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Jornal 82: Para responder à crise: Por uma frente da esquerda socialista e dos trabalhadores


12 de setembro de 2015

As ruas foram tomadas novamente pelo verde e amarelo, cores das maiores manifestações depois de junho de 2013. Diferente das anteriores em que a pauta era bem difusa, dessa vez girava em torno do Fora Dilma, pelo Impeachment e contra o PT. Mas, qual o caráter dessas manifestações? E das realizadas no dia 20 de agosto? E a esquerda socialista, quais propostas?

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Uma crise política sem luz no fim do túnel

Mesmo com a sinalização de Dilma/PT e do PMDB do Senado para a burguesia da proposta de “Agenda Brasil” (que apresenta vários ataques contra direitos históricos da classe trabalhadora), mesmo com o tempo que ganhou do Tribunal de Contas da União (TCU) para prestar contas do mandato anterior (embora juridicamente seja muito difícil uma possível improbidade condenar com impeachment nesse mandato), mesmo com as negociações com os empresários da indústria, mesmo com as declarações de banqueiros como o presidente do Bradesco (banco do qual o ministro da fazenda é funcionário) e do Itaú e mesmo com a orientação da Globo em manter Dilma no poder, o fato é que a crise política continua e o governo deve seguir a pauta. No entanto, essa crise pode ter intensidade maior ou menor. Expressão disso é a ameaça de Temer (no momento em que escrevíamos esse texto) em sair da articulação política.

A certeza de que essa crise segue tem como base a sua origem: a crise econômica e suas consequências sobre a classe média, principalmente, a camada superior, com a restrição ao crédito, a inflação, etc., sem que haja alguma possibilidade de serem eliminadas.

E possui também outro elemento importante: por mais que se façam acordos de cúpula, “por cima”, com os partidos, isso não possibilita acabar com a rejeição à Dilma e ao PT que existe na classe média e, também, na classe operária em grandes e pequenas cidades e em regiões onde o partido, tradicionalmente, tinha forte influência política e eleitoral.

A direção é de direita e Os atos seguem esse caminho

As manifestações do dia 16 reuniram dezenas de milhares de pessoas que expressavam o nacionalismo reacionário até mesmo com a defesa de intervenção militar. Embora muitos participando por acreditar que podem melhorar suas condições de vida, esses atos tiveram um caráter de oposição ao governo Dilma, pela direita.

O conteúdo desses atos (com faixas “contra a invasão comunista”, “abaixo o comunismo e a esquerda”, etc.) demonstrou também, além de seu caráter de direta, grande erro de análise e de confusão de seus participantes, pois avaliam ainda que PT e Dilma são de esquerda e defendem o comunismo.

Suas lideranças, os oradores dos carros de som, os grupos de direita (Casa da Monarquia, Integralistas, etc.), esses sim, não têm dúvidas quanto aos objetivos de demarcar suas posições e disputar o poder diante da atual crise econômica e política.

Neste sentido, os grupos de direita têm se apoiado no desgaste de Dilma e do PT (por aplicar o programa da direita, mas com menos rapidez) para canalizar essa insatisfação para o seu programa. A ampla maioria dos participantes tinha como bandeira política “Fora Dilma” (o impeachment é só uma das formas) e “Fora PT” (incluindo ataques diretos ao Lula – única hipótese do PT ter peso em 2018), com alternativas dentro do leque de direita.

São várias as propostas apresentadas para uma eventual queda de Dilma: desde desgastá-la até a proposta de novas eleições (para isso deveria cair Dilma e Temer); outros defendem a saída de Dilma para Temer assumir; há os que defendem a volta dos militares. Enfim, mesmo entre os diversos setores da direita que estão fora dos partidos (revoltados online, MBL, etc.) e entre os partidos da oposição burguesa não há consenso sobre uma saída para a crise política.

O fato de trabalhadores assalariados terem participado dessas manifestações não impede de caracterizá-las como de direita, por várias razões, uma delas é a questão da consciência de classe. Um trabalhador que ganha um salário mínimo e defende o golpe militar não nos faz aliado e não nos furtamos em contribuir com esse debate.

