e espaço de produção de conhecimento e desenvolvimento humano.
Para isso, a luta por uma Educação pública de qualidade sob o controle dos trabalhadores deve ser combinada com a luta pela transformação da sociedade.
Fundação Santo André: chapa de esquerda, formada em convenção democrática, vence eleições do D.A.
O início do mês de Junho na Fundação Santo André foi marcado pelo processo eleitoral para o Diretório Acadêmico da FAFIL. A primeira especificidade destas eleições reside no fato de terem se formado quatro chapas para concorrer às eleições, diferentemente do processo ocorrido no ano passado, quando formou-se um “chapão” baseado em um programa e experiência do movimento de que saímos em 2008. Apesar de os membros da chapa estarem de acordo com as reivindicações da greve e que foi fundamental para unir todos os setores de esquerda em uma única chapa de luta, o processo cotidiano da gestão da entidade foi muito complicado, pois vários militantes sequer cumpriam com as tarefas votadas.
A falta de uma séria discussão desse programa não só com os militantes organizados mas também com a base dos estudantes, a falta de acordo entre os membros da chapa com alguns princípios que amarrassem minimamente a atuação no mesmo sentido culminou em um DA esvaziado, ao qual a maioria dos estudantes e membros da própria chapa não se identificavam e não tinham com ele nenhum compromisso.
Ao final da gestão, as reuniões contavam com poucos participantes, todos militantes organizados ou que possuíam alguma ligação com a militância organizada presentes. A formação do “chapão” terminou por resultar em um órgão que não tinha força para sequer tocar as tarefas mínimas e que contou com sérios problemas na relação partido- movimento por parte dos militantes do PSTU. Se por um lado, não negamos, têm o mérito de não terem abandonado a gestão como muitos fizeram, por outro, tentavam usar o Diretório na maioria das vezes exclusivamente para implementar suas políticas nacionais, valendo-se de graves problemas de método e uma grande falta de discernimento do seu papel na construção do movimento.
Gastou-se muito tempo e energia dos poucos resistentes que ainda participavam das cansativas reuniões finais da última gestão do DA com discussões externas à FSA, que devem e precisam ser feitas, mas não devem se sobrepor mecanicamente às demandas dos estudantes da FSA.
A construção do processo democrático
Diante da caracterização da atuação do DA no último período, este ano decidimos impulsionar a realização de uma Convenção de estudantes da FSA, aberta e democrática, que garantisse um amplo debate para a construção de um programa mínimo e de uma chapa que o representasse. Assim nascia a UNIDADE PELA LUTA.
Uma intensa mobilização se armou. Todas as salas da FAFIL foram convidadas, e após várias reuniões preparatórias, realizamos em 20/05 a CONVENÇÃO, contando com mais de 50 alunos, dos 11 cursos da FAFIL. Esse número de alunos pode parecer pequeno no universo de 2.500 alunos da FAFIL, mas, é um avanço diante do quadro de desmobilização no qual o Movimento Estudantil da FSA se encontra.
Outro fato que merece destaque é que o processo de Convenção garantiu a discussão e constituição de um programa próprio dos estudantes da FSA. Mesmo com algumas lacunas que podem ser apontadas no mesmo, ele está longe de ser aqueles programas exógenos, concebidos longe da FSA e que são oferecidos aos estudantes da FAFIL como um contrato de adesão: aceita ou aceita. Em sua simplicidade, o programa resultante da Convenção queria dizer: sim, nós podemos fazer algo por nossa própria autonomia. E no ano que vem será ainda melhor.
Sobre um processo de sucessão para o DA com 4 chapas, achamos que foi positivo para conhecermos as forças políticas em atuação (ou não) dentro da FAFIL. Dessas chapas, três eram formadas por militantes e ativistas de esquerda e uma, que embora tivesse alguns participantes que participaram das mobilizações de 2007- 2008, agora se apoiavam num discurso de “garantir as aulas”, numa negação daquele processo que foi o estopim da queda do reitor corrupto.
Outro fato bastante negativo é do que são capazes algumas correntes políticas de esquerda quando perceberam o risco de saírem derrotadas do processo, utilizando de expedientes de difamação e boataria, e até o famoso “pão e circo”, quando se ofertou um Telão para assistir ao jogo “Corinthians x Vasco”, como cortesia de uma certa chapa. Ou seja, vimos “mais do mesmo”, repetição das usuais práticas da direita.
