Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

Apresentação

O Espaço Socialista é uma organização formada por trabalhadores para a intervenção na luta de classes, tendo como objetivo a construção do socialismo. Temos como referência a visão de mundo marxista, que consideramos não como um conjunto de dogmas estáticos e de palavras de ordem desgastadas, mas como um patrimônio teórico da classe trabalhadora mundial e um método vivo para a análise da realidade do ponto de vista do proletariado em sua luta pela emancipação.

Dentro dessa referência marxista, o Espaço Socialista desenvolveu um conjunto de elaborações teóricas contidas no seu “Perfil Programático”, o qual expõe de modo mais detalhado nossas contribuições no sentido da construção de um programa socialista, entendendo-se o programa como “uma compreensão comum dos acontecimentos e das tarefas” (Trotsky). O presente texto contém de forma resumida alguns pontos desse Perfil, com o objetivo de apresentar as principais propostas da organização.

A incontrolabilidade do capital

Partimos do entendimento de que o antagonismo entre capital e trabalho continua sendo o traço determinante da realidade mundial. A classe trabalhadora, pelo papel central que ocupa na produção de toda a riqueza social, é o único elemento capaz de reorganizar essa produção para atender racionalmente as necessidades humanas. Mas para isso, terá que se enfrentar com a burguesia, classe proprietária dos meios de produção, que não abrirá mão facilmente do seu privilégio de espoliar o conjunto da humanidade. A luta de classes só pode ter fim com a dissolução das classes numa sociedade socialista. Enquanto houver capitalismo, haverá exploradores e explorados, pois o sistema do capital só pode sobreviver por meio da dominação dos trabalhadores, através da extração de sua força de trabalho e da negação de todos os potenciais criativos humanos.

O capitalismo não pode ser controlado, nem atenuado ou “humanizado”, pois sua lógica intrínseca transforma os seres humanos, de sujeitos que são, em meros objetos do processo de acumulação ampliada do valor. A busca do lucro é o que prevalece nesse sistema, acima de qualquer outro imperativo, inclusive a própria sobrevivência da humanidade, pois até mesmo as condições básicas da vida estão ameaçadas, senão pela degradação ambiental avassaladora, pela simples existência de imensos arsenais de armas de destruição em massa nas mãos dos Estados imperialistas, capazes de aniquilar completamente o planeta. Desse modo, não há outra alternativa para a humanidade a não ser destruir o capitalismo, antes que seja destruída por ele, e construir um modo de produção socialista voltado para o atendimento das necessidades humanas e para a realização dos potenciais criativos da ciência, da tecnologia, da cultura, da arte, da subjetividade, da sexualidade.

A crise estrutural do capital

Apesar de ser hoje a força predominante na realidade mundial, o sistema capitalista atravessa um momento de sua história o qual caracterizamos, acompanhando alguns autores contemporâneos, como sua crise estrutural. A crise estrutural do capital significa que o sistema não pode administrar suas contradições sem se tornar crescentemente destrutivo. O sistema capitalista é permanentemente atravessado por contradições desde sua origem. A maior parte dessas contradições foram descritas já no século XIX pelo próprio Marx. A principal contradição é aquela que obriga o sistema a diminuir o trabalho vivo, o elemento humano no processo de produção, e aumentar o trabalho morto, ou seja, as forças produtivas materializadas na forma de objetos, de tecnologia, de meios de produção.

Na medida em que se amplia a incorporação de ciência e tecnologia à produção, aumenta a quantidade de bens que podem ser produzidos com a mesma quantidade de trabalho e conseqüentemente, diminui a quantidade de força de trabalho humano aplicada na produção. Na lógica capitalista, isso faz com que haja um número cada vez menor de trabalhadores empregados. O capitalismo cria o desemprego tecnológico estrutural, expulsando do sistema produtivo o único elemento gerador de valor, a força de trabalho, que multiplica a riqueza social através da mais-valia. A diminuição do número de trabalhadores empregados faz com que haja um número menor de pessoas para consumir uma quantidade maior de produtos, ou seja, gera superprodução. A superprodução de mercadorias é a causa principal das crises periódicas que marcam a economia capitalista desde o início de sua história.

