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Jornal 88: Argentina: onda de demissões e ataques mostra que a crise é internacional e que o inimigo é um só


4 de abril de 2016

A classe trabalhadora argentina inicia 2016 sob duros ataques da patronal por meio de seu novo governo. A vitória de Maurício Macri (PRO) para a presidência do país encerra, após 12 anos, a chamada Era Kirschner, de essência igualmente patronal. Macri, um representante mais clássico da direita conservadora, assume para dar continuidade ao projeto da classe dominante, agora sem nenhuma mediação, aplicando o ajuste com mãos de ferro para fazer as vontades do imperialismo.5

Para dar resposta (do ponto de vista da patronal) ao acirramento da crise econômica mundial e ao mesmo tempo se diferenciar do perfil do governo anterior, Macri se apoia no discurso da eficiência. Utiliza a defesa de um estado “enxuto” como respaldo para seus duros ataques. A verdade porém é que seu governo está disposto a jogar quantos trabalhadores for necessário na miséria para satisfazer aos interesses da patronal.

A sarjeta é só o começo: o ajuste mostra do que é capaz

Uma das peŕolas de Macri que ficaram conhecidas no último período foi chamar os funcionários públicos de nhoques. O nhoque é um prato tradicionalmente servido no dia 29 de cada mês. A comparação com os funcionários públicos tem o objetivo de classificá-los como parasitas, que aparecem no trabalho só no dia 29, final de cada mês, para receber o salário. A verdade é que com esse discurso Macri pulverizou simplesmente mais de 60 mil postos de trabalho. Há dados recentes da CTA (Central de Trabalhadores da Argentina) que apontam para mais de 107 mil postos. O funcionalismo público tem grande expressão na composição desse número, sendo cerca de metade dos demitidos.

Para além das demissões, o pacote do ajuste inclui um tarifaço que anunciou elevar a conta de luz em até 300%, cortando os subsídios públicos que existiam antes no fornecimento de energia. No entanto, foram registrados aumentos de até 700% nas contas de luz. Após implementar esse grande ataque, o governo Macri anunciou também, para março, o aumento no custo do gás, também em até 300%. A desculpa é equilibrar a contas do Estado. Mas o novo “estado enxuto” da patronal na realidade faz a classe trabalhadora argentina sangrar um pouco mais a cada dia.

É preciso lembrar que os ataques, assim como no Brasil, não vêm somente da esfera nacional de governo mas também das províncias e municípios, denunciando o pacto da oposição kirchnerista com a agenda do ajuste, já que ainda controlam grande parte dos governos locais. Ao passar o facão no funcionalismo público, nos benefícios sociais e implementar o tarifaço, a política do governo Macri prova sim a sua eficiência para fazer a qualquer custo a gestão do estado capitalista a contento do capital, mas não para atender às necessidades dos trabalhadores.

O endurecimento e conservadorismo para respaldar os ataques

O conservadorismo e o caráter antidemocrático que marca o perfil do novo governo fica bem claro em outra pérola recente. Essa saiu da boca do Ministro das Finanças do governo, Alfonso Pra-Gay, que disse que um dos objetivos do governo é “eliminar a gorrdura militante” da administração do estado, se referindo às demissões dos funcionários públicos. Além disso, a maior parte das medidas mais polêmicas tomadas pelo novo governo foi feita durante o recesso de verão dos parlamentares, já que Macri não tem a maioria no Congresso.

Mas uma das mais significativas tentativas de se blindar da reação dos trabalhadores a todos esses ataques foi o recente lançamento de um protocolo anti protesto, chamado pelo governo de protocolo de segurança, que proíbe o trancamento de ruas durante as manifestações.

Mas os trabalhadores argentinos já iniciam sua resposta. Organizaram uma paralização de 24 horas e uma grande marcha no dia 24 de fevereiro em defesa do desempregados. Esse foi o primeiro recado dos trabalhadores para Macri e a patronal. A marcha reuniu cerca de 50000 e fechou importantes ruas do centro de Buenos Aires, trancando cruzamentos e paralisando parte dos serviços. O Ministerio do Desenvolvimento e Emprego e depois a sede do governo foram pontos de parada. Nas províncias, outras paralisações e atos aconteceram simultaneamente. O protocolo de Macri não foi capaz de amedrontar os trabalhadores argentinos, que deram sua primeira resposta à altura. Essa foi a primeira manifestação não só contra os ataques mas contra o próprio governo, desde que Macri assumiu a presidência.

Com o lançamento do ameaçador protocolo anti protesto, os argentinos nos indicaram o único caminho para resolver o problema da repressão: enfrentá-la. Se não podemos recuar frente aos ataques ao emprego aos nossos direitos e ao rebaixamento das condições de vida, não podemos igualmente estremecer frente a tentativa de nos calar.

Por mais difícil que seja, o pressuposto para a própria existência da luta dos trabalhadores contra os ataques é enfrentar as ameaças dos governos e da patronal e a sua dura consequência, a repressão. A massificação da mobilização de 24 de fevereiro tornou inviável a aplicação do protocolo e o uso da repressão a um número tão grande de trabalhadores em uma situação tão delicada para o governo. A resposta dos trabalhadores, não abrindo mão de sua marcha, impediu que o protocolo se naturalizasse e impusesse o medo. A única força que pode fazer frente a repressão é a força das massas nas ruas. Precisamos avançar!

O fim de um ciclo político denuncia o que está por baixo da superestrutura

A vitória de Macri expressa um movimento na superestrutura política que está presente na América Latina de conjunto e que denuncia dificuldades concretas da reprodução do próprio sistema capitalista.

A queda no preço geral das matérias-primas e a consequente diminuição das receitas nas economias periféricas representou o fim de uma conjuntura favorável para os governos dos países que se colocam na economia mundial fundamentalmente como produtores de matérias-primas. Com isso, as contradições inerentes à forma de reprodução do capital se colocam mais às claras e com mais força. A disputa entre frações da classe dominante se acirra, favorecendo o retorno ao governo de falsas alternativas diferentes e mais conservadoras do que aquelas que ocupavam o governo anteriormente.

A volta à normalidade neoliberal e conservadora se coloca na Argentina portanto como parte de um todo. A conjuntura vista nos países periféricos tem demonstrado qual a resposta atual da burguesia para um momento de acirramento das contradições capitalistas: ou assumem governos da direita conservadora ou as burocracias reformistas se direitizam para responder rapidamente aos interesses dos setores mais influentes da burguesia. O fim desses ciclos políticos em que prevaleceram os projetos reformistas, neodesenvolvimentistas ou de cunho “democrático-popular”, como se queira chamar, deixa lições.

Na superestrutura, uma gama de propostas políticas que não se propoem uma ruptura revolucionária com o modo de produção capitalista. Na estrutura um sistema com pés de barro, incapaz manter a sociedade de pé produzindo para satisfazer ao menos as necessidades mínimas dos trabalhadores. A ameaça da crise capitalista é mundial e o inimigo é um só, o capital. Para derrotá-lo é obrigatório que derrotemos a patronal por todo o globo. A cada ataque que os patrões ousam desferir contra nós, precisamos responder à altura. Unidade internacional dos trabalhadores contra os ataques da patronal! Não recuar frente ao avanço da repressão! Avançar na construção das paralisações, manifestações e greves, independentes dos governos e patrões! Rumo à construção da única saída para a crise capitalista: a ruptura revolucionária!