Jornal 01: Abril de 2000
11 de agosto de 2009
- Apresentação
- Zeca do PT… do PSDB, PFL, PPB, PTB, construtores …
- Política vacilante e burocratismo versus reorganização do movimento por fora dos aparatos – essa foi a tônica do II encontro americano
- A democracia e os trabalhadores
- HIP-HOP: Cultura e Política
- O nascimento de um novo movimento operário
- A História … é outros 500!
- O remédio amargo do capitalismo
- Mumia Abu Jamal: A Luta Continua!
Apresentação
Este é o segundo número de nosso jornal. Para nós uma vitória incrível, pois aos poucos estamos avançando no projeto, de construir um espaço de debates no campo revolucionário e socialista visando o objetivo maior que é contribuir para a reconstrução do movimento operário sobre novas bases socialistas e de classes.
Como os companheiros poderão ver, as matérias não são opiniões do jornal (como a esquerda tradicional faz, de orientação para os militantes de base), mas sim opiniões de coletivos estaduais, regionais e de militantes que expressam uma realidade política e social.
Neste ano de eleição vem a tona e, com a participação ativa da esquerda, o deprimente jogo das campanhas eleitorais. As eleições são o caminho para resolver os problemas políticas e sociais do país? Qual deve ser a postura dos revolucionários frente a democracia? Este é o tema abordado pela matéria “Democracia e os trabalhadores”.
A situação da juventude que está cada vez mais excluída é abordada na matéria sobre As raízes do Hip-Hop” e “Hip-Hop Cultura e Política.
Temos a imensa satisfação de apresentar o artigo do companheiro Emiliano (de Fortaleza), militante do Contra a Corrente que aborda um dos temas candentes da atualidade para todos os revolucionários que é a situação do movimento operário em O nascimento de um novo movimento operário.
Há também a matéria sobre um tema que está pegando, que é o dos remédios, escrita pelo companheiro Ney, do coletivo Bandeira Vermelha do Rio de Janeiro. E a campanha global dos 500 anos é rebatida pelos camaradas professores de SP e busca discutir o caráter da dominação capitalista sobre o país. Do norte, vem a matéria do companheiro da federal do Para, fazendo um balanço pessoal do encontro contra o neoliberalismo realizado naquela cidade.
E a administração petista do Mato Grosso do Sul? Veja a opinião do camarada Márcio, militante de Campo Grande, que conhece de perto o modelo de governo da esquerda oficial.
O mais importante é que com este número consigamos dar mais um passo nesse projeto ambicioso, de unir mais e mais companheiros, de distintas tradições, num projeto de união dos revolucionários, rompendo com os conceitos sectários que muitas das organizações de esquerda tem até hoje.
Quanto ao nome do Jornal, tivemos várias propostas (Tribuna Socialista, Tribuna Vermelha, Bandeira Vermelha, Defendam-se, Folha Comunista, etc). Optamos pelo Espaço Socialista, uma proposta de um companheiro de Belém, por acharmos que expressa a proposta do Jornal de ser um espaço aberto de discussão e de idéias socialistas.
“Mais uma vez queremos manifestar nossos agradecimento e pedir àqueles companheiros que queiram colaborar para o nosso jornal que o façam, enviando suas matérias por e-mail ou através de nossos colaboradores.”
Zeca do PT… do PSDB, PFL, PPB, PTB, construtores …
Márcio Cabral – Campo Grande-MS
A pouco mais de 15 meses tomou posse o governo petista de Zeca do PT sob uma cortina de fumaça de um governo popular com grande apoio da população sul mato-grossense .Diferente do que muitos imaginavam essa vitória do PT em nada representava uma vitória da esquerda ou do chamado campo popular. Na verdade foi uma grande vitória da direita ao conseguir ganhar de vez o maior partido da esquerda do estado para o seu campo. Vale lembrar que já no primeiro turno, o então candidato Zeca havia feito todo tipo de acordo com os setores conservadores do estado em troca de financiamento e apoio. No segundo turno foi escancarado de vez, até o arcdireitoso e ex-. governador por varias vezes do estado Pedro Pedrossiam, não só declarou apoio público como colocou toda a máquina da sua campanha a serviço do Movimento Muda MS (Zeca ) .
Clientelismo, nepotismo favorecimento… a cara do governo popular
Já no início esse governo mostrou a que veio. Vale a pena ressaltar que ao assumir a lógica de fazer a política da burguesia, o PT também assumiu sua lógica de governo ,ou seja, contratação de parentes (sobrinhos , primos, esposas, irmãos do governador e do vice) para o governo. Fato vastamente publicado na imprensa nacional num verdadeiro escândalo digno de ACM e cia Ltda. Na parte das contratações, escândalos também não faltaram. O mais conhecido envolve uma empresa de táxi aéreo e o governador. Sem nos esquecermos das férias que Zeca e a família passaram na casa de um grande construtor, que hoje é o responsável pela maior obra em andamento no estado. Não para por aí. O governo do estado através do DERSUL licitou uma ponte depois de já estar construída, por sinal, pelo irmão do então presidente do que ? Do DERSUL!!!!!
A esquerda Petista e o PSTU
Desde antes do início da campanha travou-se um importante debate na esquerda sobre qual seria o caráter de um possível governo do PT. Infelizmente toda a esquerda, sem exceção, contaminada pela embriagues eleitoral apoiou e participou, em maior ou menor grau, da frente eleitoral Muda MS
O PSTU com sua velha ideologia de que as massas precisam fazer experiências apoiou de fora, mas tendo seus programas financiados pelo PT, acabou tornando-se fio condutor da política da burocracia petista, não se diferenciando nem denunciando o caráter burguês da frente. Após a eleição entrou em crise total, perdendo vários de seus filiados diretamente para o aparato do governo. Hoje encontra-se reduzido a poucos militantes na capital, porém parece não ter tirado todas as lições de anos de adaptação à burocracia petista e sindical. Continua na mesma vala comum da consigna de frente dos trabalhadores, quando não existe a menor chance de tal frente vir realmente a se concretizar. Vale a pena perguntar: frente dos trabalhadores com quem? Com o PT, PC do B? Será que é possível chamar esses partidos de operários ou algo similar? Sinceramente acho que não!