Ao longo dessa história, o capitalismo encontrou meios de deslocar suas contradições, desenvolvendo formas de consumo artificiais e improdutivas para aliviar o problema da superprodução. A indústria de objetos de luxo, a criação de necessidades artificiais, o consumismo e seus modismos, a utilização decrescente dos produtos (obsolescência programada) são formas de consumo perdulário que não satisfazem qualquer necessidade humana. Da mesma forma, os gastos militares do Estado, ao longo das Guerras Mundiais, da Guerra Fria, da atual “guerra ao terror”, são formas absolutamente irracionais de manter a economia capitalista funcionando artificialmente através da produção de meios de destruição. Até mesmo algumas concessões foram feitas à classe trabalhadora (advento do consumismo de massa e do “Estado de bem-estar social”) em alguns países e por algum período, de modo a induzir alguma estabilidade na economia e atenuar as crises periódicas. A crise estrutural do capital corresponde ao momento histórico em que essas formas de deslocar as contradições perdem sua eficácia e as crises econômicas se repetem mesmo com a ampliação da produção destrutiva.

A crise estrutural acompanha o capitalismo aproximadamente desde o início da década de 1970 e se mantém até hoje. As principais conseqüências dessa crise são o desemprego tecnológico permanente, que transforma imensas parcelas da humanidade em seres supérfluos para o sistema; a degradação ambiental ameaçadora (poluição das águas, do ar, do solo, desertificação, aquecimento global, perda da biodiversidade, desequilíbrio climático, catástrofes, etc.); e o agravamento das rivalidades entre as potências (disputa por mercados cada vez mais estreitos) e das intervenções imperialistas na periferia (em formas como a “guerra ao terror”).

Naturalmente, os gestores do sistema não percebem a crise estrutural como tal e na vã tentativa de combater os seus sintomas, lançam mão de políticas que só fazem aprofundar os problemas, tais como programas de “ajuste” do FMI, as “reformas” neoliberais previstas no “Consenso de Washington” (privatizações, corte de direitos dos trabalhadores, etc). Essas políticas não fazem mais do que agravar a crise, aumentando a miséria e tornando ainda mais urgente o enfrentamento e a resistência.

O Brasil na crise do capitalismo

No Brasil, o governo Lula tem sido um aplicador comprometido das políticas neoliberais, prosseguindo com as privatizações (bancos estaduais, reservas de petróleo, rodovias, concessões na Amazônia), as reformas (reforma da Previdência, REUNI), o pagamento dos juros da dívida pública fraudulenta (mais de 200 bilhões de reais são pagos todo ano, e mesmo assim a dívida subiu para mais de um trilhão); e maquiando a realidade com os programas de bolsa-auxílio.

Enquanto isso, a burguesia continua lucrando cada vez mais, desrespeitando diariamente os direitos trabalhistas, demitindo, arrochando salários, precarizando as condições de trabalho, destruindo a saúde física e psicológica dos trabalhadores. Contra os que ousam resisitir, a classe dominante reage por meio da força bruta, da repressão policial, matando ativistas, prendendo, perseguindo, demitindo; tudo isso com a cobertura da justiça burguesa e o apoio cerrado da grande mídia.

Durante o governo Lula, o PT e suas correias de transmissão no movimento social (CUT, MST, UNE, pastorais sociais da Igreja) não têm servido como obstáculo para enfrentar o avanço da barbárie capitalista no Brasil. Pelo contrário, tudo o que fazem é dar sustentação política e eleitoral para Lula e os candidatos petistas, contribuindo de maneira nefasta para aumentar a confusão, a frustração, a prostração, a desorganização dos trabalhadores e o retrocesso da sua consciência.

Por isso, o Espaço Socialista apóia e participa de todas as iniciativas de reorganização da esquerda para a luta, seja através do movimento sindical (Conlutas), do movimento estudantil, e de todas as formas de enfrentamento contra a barbárie capitalista, defendendo sempre a necessidade da unidade de todas as forças da esquerda e da disputa ideológica para elevar a consciência dos trabalhadores.

