Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

O SEQÜESTRO DO METRÔ E O SUMIÇO DA CRISE

“O seqüestro do metrô 123” é mais um típico filme de ação enlatado do cinema estadunidense. A sua peculiaridade está na alegoria que se pode fazer entre a sua narrativa e o discurso ideológico por meio do qual os políticos, economistas, jornalistas e outros gestores do sistema querem nos fazer crer que a crise econômica já foi superada.
O protagonista do filme é um executivo da companhia do metrô de Nova York (interpretado por Denzel Washington) que está sob investigação por suspeita de aceitar suborno em uma licitação. Por conta disso ele foi rebaixado para a função de controlador de tráfego, encarregado de monitorar o fluxo dos trens nas linhas e se comunicar com os maquinistas. É nessa função que ele entra em contato com seu antagonista, um ex-presidiário (interpretado por John Travolta) que seqüestra um trem e exige um resgate milionário da prefeitura. Mas não se trata de um ex-presidiário qualquer: o seqüestrador havia sido preso por aplicar um golpe em Wall Street.
Seguem-se então as piruetas tradicionais dos filmes de ação, o clássico duelo do mocinho e do bandido, a ideologia tradicional do heroísmo hollywoodiano, etc. Nessa linha, trata-se de uma produção competente, realizada por profissionais de bom nível. O diretor é Tony Scott, o irmão sem talento de um dos grandes artistas em atividade no cinema (Ridley Scott, responsável por clássicos como “Alien, o 8º passageiro” e “Blade Runner”, além de uma longa coleção de obras acima da média, como “Os duelistas”, “Chuva Negra”, “1492”, “Telma e Louisie”, “Gladiador”, entre outros). Mesmo sem o talento do irmão, Tony Scott já emplacou um mega-sucesso de bilheteria, o icônico “Top Gun”, filme paradigmático da década de 1980 e seu “revival” da Guerra Fria, com a apologia explícita do aparato militar estadunidense, embalada no clichê do herói rebelde romântico.
Em “seqüestro do metrô 123” temos outro tipo de discurso ideológico, adequado a uma época de crise econômica.
O herói é um funcionário público civil, apesar de também pegar em armas no final. Isso representa uma defesa do papel do Estado ao supostamente tirar a economia estadunidense da crise (sem no entanto abrir mão das guerras no Oriente Médio).
O vilão da história é um especulador do mercado financeiro. Ou seja, a causa da crise são as “maçãs podres” de Wall Street, os banqueiros inescrupulosos que transformaram a economia num cassino. A mensagem é que, expurgando-se essas maçãs podres, o sistema vai voltar a funcionar normalmente. Não há nada de errado com o capitalismo, apenas com alguns indivíduos problemáticos.
O herói da história é um negro, assim como o atual presidente estadunidense é negro. O herói cometeu um erro no passado, assim como o governo estadunidense (que praticou torturas, prisões ilegais, morte de civis inocentes, entre outros crimes de guerra.) cometeu. O combate ao vilão redime o herói de seus crimes, assim como Obama acoberta os crimes dos seus antecessores. O prefeito é um político tradicional, demagogo, mulherengo, etc., que não está concorrendo à reeleição, assim como os republicanos conservadores cederam o bastão a Obama e se retiraram para os bastidores, para voltar quando o serviço sujo de administrar a crise tiver sido feito. Um encobre os crimes do outro, uma mão lava a outra, e estamos conversados. O mocinho do filme pode voltar para casa feliz, como se nada tivesse acontecido.
O resumo da ópera é que o Estado salvou o capitalismo. Um conto de fadas para quem acredita num mundo de mocinhos e bandidos “made in Hollywood”. No mundo real, é preciso mais do que marketing e demagogia estatista. A crise continua, o capital fictício foi estocado nos cofres públicos, o Estado socializou os prejuízos das falcatruas privadas, trabalhadores perderam seus empregos, suas casas, seus salários e seus direitos, as guerras continuam no Oriente Médio, golpes de Estado na América Central, bases militares na Colômbia e a IV Frota estadunidense de olho no nosso pré-sal, e Lula, em conluio com Sarney e outros caciques, está loteando o pré-sal para as transnacionais, garantindo uma fatia para que a burocracia petista possa continuar anestesiando as massas com bolsa-esmola, e assim eleger Dilma.
O show vai continuar, enquanto não dermos fim ao seqüestro das consciências.

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A Internacional

De pé, ó vítimas da fome!
De pé, famélicos da terra!
Da idéia a chama já consome
A crosta bruta que a soterra.
Cortai o mal bem pelo fundo!
De pé, de pé, não mais senhores!
Se nada somos neste mundo,
Sejamos tudo, oh produtores!

Refrão (bis)

Bem unidos façamos,
Nesta luta final,
Uma terra sem amos
A Internacional.

Messias, Deus, chefes supremos,
Nada esperemos de nenhum!
Sejamos nós quem conquistemos
A Terra- Mãe livre e comum!
Para não ter protestos vãos,
Para sair deste antro estreito,
Façamos nós por nossas mãos
Tudo o que a nós diz respeito!

Refrão (bis)

Crime de rico a lei o cobre,
O Estado esmaga o oprimido.
Não há direitos para o pobre,
Ao rico tudo é permitido.
À opressão não mais sujeitos!
Somos iguais todos os seres.
Não mais deveres sem direitos,
Não mais direitos sem deveres!

Refrão (bis)

Abomináveis na grandeza,
Os reis da mina e da fornalha
Edificaram a riqueza
Sobre o suor de quem trabalha!
Todo o produto de quem sua
A corja rica o recolheu.
Querendo que ela o restitua,
O povo só quer o que é seu!

Refrão (bis)

Fomos de fumo embriagados,
Paz entre nós, guerra aos senhores!
Façamos greve de soldados!
Somos irmãos, trabalhadores!
Se a raça vil, cheia de galas,
Nos quer à força canibais,
Logo verá que as nossas balas
São para os nossos generais!

Refrão (bis)

Somos o povo dos ativos
Trabalhador forte e fecundo.
Pertence a Terra aos produtivos;
Ó parasitas, deixai o mundo!
Ó parasita que te nutres
Do nosso sangue a gotejar,
Se nos faltarem os abutres
Não deixa o sol de fulgurar!

