Lei de Greve joga movimento sindical na ilegalidade
3 de janeiro de 2009
Márcio Cardoso (Bancários/SP)
No bojo das reformas neoliberais, o governo Lula do PT (Partido dos Traidores) prepara mais um duro golpe nos trabalhadores: jogar o exercício do direito constitucional de greve na ilegalidade, prevendo suspensão, compensação dos dias parados, e, pasmem, DEMISSÃO do trabalhador que participar do movimento. Começa atacando o setor público, para depois estendê-lo para o restante dos trabalhadores. Segue abaixo as principais linhas do Projeto de Lei (PL) 4497 de 2001. TODOS os servidores tanto estatutários quanto os celetistas serão afetados pela medida.
O Projeto de Lei determina que os servidores alocados em órgãos ou entidades públicas responderão nos termos da presente proposição. Tal definição do que é órgão ou entidade pública está no art. 2º, I do Projeto de Lei, que está com a seguinte redação:
. Art. 2º. Para fins desta lei considera-se:
. I- Órgão ou entidade pública: órgão da Administração direta ou indireta de qualquer dos Poderes da união, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e suas respectivas autarquias e fundações públicas.
Funcionários da Administração direta são aqueles cujo regime jurídico é o do Estatuto dos Funcionários das esferas Federal, Estadual e Municipal e estão alocados notadamente nos Ministérios e Secretarias, Câmaras e Assembléias. Já os funcionários da Administração Indireta são aqueles trabalhadores de fundações, autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista. Sendo que estes dois últimos são trabalhadores regidos pela CLT por que estão no mercado como qualquer empresa. Tais trabalhadores encontramos nas empresas como Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Petrobras.
Primeiro, cai a falácia de que o projeto só valeria para os estatutários, abrangendo trabalhadores regidos pela CLT. Dessa forma, para a cassação do direito de greve passar para a classe trabalhadora de conjunto é só uma questão de tempo, pois suas bases já estão lançadas. E começa pela vanguarda do movimento.
Conceitos e regras burguesas para a Greve
O primeiro golpe dado pelo governo foi na conceituação de greve. Segundo o Projeto de Lei, a greve é:suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, da prestação de serviços públicos subordinados à Administração (art. 2º, IV).
Isso quer dizer que, basta o patrão chamar a polícia para desfazer um piquete para que caia por terra o caráter pacífico da grave e a considere abusiva, ensejando uma série de sanções aos trabalhadores. É uma medida que inviabiliza o piquete e o enfrentamento com o patrão, pois não se permitirá uma comissão de esclarecimento na porta dos locais de trabalho.
O governo Lula chega ao absurdo de fixar a exigência de presença de até 50% da categoria na assembléia que deliberará a greve. Vai às favas a autonomia sindical. Se levado à risca o Projeto de Lei, a greve sempre será abusiva. Um exemplo disso é a greve dos bancários em 2004, que foi a mais representativa e significativa depois de 10 anos. As maiores assembléias tiveram 3000 trabalhadores. Isto representa apenas 3% da base de São Paulo, com mais de 100 mil bancários. Para a deflagração da greve, nos moldes deste Projeto, seria necessário que o sindicato fizesse assembléias no Estádio do Morumbi, único lugar da cidade que comporta mais de 50 mil pessoas, tamanha a insanidade do governo!
Outra manobra para considerar o movimento de greve como abusivo é condicioná-lo à previa comunicação ao patrão imediato, com antecedência mínima de 72 horas, ou seja, 3 dias (art.4º)! Junto com isso ataca também os piquetes:
. §1º. É obrigatória a comunicação da deflagração da greve das reivindicações dos servidores à Administração, por parte da entidade sindical, ou da comissão de negociação a que se refere o art. 3º com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas antes do início da greve.
É bom ressaltar que, historicamente, os trabalhadores sempre se pautaram pela negociação com o patrão, respaldada pela base, para conseguir conquistas ou defender direitos, sem a necessidade de um enfrentamento extremo como é a greve. Antes da greve, os trabalhadores promovem intermináveis rodadas de negociação. Somente quando os patrões se mostram irredutíveis é que os trabalhadores lançam mão do último recurso para dobrar a patronal. Novamente temos como exemplo a categoria de bancários, que na campanha salarial de 2006, após 6 rodadas de negociação, com duração de 3 meses e data base estourada, é que a greve foi deflagrada. Tendo como resultado apenas 3,5% de reajuste, diante de uma proposta inicial de 2% (a reivindicação da categoria era de 7%) .Assim, já se responde a seguinte pergunta: São necessários 3 DIAS DE ANTECEDÊNCIA para avisar os patrões sobre a deflagração da greve? Claro que não, pois é a condução natural do processo infrutífero de negociação e de intransigência dos patrões.