A UNIDADE PELA LUTA foi eleita dentro da concepção de um D.A. executivo, que coloca em prática o que é discutido e aprovado nas esferas de decisão dos estudantes (Assembléia Geral, Assembléias de Curso, Conselho de Representantes de Classe, e reuniões deliberativas convocadas para decidir algum tema específico).
Por isso, dentro dessa concepção de DA horizontal, que garanta voz e voto para todo aluno da FAFIL, conclamamos as demais chapas, correntes políticas, e independentes, a ajudar a construir um DA forte, que dê vez e voz aos estudantes da FAFIL. O único risco – se houver – é aprovar e implementar a vontade dos estudantes presentes na reunião.
Caracterizamos o próximo período como de ataques contra os estudantes, em particular aos estudantes trabalhadores (inadimplência, tentativa de aumento das mensalidades, fechamento de salas, sucateamento dos laboratórios e bibliotecas, entre outras ações) vindo de todas as frentes (da Reitoria da CUFSA, da prefeitura e dos governos estadual e federal). Por isso, mais do que nunca, faz- se necessária a UNIDADE de ação no DA, uma vez que a unidade não foi possível nas eleições.
Esse apelo é feito a todos, especialmente àqueles que já se anunciaram como oposição. Fazer oposição ao DA no próximo período – horizontal e aberto como pretendemos – é colocar-se em oposição aos estudantes da FAFIL.
Epidemias e crise econômica: o capitalismo mata
Dalmo Duarte
Nos últimos meses o mundo está sendo ameaçado com a possibilidade de proliferação de um vírus inicialmente denominado “gripe suína” e depois A H1N1 com alta taxa de transmissão entre humanos e de uma perigosa letalidade.
Apesar do desinteresse da mídia nos últimos dias o perigo ainda está nos rondando. Os casos continuam se espalhando pelo mundo e no Brasil só nos últimos 30 dias os casos mais que dobraram (e continuará subindo). Sua presença está em vários países, dos mais pobres aos mais ricos. A própria OMS a caracteriza como “pandemia moderada”. Apesar da insistência dos diversos órgãos da burguesia mundial em caracterizá-lo como uma catástrofe natural, uma análise um pouco mais apurada desmonta esse argumento irresponsável. As doenças que se caracterizaram como grandes catástrofes mundiais tem tanto no seu surgimento como no desenvolvimento causas sociais, ou seja, as condições do meio em que as pessoas e os animais estão inseridos, são a verdadeira causa dessa e de outras doenças que apareceram.
A falta de saneamento básico, a fome e a miséria que expõe milhões de seres humanos a todo tipo de doença, alterações genéticas em vários tipos de alimentos que consumimos diariamente, a industrialização das criações de animais (grandes fazendas automatizadas), as rações modificadas para acelerar o processo de engorda e tornar a carne mais lucrativa, a destruição do meio ambiente constituem a base para o desenvolvimento de tantas e tantas doenças.
No caso da “gripe suína” especialistas independentes apontam que a vacinação das criações de porcos com antivirais de eficácia duvidosa (só para atender exigências de alguns países consumidores) é outro facilitador de mutações desses vírus, o que os tornam potencialmente perigosos e anuncia outras epidemias. São nessas condições, próprias do capitalismo, que as doenças se propagam rapidamente e coloca em risco milhões de pessoas.
O desenvolvimento técnico que se alcançou poderia permitir a humanidade ter uma qualidade de vida nunca antes imaginada, mas essa técnica sob domínio da burguesia se transforma em destruição. As forças produtivas passam a se opor à natureza, com tecnologias que constantemente levam a destruição e a acidentes de grandes proporções, como chuvas ou sol em excesso, o desenvolvimento de novas doenças, etc.
A atual configuração do capital torna o seu processo produtivo extremamente destrutivo tornando a natureza uma presa. Quase tudo que se produz na sociedade capitalista deixa um lastro de destruição da vida natural. A devastação das florestas, dos rios e de toda vida selvagem deixa o sistema ecológico frágil e debilitado de maneira que não mais consegue encontrar em seu próprio meio as formas de controle de bactéria, fungos, vírus, etc, desenvolvendo situações que facilitam a proliferação de todo tipo de doenças que atingem homens e outros seres da natureza. A produção capitalista é um risco para a humanidade.