A chamada esquerda do PT, se é que se pode chamar desse nome, um ente que ninguém sabe ao certo o que é, e que passou de malas e bagagens ao campo do governo, assumiu cargos e brigou para tê-los sem o menor constrangimentos, limitando-se a fazer críticas no marco do aparato estatal. Aqueles que não conseguiram cargos, via os acordos internos do PT, não se envergonharam de assumir a causa da Articulação e mais precisamente ao grupo Zequista. Parecem ter esquecido dos discursos inflamados de ontem. Hoje são os mais fervorosos defensores do Governo.
Hoje, ainda mais do que ontem, está mais que provado que as eleições não mudam e nem poderão mudar a situação da classe trabalhadora. Só a auto-organização dos que vivem do trabalho, poderá transformar a situação de crise e desesperança que a maioria da população hoje vive.
Política vacilante e burocratismo versus reorganização do movimento por fora dos aparatos – essa foi a tônica do II Encontro Americano
Gustavo Curuja – Belém-PA
Depois do sucesso ocorrido no I Encontro Americano pela Humanidade e contra o Neoliberalismo, realizado no ano de 1996 em Chiapas México, organizado pelos Zapatistas e que contou com a ampla participação democrática e um espírito de solidariedade dos povos oprimidos, esperava-se que o 20 Encontro Americano, ocorrido em Belém do Pará Brasil em dezembro de 1999, desse continuidade a esse importante processo de unificação e construção de um programa político (mínimo) que fosse capaz de organizar o movimento internacional em ações conjuntas em defesa dos direitos dos trabalhadores e de todos os que de alguma maneira tem historicamente sofrido com o preconceito, a discriminação e a opressão do sistema capitalista.
Um bom número de organizações ou representantes de movimentos organizados compuseram as 2600 pessoas credenciadas dos cerca de 24 países representados no evento. Entre as mais importantes ou que participaram ativamente podemos destacar Zapatistas do México, ELN da Colômbia, Movimiento por un Partido de los Trabajadores e CTA da Argentina, Movimento Bolivariano da Venezuela, representante do PC Cubano, PIT/CNT do Uruguai, Partido dos Trabalhadores do Brasil, PCR, PSTU, LBI, PCdoB, Movimento Hip-Hop, movimento Contra-Corrente Articulação dos Povos Indígenas do NE, MG, ES e PA, Comunidade Quilombolas, ONGs, Movimento Negro, de Mulheres, Gays, Lésbicas, entre outras.
A organização de um evento desse nível, que deveria fundamentalmente contar com a experiência dos Zapatistas e de outras organizações como a FARC, MST, CUT e os partidos políticos da esquerda socialista, acabou ficando sob responsabilidade da corrente petista Força Socialista, com grandes desvios burocráticos e sem nenhuma tradição de internacionalismo. Desenvolvendo uma política de disputa eleitoral, burocrática e sem mobilização e, atualmente, administrando a prefeitura de Belém através de aliança com a burguesia, esta corrente tomou para si a tarefa de transformar o II Encontro Americano em uma grande festa de propaganda da atual gestão petista sem um mínimo de respeito aos verdadeiros objetivos deste encontro. Desde o princípio, centralizando as decisões de organização e funcionamento do evento na cúpula do partido sem respeitar os fóruns de discussão internacional, esta corrente criou as condições objetivas para a burocratização do evento estabelecendo uma metodologia pouco participativa que acabou enfraquecendo os grupos de trabalho impossibilitando a participação da base. Além da limitação da voz e do voto nas decisões políticas que foram garantidas somente àqueles que pudessem pagar os 15 reais de inscrição.
Considerando todos esses fatores, o encontro, que deveria ser um momento de ampla unidade na luta contra o neoliberalismo e pela humanidade, teve dias de grandes conflitos internos causado pela tentativa de exclusão, por parte dos organizadores do evento, dos “sem crachás”, através da utilização da polícia da prefeitura de Belém. O descontentamento de um amplo setor de estudantes, trabalhadores, anarquistas, punks, além dos representantes indígenas, devido a presença da polícia municipal no evento, a falta de diálogo e as manipulações constantes, da direção petistas, foi o estopim para que acontecesse uma rebelião e ao mesmo tempo uma ruptura com os organizadores do encontro.
A construção de um encontro alternativo contou com quase 50% dos participantes levando a uma experiência interessante de auto-organização, conseguindo estabelecer o processo democrático até então inexistente, e demonstrando que ainda existe vontade política de um amplo setor da vanguarda de se desprender dos aparelhos burocráticos sem democracia direta. Este fato político criado teve grande repercussão na mídia fazendo com que os petistas da força socialista culpassem os Anarcopunks pelo acontecido, caracterizando-os como vândalos e desordeiros.
A presença dos Zapatistas no encontro de forma pouco incisiva na disputas políticas existentes e suas dificuldades de tomarem uma posição revolucionária em relação a crise provocou uma grande tensão, o que levou a realização de várias reuniões de esclarecimentos, onde os Zapatistas, com uma atitude centrista, colocaram a necessidade da unidade pela unidade, sem ter uma postura crítica em relação aos acontecimentos. Pressionados por uma ampla vanguarda para que tomassem uma posição definitiva em relação às disputas acabaram concordando em apresentar aos petistas uma proposta de unificação a partir dos critérios de democracia participativa, da não tolerância de policiais no encontro, do fortalecimento dos grupos de discussão e de elaboração e do credenciamento de todos os que quisessem participar, sendo então, todos os pontos aceitos pelos representantes da Força Socialista, já extremamente preocupados com o que estava acontecendo.
Não fosse a volta da polícia municipal para os portões do local onde aconteceria a plenária final, como forma de controle político das deliberações que viessem a ser votadas, e a presença de um grande contingente de policiais no interior do evento (o que criou uma revolta por parte de estudantes sem crachá que queriam participar) o encontro Americano teria recuperado o seu objetivo fundamental. Porém, a agressão sofrida pelos estudantes da Universidade Federal do Pará André Luís Silva de Miranda e Luciana Chaves que, após terem o seu direito de participar negado por não possuírem “crachás”, e mobilizarem os restantes para entrar, sendo rapidamente detidos e espancados na frente dos demais, levou a novos conflitos.