A crise de alternativas socialistas

Um dos maiores, senão o maior obstáculo para o enfrentamento do capitalismo no Brasil e no mundo, é a ausência de uma referência concreta de um projeto próprio da classe trabalhadora. Muitos indivíduos percebem isoladamente os problemas do capitalismo, a necessidade de resistir e de lutar, mas esses impulsos atomizados de revolta não se aglutinam e não convergem para um movimento que tenha reais condições de se opor contra a ordem estabelecida, pelo simples fato de não estar armados de uma concepção socialista como alternativa global. Em outras palavras, falta uma consciência socialista de massa incorporada por um setor significativo da classe trabalhadora.

A ausência de um horizonte socialista se agravou particularmente a partir dos eventos de 1989-1991, com a queda do muro de Berlim e da URSS. Uma vez que os estados pós-capitalistas ali existentes eram erroneamente identificados como sendo “o socialismo”, a sua queda deu oportunidade para que a burguesia desencadeasse uma maciça ofensiva ideológica, pregando o “fim da história”, a morte do socialismo, a inevitabilidade do capitalismo, da “globalização”, e outras bobagens. O debate sobre a natureza dos estados pós-capitalistas e as conseqüências de sua queda ainda está em aberto no conjunto da esquerda. Nós do Espaço Socialista não nos furtamos à tarefa crucial de apresentar nossas elaborações sobre essa questão, e para desenvolver esse debate, entre outros, lançamos a iniciativa da revista teórica “Primavera Vermelha”.

O que importa aqui é assinalar o quanto a ausência de uma caracterização correta da situação histórica prejudica o rearmamento teórico e prático da esquerda. A maior parte das organizações, especialmente aquelas que reivindicam alguma tradição trotskista, atuam como se o problema se limitasse a uma “crise de direção revolucionária”, ou seja, à ausência de um partido revolucionário que conduzisse os trabalhadores para a vitória. Costruindo-se este partido, a revolução estaria assegurada, de maneira praticamente automática. Naturalmente, as organizações que atuam com base nessa concepção se candidatam a ser (ou proclamam já ser), elas próprias, o partido revolucionário que conduzirá os trabalhadores à vitória, excluindo sectariamente todas as demais.

Nós do Espaço Socialista não negamos a necessidade da organização política da classe trabalhadora na forma de um ou mais partidos e organizações revolucionárias. Também apresentamos as propostas da nossa organização no interior de todos os fóruns do movimento e disputamos sua direção. Entretanto, entendemos que o problema é mais profundo. Mais do que uma “crise de direção”, que se resolveria pela simples formação do partido revolucionário, entendemos que está em curso uma crise de alternativas socialistas, ou seja, a falta de uma visão do socialismo como alternativa societária por parte de um setor importante da classe trabalhadora.

A existência de uma consciência socialista de massas é um pré-requisito para que a emancipação dos trabalhadores seja realizada pelos próprios trabalhadores, como preconizou Marx. Inclusive, a própria formação de organizações revolucionárias com condições de intervir na realidade só é possível a partir da existência de uma vanguarda de trabalhadores educados em idéias e práticas socialistas. A classe trabalhadora é o agente social da transformação socialista, através da ação organizada do partido, mas é preciso compreender que o partido e a classe não podem estar separados, pois do contrário o que se tem é uma liderança artificial e sem raízes. Muitas organizações políticas buscam atalhos e falsas soluções, proclamando seu programa como a solução já acabada de todos os problemas, tentando artificialmente contornar o imperativo absolutamente vital de superar a crise de alternativas e a necessidade de construir a consciência socialista entre as massas.