A ideologia burguesa sempre oferece explicações falsas para o que acontece. Escondem as reais causas de tantas doenças e tantas mortes “imbecis” que se espalham pelo mundo. E para isso aparecem “cientistas” e “especialistas” muito bem pagos pelos grandes laboratórios em suspeitas entrevistas aos meios de comunicação tratando tais doenças como se fossem fatos sobrenaturais e imprevisíveis.
Como parte da luta contra o capitalismo, é preciso dar uma explicação para essas e outras doenças a partir do marxismo, ou seja, de que o modo de produção capitalista é o verdadeiro responsável pelas doenças que se alastraram rapidamente. Nos últimos anos tivemos a vaca louca, a gripe do frango e agora a gripe suína todas elas provocadas por manipulações na ração ou mesmo o confinamento a que estão submetidos, condições impostas pela produção capitalista que sempre objetiva o lucro. A “gripe suína” é só mais uma delas.
Crise econômica e saúde pública
A grave crise da economia capitalista, a qual todos os países estão submetidos, colocou em movimento um plano dos Estados capitalistas para salvar as suas burguesias, distribuindo enormes quantias de dinheiro público para o setor privado e sem qualquer perspectiva de que o Estado vai receber de volta. Nos Estados Unidos foram bilhões de dólares para bancos, companhias de seguro e mais recentemente injetaram bilhões para “recuperar” a GM. No Brasil é o financiamento das empresas automobilísticas e tantas outras “ajudas” para os grandes grupos capitalistas.
O Estado coloca a disposição dos capitalistas bilhões de dólares. Só que para garantir a liberação desse dinheiro para as empresas privadas os governos precisam cortar verbas do serviço público seja da educação ou mesmo da saúde pública. A crise econômica e a política adotada pela maioria dos governos colocam em risco qualquer plano para enfrentar uma pandemia como essa ameaça pela gripe suína.
Outra questão dessa relação crise e saúde pública é o aumento do lucro dos laboratórios que fabricam medicamentos (principalmente o Tamiflu) adotados pela maioria dos governos para combater a “gripe suína”. O fato de terem a sua eficiência questionada, tanto porque foram fabricados antes desse surto como pelo fato de que são estoques antigos – era para combater a gripe viária-, não impediu que a OMS (Organização Mundial de Saúde), em abril, recomendasse aos governos que comprassem e aumentassem os seus estoques desses antivirais. O resultado foi que o lucro aumentou e o valor das ações da Roche e Gilead (fabricantes) subiu mais de 4% mês de abril. A curiosidade é que Donald Rumsfield (ex-secretário de defesa dos Estados Unidos no governo Bush) é um dos diretores dessa empresa. Só após várias pressões é que a OMS reconheceu a possibilidade de que esses antivirais não surtem o efeito desejado.
Até o momento ainda há um controle, frágil, do vírus da “gripe suína”, mas o que já provou que o atual sistema de saúde pública mundial não tem condições de enfrentar uma pandemia dessa natureza ou qualquer outra doença que ganhe proporções mundiais. Como os trabalhadores e pobres dependem da saúde pública o descontrole desse vírus pode fazer com que milhões de trabalhadores sejam condenados a morte.
É para não expor a precariedade da saúde pública capitalista que a mídia burguesa esconde e mente para o mundo. O desvio de recursos públicos para a iniciativa privada é mais uma demonstração que no capitalismo os interesses dos grupos e empresas sempre estão acima das necessidades humanas. Para o capitalismo o lucro vem antes da vida.
Quebrar as patentes: o conhecimento a serviço da humanidade
Os laboratórios farmacêuticos estão entre os negócios mais lucrativos do capitalismo, lucram mais que tráfico de drogas e armamentos. São verdadeiras fortalezas do capitalismo, que acumula bilhões tornando os doentes seus reféns.
Mas na formação dessa fortuna também tem um dedo dos Estados capitalistas que, mesmo com milhões de pessoas morrendo, mantém a proteção das patentes de medicamentos que poderiam curar as pessoas. Outra contribuição muito generosa é a destinação de verbas públicas para esses laboratórios. Nos Estados Unidos, por exemplo, o que os laboratórios gastam com pesquisa e propaganda podem ser abatidos dos tributos. Sem falar no fato de que já pagam impostos bem menores. Outra forma de ajuda do Estado ao laboratório está na distribuição das verbas para as pesquisas. Como as pesquisas iniciais são mais caras e arriscadas (a chance de não dar certo é maior) o Estado as financia, sendo que 90 % dos custos de pesquisas dos 5 medicamentos mais vendidos nos anos 90 foram custeadas por verbas públicas. Elias Zerhouni, diretor do NIH (Instituto Nacional de Saúde nos Estados Unidos) confirma: “…nós financiamos quase 90% da investigação nos Estados Unidos na esfera da saúde…”.