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Avatar: revolução e paradoxo da técnica

    As revoluções da história do cinema

    Periodicamente, a cada uma ou duas décadas, o cinema passa por revoluções que atualizam sua capacidade de funcionar como a arte típica da sociedade capitalista moderna e expressar seus dilemas e contradições. Esbocemos sumariamente algumas dessas revoluções:
    – A primeira delas foi a própria invenção do cinema como veículo para contar histórias, saindo do submundo das curiosidades circenses para se tornar um ramo independente da indústria cultural com regras, métodos e cânones próprios. Esse processo de construção do cinema como instrumento da arte narrativa passa pelas criações de Méliès, Griffith, Chaplin, Eisenstein, o movimento expressionista, até alcançar a maturidade com Orson Welles e seu “Cidadão Kane”.
    – A invenção do cinema falado no fim dos anos 1920.
    – A introdução das cores no fim dos anos 1930.
    – O aperfeiçoamento nas técnicas de projeção nos anos 1950 (CinemaScope, Cinerama, 3D), na tentativa de fazer frente à concorrência da televisão.
    – A revolução temática impulsionada pela explosão das cinematografias não-hollywoodianas (neo-realismo, nouvelle vague, cinema novo, Fellini, Kurosawa, Bergman, Kubric, etc.) no pós-II Guerra e nos anos 1950.
    – A chegada dessa revolução temática a Hollywood pelas mãos da contra-cultura, na virada entre os anos 1960 e 70, deixando para trás a inocência dos musicais e contos de fadas com final feliz obrigatório. O cinema se tornou capaz de falar da vida de pessoas reais e abordar abertamente certas questões sociais, com marcos como “Adivinhe quem vem para jantar?”, “Sem destino”, “Uma rajada de balas”, “A primeira noite de um homem”, até chegar ao “Poderoso chefão”.
    – A revolução dos efeitos especiais entre os anos 1970 e 80, cujos maiores expoentes são as trilogias “Guerra nas Estrelas” e “Indiana Jones”.
    Conhecedores mais profundos da história do cinema poderão completar e precisar essa lista e enriquecê-la com muitos outros exemplos. Mas tal debate alongaria demais esse texto e o desviaria de seu propósito.
    Voltemos à última “revolução” indicada. O desenvolvimento dos efeitos especiais foi tido como uma resposta ao surgimento dos videocassetes (assim como nos anos 1950 fora preciso responder à massificação da televisão). Era preciso criar um espetáculo suficientemente grandioso para concorrer com o conforto do vídeo doméstico e motivar os espectadores a sair de casa para continuar freqüentando as salas de cinema.
    Na época esse fenômeno foi interpretado por Pauline Kael (reputada como a maior crítica de cinema estadunidense) como a verdadeira morte do cinema, pois os filmes passariam a estar cada vez mais baseados nos efeitos visuais do que na história.
    Coerentemente com essa interpretação “apocalíptica”, vimos cada vez mais as salas de projeção serem invadidas por filmes de ação, aventura, fantasia, ficção científica e histórias em quadrinhos, que se sustentam em efeitos visuais e secundarizam a expressão da realidade humana. Assim como o cinema deslocou o teatro para uma espécie de gueto habitado por remanescentes cultuadores das antiguidades culturais, o cinema de efeitos especiais transformou os filmes que tratam de pessoas reais num segmento apreciado por uma restrita tribo de cinéfilos, seguidores de produções independentes, européias, asiáticas, sulamericanas, etc.
    
    A obra de James Cameron

    Toda essa digressão sobre a história do cinema se propõe a preparar o terreno para a tentativa de localizar o significado do filme “Avatar”, de James Cameron. Passemos rapidamente em revista a obra desse diretor. Cameron foi um dos protagonistas da revolução dos efeitos especiais com “O Exterminador do Futuro”, de 1984, obra impulsionada por uma história originalíssima, de profundo impacto e marcante influência no imaginário da época (influência que perdura até hoje), culturalmente representativa do último surto da Guerra Fria e embalada por uma narrativa de suspense bastante eficiente, elementos que o tornam um clássico. A partir desse sucesso inicial, Cameron desenvolveu uma carreira pouco prolífica, mas repleta de títulos que o tornaram sinônimo de ambição e inovação: “Aliens, o resgate”, “Segredo do abismo”, “O Exterminador II”, “True Lies”, “Titanic” e agora “Avatar” (tornaram-no também titular da minha lista pessoal de diretores preferidos, fato que não tem a menor importância, mas para quem ficou curioso aqui vai: Martin Scorcese, Ridley Scott, Oliver Stone, Tim Burton e David Fincher).
    A curta filmografia de Cameron inclui os 2 filmes de maior bilheteria da história (o recorde de “Titanic” estava sendo superado por “Avatar” no momento em que este comentário era finalizado), fato este sim da maior relevância para os executivos de Hollywood e para a votação dos prêmios Oscar. E tal filmografia inclui ainda os marcos de mais duas revoluções na história do cinema, ou pelo menos dentro da atual fase da história:
    – “Exterminador II”, primeiro exemplar de utilização maciça e bem-sucedida de imagens geradas em computador (conhecidas pela sigla em inglês “CGI”), que causou escândalo na época pelo seu elevado custo de produção (mais de U$ 100 milhões, marca esta tornada rotineira a partir de então).
    – O próprio “Avatar”, filme quase inteiramente feito em CGI e concebido para ser apreciado em 3D.

    O paradoxo da técnica

    No que se refere à técnica cinematográfica, “Avatar” é indubitavelmente um salto adiante. As diversas revoluções técnicas do cinema citadas acima acrescentaram sucessivos aperfeiçoamentos à sua capacidade de funcionar como uma armadilha sensorial que suspende o espectador da sua relação com o mundo real e o arremessam no universo da fantasia. A sala escura, a tela gigante, a luz em que brilham os astros e estrelas, o volume ensurdecedor do som, a trilha sonora cuidadosamente arquitetada para conduzir as emoções, o ritmo da edição, a profusão dos efeitos especiais, ganharam nas últimas décadas a companhia das imagens em CGI e no caso em questão, da profundidade em três dimensões. Essas sucessivas inovações técnicas, nas quais aliás Cameron tem demonstrado inigualável aptidão, dotaram o cinema das ferramentas necessárias para reproduzir na tela as fantasias mais delirantes que o cérebro for capaz de criar.
    Os elementos criativos que povoam a história de “Avatar” (colonização interplanetária, engenharia genética, controle da mente sobre outro corpo, raças de humanóides descendentes de felinos com 4 metros de altura e ossos de fibra de carbono, que moram numa aldeia-árvore e são capazes de se comunicar com animais e vegetais, que cavalgam em dragões e voam entre montanhas flutuantes) são lugares-comuns em vários nichos da ficção científica, como os contos da lendária revista de quadrinhos alternativos “Heavy Metal”. Claro que, para tornar o filme palatável para as grandes audiências, Cameron teve que retirar quase todo o sexo, violência, provocação política e amoralidade que caracterizam aquela publicação, retirando também a vulgaridade e futilidade em que os elementos acima costumam vir empacotados na revista. “Avatar” é Heavy Metal em embalagem da Disney.
    A simplicidade quase banal da história e a falta de originalidade tem rendido a Cameron uma série de processos por plágio. Entretanto, a confiança do diretor em sua capacidade técnica o fez desdenhar impavidamente esses contratempos insignificantes e se dar ao luxo de se esbaldar com o brinquedo, dando livre curso a algumas das suas obsessões típicas já exploradas em filmes anteriores: o ambiente militar, a ética dos soldados, a parafernália tecnológica armamentista, os limites da ciência (e as criaturas bioluminescentes, como o absurdo “inseto-cóptero” que passeia no filme), etc.
    “Avatar” representa a chegada ao patamar histórico em que qualquer coisa que pode ser imaginada pode também ser filmada de modo tecnicamente convincente, o que coloca em pauta uma outra questão: o hiper-realismo proporcionado pela técnica cinematográfica acrescenta credibilidade à fantasia ou destrói a sua fecundidade, já que não deixa nada ao espectador para ser livremente imaginado? Ou dito de outra forma, porque o cinema fantástico-hiper-realista deve ser considerado um avanço em relação ao teatro de bonecos, se este pode ser tão eficiente quanto aquele na sua tarefa fundamental, que é contar uma história?
    O culto da novidade e da técnica como substitutos da vida é mais um sintoma da patologia social contemporânea, da qual “Avatar” é mais uma confirmação. Mas é uma confirmação invertida, pois a moral da história é justamente… a volta à natureza!
    Esse paradoxo é o grande achado de “Avatar”. O homem adquire a capacidade de viajar pelo espaço, conservar-se vivo em sono criogênico, colonizar outros planetas, construir e reconstruir corpos por engenharia genética, controlar remotamente um outro corpo, etc., mas o seu objeto de desejo é retornar à mesma relação com a natureza que os índios praticam: caminhar descalço pela floresta, beber água coletada da chuva pelas folhas das árvores, dormir em rede, contar histórias em torno da fogueira…