A tensão e o medo tomaram conta dos estudantes que tiveram que recuar sob a violência dos policiais até que viessem alguns dos participantes internos para socorrê-los, principalmente anarquistas e punks, que aproveitaram para denunciar a violência cometida pedindo aos representantes da mesa organizadora o direito de voz para os agredidos. O fato desse direito ter sido negado justamente no dia Internacional dos Direitos Humanos e de, nesse mesmo momento, utilizarem-se da calúnia e da mentira como única forma de isentarem-se da responsabilidade e da culpa pelo acontecido só fez aumentar a indignação e a revolta. Cercados por uma vanguarda de luta e protegidos por um pelotão de pobres mercenários (seguranças contratados) não viram outra saída senão decretar o fim do encontro Americano pela Humanidade e contra o neoliberalismo dispersando a multidão para o pão e circo que haviam preparado.
Como não poderia deixar de ser, o desdobramento dessa metodologia burocrática utilizada pelos petistas da Força Socialista no II Encontro, acabou refletindo nas deliberações política que foram aprovadas na plenária final. Estando os mesmos em maioria durante este processo, devido à distribuição de crachás em massa para a sua militância, garantiram a aprovação de uma política reformista sem estabelecer nenhum critério classista para os atos e mobilizações que serão realizados a partir desse encontro. Por exemplo, não se deliberou acerca da defesa do socialismo com única via capaz de garantir a emancipação dos povos contra a exploração capitalista, demonstrando o quanto essa corrente petista e a sua direção está distante da luta real contra o neoliberalismo. A aprovação de uma marcha dos povos oprimidos das Américas em direção ao México num período de 5 anos partindo de vários países, e o impulsionamento de um plebiscito sobre a dívida externa. Como se vê, nada concreto de fato no que se refere a atender a necessidade dos trabalhadores na América Latina hoje. Assim, este movimento corre o risco de não ter uma bandeira concreta de luta que unifique aqueles que defendem uma nova sociedade, diferente dos que acreditam na possibilidade de sensibilização dos capitalista burgueses para garantir maiores fatias de direitos sociais e renda para os pobres, ou seja, os setores reformistas, burocratas de gabinetes que vivem dos aparatos e que a muito vem negociando nos bastidores apostando na conciliação entre as classes.
Percebendo o quanto essa postura política é prejudicial para todos nós trabalhadores, estudantes, camponeses, negros, índios, mulheres e desempregados, hoje mais do nunca desesperados com a atual situação de miséria que os capitalistas historicamente tem produzido, acreditamos que temos muito a refletir acerca da necessidade urgente de construirmos uma nova forma de organização para encaminhar os nossos interesses, tendo como princípio fundamental a destruição do capitalismo e dos aparelhos e aparatos tradicionais de representação dos trabalhadores hoje tomados pelo vício e pela burocratização. A auto-organização através da democracia direta com ampla participação a partir de uma metodologia que garanta a elaboração na base, sem a tradicional hierarquização de cargos ou funções, conforme pudemos ver nesse encontro, possibilitaria uma real igualdade, solidariedade e liberdade entre os povos e um espírito de coletivismo. Isto nos daria condições objetivas de construirmos a tão sonhada sociedade sem classes e sem patrões preconizada pelos verdadeiros revolucionários de nossa história.
Essa reflexão, acerca do ocorrido no II Encontro, tem o intuito de esclarecer os fatos e ao mesmo tempo denunciar essa organização (Força Socialista), além de ratificar nosso posicionamento em defesa intransigente do socialismo, do não pagamento da dívida externa, da reforma agrária radical sobre o controle dos trabalhadores, do direito de autodeterminação dos povos, da redução da jornada de trabalho sem redução do salário, do fim da especulação financeira e da estatização do sistema financeiro, bem como das demais reivindicações da classe trabalhadora e dos povos oprimidos pelo sistema capitalista.
Saudações revolucionárias.
A democracia e os trabalhadores
Duarte / João – ABC – São Paulo
A força existe para garantir a democracia. Com essas palavras, o antigo secretário de segurança do DF justificava a ação da PM e conseqüentemente do governo estadual na repressão à greve da Novacap (estatal de Brasília) que culminou com o assassinato de um trabalhador e dezenas de feridos, entre os quais dois companheiros que acabaram perdendo a visão de um dos olhos.
Esse comentário demonstra a verdadeira concepção da burguesia sobre a democracia. A liberdade é universal desde que todos os explorados estejam aceitando passivamente o seu governo. Percebemos isso em qualquer país do mundo, basta que os trabalhadores e o povo oprimido saiam em busca de seus direitos, lá está o cacetete democrático, com uso da força contra a mobilização dos trabalhadores, com o falso discurso de defesa dos direitos da maioria e da democracia. A liberdade das pessoas no capitalismo é do tamanho de seu poder aquisitivo.
A democracia, apesar de toda a propaganda que se faz, nada mais é que uma ferrenha ditadura contra os trabalhadores e o povo oprimido. Senão vejamos:
A Atual constituição consagra o que os doutrinadores burgueses chamam de Estado Democrático de Direito , ou seja, um ordenamento jurídico e funcionamento do Estado onde deve prevalecer a lei (a democracia é garantida pela força da lei), esta deve ser cumprida a qualquer custo. Na verdade, esse ordenamento jurídico esconde várias leis características de regimes ditatoriais, como se fosse um almoxarifado. Quando a burguesia e seu governo estão diante de processos radicalizados de luta, vão lá e sacam uma delas para dar fachada “legal” para reprimir os trabalhadores.
Um bom exemplo é a lei 7170/83, mais conhecida como Lei de Segurança Nacional (LSN), que entre outras barbaridades impõe pena de reclusão de 1 a 4 anos para os que… incitar à subversão da ordem política e social ou ainda pena de detenção de 1 a 4 anos para os que … fizerem, em público, propaganda de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social. A pena é aumentada em até 1/3 se a propaganda for em. local de trabalho.
A democracia, na forma que esta estruturada só interessa aos poderosos. Independente do partido que vença as eleições, a situação sempre vai ser a mesma por que o problema é mais embaixo. Está nas regras do chamado “jogo democrático”. Quem vence as eleições, não pode em hipóteses alguma acabar com a propriedade privada, distribuir os lucros dos patrões para todos os trabalhadores, deixar de pagar a dívida externa. Se acaso algum político tentar fazer algo assim que dissemos acima, tem a constituição, os tribunais, a imprensa e o Congresso para barrar e se tudo falhar, tem o Exército. O jogo já é viciado desde o início. E não é só isso. As campanhas milionárias, o jogo de desinformação e dissimulação, as manipulações das pesquisas e das urnas são a cara de um sistema que não admite que se mude as regras do jogo. O sistema capitalista pressupõe este tipo de democracia, a democracia burguesa.