Todo esse mecanismo é garantido com a preservação das patentes (propriedade da fórmula dos medicamentos) e que para os trabalhadores representa a morte. As pesquisas são feiras com dinheiro público, os laboratórios ficam com a fórmula e os trabalhadores morrem porque não podem comprar remédios tabelados pelos monopólios que, por serem os únicos que produzem, cobram o que querem.
O lucro não pode estar acima da vida. Por isso é fundamental a luta pela estatização, sob controle dos trabalhadores, de todos os laboratórios tornando público todas as fórmulas dos medicamentos. A “gripe suína” e apenas um dos casos, pois há outras doenças como a AIDS, a tuberculose, a malária, a doença de chagas, vários tipos de câncer que têm medicamentos que ou curam ou garantem uma vida com mais qualidade para as pessoas, mas que as pessoas não conseguem utilizá-los pelos altos custos.
O capitalismo já provou o seu poder de destruição e sob o domínio dele os homens não controlam as forças da natureza, pelo contrário, cada ato seu é sinônimo de destruição e de oposição do homem ao próprio homem e à vida.
Só colocando o conhecimento a serviço da população do mundo é que acabaremos com doenças que ainda matam milhões de pessoas pelo mundo. Fim do monopólio dos laboratórios. Quebra de todas as patentes de medicamentos. Saúde pública e gratuita para todos os trabalhadores. Tarefas que só podem ser levadas adiante com o socialismo, único sistema social que produz de acordo com as necessidades humanas e não pelo lucro, única maneira de livrar a humanidade de todo sofrimento.
Cem dias da gestão Obama: a lógica segue a mesma
O governo Obama, contrariando as expectativas daqueles que embarcaram na atmosfera de mudança de sua campanha eleitoral, já completou mais de cem dias à frente do maior império da história humana, demonstrando claramente o que pretende continuar fazendo no comando da Casa Branca.
Não podemos observar seus primeiros três meses de governo sem lembrar que o sistema eleitoral que lhe deu legitimidade para governar é ainda um dos menos democráticos que existem na Terra, pois um colégio eleitoral em que apenas 538 membros escolhem, em nome de mais de 300 milhões de pessoas, o presidente do país mais rico e perigoso do planeta revela a incoerência entre o ideal de democracia exercido pelo povo estadunidense e aquele utilizado pelas forças armadas para invadir o Afeganistão e o Iraque e chantagear a Coréia do Norte.
Não podemos esquecer que os EUA são governados por uma elite política que se viu alçada a dirigente de metade do mundo desde o fim da 2° Guerra Mundial e pretensamente do mundo inteiro após a queda da União Soviética. A escolha por essa elite de um homem negro e não descendente direto da oligarquia é significativa como indicação de até onde ela pode ir para garantir a aplicação de seu projeto de Estado. Mas não podemos nos enganar, esse projeto visa garantir os interesses de uma elite que, por ironia ou não, é formada por brancos.
Travestir a realidade de ilusões sempre foi necessário para qualquer elite em qualquer parte do mundo para seguir dominando. O discurso de mudança sem dizer para onde também já foi utilizado muitas vezes antes. A novidade no caso da eleição de Barack Obama era ele próprio. Após dois mandatos de George Bush (filho) e de se esgotar uma política escancaradamente imperialista, fez-se necessário para a elite estadunidense reciclar suas formas de dominação. Para tanto, não foi preciso fazer nenhuma concessão política ou econômica aos trabalhadores ou às minorias oprimidas, bastou escolher um candidato que tivesse a constituição física de alguém que foi historicamente oprimido, caso dos negros e mulçumanos em um país de maioria branca e protestante, para com isso representar a mudança. Os acordos e alianças com as organizações populares, compromissos programáticos e demais propostas políticas e econômicas para embasar uma proposta realmente progressista foram substituídos por uma calorosa recepção da mídia e pelo apoio das celebridades do cinema.