No entanto, a maioria participava como “cidadão” (na condição de eleitor, consumidor, etc., que pode ser de qualquer classe social) sem se reconhecer enquanto classe trabalhadora, mesmo porque a composição majoritária de classe média alta.

Sem a consciência de classe, a parcela assalariada participa desse processo com posições reacionárias e que fortalecem a direita para desgastar ainda mais ou pressionar o governo a aplicar mais rapidamente os ajustes que somente prejudicam a classe trabalhadora.

A direita não tem como lutar contra a corrupção

Já tratamos de corrupção, em edição anterior, como parte da própria lógica concorrencial do capitalismo. Todo capitalista, ainda mais quando todas as empresas têm a mesma produtividade (e a mercadoria com valor similar), precisa encontrar formas de ganhar das empresas concorrentes. Essa é a base da corrupção. E acontece tanto nos órgãos públicos quanto nas vendas entre empresas privadas.

A ilusão da classe média na existência de um Estado capitalista sem corrupção tornou-se um excelente mote para setores da direita defender o fortalecimento das instituições repressivas do Estado (Sérgio Moro, Ministério Público, Polícia Federal) que serão utilizadas contra os trabalhadores, inclusive contra as camadas inferiores da classe média.

Defendemos punições rigorosas, expropriação dos bens, etc. a todos os corruptos e corrompidos. Mas, nenhuma instituição burguesa fará isso porque significa negar a sua própria essência. O programa da direita contra a corrupção não pode ser levado a sério. Somente a organização dos trabalhadores poderá mudar esse rumo.

Reconhecer o inimigo e não desprezar a direita

Sabemos que a direita, de fato, não é a alternativa. A própria burguesia brasileira não trabalha com a possibilidade de um endurecimento do regime a ponto de impor um governo fascista, tipo militar ou civil. Não é a hipótese mais provável porque as instituições democrático-burguesas ainda conseguem garantir a implementação de seu projeto. E também, até esse momento, não é a política do imperialismo alimentar golpes militares. Tem sido exceção.

No entanto, como já frisamos, a direita tem acumulado força e precisamos enfrentar, sob pena de arcarmos com o seu crescimento política. Agora também não podemos nos enganar, pois a direita está alojada no governo federal. Joaquim Levy e Katia Abreu são apenas os mais conhecidos. A própria política econômica de Dilma é o programa que Aécio e a direita defenderam na eleição passada.

Hoje a direita não tem nenhuma liderança que consiga unificá-la (o que aumentaria a sua força), mas isso não significa desconsiderar que suas ideias possuem apoio de massas. As crises colocam em discussão a busca por saídas e, se a esquerda não consegue se colocar como alternativa, a direita também apresenta as suas propostas. Então não descartamos a hipótese de esses setores conservadores ganharem mais projeção social, abrindo a possibilidade de a burguesia endurecer o regime, apelar ainda para a repressão aos movimentos sociais e assim garantir o aumento da exploração sobre os trabalhadores para recuperar a lucratividade.

Também nas crises aumenta o risco do aparecimento de “salvadores da pátria”, como foi o caso de Hitler que ganhou força durante a crise de 1929. Não é o mais provável, mas existe essa possibilidade.

Outra demonstração do avanço das ideias da direita tem sido as votações no Congresso Nacional. A redução da maioridade penal, o avanço da terceirização, a “Agenda Brasil” e tantos outros projetos de lei são de interesse do capital e pioram a vida dos trabalhadores.

Inegavelmente na situação política nacional os setores mais reacionários estão com peso político considerável. Por outro lado, a esquerda revolucionária não tem conseguido se avançar nesse processo, pautar as reivindicações da classe trabalhadora e frear os ataques que o capital desfere contra os trabalhadores. Precisamos construir uma saída que imponha as reinvindicações e pautas da classe trabalhadora.

Impeachment?