Faz 15 anos que o Brasil vive sob o signo da democracia burguesa. Durante este tempo, vivemos várias fases, ora de euforia democrática, ora de crises muito profundas, como foi no Fora Collor. O que mais marcou todo esse período foi que o regime burguês em nenhum momento esteve ameaçado. Esse é o desafio para os revolucionários, uma vez que com a queda do falso socialismo do Leste Europeu, os trabalhadores e a vanguarda estão desorientados, mesmo com todo desgaste da democracia burguesa.
Sob a democracia burguesa, os governos civis fizeram coisas que nem os militares se atreveram. Como os ataques violentos às conquistas históricas dos trabalhadores, a entrega das maiores e mais lucrativas estatais de todos os ramos da economia, a abertura da economia ao capital financeiro internacional, o fim da estabilidade do funcionalismo e principalmente a abertura do país aos capitalistas americanos e europeus.
Diante disso abrimos essa discussão com todos os setores que queiram manifestar-se sobre os mecanismos de dominação da burguesia, de como e onde se expressa, o papel dos revolucionários dentro da democracia burguesa, a questão eleitoral, a violência, a cultura, etc…
É certo que as liberdades democráticas são conquistas importantes para os trabalhadores. No cone sul, foram necessários meses de mobilizações, greves e enfrentamentos para conquistá-las pondo fim à anos de ditaduras. Mas não podemos em hipótese alguma entender como uma coisa em si mesma, um “valor universal”, como dizem os ideólogos da burguesia. A luta deve ser por destruir as ilusões dessa democracia, denunciar permanentemente as ciladas burguesas e reconstruir o movimento operário sobre novas bases classistas, socialistas e com independência de classe.
A esquerda, inclusive a revolucionária, com raras exceções, diante das confusões geradas pós-89, tem se perdido nesse caminho. Quando um partido e/ou uma organização, sob um regime democrático burguês, tem como centro de sua atuação a intervenção nas instituições do Estado, quando passa a atuar de acordo com as regras do jogo é um claro sinal de capitulação e adaptação ao sistema burguês pois passa a vender a idéia de que é possível resolver os nossos problemas pelo processo eleitoral, dentro dos marcos do capitalismo.
Já é comum ouvir no movimento o nome dos candidatos, as articulações para coligação com a esquerda, de que é possível eleger, enfim já estão perfeitamente sintonizados com o processo eleitoral. É dessa forma que acontece a adaptação, ou seja, se acostuma, ao regime democrático, transforma a cédula em uma pretensa arma superior às lutas diretas, enfim toda a atuação tem como referência a eleição. A denúncia é no campo eleitoral – de que o governo não fez isso, não fez aquilo – Não denunciando as mazelas do capitalismo, do questionamento do processo eleitoral como um todo, uma manobra da burguesia. Porque temos eleição de 2 em 2 anos? É porque a burguesia é boazinha? Ou é para iludir permanentemente os explorados.
A questão do Fora FHC e o FMI é um exemplo, onde um setor da esquerda propõe como alternativa a proposta de eleições gerais já. Claro que queremos que FHC e o FMI estejam o quanto mais distante, mas daí dizer que as urnas podem dar a resposta, é outra questão. Isso que é capitulação! Essa campanha tem importância pelo fato de que, na prática, vai contra o regime. E se na hipótese de que milhares saiam às ruas, proporemos uma saída dentro do regime para este se recompor como foi o caso do Fora Collor?
Nós não compartilhamos dessas idéias. Para nós a luta é contra o sistema capitalista e as formas de dominação. E a luta pelo poder para os trabalhadores é o problema central. Somos nós quem produzimos as riquezas, a cultura e que geramos o desenvolvimento da sociedade. Somos nós, trabalhadores, que devemos governar diretamente, com a nossa auto-organização. Devendo começar nos bairros e nas fábricas e se estender por todo o país e pelo mundo. O Estado se modifica por baixo e nunca pela superestrutura.
HIP-HOP: Cultura e Política
Marcelo Marques
O próprio capitalismo cria e arma os seres que corroem as estruturas deste sistema podre.
O imperialismo americano ao invadir a América Latina corrompendo todo o cotidiano de sua vida, às vezes atira pela culatra. A indústria de cultura de massa ao impor o idioma inglês como referência de comunicação trouxe a reboque, uma nova linguagem altamente nociva aos seus interesses consumistas.
Como toda linguagem de periferia “que sobrevive à estatísticas” o Hip-Hop também tem seu lado violento.
Rimando em letras incendiárias o rap mostra sua cara e lembra à pequena população do Shopping Center que o garoto do semáforo também sonha, tem orgulho e não está disposto a aceitar apenas centavos. Como um pesadelo para a classe média (em extinção) este garoto não está só e reconhece que faz parte de um exército de marginalizados mundo afora.
Como porta-vozes da periferia, seja ela paulista (Racionais), carioca (MV Bill) ou da “quebrada” de Brasília (G.O.G.) atiram com sua metralhadora giratória em todos os valores burgueses, atingindo tanto o sonho do carro importado, quanto a ilusão da representatividade política dentro do congresso ou na assembléia legislativa mais próxima.
Exigindo tomada de posição de todos que escutam sua “batida”, não permite vacilo prova o alto custo dos cortes no orçamento social, que toda propriedade é um roubo, já que os “manos” nunca tiveram nada e só conhecem a lei da sobrevivência.
Dançando Break e grafitando seu dia a dia, forma-se um grande “tráfico de informações” estendendo seus tentáculos pelas periferias de todo continente, influenciando bandas como: Rage Against the Machinne (apoio declarado ao E. Z. L. N. e ao M. S. T.), Charlie Brown Jr e grande parte da nova geração musical contemporânea a mesclar guitarras e batidas com letras ácidas e protestos práticos, inclusive apoio à formas anti-capitalistas de participação política.
Uma nova consciência internacionalista brota do gueto: TODOS SÃO MANOS.
ABC – São Paulo: As raízes do hip-hop
Carlos Wellington – ABC – São Paulo
Os efeitos desse sistema excludente, que adota procedimentos obscuros, revelam-se muitas vezes criminosos, outras vezes assassinos. Nas favelas e periferias, a agressividade dessa violência é dupla, não se limita a fatores de abandono. Os grupos do status quo (formado por policiais) punem àqueles que faltam com seu dever. O dever de permanecer passivo na miséria, num sistema capitalista totalmente excludente.