    A hipótese apocalíptica

    Para explicar esse paradoxo, é preciso entrar na discussão sobre a relação do cinema com o contexto político-ideológico. Dentre os filmes de Cameron, “Avatar” é uma espécie de antípoda do primeiro “Exterminador”, pois se aquele contava com uma história poderosa e efeitos que hoje podemos considerar precários, este possui um visual absolutamente deslumbrante e uma história sofrível. Ponto para Pauline Kael? Depende.
    A hipótese apocalíptica que explica a decadência artística do cinema pelo abuso da técnica dos efeitos especiais tem uma contraparte dialética que consiste no fato de que a extrapolação da corrida tecnológica para o cinema corresponde proporcionalmente à vigência dessa mesma corrida tecnológica na vida social em geral. Não é apenas o cinema que se tornou irreal, mas a vida real que se tornou cinematográfica, espetacular, fantástica, ilusória e instável, no contexto histórico do capitalismo plenamente mundializado, o que vale dizer, plenamente atravessado pela aceleração explosiva das suas contradições constituintes. Nesse sentido, o cinema mais espetacular e irreal pode ser também o produto ideológico mais típico e ilustrativo de determinados fenômenos sociais muito reais. Isso atualiza o valor crítico do cinema e da crítica de cinema, ainda que o cinema em questão venha à tela completamente despido de intenções críticas; e demonstra também a impossibilidade de se fazer crítica de cinema e de arte com alguma seriedade e coerência sem uma perspectiva crítica do conjunto da vida social.
    O paradoxo técnica X natureza em “Avatar” o torna culturalmente significativo a ponto de merecer a qualificação de obra revolucionária, para além do aspecto cinematográfico e do recorde de bilheteria. Para avaliar esse significado cultural, é preciso relacionar sua narrativa aos discursos ideológicos em voga. A história do filme, que já foi descrita como “Pocahontas no espaço”, é um completo clichê: soldado se apaixona por nativa e se volta contra os colonizadores dos quais era parte. Essa mesma história já foi contada antes muitas outras vezes, merecendo destaque pela profundidade antropológica e paixão humanista um outro clássico do cinema recente: “Dança com lobos” (outro fato sem a menor relevância: primeiro filme que me fez chorar).
    O que torna essa narrativa culturalmente significativa é o acréscimo da questão ambiental. O ambientalismo é o bom-mocismo do século XXI. É a causa que aparentemente unifica a todos, gregos e troianos (veremos que não é bem assim nas próximas seções deste texto), o que ajuda a explicar o sucesso do filme (e o recorde de bilheteria), para além do refinamento visual. Ao colocar de um lado a defesa da natureza e de outro a sua destruição, “Avatar” fornece ao público heróis para os quais torcer e vilões aos quais odiar, e não há nada que o grande público aprecie mais do que heróis virtuosos derrotando vilões odiosos. Sem isso, não há efeitos especiais que bastem para construir um sucesso artístico e comercial dessa magnitude. Mesmo sendo rasa, banal, repetitiva, pouco criativa, a narrativa central de “Avatar” fornece ao espectador uma experiência dramática gratificante, ou seja, boa diversão.
    
    Gregos e troianos?

    A consagração artística e comercial do ambientalismo em “Avatar” (através de uma overdose de técnica cinematográfica) representa ainda uma espécie de “vingança estética” contra a era Bush. O discurso dos vilões do filme é literalmente o mesmo dos sinistros personagens que povoaram os noticiários na década de 2000, os procônsules estadunidenses no Oriente Médio e os executivos rapaces da Enron, Halliburton, AIG, Lehman Brothers e Cia. O executivo que dirige a exploração do mundo de Pandora em “Avatar” diz que tudo o que importa para os acionistas é o balanço trimestral, a mesma obsessão dos especuladores trazidos à berlinda pela atual crise econômica. O coronel que chefia a milícia particular da empresa diz que se deve “combater o terror com terror”, a mesma coisa que os Estados Unidos fizeram no Iraque e no Afeganistão (e em Guantánamo ou em outras bases secretas nas quais torturaram “suspeitos de terrorismo”) ou que Israel fez contra Gaza.
    Dando mostras do quanto está sintonizado com o sentimento anti-Bush ainda presente na opinião pública mundial, “Avatar” dá a pista dos próximos alvos da “guerra ao terror”, quando lembra que o protagonista, antes de ser mandado para o espaço, serviu na Venezuela, enquanto o coronel servira na Nigéria, ambos “coincidentemente” produtores de petróleo. Ao aterrissar em Pandora, o ex-fuzileiro paraplégico ainda acredita que na Terra as forças armadas estadunidenses estão “lutando pela liberdade”, sendo que a corrupção dos soldados no processo da colonização seria causada apenas pelo fato de estarem servindo como mercenários de uma empresa privada.
    Algumas de suas falas poderiam ter saído da boca de um veterano do Iraque dos nossos dias de crise econômica e desemprego galopante nos Estados Unidos, quando diz que seria possível reparar sua espinha para que pudesse voltar a andar, “mas não nessa economia, não com essa pensão”. Gradualmente o protagonista muda seu ponto de vista sobre o mundo de onde veio, pois passa-se para o lado dos nativos. Supera-se também aos poucos a hostilidade mútua entre o soldado e os cientistas. A separação entre o homem de pensamento e o homem de ação, entre trabalho intelectual e trabalho braçal, típica da cultura estadunidense, também é vencida no filme, conforme o soldado se torna capaz de refletir (o videolog mostra-se uma ferramenta bastante útil, mas também perigosa) e os cientistas de se engajar numa rebelião contra a corporação.
    Cameron também subverte outro padrão típico da cultura estadunidense, retirando as mulheres do seu papel subalterno tradicional e dando-lhes funções decisivas, o que aliás é um dos traços mais marcantes da sua filmografia. Em todos os seus filmes há personagens femininas fortes, que não ficam atrás dos protagonistas masculinos, seja em inteligência ou desenvoltura. Em “Avatar”, temos a cientista-chefe e até a piloto de helicóptero, mas o destaque fica para a guerreira nativa, capaz de desafiar as tradições de seu povo para unir-se ao estrangeiro por quem se apaixonou.
    Há outros traços “politicamente corretos” e pós-modernos em “Avatar”, como a concessão que se faz à religião, quando a “mãe natureza” se envolve pessoalmente no combate, enviando um exército de criaturas para enfrentar os humanos, ainda que se faça um esboço de explicação científica para a experiência mística de comunicação com a divindade-natureza vivenciada pelos Na'vi. A mesma concessão à religião, as mesmas boas intenções e o mesmo paradoxo de técnica X natureza comentado duas seções acima já foram vistos antes em “Final Fantasy”, tentativa pioneira e infeliz de substituir atores reais por CGI que fracassou estética e comercialmente. Prova de que é preciso algo mais do que boas intenções e propostas politicamente corretas para que um filme possa funcionar. “Avatar” oferece esse algo mais, expondo uma ilustração um pouco mais radical das contradições sociais.
    “Cedo ou tarde, sempre temos que acordar”, aprende o fuzileiro. A operação de exploração mineral em Pandora é uma metáfora de todas as invasões imperialistas no planeta Terra. Repete-se ali o mesmo processo que se desencadeou sobre a América, a África e a Ásia, onde se destruíram povos, culturas e ecossistemas em busca de riquezas efêmeras, com a diferença de que, na batalha de Pandora, os nativos venceram. E o público que lotou os cinemas do mundo inteiro para dar a “Avatar” o recorde de bilheteria torceu pela vitória dos nativos. Eis uma novidade ideologicamente significativa, que sinaliza a vitória política do ambientalismo.
    Entretanto, qual é a conclusão a que a vitória dos nativos pode nos levar? Devemos abandonar a tecnologia e voltar a viver como os índios? Será que “caminhar descalço pela floresta, beber água coletada da chuva pelas folhas das árvores, dormir em rede, contar histórias em torno da fogueira…” devem ser o nosso ideal de felicidade e realização humana? Todo o progresso técnico realizado até hoje deve ser jogado fora, pois representa um pecado contra a inviolabilidade da mãe-natureza? Toda a ciência, a arte, a cultura, a humanização do mundo, o conforto, são inseparáveis dos males que o homem provocou?