Dilma está à frente de um governo que tem aplicado um brutal ataque sobre a classe trabalhadora. Entre seus aliados estão os maiores inimigos de classe como Katia Abreu e Joaquim Levy, dentre outros. O congresso, como todo parlamento burguês, também está na trincheira da burguesia atacando os trabalhadores.

Muitos dizem que com Aécio seria melhor. Pura ilusão. Ambos disputam apenas quem vai administrar melhor para o capital. Estaríamos enfrentando o mesmo projeto econômico, pois o programa que Dilma é o mesmo defendido pelo PSDB. Enfim, são todos inimigos dos trabalhadores.

Com isso, a primeira conclusão que podemos tirar é que as nossas forças não podem ser direcionadas somente para o gerente imediato e seus planos de cortes de verbas públicas e exploração, mas também contra o próprio capital.

A segunda é que, ao não termos uma alternativa organizada da classe trabalhadora, o impeachment de Dilma trará para o seu lugar Temer, Eduardo Cunha ou até mesmo Aécio (ou outro maldito qualquer do PSDB) em uma nova eleição.

A troca de Dilma por outro governo burguês não vai mudar em nada a situação da classe trabalhadora, pelo contrário, ao assumir um governo menos desgastado do que o de Dilma vai haver mais condições para aprofundar os ataques sobre os direitos dos trabalhadores.

Assim, a principal batalha política que se coloca no horizonte é ganhar a classe trabalhadora para a luta, para se colocar em marcha contra os planos de austeridade de Dilma e da burguesia e para colocar toda a sua força na ruptura com o capital. Com a classe trabalhadora mobilizada tudo muda, pois poderemos construir uma saída que seja, de fato, uma alternativa a esse governo, a esse judiciário e a esse parlamento, essa “tríplice aliança” contra os direitos dos trabalhadores.

Por uma frente da esquerda socialista e dos trabalhadores

Precisamos romper esse cerco e apresentar para a classe trabalhadora as propostas da esquerda para a atual crise econômica e política. Apesar de todos os problemas e dificuldades da atual conjuntura, a crise também abre possibilidades para a esquerda revolucionária ser alternativa para a classe.

O desemprego, a ausência de serviços públicos, a inflação, etc., são sintomas da crise econômica e um campo fértil também para as ideias revolucionárias. Precisamos disputar a consciência do trabalhador sob pena de perdê-lo para a direita.

Para potencializarmos a intervenção da esquerda pensamos que é fundamental a construção da unidade da esquerda revolucionária e antigovernista. Essa unidade se colocaria na forma de construção de uma Frente da Esquerda e dos Trabalhadores da qual participaria lutadores, ativistas, trabalhadores e todos os grupos e partidos do campo antigovernista.

Para nós, essa frente deve se iniciar com a realização de plenárias de base para discussão e elaboração de um programa que responda à crise política e econômica, a partir das necessidades dos trabalhadores. Esse programa, a nosso modo de ver, deve partir das reivindicações imediatas (contra o desemprego, aumento de salários para enfrentar a inflação, etc.), mas também deve tratar da construção de uma alternativa política para a crise, se opondo ao crescimento da base da direita e disputando a consciência dos trabalhadores.

É hora de a esquerda socialista construir ações de rua

Reafirmamos que nem no ato do dia 16 e nem do dia 20 os interesses da classe trabalhadora estavam representados.

De um lado os setores de direita que canalizaram a insatisfação com Dilma e tem organizado manifestações massivas. De outro, ainda que com pauta “contra a política econômica” e “contra o ajuste” (bandeiras bem genéricas), várias organizações como MST, MTST, CUT, UNE e maioria do PSOL realizaram as manifestações do dia 20.

Mesmo um setor insistindo que não seria um ato em defesa do governo (por isso em alguns estados foram realizados dois atos), a forte presença da CUT e de militantes do PT que assumem a defesa de Dilma, foi o que realmente apareceu mídia.