Será que queriam os burgueses (que são responsáveis por esse sistema) que todos os jovens se conformassem com os remédios suaves – carnaval, copa do mundo, pagode, religião e tantos outros anestesiantes – que são bondosamente doados aos miseráveis promovidos pelos meios de comunicação?
Mas por trás de todo esse mascaramento da realidade, desse espetáculo preguiçosamente engolido (o qual a esquerda tradicional participa ativamente onde ela “gentilmente” administra o capitalismo), pesa o sofrimento humano, um sofrimento real, gravado no tempo, naquilo que tece a verdadeira história sempre ocultada. Sofrimento irreversível das massas sacrificadas, quer dizer, de consciências torturadas e negadas uma por uma.
Para os jovens que estão destinados de antemão à exclusão, o desastre é sem saída e sem limites, nem mesmo ilusórios. Toda uma rede rigorosamente tecida, que já é quase uma tradição, lhes proíbe a aquisição não só de meios legais de viver, mas também de qualquer razão homologada para fazê-lo. Marginais pela sua condição, geograficamente definidos antes mesmo de nascer, reprovados de imediato, eles são os “excluídos” por excelência. Virtuoses da exclusão! Por acaso eles não moram naqueles lugares concebidos para se transformar em guetos? Guetos de trabalhadores antigamente, já que hoje a fonte de trabalho secou. Por acaso esse endereço em face de nossos critérios sociais não indica: “terras de ninguém” ou “terras dos que não são homens” ou mesmo de “não homens”?
É imediata e flagrante aqui a situação de injustiça e de desigualdade, sem que os interessados sejam os responsáveis, sem que eles próprios tenham-se colocado nessa situação. Seus limites já estavam fixados desde antes de nascer, por esse sistema capitalista.
A sociedade indiferente a situação desperta assustada, escandalizada: “eles não se integram; eles não aceitam tudo com a gratidão que era de se esperar” – pelo menos sem se debater, sem sobressaltos aliás inúteis, sem infrações ao sistema que os expulsa, que os encarcera na reivindicação de algo que ele não pode lhes dar (o trabalho). Bloqueados numa segregação não formulada, “eles” têm a indecência de não se integrar!
Mas integrar-se a quê? Ao desemprego, à miséria? À rejeição? Às vacuidades do tédio, ao sentimento de ser inútil, ou até mesmo parasita? Ao futuro sem projeto? Integrar-se! Mas a que grupo rejeitado, a que grau de pobreza, a que tipos de provas, que sinais de desespero? Integrar-se a hierarquias que, de imediato, relegam ao nível mais humilhante sem dar jamais a possibilidade de fazer as provas? Integrar-se à ordem capitalista que, de ofício, nega todo direito ao respeito? A essa lei implícita que quer que aos pobres seja concedida vida de pobre, interesse de pobre (isto é, nenhum interesse) e trabalhos de pobre (se houver trabalho)?
É aí, nesse vazio, nesse estado vago sem fim que destinos são aprisionados e desagregados, que se afogam energias, que se anulam trajetórias. Aqueles cuja juventude, impotente, caiu na armadilha da marginalidade oficializada, têm consciência disso e preferem não demorar a enfrentar a seqüência de suas vidas.
Mas é também aí que parte desse vazio é preenchido de forma subversiva (ameaçadora à ordem vigente). Os excluídos agora tem um movimento cultural que pode (tende para isso) se converter em algo desestabilizador do sistema capitalista. Algo político. Ou melhor, algo politizadamente político (tende para isso) já que toda e qualquer forma de ação é política! Só que o movimento Hip-Hop tende a ser aquela ação que não aceita a sua exclusão, da forma que descobrirão que a única forma de se incluírem na sociedade é excluindo (pondo abaixo) o sistema capitalista. E assim vingando os mortos, vítimas desse sistema. Mortos muitas vezes deixados nas ruas com seus duros paralelepípedos, mas bem mais macios que esse sistema capitalista.
O nascimento de um novo movimento operário
João Emiliano- militante do Contra a Corrente Fortaleza- CE
O velho movimento operário está em crise e em crise terminal. Aquele movimento operário surgido após a segunda guerra, baseado nos grandes sindicatos, nos partidos parlamentares ditos operários e numa estratégia nacional de luta já não consegue, de nenhum modo, dar respostas aos problemas atuais. Este era um modelo próprio ao período de prosperidade do capitalismo (1945-73), no qual as organizações operárias compunham o esforço de reconstrução do capitalismo (na Europa) ou de modernização retardatária (como na América Latina). Particularmente em nosso continente, a função modernizadora (nacional-desenvolvimentista) da antiga estratégia do movimento, sob controle ou não dos velhos PCs ou outras correntes nacionalistas, baseava-se fundamentalmente na idéia de um desenvolvimento nacional independente a partir de um papel soberano do Estado, o qual deveria participar da economia, desenvolvendo-a e distribuindo rendas. Era uma função histórica semelhante ao que cumpriam, na Europa, os partidos socialistas e comunistas e suas centrais sindicais.
A mundialização da economia que nada mais é do que o controle do mercado mundial por imensas corporações transnacionais deu uma imensa liberdade de movimento ao capital, representando um poder frente ao proletariado ao qual este não pode se contrapor senão superando completamente a estratégia e os métodos de luta tradicionais. Sob este aspecto, o que está em crise não é uma ou outra experiência de luta proletária, uma ou outra corrente política: mas o conjunto do antigo movimento operário, em todos os cantos do mundo.
Como basear a luta proletária nas lutas de categorias, quando a condição para a implantação das sedes das transnacionais são precisamente os baixos salários? Como basear nos sindicatos a organização da classe, se a maioria da classe está desempregada ou em situação precarizada? Como buscar politizar as lutas proletárias e populares tendo como alvo central os governos e Estados nacionais, se o poder real hoje (inclusive no que toca à legislação trabalhista, ambiental, científico-tecnológica etc) está não mais nos Estados nacionais, mas, nas corporações monopolistas transnacionais e suas instituições (OMC, BM, FMI e acordos comerciais regionais)?
O que explica o esvaziamento das antigas formas de organização e de luta de massas, e inclusive a crise das correntes políticas, é, antes de tudo, essas mudanças na realidade e a incapacidade do movimento tradicional de corresponder às novas exigências.