As medidas antipiquetes buscam acabar com a alma do movimento grevista. O piquete é utilizado para se evitar que o movimento seja minado pelos trabalhadores que não queiram aderir ao movimento e colocam em risco o interesse do coletivo. É através do piquete que se consegue adesão massiva dos trabalhadores e se esclarece a população sobre os objetivos do movimento. Mas as maldades ainda não terminaram…
Para os trabalhadores os três P´s: Prisão, Punição, e Porta da rua.
O Projeto de Lei 4497/01 institucionaliza a compensação dos dias parados para os trabalhadores que exercerem o direito legítimo e constitucional de greve. Acaba com qualquer possibilidade de adesão ao movimento, pois os trabalhadores saberão de antemão que serão punidos com a reposição dos dias parados. Geralmente a reposição é feita por meio de horas extraordinárias de trabalho, em que o indivíduo tem direito ao acréscimo de, pelo menos, 50% da hora trabalhada. É a legalização da fraude da hora-extra, conforme o art. 9º.
. Os dias de greve serão contados como de efetivo exercício para todos os efeitos, desde que, após o encerramento da greve, sejam repostas as horas não trabalhadas, de acordo com o cronograma estabelecido conjuntamente pela Administração e entidade sindical, ou comissão de negociação a que se refere o §2º do art. 3º.
E mais, constatado o abuso do direito de greve (segundo as regras do patrão) o servidor ainda se submeterá a uma suspensão de até 90 dias, que poderá ser convertida em multa de até 30 % do salário. Dependendo do conseguido o reajuste virará pó, diante de uma mordida dessa no bolso do trabalhador, por exercer um direito. É o primeiro “P” de Punição.
Os trabalhadores, infringindo as normas patronais no presente Projeto de Lei, responderão processo nas esferas administrativas, penal e civil pelos “prejuízos” causados em função do movimento. Convém aqui fazer um debate: E quando houver a radicalização do movimento por intransigência do patrão, que não tem nada a perder com a referida lei? Ele não é obrigado a sequer analisar a proposta dos trabalhadores ou repor a inflação. Por outro lado, dá carta branca para que o patrão prenda o funcionário que optou por “furar” a greve nas repartições, focando, inclusive, a pernoite no local de trabalho. Mas para isto pode-se alegar que o patrão está exercendo o direito constitucional de propriedade, não é, DEMocratas de plantão? Nestes casos, com a radicalização do movimento, por culpa da intransigência da Administração, só restaria a prisão do servidor num eventual enfrentamento com a polícia, mandada pelo patrão. É o segundo “P” de prisão.
Agora, a pá-de-cal vem com a determinação do Projeto de Lei que prevê a DEMISSÃO do trabalhador, assim que constatado o abuso do direito de greve, sempre no juízo burguês, nos casos em que haja “reincidência” no abuso. É tudo que os papagaios de “Uóchintom” sempre quiseram: Dar um pé-na-bunda daqueles que exercem a cidadania, como determina o art. 11, II do projeto de lei. É o terceiro “P” de porta-da-rua.
Breve reflexão sobre o projeto de lei.
A lei ataca o setor de vanguarda do movimento operário brasileiro, servidores públicos e os trabalhadores das empresas estatais como a PETROBRAS, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, que estão com os salários arrochados por conta do congelamento de salários imposto por FHC nos anos 90, agravado pelas perdas acumuladas no governo Lula. Tudo indica que a relação com a administração ficará ainda pior por causa do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento), que prevê reajuste ao funcionalismo de 1,5% ao ano. Só para repor a perdas dos funcionários do Banco do Brasil desde julho de 1994, os salários dos trabalhadores da estatal deveria ser reajustado em mais de 130%, por exemplo.
Mesmo diante de um quadro tenebroso, as esquerdas ainda não acordaram para o tamanho do ataque que está por vir. Não há qualquer movimentação das entidades combativas. A CONLUTAS (Coordenação Nacional de Lutas), cuja maior base de filiados está no setor público não fez nenhuma campanha ostensiva tratando deste ataque ao direito de greve como mais uma medida neoliberal. Embora tal medida faça parte das Reformas neoliberais é necessário que se dê um tratamento diferenciado ao tema, pois se com as poucas garantias já é difícil mobilizar, ficará impossível tal tarefa se levarmos em consideração que o movimento ainda está em refluxo.
E necessário disputar a consciência da população, por meio de esclarecimento, distribuição de materiais. Promover debates e definir que o governo é inimigo dos trabalhadores. Que o governo, papagaio dos EUA, inviabiliza a qualidade do serviço público por meio do desvio de verbas para garantir o superávit primário, impedindo a contratação de mais funcionários, a abertura de mais escolas e a construção de hospitais. Nós, trabalhadores, somos vítimas e não causadores dos problemas.