    Trabalho alienado e natureza
    
Para responder a essas perguntas, é preciso recorrer a uma perspectiva histórica concreta. Não existe tecnologia (nem arte, nem religião, etc.) que não esteja envolvida no contexto de determinadas relações sociais. O problema das agressões da nossa tecnologia contra a natureza não está na tecnologia em si, mas no propósito social que dirige a sua utilização. A tecnologia é apenas uma ferramenta a serviço de uma lógica social, que determina o que deve ser produzido e de que forma, e em proveito de quem. A lógica que dirige a utilização da tecnologia em nossa sociedade é a da acumulação de capital.
Portanto, não é “o homem” abstrato que agride a natureza, mas quem o faz é o homem histórico e concreto, o homem envolvido em relações de produção social e historicamente determinadas, o homem envolvido nas relações capitalistas (para as quais inconscientemente se dirige a condenação moral estetizada em filmes como “Avatar”). A relação destrutiva com a natureza (e portanto auto-destrutiva) posta em prática pelo homem é uma decorrência das relações de trabalho alienado. O paradoxo técnica X natureza que viemos debatendo se enraíza em contradições muito profundas, que requerem uma adequada contextualização antropológica e filosófica do trabalho alienado.
O trabalho é a atividade que diferencia o homem dos demais animais. O homem se torna humano por meio do trabalho, que se define como atividade previamente ideada, ou seja, consciente. Ao contrário dos demais animais, cuja atividade é inconsciente, instintiva, repetitiva e imutável, o homem altera o mundo com seu trabalho e ao fazer isso altera também a si mesmo. Por ser a única espécie capaz de alterar o mundo e a si mesmo, só o homem possui uma História propriamente dita, que é na verdade um desdobramento da história natural. O surgimento da espécie humana, com sua capacidade de trabalho, é um desenvolvimento de propriedades inerentes ao mundo natural, mas ao mesmo tempo representa o surgimento de um mundo novo, humano.
O trabalho constrói biologicamente o corpo do homo sapiens, com seu caminhar ereto, polegar opositor e cérebro superdesenvolvido, e cria o gênero humano como ser capaz de atribuir uma finalidade aos objetos e um sentido para as próprias ações. Ao satisfazer suas necessidades naturais (comer, vestir-se, abrigar-se, procriar) por meio do trabalho, o homem cria novas necessidades sociais, pois as satisfaz de modo humano. As características humanas do homem, a socialidade, a historicidade, a liberdade, a universalidade, a consciência, a linguagem, são produto do trabalho.
O trabalho é a forma especificamente humana, social e histórica, de metabolismo com a natureza. Cada ser humano está em relação com a natureza por meio de seu corpo físico, cuja existência precisa ser mantida, mas essa relação não se dá de forma imediata, pois é social e historicamente mediada pelo trabalho. O uso de recursos naturais para produzir alimentos, vestimentas, moradias, utensílios, etc., não é feito separadamente por cada indivíduo, mas coletivamente por meio da formação social da qual este indivíduo faz parte. Ou seja, o homem somente se relaciona com a natureza indiretamente, por meio de sua relação com os outros homens, com o meio social no qual desempenha algum tipo de papel produtivo e de onde recebe uma cultura.
A humanidade do homem não está dada de modo imediato na realidade histórica, ou seja, cada homem não está imediatamente unificado com a sua humanidade, da forma como estão os animais. Cada animal é imediatamente idêntico a sua espécie e capaz de fazer tudo que a espécie é capaz. O homem, ao contrário, se encontra separado de sua espécie, da sua humanidade, seu ser genérico, por conta da condição histórica da divisão da sociedade em classes e do trabalho alienado.
Assim que o trabalho se torna capaz de produzir um excedente em relação às necessidades sociais, surge uma classe social que se apropria desse excedente. Ao longo da história desenvolve-se uma luta entre as classes proprietárias e as classes trabalhadoras pela posse desse excedente do trabalho social. O controle do excedente pelas classes proprietárias transforma o trabalho numa atividade alienada, ou seja, estranha para a maior parte dos seres humanos. O homem se separa de seu ser genérico, sua humanidade, ao não poder determinar o que fazer com seu tempo de trabalho e ser forçado a trabalhar para outro. O homem se aliena da atividade do trabalho, dos produtos do trabalho, da sua relação com os outros homens, que aparecem todos como elementos externos e opressivos sobre o indivíduo; e se aliena também da natureza.