Na verdade, quem venceu a disputa eleitoral que levou Obama a Casa Branca foi a mesma elite vinculada ao petróleo, às indústrias militares e aos grandes financistas que vêm ditando os rumos estratégicos dos EUA, ora com o Partido Republicano, ora com o Partido Democrata. O controlado processo eleitoral estadunidense serviu para que essa elite, que está no epicentro da maior crise econômica do pós-guerra e que sofre questionamentos políticos pelo mundo inteiro, conseguisse em plena crise reunir em torno de si as melhores condições de seguir aplicando seu projeto baseado em três pilares básicos: o controle das fontes de energia, a utilização e expansão do complexo industrial militar e o controle econômico mundial através do sistema financeiro baseado no padrão dólar.
É visando aplicar esse projeto de Estado que a burguesia daquele país se debruça periodicamente sobre as eleições para reciclar sua dominação e extrair dentre os possíveis candidatos o melhor representante de seus interesses. Da mesma forma que a burguesia brasileira escolheu uma figura identificada com os trabalhadores para melhor aplicar uma política contra os trabalhadores, a burguesia dos EUA escolheu uma figura identificada com tudo o que poderia evocar mudança para garantir que nada de substancial fosse mudado.
Nos mais de cem dias de Obama ficou evidente que o critério de escolher “os melhores e mais brilhantes” utilizado em seu discurso para justificar a formação de um governo composto por ultraconservadores como Paul Volker, James Jones e Robert Gates serviu apenas para continuar iludindo aqueles que acreditam que existe neutralidade quando falamos em política.
Paul Volker é um veterano em salvar sua elite de crises: em 1971 ele foi um dos artífices da manobra do Presidente Nixon que acabou com o lastro em ouro do dólar, e dessa forma permitiu ao tesouro estadunidense emitir o dinheiro necessário para que os EUA pagassem as dívidas contraídas durante a guerra do Vietnã; em 1979, para salvar a burguesia de uma perigosa combinação de inflação alta com baixo crescimento econômico, ele reajustou as taxas de juros dos Estados Unidos, o que por tabela mais que dobrou as dívidas dos países latino-americanos, uma vez que os contratos dos empréstimos eram atrelados a cláusulas de juros flutuantes.
Em política militar, o conservadorismo não poderia ser maior sem James Jones e Robert Gates. O primeiro é um general veterano da guerra fria e ex-comandante da OTAN (Organização do Tratado Atlântico Norte); o segundo foi nomeado para ocupar o cargo de Secretário de Defesa ainda por George Bush em 2006, sendo mantido por Obama. Esse fato por si só já marca o tamanho da distância entre o discurso de mudança e a realidade de continuidade, já que nunca antes houve a permanência do mesmo Secretário de Defesa após uma troca de partido nas eleições presidenciais.
Não podemos esperar que um governo formado com esses tipos de representantes hesitará em elaborar medidas contra os trabalhadores para buscar saídas de uma crise econômica que pela primeira vez desde 1974/1975 reduziu o PIB em 6,1% e que já registra uma taxa de desemprego de 9,4 %.
É considerando o governo como um instrumento dos interesses da elite estadunidense que podemos entender a natureza das políticas que Obama implementa contra os trabalhadores, imigrantes e contra o próprio povo negro do qual descende diretamente. Em contra-partida à aplicação de mais de US$ 700 bilhões para socorrer bancos, nada foi feito para garantir moradia para milhões de famílias de baixa renda endividadas e que tiveram suas hipotecas executadas. Essas moradias são em sua maioria utilizadas por afro-americanos e hispano-americanos.
Na política externa, depois de emocionados discursos sobre a paz mundial, o que a gestão Obama oferece de concreto é a constante ameaça do uso da força caso “fracassem os meios diplomáticos”, e por fracasso diplomático devemos entender condições não aceitas pelos países alvos. Têm sido assim com o Irã: a cada novo movimento do xadrez da política internacional, a Secretária de Estado Hillary Clinton lembra que existem tropas mobilizáveis no vizinho Iraque. Enquanto isso, no Afeganistão, houve um aumento dos efetivos militares e do uso da força de forma indiscriminada, o que resultou no genocídio de mais de 150 civis afegãos em maio.
Nem mesmo no terreno dos direitos humanos houve avanços substanciais, uma vez que as denúncias de tortura nas prisões militares não foram investigadas a fundo e somente se anunciou o fechamento da base-prisão de Guantánamo. Ainda nem se tocou na situação jurídica de seus detidos, uma vez que não foram submetidos a julgamento e mesmo que um dia o sejam é pouco provável que isso seja feito por um Tribunal Penal Internacional. Os Estados Unidos se negam a reconhecer esse Tribunal, pois se o fizerem terão que entregar seus oficiais acusados de crimes de guerra. Ou seja, a administração Obama espalha sorrisos ao mesmo tempo em que segue desrespeitando a dignidade humana. Outro exemplo desse desrespeito é que, desde sua posse, se mantém ilustres presos políticos, como os Cubanos acusados de espionagem, o militante do Partido dos Panteras Negras, Múmia Abul Jamal, além dos supostos terroristas de Guantánamo.