Relação entre as organizações e o movimento

O Espaço Socialista pauta a sua conduta pela concepção de que a tarefa fundamental nesse momento é desenvolver essa consciência socialista entre as massas e fortalecer o máximo possível a influência das idéias socialistas na sociedade. Os trabalhadores não nascem prontos para a luta socialista, precisam ser ganhos para esse projeto. O ambiente apropriado para desenvolver essa disputa ideológica pela consciência são os organismos de luta da classe trabalhadora, como os sindicatos, os grêmios estudantis, as associações de bairro, os movimentos sociais, etc. Os indivíduos se aproximam da luta movidos por questões imediatas, como a luta por melhores salários, por educação de qualidade, por transporte público, etc. Através dessas formas organizativas voltadas para questões imediatas, os trabalhadores superam a passividade em que o cotidiano da sobrevivência os aprisiona e desenvolvem o enfrentamento contra as conseqüências imediatas do capitalismo. É aí portanto que deve realizar-se o processo gradativo da sua educação política, visando desenvolver a compreensão de que a miséria e a exploração somente serão superados com a superação de sua causa, ou seja, do próprio capitalismo; e também preparar os indivíduos para exercer a administração consciente de suas vidas na futura sociedade socialista.

Justamente por isso, a maior parte das organizações da esquerda desloca seus militantes para disputar a consciência dos trabalhadores reunidos nessas instâncias organizativas de luta imediata. Entretanto, a forma como muitas organizações políticas atuam acaba sendo mais prejudicial do que construtiva para o movimento. É muito comum as organizações tomarem os organismos de luta como espaço onde devem impor as suas táticas e as suas concepções a qualquer preço. Ao invés de promover o debate com as demais organizações, com os ativistas independentes e com o conjunto da classe, de modo a fortalecer o movimento, acabam criando uma disputa em que se lançam mão dos métodos mais questionáveis.

A falsificação das propostas dos adversários, as manobras nos bastidores, a manipulação, a violência retórica (e às vezes até mesmo física) entre os militantes; são vícios perpetuados na esquerda que acabam afastando muitos indivíduos que porventura se aproximam do movimento. Dissemina-se assim a idéia nefasta de que todos os partidos são iguais, de que “nenhum presta”, de que onde existem partidos existem interesses escusos, etc. O anti-partidarismo é uma idéia que apenas facilita o trabalho da burguesia na propagação do conformismo e da paralisia.

Os organismos de luta da classe devem funcionar como frente única, ou seja, como uma frente de atuação comum no qual caibam os militantes das diferentes organizações políticas revolucionárias, os ativistas independentes, os trabalhadores sem qualquer experiência de luta, os indivíduos com concepções reformistas, dominados pelo senso comum, adeptos de todos os partidos e religiões, etc. É no interior desses organismos de frente única que deve se dar o debate entre as diferentes organizações políticas, mas de modo que o movimento no seu conjunto seja fortalecido, o que exige uma metodologia democrática de atuação, a qual infelizmente é negligenciada por boa parte da esquerda. Resgatar os métodos da democracia operária no interior do movimento é uma das tarefas fundamentais até mesmo para fazer com que as lutas mínimas avancem e para reconstruir o projeto socialista como alternativa.

A necessidade de formas democráticas de organização

As propostas do Espaço Socialista para a reorganização do movimento não são uma novidade inventada por nós. Trata-se simplesmente de resgatar as tradições do movimento operário tais como eram postas em prática no passado. A prática da democracia operária consiste na tomada de decisões pela base e no controle e vigilância sobre os militantes a quem são dadas funções de direção. Submeter-se a esse método requer qualidades que a maior parte das organizações abandonou, como a tolerância para com as posições divergentes, a disciplina para se submeter aos fóruns coletivos, a paciência para construir objetivos comuns, a capacidade para dialogar com as consciências atrasadas. Cultivar essas qualidades na militância é a única forma de fazer com que uma organização se mantenha saudável, enraizada no seio da classe trabalhadora, extraindo daí a sua força para intervir na realidade.