Capitalismo e destruição da natureza

Se a relação com a natureza se dá primordialmente por meio da relação social e histórica de trabalho, o trabalho alienado leva a uma relação também alienada com a natureza. Na sociedade de classes, a natureza se apresenta ao homem como ambiente externo e objeto estranho a ser controlado, dominado, usufruído e descartado, conforme os interesses da classe dominante. A natureza deixa de ser o “corpo inorgânico do homem”, como a definiu Marx, e se torna propriedade privada. Na condição de propriedade privada, a natureza pode ser usada e abusada de maneira irresponsável, pois a necessidade coletiva é desconsiderada em favor dos interesses privados.
    Na sociedade capitalista, que é a forma mais recente da sociedade de classes, a natureza mais do que nunca aparece como estranha ao homem, como puro objeto de manipulação, fonte supostamente inesgotável de matéria-prima e repositório dócil para os infinitos subprodutos da ação humana (lixo e poluição). O capitalismo simplesmente ignora que a natureza não é inesgotável nem pode suportar indefinidamente os dejetos que lhe atiramos. A lógica do capital considera apenas o curto prazo, o balanço trimestral das empresas, a cotação diária da bolsa de valores, e simplesmente despreza a sobrevivência da espécie. Como disse um autorizado representante da burguesia, o economista inglês John M. Keynes, “a longo prazo estaremos todos mortos”.
    O trabalho excedente apropriado pela burguesia é a fonte da imensa acumulação de riqueza social que tem se multiplicado desde o início da Revolução Industrial, ponto de partida do capitalismo propriamente dito. Parte dessa riqueza social apropriada pela burguesia é consumida improdutivamente em luxo e parte tem que ser necessariamente reinvestida na continuidade da produção.
    Acontece que não basta ao capitalista apenas manter a produção nos mesmos patamares do ciclo anterior de realização do capital, pois ele é forçado a produzir sempre mais mercadorias com o emprego de menos força de trabalho, para reduzir seus custos, aumentar seu lucro e vencer os concorrentes na competição por mercado. Essa é a única forma de realizar mais capital. A reprodução ampliada do capital é a força motriz que comanda as ações de burgueses e conseqüentemente também dos proletários na sociedade capitalista. Essa é a fonte material da ideologia do crescimento econômico (que não é sinônimo de desenvolvimento humano), do culto cego ao progresso e à novidade, que impulsiona um modo de vida voltado para o imediato e desprovido de sentido, em que os objetos se tornam sujeitos e os homens objetos.
    Essa lógica social da reprodução ampliada origina uma espiral infinita de aumento da produção de mercadorias. Esse aumento da produção não leva em consideração as necessidades humanas e sim a possibilidade de lucro. A sociedade capitalista cria o paradoxo de uma gigantesca capacidade produtiva usada para gerar objetos absolutamente inúteis, como bombas atômicas e bens de luxo, ao mesmo tempo em que mais de 1 bilhão de pessoas passa fome.
    Como se não bastasse o absurdo social desse desperdício e do desvio de capacidade produtiva, isso ainda é feito de uma forma tal que compromete a capacidade da natureza de suportar o impacto das ações humanas. O consumo de matérias-primas e de fontes de energia, o esgotamento da fertilidade do solo, o acúmulo de lixo, a poluição da terra, do ar e das águas chegaram a um nível tal que já ameaça a continuidade da vida. O efeito estufa, a elevação do nível dos mares, as secas e inundações, as tempestades e furacões, a escassez de água potável, as ondas mortais de frio e calor, a desertificação, a extinção em massa de espécies animais e vegetais, a multiplicação de vírus e bactérias mortais, etc.; tudo isso são conseqüências da ação irracional do capitalismo sobre a natureza.
    
    Superação da alienação    

    Na natureza, a cada ação corresponde uma reação igual e contrária. Os desastres naturais não são resultado de castigo divino, mas reações naturais aos desequilíbrios provocados pelo capitalismo. Esses desastres atacam justamente as populações mais vulneráveis, os pobres, os pequenos camponeses, os moradores das periferias das metrópoles, os segmentos mais desprotegidos da classe trabalhadora, que somente acessam uma fração insignificante das riquezas geradas pelo trabalho social.
    Os desequilíbrios não podem ser corrigidos sem uma ruptura com a lógica do capital. O capital é uma força social inerentemente incontrolável e submete ao seu controle todas as demais relações sociais. Não é possível impor restrições às atividades das grandes corporações capitalistas. Não existe Estado ou legislação capaz de impedir essas corporações de seguir explorando a natureza de forma irracional. Não existe pressão dos consumidores capaz de forçar as empresas a produzir de forma ambientalmente responsável A competição entre as empresas e a corrupção das instituições que teriam o papel de fiscalizar suas atividades abrem as portas para novas transgressões a cada remendo imposto pela pressão social.
    Para restaurar o equilíbrio natural e reverter os graves danos já causados é preciso ao mesmo tempo reverter a lógica que dirige o emprego das forças produtivas sociais, direcionando-as para o atendimento das necessidades humanas. É preciso estabelecer racionalmente o que a humanidade precisa produzir e de que forma isso pode ser produzido sem afetar a capacidade do planeta de seguir fornecendo indefinidamente os recursos de que necessitamos. Ao invés de produzir a infinidade de objetos inúteis em que estamos entulhados, o trabalho social passaria a produzir aquilo de que os seres humanos realmente precisam para viver. Isso por si só já teria grande impacto na reversão dos danos ambientais.
    Mas isso só é possível com o fim do trabalho alienado, ou seja, com a conquista do controle dos trabalhadores sobre seu tempo e seus instrumentos de trabalho. Para isso é preciso romper com a propriedade privada dos meios de produção e com a divisão da sociedade em classes. Somente uma humanidade sem classes pode se relacionar de forma racional com seu trabalho, direcionando seu tempo e recursos para produzir aquilo que realmente é necessário e considerando o equilíbrio da natureza e a continuidade da vida. Ao mudar a relação do homem com o trabalho, muda-se também a relação com a natureza.
    Para a natureza é indiferente que o planeta seja habitado por seres inteligentes ou por bactérias, pois o planeta seguirá seu curso em torno do sol, quer sejam os homens os seus passageiros ou sejam os microorganismos. Para o homem, entretanto, a preservação de certas condições indispensáveis para a sua sobrevivência, como ar respirável, água potável, terras férteis, temperaturas suportáveis, etc., deve ser resultado de sua ação consciente e coletiva. Essa ação passa necessariamente pela revolução social, pela superação da lógica do capital e pela construção do socialismo, único regime capaz de devolver ao homem o controle sobre seu trabalho, sua humanidade e sua relação racional e sustentável com a natureza.    
 

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“O sequestro do metrô” e o sumiço da crise