O interessante, no entanto, é que, na crise, está nascendo um novo movimento operário. A manifestação em Seattle (EUA), em novembro do ano passado, durante a abertura da nova rodada do milênio da OMC é um exemplo disso. 5O mil pessoas, de diversas partes do mundo e de diversos setores sociais, atrasaram, durante duas horas, o início da reunião; presidentes e ministros de diversas partes do mundo ficaram presos nos hotéis, sem segurança para saírem; outros, só entraram no Teatro Parammount, onde se realizaria a abertura oficial do evento, pulando janelas, como ladrões de galinha; Clinton foi aconselhado a adiar a decolagem de seu avião. Nas ruas, completamente ocupadas pelas massas, as pessoas festejavam a demonstração de força popular. Uns cartazes diziam: Fechamos a OMC! Um jovem trabalhador, fotógrafo, declarava ao repórter do Le Monde Diplomatique: Viemos aqui porque não queremos mais ser tratados como coisas. Não somos mercadorias. Quem estava lá? Jovens trabalhadores, sindicalistas alternativos, ecologistas, movimentos de mulheres, movimentos de gays e lésbicas, estudantes, pescadores, pequenos agricultores, movimentos de direitos humanos… O que reivindicavam? Contra os baixos salários, o desemprego, o trabalho infantil, o trabalho escravo no Terceiro Mundo, a extinção das tartarugas… E reivindicavam contra quem? Contra a OMC que, segundo afirmavam, é o verdadeiro poder das corporações… A força do movimento foi tão grande que, durante três dias, a Prefeitura local decretou toque de recolher a partir das 18 horas! O interessante, no entanto, é que este não foi a única manifestação. No mesmo dia, 30 de novembro, os sindicalistas e ambientalistas oficiais também fizeram uma pequena, sem massa, em local e ritual acordado com as autoridades… Neste cenário, defrontaram-se claramente o novo e o velho movimento operário.
A organização da manifestação de Seattle se deu a partir das iniciativas dos movimentos que compõem a AGP (Ação Global dos Povos). A AGP é uma articulação mundial, que congrega de forma horizontal e não-hierárquica, movimentos autônomos dos cinco continentes; sua estratégia principal é a unificação na ação e na reflexão dos movimentos de base que, independentes dos Estados e poderes econômicos, se baseiem na democracia direta e na ação direta tendo como alvo o combate mundial ao poder do capital transnacional. Antes dessa manifestação de Seattle, já havia impulsionado a manifestação de fevereiro de 98, em Genebra, durante a reunião do G-7, e, em 18 de junho do ano passado, um dia de luta internacional contra os centros do capital financeiro. A sua próxima atividade é o chamado a realizar em 1º de maio próximo uma nova Ação Global Contra o Capitalismo.
O que há de novo nessa experiência é tanto uma nova estratégia, como novos métodos de organização e ação. Uma estratégia anticapitalista que é inseparável do internacionalismo; um método de luta baseado na ação direta, que é inseparável da autonomia das formas de organização de base. Fundamentalmente, o que esta nova experiência demonstra é a possibilidade de ultrapassarmos positivamente o corporativismo e o nacionalismo, como também a idéia de que a força do movimento depende de quem está na sua direção. Essas novas formas de movimento, no centro e na periferia do movimento, está buscando se basear na auto-organização, numa relação horizontal, sem a velha divisão de trabalho entre dirigentes e dirigidos, especialistas e executantes. Busca ultrapassar a idéia do combate econômico centrado no salário e demonstra que o domínio da economia sobre a vida humana é que é o problema, e problema que se manifesta em todas as áreas da vida social: os direitos humanos, a cultura, a opressão sobre as mulheres, o trabalho infantil, a crise ecológica… como também sobre o desemprego, os baixos salários, os direitos trabalhistas. Está questionando, portanto, o próprio mercado: a mercantilização da vida, das pessoas, da cultura… E não tem mais a ilusão de que o poder está nos Estados nacionais: como tornou-se visível, o Estado não pode mais ser a via pela qual busquemos a emancipação da humanidade; do que se trata, como diz o manifesto da AGP, é colocar nas mãos dos povos os poderosos meios de vida que hoje estão nas das corporações, estabelecendo relações igualitárias e solidárias, sem o objetivo de lucro.
Será que conseguiremos aprender com as novas experiências, nós que viemos de uma tradição marxista que privilegiou sempre as formas tradicionais do movimento operário? Nós que, a despeito do nosso internacionalismo professado, buscamos sempre basear nossos esforços numa estratégia de luta pela tomada do poder de Estado nacional? Nós que sempre acreditamos que o central era nos catapultarmos como direção dos trabalhadores e construirmos nossas próprias organizações dirigentes? Será que não está na hora de estabelecermos uma relação horizontal com o restante da classe, tendo em vista contribuirmos para a sua auto-organização? Não estará na hora de buscarmos dar essa contribuição através das múltiplas formas que o próprio movimento espontâneo da classe está nos apontando: o trabalho de cultura proletário, grupos operários autônomos, organizações autônomas dos precarizados etc? Enfim, não estará na hora de compreendermos na sua radicalidade a afirmação de que a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores?
A História … é outros 500!
Alex e Ira (ABC)
Com a comemoração eufórica dos 500 anos do Descobrimento do Brasil, os meios de comunicação e mídia não produzem somente uma falsificação da nossa história, mascaram todo o processo de invasão e ocultam a real situação de exploração, discriminação, preconceito, violência social, destruição de todos os valores humanos e coletivos que sofremos.
A outra marca da campanha Brasil – 500 Anos é seu clima de otimismo conformista sobre o futuro. É o que está embutido na idéia de que o Brasil é um país jovem (?), globalizado, integrado ao primeiro mundo e rumo ao desenvolvimento, o que poderia ser constatado na disseminação de computadores, celulares, TV´s a cabo, turismo, que povoa os sonhos e a vida dos que ainda podem consumir.
Mas, se formos ver, esse otimismo conservador não tem a menor base na realidade dos milhões que vivem do seu trabalho, hoje mais explorados, inseguros e infelizes do que nunca.
O desemprego estrutural bate novo recorde e o rebaixamento dos salários e direitos são a tônica no Brasil como em toda América Latina. Com o emprego de novas tecnologias, terceirizações, etc a super-exploração dos capitalistas ocorre sobre um número menor de trabalhadores com jornadas e ritmos extenuantes e nos mostra uma face bem mais monstruosa do que vemos na telinha ou nos sambas-enredos do Carnaval.