Se é verdade que os trabalhadores não desenvolvem espontaneamente a consciência socialista (pelo simpĺes fato de estarem ocupados demais lutando para sobreviver) e esta tem que ser trazida de fora pelas organizações políticas, como aprendemos com Lenin; também é verdade que essas organizações somente serão bem-sucedidas se estiverem ao lado da classe trabalhadora, lutando ombro a ombro com as mesmas alienações, padecendo das mesmas dificuldades, vivendo o mesmo cotidiano. Esse mandamento foi esquecido por boa parte da esquerda e os resultados foram catastróficos para o movimento socialista.

Os partidos políticos e organismos de luta como os sindicatos se adaptaram à realidade do capitalismo e deixaram de ser instrumentos para combatê-lo. Ex-militantes passaram a disputar os cargos eleitorais no Estado burguês ou os cargos de direção nos organismos de luta com o pretexto de trazer melhorias na vida dos trabalhadores, mas a única melhoria que obtiveram foi o seu próprio enriquecimento pessoal. Converteram-se assim em burocratas, ou seja, dirigentes que transformam os instrumentos de luta em aparatos de poder pessoal e acomodação social, desviando a luta socialista para o pântano da colaboração de classe com a burguesia.

A participação dos socialistas nas eleições para cargos no Estado burguês e a ocupação de cargos nos organismos de frente única precisa ser controlada pelo critério de fazer avançar a consciência socialista. Sem seguir esse critério, a presença de indivíduos identificados com o socialismo nesses aparatos acaba servindo apenas para perpetuar a ilusão de uma convivência possível com a ordem capitalista. Assim, a burocratização de dirigentes nos aparatos prejudica não apenas esses dirigentes e suas organizações, mas o conjunto da classe.

A burocratização dos organismos de luta precisa ser combatida não apenas moralmente, pela simples censura a dirigentes degenerados, mas politicamente, por meio de medidas como:

  • proibição da reeleição indefinida dos dirigentes;
  • renovação de pelo menos metade dos órgãos de direção a cada eleição;
  • tomada de decisões nos fóruns de base, como as assembléias;
  • garantia do direito de que as posições divergentes sejam apresentadas;
  • a remuneração dos dirigentes não pode ser maior que a da média dos trabalhadores;
  • transparência na administração dos recursos financeiros da entidade;
  • esforço permanente para desenvolver a formação teórica e política dos trabalhadores, para que se qualifiquem a exercer criticamente sua opção sobre a linha de atuação dos organismos;

Retomar essas medidas organizativas de caráter democrático nos organismos de luta é parte da batalha política permanente que o Espaço Socialista desenvolve em todos os setores em que realiza sua intervenção.

Em busca de uma nova concepção de militância

Os métodos de atuação que defendemos para o movimento em geral também fazem parte de nossa dinâmica interna de atividade. O Espaço Socialista é um espaço em que se intenta pôr em prática as concepções socialistas. Isso significa lutar para que os indivíduos superem as alienações que a realidade capitalista impõe a todos nós. Além de militantes socialistas, somos também parte da classe trabalhadora, batalhamos contra as mesmas dificuldades para sobreviver, entregamos boa parte de nosso tempo para a exploração pelo capital, temos todo tipo de atividades, vida pessoal e familiar, etc. Mas acima de tudo, batalhamos também para viver, para realizar nosso potencial criativo e subjetivo, para ter a militância como uma atividade que não apenas constrói para o futuro da humanidade, mas seja também gratificante no presente e humanamente enriquecedora.

Ao contrário do que prega a reacionária ideologia burguesa do individualismo egoísta, acreditamos que o indivíduo somente se realiza pelo coletivo, desenvolvendo relações humanas ricas e constantemente renovadas. O objetivo da militância não é fazer da luta uma “cruz” que se carrega, mas um ambiente em que se criam laços verdadeiramente humanos entre os indivíduos, relações de camaradagem e solidariedade, espaços para o desenvolvimento dos potenciais criativos; oportunidades essas que a sociabilidade capitalista, que mercantiliza todas as relações humanas, simplesmente não pode oferecer.