Dois exemplos ilustram de maneira definitiva os interesses aos quais Obama serve. Nos primeiros meses do ano explodiu o escândalos dos bônus milionários pagos aos executivos dos bancos e financeiras, os mesmos que provocaram a quase-falência do sistema financeiro e cujas empresas receberam centenas de bilhões de dólares em pacotes de salvamento do governo. Em meio à indignação geral de milhões de trabalhadores que perderam seus empregos e suas casas contra os financistas, o governo Obama não fez nada concreto para limitar o pagamento dos bônus, que em última instância representam a entrega pura e simples de dinheiro público aos barões de Wall Street.
Pouco depois, em abril, foram divulgados os memorandos internos do Departamento de Justiça do governo Bush autorizando os agentes da CIA e o do Pentágono a praticar tortura contra prisioneiros capturados na “guerra ao terror” e mantidos ilegalmente cativos. Obama não fez nada para que os responsáveis, ou seja, todo o alto escalão do governo Bush, fosse criminalmente processado de acordo com as próprias leis estadunidenses, tornando-se assim ele próprio um cúmplice de crimes de guerra, de acobertar violações aos direitos humanos e de desrespeito a todas as convenções internacionais contra a tortura e as prisões ilegais.
Devemos avaliar um governo pelas suas forças de sustentação e pelas políticas que seus atos representam. No caso da administração Obama seus aliados são os mesmos dos seus antecessores, seus atos de governo beneficiam a mesma elite do petróleo, das armas e dos bancos e seu padrão de produção e consumo seguem destruindo o planeta.
Não podemos depositar nenhuma confiança em projetos que não nascem da classe trabalhadora e de suas lutas e por isso não representam nossos interesses. Qualquer governo formado e sustentado pela burguesia somente conduzirá à guerra, à miséria e à barbárie.
Relação Partido e Movimento: um debate atual e necessário
A relação Partido e Movimento é um tema crucial na luta pelo socialismo. A depender da concepção sobre o tema tem consequências graves para a luta de classes, como a “apropriação” das entidades do movimento pelo partido. Esse é um debate fundamental para os ativistas e para as organizações revolucionárias. Internamente também fazemos esse debate e como contribuição, publicamos o texto do companheiro Márcio da Oposição Bancária de São Paulo. Ao mesmo tempo convidamos os demais companheiros para participarem desse debate. |
As diversas tradições trotskistas tem como um ponto comum a ideia de que é necessário construir o partido revolucionário, como garantia de que a a revolução socialista seja bem sucedida. Essa ideia, que em si está correta, tem sido aplicada de uma maneira unilateral, como se a única tarefa fosse a construção do partido, a qual acaba se sobrepondo às necessidades do movimento socialista como um todo. O objetivo desse texto não é evidentemente fazer um balanço do trotskismo na sua totalidade, mas discutir um aspecto problemático da atuação da maior parte das correntes trotskistas, a sua concepção da relação entre partido e movimento.
Quando Trotsky disse em 1938 que “a crise da humanidade é a crise de sua direção revolucionária”, essa afirmação tinha o sentido de apontar para o fato de que o proletariado como classe revolucionária capaz de trazer uma alternativa societária para a humanidade estava em crise, e essa crise incluía a ausência de uma organização política. Foi para suprir essa ausência que o grande dirigente revolucionário lançou a iniciativa da construção da Quarta Internacional. Na visão de Trotsky, a função da IV seria liderar uma revolução política que derrubasse o stalinismo dos “Estados operários burocratizados”, retomando a construção do socialismo sobre uma base social já transformada.
Deixando de lado as questões a respeito da validade da caracterização da URSS e seus satélites como “Estados operários burocratizados” e da revolução anti-burocrática ser concebida exclusivamente como “revolução política” pelo fato de já se ter uma base social supostamente socialista; o fato é que as diversas correntes que reivindicam o trotskismo passaram a ter como eixo praticamente exclusivo de sua ação a construção de um “partido revolucionário marxista-leninista-trotskista” para tomar o poder.