O aumento da discriminação e segregação dos negros, problemas como as drogas, chacinas executadas por grupos de extermínio ou diretamente pela polícia vão se tornando cada vez mais normais.
Quanto ao que restou das comunidades indígenas, o capitalismo lhes impõe a adaptação às suas regras ou a morte, o que já está levando à destruição completa de identidades e tradições muito ricas, mas sem valor para o capital.
Um menor olhar crítico também basta para deixar qualquer um perplexo com as catástrofes urbanas e camponesas (enchentes, desabamentos, poluição ambiental, desmatamentos, efeito estufa, destruição da camada de ozônio) criadas pela civilização do capital. Projetar nosso pensamento para o futuro nos faz sentir um calafrio…A barbárie está batendo à nossa porta!
Sendo assim, toda a euforia dos meios de comunicação a respeito da situação e das perspectivas do Brasil e do mundo só pode corresponder aos interesses dos grandes empresários que tentam passar a imagem de que aqui tudo está bem. No momento em que os 10 mais ricos controlam 50,6% da renda nacional (maior taxa de concentração do mundo).
Como todo rico emergente, procuram festejar o hoje e não pensar nem nos outros seres humanos, nem no amanhã. Presos à sua própria realidade de parasitas, comemoraram o aniversário de um processo de conquista e pilhagens, passando a idéia de que os seus êxitos de dominação são de todos. Querem nos contaminar com suas idéias e valores.
Essa farsa pode ser até eficaz por um período, até que venham os próximos momentos de agravamento da crise econômica hoje varrida para debaixo do tapete.
Hoje, as classes dominantes podem comemorar principalmente o fato de que os trabalhadores e demais explorados brasileiros das diversas etnias e origens não desenvolveram ainda uma alternativa unificada e internacionalizada de resistência e muito menos um projeto de sociedade alternativa ao capitalismo.
Mas, a história não deu sua última palavra. Atravessado por contradições insolúveis e sem oferecer qualquer perspectiva de um futuro digno, esse sistema não é indestrutível como procura se apresentar.
O movimento subterrâneo de experiências e descontentamento se desenvolve e em toda parte vemos que os explorados se recusam a perecer sem lutar. Ainda que desorientada, nossa classe começa a reagir, inventando diversas formas de resistência e organização (os sem-terra, o movimento Hip-Hop, as lutas dos camelôs, dos perueiros, dos caminhoneiros, lutas essas que já não se enquadram nos esquemas sindicais envelhecidos e corrompidos.
Devemos reconhecer que, ao estarmos deste lado, as tarefas não são nada fáceis. Mas não podemos cair no desânimo ou no conformismo. Tão pouco o desespero e o imediatismo conduzirão a bons resultados. É preciso livrarmo-nos dessa herança escravista. Não podemos levar mais 500 anos para mudarmos o rumo de nossa história.
Pensar e lutar por uma saída frente a atual da situação dos explorados e oprimidos exige estudo e atuação nas diversas formas de resistência que se constituíram e ainda sobrevivem contra o processo de dominação e exploração que se implantou no país nesses 500 anos.
As lutas dos indígenas para sobreviverem e dos negros com sua recusa a viverem como escravos; as experiências comunitárias como os quilombos, aldeias indígenas; as lutas dos imigrantes por melhores condições de trabalho e remuneração; as insurreições como a Cabanagem, Canudos, a Balaiada, etc; as lutas da jovem classe operária influenciada pelas idéias libertárias do anarquismo italiano, etc… as experiências das comunidades e guerrilhas camponesas pela terra; a resistência contra a ditadura militar; as lutas sindicais dos anos 70 e 80,etc. As lutas das mulheres pelo fim regime patriarcal, das comunidades camponesas e tantos outros que surgiram nesses anos todos de dominação constituem um imenso patrimônio, geralmente menosprezado pelas esquerdas.
Hoje, cabe aos novos movimentos que se colocam em cena, se coordenarem e atuarem sobre os trabalhadores industriais e de outros setores fortes da economia, no sentido de influenciá-los com suas bandeiras. Também será necessário que os segmentos tradicionais da classe que vive do seu próprio trabalho, por sua vez, estabeleça a unidade com todos esses setores, incorporando suas reivindicações e várias de suas experiências.
A expropriação das máquinas, técnicas e ciências desenvolvidas pelo capitalismo, transformando-as e colocando-as sob a gestão direta e coletiva dos trabalhadores, direcionando o seu uso para o bem estar humano e não para o lucro, é a única forma de assimilar os progressos desenvolvidos sob o capitalismo e fazer com que os estragos humanos e ambientais provocados por esses 500 anos sejam revertidos.
Por outro lado é necessário combatermos o nacionalismo desenfreado e estabelecermos vínculos na direção dos outros países e povos da América Latina, que também são fruto de uma mesma cultura de dominação. Seria necessário retomar a idéia de uma Segunda Libertação latino-americana, desta vez a libertação da dominação capitalista.
Ao nosso ver, duas tarefas hoje se destacam nessa direção:
- A participação social nas lutas e experiências da classe trabalhadora como seus aliados e impulsionadores e não como seus guias; como seus interlocutores e não como seus mestres; lutando para ajudar a produzir a consciência e uma saída de classe e não como transmissores de uma suposta consciência que julgamos possuir.
- O reagrupamento internacional dos revolucionários que ganha sentido como forma de multiplicarmos a força e influência das idéias anticapitalistas, socialistas e libertárias com o objetivo de se construir sínteses e não dogmas.
Na verdade o projeto Brasil, 500 anos é a tentativa mais violenta de demonstração de uma nação sem conflitos às custas da falsificação da história e do ocultamento da dura realidade da nossa classe.
500 anos de extermínio e etnocídio;
389 anos de massacre ao negro e a cultura afro;
111 anos de exploração da classe trabalhadora e imposição da cultura capitalista.
Não podemos negar a nossa história, mas, podemos mudar o seu rumo!
O remédio amargo do capitalismo
Ney Nunes – Coletivo Bandeira Vermelha/ RJ
Os aumentos nos preços dos remédios foram tão violentos nos últimos cinco anos, que além de causarem a revolta nos consumidores, obrigaram o Congresso e o Governo a se posicionarem diante do que está conhecido na mídia como o escândalo dos remédios. Até mesmo uma CPI dos medicamentos foi criada na Câmara Federal, e o Ministro da Saúde José Serra veio a público denunciar os abusos da indústria farmacêutica.