Embora os eixos da convocação do dia 20, apresentados por Guilherme Boulos (MTST), tenham sido: 1) Contra o ajuste fiscal, que os ricos paguem pela crise; 2) Fora Cunha, não às pautas conservadoras e ao ataque aos direitos; 3) A saída é pela esquerda, com o povo na rua e por Reformas populares e também contra Joaquim Levy e a política econômica, o chamado não se apresenta contra Dilma, que nomeou Levy, tem o partido de Cunha como aliado e aplica toda essa política contra a classe trabalhadora.

No mesmo chamado, Guilherme Boulos (ainda que não tenha nenhuma crítica a Dilma) criticou os grupos e partidos de esquerda por não mobilizarem as pessoas em torno das suas propostas. Boulos tem razão. A esquerda socialista não acredita que a força das mobilizações canalizada pelos governistas ou pela oposição burguesa levará a classe trabalhadora à vitória.

Há tempos temos reafirmado a necessidade de a esquerda, em oposição a esses dois setores, construir um processo de mobilizações com as reivindicações históricas da classe trabalhadora e também um Encontro Nacional de Lutadores e Ativistas.

Nesse sentido, achamos extremamente positivo a convocação feita pela Coordenação Nacional da CSP Conlutas de um ato nacional no dia 18 de setembro, em São Paulo, e de um encontro nacional no dia 19, também em São Paulo.

Agora é construí-lo em cada local, em cada categoria, escolas, bairros, etc., para que seja, de fato, democrático e de base e possa sair com um programa anticapitalista contra o desemprego, por reforma agrária e urbana, por lutas democráticas, contra a criminalização do movimento social, contra a “Agenda Brasil”, etc. Fortalecer esse encontro é uma das primeiras tarefas dessa frente da esquerda socialista e dos trabalhadores.

Os ataques (Agenda Brasil, PPE) aos direitos e as lutas

Os efeitos da crise chegaram e de forma intensa, com desemprego, arrocho salarial, perdas de direitos e congelamento salarial. E os trabalhadores resistem. São várias categorias em greve.

No funcionalismo federal são os professores e os técnicos das universidades federais, os técnicos dos institutos federais, o judiciário federal e os trabalhadores do INSS. A maioria já passa dos 80 dias em greve. Lutam pela recomposição salarial.

Nos estados, o funcionalismo do Rio Grande do Sul enfrenta parcelamento de salários e a tentativa do governo jogar sobre as costas dos trabalhadores a falência do estado. No Rio Grande do Norte os trabalhadores da saúde estadual estão completando 70 dias de greve por reajuste salarial.

Nas montadoras a luta é contra as demissões. Os trabalhadores da GM, de São José dos Campos, resistiram com greve e mobilização de rua e conseguiram, pelo menos, adiar as demissões (transformadas em layoff por 5 meses). Também na GM, de São Caetano, foram mais de 490 demitidos. Na Volks, Taubaté, o processo é o mesmo. No ABC, a Mercedes ameaça alegando que tem “excesso” de trabalhador e que precisa cortar 2000 postos de trabalho. E quando fechávamos essa edição a greve se iniciava contra as demissões. Essa situação se espalha por outras montadoras e se estende para as autopeças que também demitem ou aproveitam a situação para impor a redução de salários e redução da jornada com o PPE (Plano de Proteção ao Emprego).

Todos esses ataques aos nossos direitos são parte do ajuste fiscal implementado por Dilma, garantindo a lucratividade das empresas à custa da redução dos nossos direitos.

A tendência é que esses ataques se aprofundem com a “Agenda Brasil” que, entre outras coisas, vai discutir a implementação da idade mínima para aposentadoria no Regime Geral da Previdência e uma nova legislação para facilitar a privatização pelas PPP (Parceria Pública Privada)

Não nos resta outra alternativa que não seja a luta e a organização. O amplo apoio e solidariedade a essas greves e lutas são fundamentais para a vitória de cada uma delas, que fortalece a classe trabalhadora de conjunto. E essa campanha depende de nós, esquerda organizada, pois as direções governistas não vão fazer nada que possa desestabilizar o governo que apoiam.