Em nome dessa preocupação exclusiva, deixou-se de lado o estudo das condições concretas e a ação sobre a consciência do conjunto da classe trabalhadora. Quando aconteceu o desmantelamento da URSS, surgiu no movimento trotskista a caracterização (cuja versão mais acabada está nas “Teses de 1990” da LIT) de que estava aberta uma nova etapa revolucionária, pois havia sido removido o maior obstáculo para a revolução, que era a burocracia stalinista. Essa caracterização mecanicista e superestrutural ignorava o elemento estrutural central que era a defasagem na consciência da classe trabalhadora dos países do ex-bloco soviético, ou seja, a ausência de uma consciência socialista sobre a qual se poderia edificar um partido revolucionário. Essa caracterização equivocada e os apelos vazios à construção do partido para tomar o poder, num contexto de derrotas objetivas e retrocessos subjetivos da consciência da classe em nível mundial, foram responsáveis por desnortear e “quebrar” toda uma geração de militantes. A despeito disso, as correntes trotskistas continuam reivindicando a construção do partido como se nada tivesse acontecido na consciência da classe. Quanto mais a crise de direção se tornava patente como algo mais profundo e estrutural, uma crise da alternativa socialista, mais essas correntes se apegam à obsessão da construção do partido como a um dogma religioso (com o agravante de que cada militante acredita que o seu partido é “o escolhido” pela revolução para guiar a classe trabalhadora à vitória.
A partir disso, os partidos passam a ter uma relação estranha com os organismos de luta da classe, como se o movimento operário e seus organismos fossem um “mercado” de militantes a serem disputados pelas organizações revolucionárias para o crescimento do partido, tal e qual os capitalistas se engalfinham na disputa de mercado para seus produtos. Essa prática está na origem da divisão da esquerda. Como cada organização socialista vê a outra como concorrente, vale tudo nesta disputa. Valem desde manobras para que a base não participe, usurpando a vontade dos trabalhadores, até encaminhar propostas do partido DIRETAMENTE no movimento, sem passar pelos fóruns deliberativos dos organismos da classe. Também é comum colocar como condição para a unidade o controle (maioria) sobre a direção das entidades do movimento. Discutiremos a seguir três exemplos relacionados a atitudes de três organizações em acontecimentos recentes do movimento: PSOL, PSTU, e LER-QI.
Antes de desenvolver os exemplos acima, é preciso deixar claro que: 1-os casos relacionados aos partidos acima são apenas exemplos, pois a prática de aparelhar os organismos do movimento é disseminada por toda esquerda; 2- o Espaço Socialista não vê tais siglas como inimigas, mas como aliadas, por terem um projeto estratégico socialista. A divergência paira sobre a relação que os partidos têm com o movimento, que entendemos ser equivocada.
Sob a alegação de combate ao burocratismo de seus militantes, que também são dirigentes sindicais no Rio Grande do Norte, o PSTU colocou como condição para que permanecessem no partido a renúncia à direção do sindicato para o qual foram eleitos pelos trabalhadores. Em respeito à soberania da base, os dirigentes sindicais optaram por permanecer nas direções dos sindicatos e saíram do partido.
Não entraremos no mérito da caracterização da direção nacional do PSTU sobre o burocratismo dos diretores sindicais, mas sim no problema de método que está em exigir a renúncia dos diretores sindicais em fóruns estranhos aos do organismo de luta dos trabalhadores, no caso, o sindicato. Isso é um atentado à democracia operária e não contribui para a educação das massas. Para se ter uma luta conseqüente contra a burocratização, o máximo que o partido poderia fazer seria expulsar os dirigentes burocratizados e denunciar perante a base os desvios desses dirigentes, travando a luta política para que os trabalhadores, de forma consciente, destituíssem os diretores tidos por burocratas. O PSTU optou por simplesmente desligá-los, o que revela que para o partido é normal fazer ingerências nos organismos de classe onde seus militantes exercem função de direção ou são maioria, como alguém que dispõe livremente do que é “seu”.
O PSOL, que é a direção política da INTERSINDICAL, coloca uma série de óbices para fazer unidade com a CONLUTAS, cuja direção é do PSTU, numa frente sindical e de movimentos populares. As diferenças “políticas” estão em torno da definição de qual organização terá maioria e de saber se há espaço suficiente para acomodar os maiores quadros de cada partido. Setores do PSOL claramente aparelhistas (sobretudo aquelas correntes que são aliadas da Articulação, como as que fizeram chapa com a burocracia nas eleições para os sindicatos dos bancários de São Paulo e do Rio), não querem saber de unificação, com medo de perder os seus cargos. Usam o movimento em proveito próprio.