    “O seqüestro do metrô 123” é mais um típico filme de ação enlatado do cinema estadunidense. A sua peculiaridade está na alegoria que se pode fazer entre a sua narrativa e o discurso ideológico por meio do qual os políticos, economistas, jornalistas e outros gestores do sistema querem nos fazer crer que a crise econômica já foi superada.
    O protagonista do filme é um executivo da companhia do metrô de Nova York (interpretado por Denzel Washington) que está sob investigação por suspeita de aceitar suborno em uma licitação. Por conta disso ele foi rebaixado para a função de controlador de tráfego, encarregado de monitorar o fluxo dos trens nas linhas e se comunicar com os maquinistas. É nessa função que ele entra em contato com seu antagonista, um ex-presidiário (interpretado por John Travolta) que seqüestra um trem e exige um resgate milionário da prefeitura. Mas não se trata de um ex-presidiário qualquer: o seqüestrador havia sido preso por aplicar um golpe em Wall Street.
    Seguem-se então as piruetas tradicionais dos filmes de ação, o clássico duelo do mocinho e do bandido, a ideologia tradicional do heroísmo hollywoodiano, etc. Nessa linha, trata-se de uma produção competente, realizada por profissionais de bom nível. O diretor é Tony Scott, o irmão sem talento de um dos grandes artistas em atividade no cinema (Ridley Scott, responsável por clássicos como “Alien, o 8º passageiro” e “Blade Runner”, além de uma longa coleção de obras acima da média, como “Os duelistas”, “Chuva Negra”, “1492”, “Telma e Louisie”, “Gladiador”, entre outros). Mesmo sem o talento do irmão, Tony Scott já emplacou um mega-sucesso de bilheteria, o icônico “Top Gun”, filme paradigmático da década de 1980 e seu “revival” da Guerra Fria, com a apologia explícita do aparato militar estadunidense, embalada no clichê do herói rebelde romântico.
    Em “seqüestro do metrô 123” temos outro tipo de discurso ideológico, adequado a uma época de crise econômica.
    O herói é um funcionário público civil, apesar de também pegar em armas no final. Isso representa uma defesa do papel do Estado ao supostamente tirar a economia estadunidense da crise (sem no entanto abrir mão das guerras no Oriente Médio).
    O vilão da história é um especulador do mercado financeiro. Ou seja, a causa da crise são as “maçãs podres” de Wall Street, os banqueiros inescrupulosos que transformaram a economia num cassino. A mensagem é que, expurgando-se essas maçãs podres, o sistema vai voltar a funcionar normalmente. Não há nada de errado com o capitalismo, apenas com alguns indivíduos problemáticos.
    O herói da história é um negro, assim como o atual presidente estadunidense é negro. O herói cometeu um erro no passado, assim como o governo estadunidense (que praticou torturas, prisões ilegais, morte de civis inocentes, entre outros crimes de guerra.) cometeu. O combate ao vilão redime o herói de seus crimes, assim como Obama acoberta os crimes dos seus antecessores. O prefeito é um político tradicional, demagogo, mulherengo, etc., que não está concorrendo à reeleição, assim como os republicanos conservadores cederam o bastão a Obama e se retiraram para os bastidores, para voltar quando o serviço sujo de administrar a crise tiver sido feito. Um encobre os crimes do outro, uma mão lava a outra, e estamos conversados. O mocinho do filme pode voltar para casa feliz, como se nada tivesse acontecido.
    O resumo da ópera é que o Estado salvou o capitalismo. Um conto de fadas para quem acredita num mundo de mocinhos e bandidos “made in Hollywood”. No mundo real, é preciso mais do que marketing e demagogia estatista. A crise continua, o capital fictício foi estocado nos cofres públicos, o Estado socializou os prejuízos das falcatruas privadas, trabalhadores perderam seus empregos, suas casas, seus salários e seus direitos, as guerras continuam no Oriente Médio, golpes de Estado na América Central, bases militares na Colômbia e a IV Frota estadunidense de olho no nosso pré-sal, e Lula, em conluio com Sarney e outros caciques, está loteando o pré-sal para as transnacionais, garantindo uma fatia para que a burocracia petista possa continuar anestesiando as massas com bolsa-esmola, e assim eleger Dilma.
    O show vai continuar, enquanto não dermos fim ao seqüestro das consciências.

    

 

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HIP-HOP: Cultura e Política

O próprio capitalismo cria e arma os seres que corroem as estruturas deste sistema podre.

O imperialismo americano ao invadir a América Latina corrompendo todo o cotidiano de sua vida, às vezes atira pela culatra. A indústria de cultura de massa ao impor o idioma inglês como referência de comunicação trouxe a reboque, uma nova linguagem altamente nociva aos seus interesses consumistas.

Como toda linguagem de periferia "que sobrevive à estatísticas" o Hip-Hop também tem seu lado violento.

Rimando em letras incendiárias o rap mostra sua cara e lembra à pequena população do Shopping Center que o garoto do semáforo também sonha, tem orgulho e não está disposto a aceitar apenas centavos. Como um pesadelo para a classe média (em extinção) este garoto não está só e reconhece que faz parte de um exército de marginalizados mundo afora.

Como porta-vozes da periferia, seja ela paulista (Racionais), carioca (MV Bill) ou da "quebrada" de Brasília (G.O.G.) atiram com sua metralhadora giratória em todos os valores burgueses, atingindo tanto o sonho do carro importado, quanto a ilusão da representatividade política dentro do congresso ou na assembléia legislativa mais próxima.

Exigindo tomada de posição de todos que escutam sua "batida", não permite vacilo prova o alto custo dos cortes no orçamento social, que toda propriedade é um roubo, já que os "manos" nunca tiveram nada e só conhecem a lei da sobrevivência.

Dançando Break e grafitando seu dia a dia, forma-se um grande "tráfico de informações" estendendo seus tentáculos pelas periferias de todo continente, influenciando bandas como: Rage Against the Machinne (apoio declarado ao E. Z. L. N. e ao M. S. T.), Charlie Brown Jr e grande parte da nova geração musical contemporânea a mesclar guitarras e batidas com letras ácidas e protestos práticos, inclusive apoio à formas anti-capitalistas de participação política.

Uma nova consciência internacionalista brota do gueto: TODOS SÃO MANOS.

Marcelo Marques

ABC – São Paulo: As raízes do hip-hop

Os efeitos desse sistema excludente, que adota procedimentos obscuros, revelam-se muitas vezes criminosos, outras vezes assassinos. Nas favelas e periferias, a agressividade dessa violência é dupla, não se limita a fatores de abandono. Os grupos do status quo (formado por policiais) punem àqueles que faltam com seu dever. O dever de permanecer passivo na miséria, num sistema capitalista totalmente excludente.

Será que queriam os burgueses (que são responsáveis por esse sistema) que todos os jovens se conformassem com os remédios suaves – carnaval, copa do mundo, pagode, religião e tantos outros anestesiantes – que são bondosamente doados aos miseráveis promovidos pelos meios de comunicação?

Mas por trás de todo esse mascaramento da realidade, desse espetáculo preguiçosamente engolido (o qual a esquerda tradicional participa ativamente onde ela "gentilmente" administra o capitalismo), pesa o sofrimento humano, um sofrimento real, gravado no tempo, naquilo que tece a verdadeira história sempre ocultada. Sofrimento irreversível das massas sacrificadas, quer dizer, de consciências torturadas e negadas uma por uma.

Para os jovens que estão destinados de antemão à exclusão, o desastre é sem saída e sem limites, nem mesmo ilusórios. Toda uma rede rigorosamente tecida, que já é quase uma tradição, lhes proíbe a aquisição não só de meios legais de viver, mas também de qualquer razão homologada para fazê-lo. Marginais pela sua condição, geograficamente definidos antes mesmo de nascer, reprovados de imediato, eles são os "excluídos" por excelência. Virtuoses da exclusão! Por acaso eles não moram naqueles lugares concebidos para se transformar em guetos? Guetos de trabalhadores antigamente, já que hoje a fonte de trabalho secou. Por acaso esse endereço em face de nossos critérios sociais não indica: "terras de ninguém" ou "terras dos que não são homens" ou mesmo de "não homens"?

É imediata e flagrante aqui a situação de injustiça e de desigualdade, sem que os interessados sejam os responsáveis, sem que eles próprios tenham-se colocado nessa situação. Seus limites já estavam fixados desde antes de nascer, por esse sistema capitalista.

A sociedade indiferente a situação desperta assustada, escandalizada: "eles não se integram; eles não aceitam tudo com a gratidão que era de se esperar" – pelo menos sem se debater, sem sobressaltos aliás inúteis, sem infrações ao sistema que os expulsa, que os encarcera na reivindicação de algo que ele não pode lhes dar (o trabalho). Bloqueados numa segregação não formulada, "eles" têm a indecência de não se integrar!