O capitalismo deseduca os indivíduos para que se tornem passivos, obedientes, submissos à autoridade (exercida em diversos níveis por políticos, patriarcas, professores, patrões, policiais, religiosos, publicitários, celebridades da mídia que a todo momento nos dizem o que fazer), de modo que anulem a própria subjetividade e percam a confiança na capacidade individual e coletiva de agir, de criar e de transformar a realidade. Faz parte da militância socialista o esforço para superar os mitos da ideologia burguesa, os preconceitos, as neuroses e os medos que aprisionam os indivíduos na condição de meros objetos do processo de acumulação de capital e para fazer com que se tornem sujeitos da sua própria construção humana.

Uma das formas de superar as alienações da sociedade capitalista é combater a forma hierárquica de estruturação, um vício do qual a esquerda em grande parte não consegue escapar. Em boa parte das organizações de esquerda existem líderes praticamente vitalícios que se perpetuam na condução da luta política, porque não se desenvolve o esforço para educar os militantes desde a base e torná-los também aptos a decidir politicamente. Na ausência desse esforço, reproduz-se nas organizações de esquerda a separação que vicia todas as atividades na sociedade burguesa, ou seja, a separação entre teoria e prática, entre trabalho intelectual e trabalho braçal. Muitas organizações da esquerda adotam um funcionamento em que um grupo de líderes decide a linha política e os militantes de base simplesmente executam as tarefas, sem ter a condição de se educar e se formar para também estar aptos a tomar as decisões políticas.

Nas condições da sociedade capitalista, com todo o massacre ideológico sofrido diariamente pelos trabalhadores, no sentido de rebaixá-los à condição de rebanho, é natural que existam dificuldades para que os militantes vejam a si mesmos como agentes da transformação social e da própria auto-transformação. É compreensível que muitos adentrem a militância em busca de alguma espécie de “líder infalível” ao qual seguir, tal como são deseducados para seguir a burguesia. Entretanto, isso não pode ser aceito pela esquerda, que precisa travar uma luta consciente contra os métodos hierárquicos e verticais de estruturação das atividades.

Uma das formas de superar a separação entre teoria e prática, entre trabalho intelectual e trabalho braçal é justamente oferecer uma formação teórica sólida para os militantes, de modo que se tornem capazes de analisar a realidade por conta própria e intervir de modo produtivo, seja nos debates internos da organização, seja na disputa ideológica externa contra a burguesia pela consciência dos demais trabalhadores. Infelizmente, um dos piores vícios da esquerda, especialmente no Brasil, tem sido o descuido com a formação teórica dos militantes, a falta de um esforço consciente para disseminar a visão de mundo marxista e criar uma sólida base teórica. Isso teve e continua tendo conseqüências trágicas, como por exemplo, a confiança que gerações de trabalhadores e ativistas depositaram em “salvadores da pátria” como Lula.

Construindo uma organização revolucionária

Os princípios que expusemos acima norteiam o Espaço Socialista na sua prática, na relação com as demais organizações e com o conjunto da classe. Temos como preocupação central fazer com que os trabalhadores sejam os responsáveis pela própria emancipação, e para isso lutamos pela democracia nos organismos de luta, pelo respeito às instâncias de base, pelo controle sobre os dirigentes, pelo aprimoramento da formação teórica, pela elevação geral do nível teórico e cultural da classe.

Estamos conscientes das dificuldades, sabemos que nossa influência ainda é pequena, não nos proclamamos os donos da “verdade absoluta” ou da “ortodoxia marxista”; entretanto, temos a confiança de que as nossas idéias e propostas encontram ressonância entre os ativistas, de que há no Brasil (e no mundo) numerosos indivíduos e organizações que adotam os mesmos métodos e concepções, e de que a luta de classes produzirá a inevitável e necessária convergência entre os revolucionários num movimento mais amplo e mais forte do que todos nós separadamente. Temos essa confiança porque acreditamos acima de tudo na classe trabalhadora e na luta socialista como única via possível para a emancipação humana.

É por isso que fazemos este chamado a todos os ativistas e indivíduos que simpatizam com estas propostas para que nos acompanhem nessa luta.

Venha construir uma sociedade socialista!

Venha construir o Espaço Socialista!