Levantamentos feitos pelos Conselhos Regionais de Farmácia e pelo próprio ministério da saúde, apontam aumentos de até 200% acima da inflação de 1994 a 1999. Enquanto isso as matérias primas usadas na fabricação desses remédios sofriam redução de preços nos exterior. Uma exploração covarde contra milhões de brasileiros, principalmente os mais idosos obrigados a usar os chamados medicamentos de uso contínuo.
Globalização que vem de longe
O setor de medicamentos no Brasil é um dos mais internacionalizados da economia, a abertura aqui foi intensificada na década de 70. Hoje os laboratórios que ditam os preços no Brasil são multinacionais. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Química Fina apenas 10% da matéria prima dos remédios é produzida aqui.
Os laboratórios estatais também sofreram um processo de desmonte a fim de limpar o caminho das multis, mas nos que ainda funcionam pode se ver a disparidade de preços. Exemplo são os hospitais federais no Rio de Janeiro, que gastavam R$ 5 milhões nos laboratórios privados, e para os mesmos produtos gastaram R$ 1,8 milhões em laboratórios do Estado.
Diante desse quadro o ministro José Serra e o presidente da CPI Nelson Marchezan (PSDB-RS), fazem discursos demagógicos de indignação, mas apresentam como propostas para reduzir os preços dos remédios a isenção de impostos para os laboratórios e também para a importação de matérias primas. Um verdadeiro escândalo dentro do escândalo! Essas medidas só servem para engordar mais ainda os lucros dessas empresas, reduzindo a arrecadação justamente daqueles que podem pagar. Essa é a resposta do governo FHC e das instituições políticas do capitalismo, cúmplices e agentes dessa exploração.
É preciso transformar a indignação de milhões de brasileiros com tudo o que se relaciona ao setor de saúde em uma campanha contra o capitalismo e seus agentes, é necessário romper com qualquer expectativa de saídas institucionais, construir com as vítimas desse sistema, os diversos segmentos profissionais da área, e o conjunto dos trabalhadores um programa e uma teia de organizações de luta contra a exploração na saúde! Exigir a humanização e a socialização de tudo que se relaciona à saúde pública no Brasil.
Mumia Abu Jamal: A Luta Continua!
Como resultado das manifestações pelo mundo afora, o juiz federal Willian Yohn, suspendeu, pela segunda vez, a execução do ativista negro Mumia Abu Jamal que desta vez estava marcada para o ia 02 de Dezembro de 1999.
Esta campanha internacional tem importância por vários aspectos:
- Coloca à disposição do mundo inteiro o caráter racista e parcial da justiça (?) americana. A pena de morte e racismo do Estado americano são a ponta do iceberg da exploração e opressão que os trabalhadores americanos, principalmente os negros e chicanos (imigrantes provenientes dos países latinos), sofrem diariamente nas mãos dos maiores capitalistas do mundo. Nos EUA têm ampliado a aplicação da pena de morte. Até o mês de setembro 76 pessoas foram executadas, sendo o maior índice desde 1945 e tem servido como uma ameaça aos setores mais explorados da sociedade americana, exatamente aqueles que oferecem maior risco à estabilidade americana. Dos 3500 condenados à morte 40% são negros e outros aproximadamente 40% são os chicanos. Na Pennsylvania, onde os negros é de apenas 9% da população total, dos condenados à morte 62% são negros. Das 176 ordens de execução do Estado da Pennsylvania, 100 são negros, os chamados afro-americanos.
- Mostra que a chamada maior democracia do mundo é na verdade a maior ditadura do mundo. E os atos de autoritarismo e ditatoriais não se restringem às intervenções e ataques aos povos em luta pelo mundo afora, mas também aos lutadores e ativistas dentro do Estado americano. Múmia é na verdade o bode expiatório, o exemplo que os lutadores não devem seguir, pois, senão terão o mesmo fim. Múmia esta sendo condenado por sua luta contra a opressão às populações minoritárias. Aliás, o imperialismo americano já tem uma dívida para com os trabalhadores do mundo com o assassinato covarde dos inocentes anarquistas Sacco e Vanzetti. O processo que Múmia sofre parece muito com aqueles roteiros dos filmes americanos em que provas são falsificadas, o júri é escolhido a dedo e o juiz é declaradamente parcial e racista. Só que na vida real, não basta um golpe de sorte para se descobrir as maracutaias, mas sim a ampliação e massificação dessa campanha.
- Nos últimos anos poucas campanhas alcançaram tamanha repercussão internacional, onde praticamente todas as correntes do pensamento revolucionário, de entidades estudantis, sindicais, direitos humanos e anarquistas se engajaram nesta campanha que já obteve duas vitórias parciais que foram a suspensão da execução em 95 e agora em 99. Essa campanha também tem importância pelo resgate da solidariedade internacional dos trabalhadores e povos oprimidos do mundo inteiro, que os stalinistas e burocratas retiraram do movimento dos explorados do mundo. Foram diversas manifestações pelo mundo afora como França, Alemanha, diversos Estados americanos, Equador, Argentina entre outros e no próprio Brasil aconteceram diversas manifestações.
Próximos passos
Após a suspensão provisória da pena as manifestações continuaram com maior intensidade como na embaixada americana em Brasília e nos consulados americanos no dia 21 de março, em Fortaleza que reuniu 120 pessoas. A banda Rage Against Machine, uma das mais expressivas bandas da atualidade tem colocado seus shows à disposição dessa campanha, denunciando publicamente a tentativa de assassinato contra a vida de Mumia.
Todos os militantes do movimento social, independente de sua posições políticas, devem se engajar nessa campanha para salvar a vida desse ativista, organizando em cada local ( de trabalho, de estudo, de moradia, etc…) atividades para continuar as denuncias e pressão internacional.
Mande mensagens de protesto para:
Embaixada americana:
SES 801 LT3
Brasília ; CEP 70403-900
Envie carta e/ou FAX protestando para: Governador da Pensilvania:
Thomas Ridge
Main Capitol
Building, Room 225
Harrisburn, PA 17210- USA
FAX 717- 783 1396
Manifestações de solidariedade e apoio à Mumia:
Centro de Solidariedade à Mumia Abu-Jamal
AM 8335, SCI Green, 1040 E. Rpy F. Hwy
Waynesburg, Pensilvania, PA 15370-USA.