Mas integrar-se a quê? Ao desemprego, à miséria? À rejeição? Às vacuidades do tédio, ao sentimento de ser inútil, ou até mesmo parasita? Ao futuro sem projeto? Integrar-se! Mas a que grupo rejeitado, a que grau de pobreza, a que tipos de provas, que sinais de desespero? Integrar-se a hierarquias que, de imediato, relegam ao nível mais humilhante sem dar jamais a possibilidade de fazer as provas? Integrar-se à ordem capitalista que, de ofício, nega todo direito ao respeito? A essa lei implícita que quer que aos pobres seja concedida vida de pobre, interesse de pobre (isto é, nenhum interesse) e trabalhos de pobre (se houver trabalho)?

É aí, nesse vazio, nesse estado vago sem fim que destinos são aprisionados e desagregados, que se afogam energias, que se anulam trajetórias. Aqueles cuja juventude, impotente, caiu na armadilha da marginalidade oficializada, têm consciência disso e preferem não demorar a enfrentar a seqüência de suas vidas.

Mas é também aí que parte desse vazio é preenchido de forma subversiva (ameaçadora à ordem vigente). Os excluídos agora tem um movimento cultural que pode (tende para isso) se converter em algo desestabilizador do sistema capitalista. Algo político. Ou melhor, algo politizadamente político (tende para isso) já que toda e qualquer forma de ação é política! Só que o movimento Hip-Hop tende a ser aquela ação que não aceita a sua exclusão, da forma que descobrirão que a única forma de se incluírem na sociedade é excluindo (pondo abaixo) o sistema capitalista. E assim vingando os mortos, vítimas desse sistema. Mortos muitas vezes deixados nas ruas com seus duros paralelepípedos, mas bem mais macios que esse sistema capitalista.

Carlos Wellington – ABC – São Paulo.

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A miséria, o espetáculo e suas perversidades

 

 

(Comentário sobre o filme “Quem quer ser um milionário”)

 

 

 

O grande vencedor do Oscar 2009 tem como principal mérito o fato de ter escolhido um favelado como protagonista. Afinal, mais de um bilhão de pessoas são favelados hoje no mundo. Vivemos no “Planeta favela”, título de um livro de Mike Davis que descreve a estarrecedora realidade dessa porção nada desprezível da população humana. A favela é o retrato acabado do fracasso da civilização capitalista. Desemprego, subemprego, trabalho informal, biscates, mendicância, prostituição, doenças, fome, violência, crime; são a realidade social dessa população. Esgoto a céu aberto, lixo, fezes, cadáveres em decomposição, ratos e moscas são a realidade material. Um bilhão de pessoas vive literalmente na merda (há uma cena em que o protagonista do filme em questão ilustra graficamente o que quer dizer “viver na merda”).

Pouco acima dessa camada de favelados, temos as também numerosas camadas dos pobres, dos remediados, dos trabalhadores explorados formalmente, que compõem a imensa maioria da humanidade, para quem a simples sobrevivência é um desafio cotidiano. Isso é um grotesco absurdo em face da abundância de recursos e de capacidade produtiva disponível no planeta. O sistema funciona de fato apenas para uma restrita minoria. Nada pode ser mais eloqüente do que essa realidade para demonstrar o fracasso estrepitoso do capitalismo, do livre mercado, da globalização, do progresso, do desenvolvimento, do crescimento, etc. Pedir a cada um desses 1 bilhão de pessoas que continue suportando a vida no inferno por mais um dia sequer, apenas para que a minúscula elite internacional dos banqueiros, executivos, especuladores, aventureiros e rapinantes de toda espécie que controlam a economia mundial possam seguir desfrutando do luxo obsceno em que se refestelam; é dar mostras de um sadismo verdadeiramente hediondo.

Entretanto, é exatamente isso que fazem os gestores do sistema, os tecnocratas e ideólogos mercenários encarregados de reciclar cotidianamente as promessas furadas da viabilidade do capitalismo e propagá-las maciçamente por todos os canais e meios de comunicação que intoxicam diariamente a consciência coletiva. Por esse motivo, os méritos de um filme que tem a coragem de expor as entranhas de uma sociedade periférica como a da Índia devem ser sempre destacados. Trata-se de uma abordagem diametralmente oposta à do “Caminho das Índias” da rede Globo, que optou por mostrar a Índia dos nababos e marajás.

Por falar em Globo e em Brasil, “Planeta Favela” registra o fato de que nosso país tem 51,7 milhões de favelados, e a Índia 158,4 milhões, o que corresponde a 36,6 e 55,5 por cento da população urbana dos dois países respectivamente. Mas nem tudo na nossa indústria cultural é pura mistificação. Por vezes a realidade também aparece. “Quem quer ser um milionário” tem um predecessor importante no seu gênero, o brasileiro “Cidade de Deus”, do qual recebe nítidas influências. Além do cenário de miséria, semelhante em Bombaim (cidade que os inventores de modismos resolveram rebatizar com o insosso nome de “Mumbai”) e no Rio de Janeiro, temos um protagonista que tenta fazer seu caminho sem se envolver com o crime, embora esse tenha sido o meio em que cresceu. No que se refere à narrativa, temos também o recurso à linhas temporais intercaladas que compõem o quebra-cabeças da vida dos personagens. Finalmente, no aspecto puramente estético, temos o estilo de edição, o ritmo acelerado, as cores fortes.

Ao escolher um favelado como protagonista, “Quem quer ser um milionário” tem a oportunidade de retratar as diversas formas de opressão de que essa população é vítima. A opressão se manifesta não apenas na condição material, mas também nas diversas formas de preconceito, discriminação e violência, não apenas física, mas também psicológica.

O título do filme se refere a um programa de televisão do tipo de perguntas e respostas. No Brasil tivemos há alguns anos o “Show do Milhão”, apresentado pelo grotesco Silvio Santos (que aliás fez sua fortuna explorando a credulidade dos pobres), imitação de um modelo internacionalmente difundido, prova de que na indústria do espetáculo nada se cria, tudo se copia. No filme, o programa é inesperadamente vencido por um concorrente que vive na favela. Jamal Malik é um típico representante do emergente capitalismo indiano: trabalha servindo chá aos operadores de telemarketing. Ele é o subalterno entre os subalternos da classe trabalhadora, parte da gigantesca massa humana anônima triturada nas engrenagens implacáveis do superlucro globalizado.

Ninguém na televisão, dos produtores ao público, acredita que Jamal tem a mínima chance de acertar as perguntas do programa. Mas ele acerta uma após a outra, e seu prêmio em dinheiro vai aumentando rodada após rodada. Antes que ele chegue à pergunta final, os produtores do programa tentam descartar-se dele nos bastidores e o acusam de ser um fraudador. Um favelado jamais poderia ter acertado as perguntas sem algum tipo de expediente ilícito. Favelado não é gente, não pode vencer nunca. Está fora do script.