No caso do Encontro dos Trabalhadores do ABC que deliberou pela construção do Comitê Contra o Desemprego e a Exploração Capitalista, a Liga Estratégia Revolucionária Quarta Internacional (LER-QI) colocou como condição para sua participação no Encontro o critério de que os participantes fossem delegados eleitos na base, ao invés de uma participação aberta a todos. Como a sua proposta foi derrotada, a organização se retirou da construção da unidade da região do ABC Paulista. No caso, o critério da eleição foi apenas uma desculpa para não participar, uma vez que os companheiros consideram, de forma equivocada, que o Comitê é um aparelho a serviço da construção do próprio Espaço Socialista, que é um dos seus maiores impulsionadores. Ou seja, a LER-QI não participou da construção do Encontro porque entendeu que isso significaria construir o ES e não ela própria. Ao invés de aproveitar a oportunidade para educar os trabalhadores e construir o movimento em conjunto com outras organizações, a LER-QI optou por se retirar ao perceber que não poderia “tirar proveito” do movimento.
Finalmente, no processo de formação de chapas para o diretório acadêmico da FAFIL (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Fundação Santo André – FSA), o grupo formado pelo Espaço Socialista e independentes, ligados à gestão anterior do DA e que aglutina os principais ativistas do movimento de 2007 e 2008 (o qual culminou no afastamento do antigo reitor); propôs uma convenção aberta para formação de uma chapa unitária da esquerda, com base em um programa mínimo e em princípios elementares de independência de classe, como não aceitar dinheiro da reitoria para financiar a ida de delegados da FSA para o Congresso Nacional de Estudantes. PSTU e LER não aceitaram esses critérios e a esquerda concorreu em três chapas separadas. Isso expôs os estudantes da FAFIL à possibilidade de ter o DA dirigido por uma 4ª chapa, composta por estudantes dos cursos politicamente hostis ao movimento. Felizmente, apesar da divisão da esquerda, a chapa composta pelo Espaço Socialista e independentes foi eleita.
O papel do partido no movimento
Também consideramos que a construção do partido revolucionário é necessária, mas para nós o partido deve estar a serviço do crescimento do movimento. Não se trata de marginalizar o papel do partido, nem de subordiná-lo ao movimento, mas de fixar de forma clara os limites de atuação dos partidos nos organismos de luta da classe trabalhadora. Assim, consideramos errado que os partidos encaminhem suas propostas sem passar pelo crivo dos organismos do movimento, ou seja, pelas assembléias e instâncias deliberativas de base.
Esse tipo de postura faz com que muitos trabalhadores abandonem a luta, porque se sentem como marionetes na disputa entre os partidos, como objetos de disputa das organizações. Muitos trabalhadores também se frustram por não serem ouvidos, não terem participação na construção do movimento, não terem influência na direção do movimento, pois tudo é decidido nos fóruns internos do partido que dirige a entidade, e as decisões já vêm “prontas” de cima para baixo.
Isso não significa que os partidos não devam participar dos movimentos. Pelo contrário. É um dever dos partidos inserir- se nos organismos de luta da classe, mas com um papel muito bem definido, que é o de educar a classe trabalhadora para a tomada do poder. Assim, o partido tem uma função precisa no movimento, mas não pode de substituí-lo.
A unidade entre os lutadores é um princípio a ser seguido por todos os partidos, pois isso é necessário para que os trabalhadores tenham uma referência, um movimento no qual possam se engajar e se colocar como sujeitos do processo histórico. A necessidade da unidade deve estar acima das preocupações desta ou daquela organização em particular de ser maioria ou minoria nas entidades e nos fóruns da classe. Nós do Espaço Socialista não cansamos de chamar o PSOL e o PSTU para construir um fórum de resistência à crise no ABC, mesmo estando conscientes de que seríamos minoria. Mais tarde este fórum viria a ser o Comitê Contra o Desemprego e a Exploração Capitalista, ao qual o PSTU e outras organizações não se integraram. Mesmo assim, continuamos chamando todas essas organizações para construir um polo político na região que tenha um caráter de oposição classista contra a burocracia, ainda que em tal polo o Espaço Socialista seja minoria. Para nós, o mais importante é construir e educar a base, para que ela, sim, seja o sujeito da história.