Os órgãos da repressão, por outro lado, cumprem fielmente o roteiro que deles se espera. O favelado é torturado para confessar o crime que não cometeu. Lá como aqui, a polícia bate primeiro e pergunta depois. Ninguém sequer cogita na possibilidade de o vencedor do concurso ter realmente acertado as perguntas, até que a tortura se prove ineficaz e o infeliz tenha a oportunidade de falar. Para explicar para a polícia como acertou as perguntas do programa, Jamal tem que narrar uma série de incidentes de sua vida, pois cada resposta tinha relação com algo que aprendeu por ter sofrido na pele. Desdobra-se então a narrativa de sua vida, desde a infância até o momento em que chega ao programa de TV.

Além do “crime” de ser favelado, Jamal deve pagar pela ousadia de tentar transgredir as normas e mudar sua realidade. O favelado só pode conseguir algo depois de apanhar muito e ganhar traumas e cicatrizes. Depois da tortura policial e de apresentar as justificativas para cada uma das respostas que acertou, ele terá a chance de voltar ao programa e arriscar a sorte na pergunta final. O detalhe é que a tortura e o interrogatório transcorrem longe dos olhares do público. O inferno vivido por Jamal não pode ser televisionado. O favelado não pode ser humanizado, seu sofrimento não pode ser partilhado pelo espectador. A televisão suprime a brutalidade do real e a dissolve na superficialidade do estereótipo. O público do programa inevitavelmente desenvolve uma empatia por Jamal e torce por ele, mas nem sequer desconfia dos horrores pelos quais ele passou para chegar até ali, desde sua infância distante até a tortura policial ali mesmo, às vésperas da pergunta final.

O mundo do espetáculo é um mundo asséptico, higienista, forjado, embalado para presente e emoldurado pelo sorriso artificial e monstruoso dos apresentadores de TV. Um mundo de fantasia que dissimula por meio da hipocrisia profissional a verdadeira realidade dos seres humanos. A demanda por “reality shows” expressa justamente isso, a necessidade do público de torcer por personagens com os quais possa se identificar. Os “reality shows” fornecem tais personagens, mas não modificam a dramaturgia básica do espetáculo, apenas substituem os atores profissionais que encenam o conto de fadas por amadores com os quais o público se considera mais parecido. Nenhum reality show mergulha na realidade de um ser humano com a mesma profundidade de que somente a verdadeira arte, a literatura, o teatro, e alguns raros filmes são capazes.

Um dos méritos de “Quem quer ser um milionário” é humanizar seus personagens, valorizando sua trajetória de vida. Jamal adquiriu uma diversificada (e terrível) experiência de vida na favela, nas ruas, na mendicância, no trabalho. Vivenciou a barbárie dos conflitos religiosos, o trauma da orfandade, a precariedade da mendicância, o horror da exploração do trabalho infantil, enquanto as pessoas mais próximas dele resvalavam para o crime e a prostituição. Conheceu a inveja, o autoritarismo e por fim a traição da parte do próprio irmão. Mas ele conheceu também a amizade e o companheirismo que unificam os miseráveis e as pessoas que atravessam situações extremas. Conheceu até mesmo o amor, que foi o fio de esperança que o manteve firme e vivo enquanto era massacrado pela vida e levado pela correnteza dos acontecimentos.

Depois de passar por esse purgatório, Jamal faz jus ao prêmio milionário do programa de TV. Chegamos então ao ponto limite do filme. “Quem quer ser um milionário” nos mostra a realidade do favelado, humaniza sua trajetória, cria no espectador a empatia pelo personagem, nos faz torcer por ele e vibrar por sua vitória; tudo isso é bastante louvável e excepcional no cinema, mas é feito no bojo de uma solução narrativa também artificial, que termina por endossar o mecanismo básico do espetáculo e seus pressupostos ideológicos.

O problema começa na forma como Jamal vence o prêmio. Ele acerta a pergunta final no chute, sem realmente saber a resposta. Com isso fica referendada a concepção de que o conhecimento, no seu aspecto acadêmico, formal, livresco, é algo supérfluo, e se pode “vencer na vida” sem ele. A cultura nesse caso aparece como algo que não é de fato necessário, que não enriquece a vida, que não recompensa aquele que se esforça para adquirí-la; enfim, algo que não é preciso conquistar e se pode viver muito bem sem tê-la.

O segundo problema está no próprio conceito do que significa “vencer na vida”, ou seja, ficar milionário. Reforça-se um ideal de realização em que o indivíduo não pode simplesmente ser o que ele é, ele precisa ser como os “vencedores”. Ou o indivíduo é parte da massa miserável, ou é parte da elite privilegiada. O favelado é festejado, mas apenas pelo fato de que ele “vence” e deixa de ser favelado para se tornar milionário.

O terceiro problema, resultante do anterior, é que se acaba referendando assim o culto ao dinheiro e aos bens materiais. É evidente que a miséria material é um mal, mas isso não torna automaticamente um bem a abundância de bens materiais. Especialmente quando tal abundância é resultante das mesmas relações sociais que produzem a miséria, o modo de produção capitalista.

O quarto problema está na idealização do amor romântico. Como numa novela da Globo, em que o final feliz é sempre um casamento (ou pior, vários casamentos), o filme indiano termina numa festa em que o casal de protagonistas fica junto. Ao contrário do que a indústria do romantismo para consumo popular insiste em dizer, o casamento não é onde os problemas terminam, é onde eles começam.

O quinto problema está na frase que encerra o filme, quando aparece a alternativa que responde à pergunta colocada ao espectador logo no começo: “estava escrito”. Isso quer dizer que o destino dos personagens já estava traçado. Com isso, reforça-se a idéia nefasta de que não é o homem que faz sua história, é alguma força sobrenatural que determina o curso dos acontecimentos. Sendo assim, não é preciso se esforçar para modificar a vida, basta se deixar levar. Nesse ponto, “Quem quer ser um milionário” coincide um pouco com outro concorrente do Oscar, “O curioso caso de Benjamin Button”, em que o destino e o roteiro determinam a vida do personagem, sem que ele tenha muita interferência e aprenda algo significativo através da luta.

Por último, e também mais grave, está o fato de que a solução para o problema do favelado é puramente individual. Com toda a ruptura que representa por conta da escolha de seu tema e do retrato humano que faz do personagem, o filme permanece prisioneiro da lógica do espetáculo. As narrativas da indústria cultural reforçam a crença de que “qualquer um pode chegar lá” e impedem o indivíduo de pensar em sua própria vida ao contemplar a vida dos “vencedores” que protagonizam o espetáculo.

Jamal fica milionário, mas a favela continua lá, com o esgoto a céu aberto, lixo, fezes, cadáveres em decomposição, ratos e moscas. Os favelados assistem pela TV e comemoram em toda Índia a vitória de um dos seus, mas continuam favelados. Aceitam assim a permanência de um sistema em que um em 1 bilhão pode ficar milionário, mas os restantes permanecem miseráveis. Um sistema em que um afro-descendente pode chegar a presidente dos Estados Unidos, mas os africanos sucumbem na barbárie das guerras tribais legadas pelo saque do continente realizado pelo imperialismo.

É tudo uma questão de sorte, de destino, de acertar um palpite. Se você for um pré-destinado, parabéns, pois se tornará um milionário. Quanto a nós todos, continuaremos na merda.

 

Daniel M. Delfino

 

15/03/2009

 

 

 

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