Desde março de 2019 o Espaço Socialista e o Movimento de Organização Socialista se fundiram em uma só organização, a Emancipação Socialista. Não deixe de ler o nosso Manifesto!

Contrariando o Plebiscito, Tsipras Pactua Austeridade com a Troika


14 de julho de 2015

No Plebiscito, uma maioria expressiva dos eleitores (61%) rejeitou o pacote da Troika e os cortes da austeridade. Um recado de que os trabalhadores estão cansados dos planos de ajuste e, o mais importante, têm disposição de enfrentar o imperialismo alemão e francês.

troika

Mas, agora Tsipras e a maioria do Syriza desacatam a decisão da consulta popular e fazem algo muito pior com uma proposta que amarra a Grécia com os planos de austeridade pelos próximos três anos e com consequências também para o futuro!

Podemos dizer que se trata de uma rendição do Syriza e de Tsipras perante Troika, demonstrando que a sua política é a de conciliação com os donos da Europa. Repetem-se as tragédias políticas do século XX em que as massas de trabalhadores querem seguir muito mais além do que as direções.

Ao invés de 7,2 bilhões de euros (R$ 25,7 bi) no curto prazo, agora a Grécia solicita 53,4 bilhões de euros (R$ 190,8 bi) e “como garantia” um conjunto de medidas econômicas. Mas, mesmo com a capitulação do governo grego não há nenhuma garantia de que pacote vá ser aceito pela Troika, apenas perspectivas de novas rodadas de negociação.

O que é certo é que Tsipras e o parlamento grego se comprometem com a efetivação de medidas duríssimas e ainda por maior prazo com o amento do IVA (Imposto sobre o Valor Agregado) para 23% (com algumas poucas exceções), cortes na Previdência que vão elevar a idade de aposentadoria de 65 para 67 anos, o fim da isenção de impostos nas Ilhas Gregas o que irá encarecer uma das fontes principais de receitas da Grécia que é o turismo. Além disso, acabam com a ajuda social para os mais pobres até 2019, cortam salários do funcionalismo públicos, avançam nas privatizações dos setores elétricos, portos e aeroportos e cortam gastos militares.

Como é de se esperar (pelo menos os que não confiam nos governos burgueses, sejam eles de direita ou ditos de “esquerda”) os dirigentes do bloco ainda não aceitaram e tentam arrancar mais e mais da Grécia. A carta “oficiosa” do ministro alemão que circulou nesse fim de semana (fonte: esquerda.net) é a expressão de como o imperialismo reage mesmo com os que querem capitular. Ameaçam excluir a Grécia do Euro e ainda querem uma “compensação e garantia” de 50 bilhões de euros em bens.

O Eurogrupo (ministros de finanças dos países da zona do euro) busca submeter à Grécia e demais países

A Zona do Euro não é um todo uniforme, em que todos exercem o mesmo papel. Internamente há países que têm mais poder político e econômico e outros que não têm esses poderes. É a velha fórmula de países desenvolvidos impondo sobre os subdesenvolvidos a sua política, ou seja, para uns serem ricos outros necessariamente têm que “bancar” essa riqueza.

A Zona do Euro só pode sobreviver se houver essa “divisão” entre países ricos e pobres. Os primeiros dependem dos segundos. O capital alemão ou francês para garantir a sua lucratividade precisa explorar os trabalhadores gregos, ter mercado para que possa vender suas mercadorias e ter força de trabalho mais barata e disponível.

Num contexto de crise estrutural do capital, com um possível momento de agravamento no horizonte (veja-se as quedas de ações na China), o imperialismo europeu não pode fazer concessões (como de fato não tem feito), ainda mais sem enfrentamento consequente, apenas bravatas e negociações. O Eurogrupo está muito endurecido, levando a que na prática se tenha apenas um aperto da austeridade mantendo a recessão e o afogamento da economia grega.

Como praticamente todas as economias dos países periféricos da Zona do Euro passam por problemas (relação PIB versus Dívida, retirada de direitos, desemprego, aumento da pobreza, etc.) a solução grega será uma referência para todos esses países e, principalmente, para as lutas da classe trabalhadora. Pensarão os trabalhadores: se os gregos conseguiram derrubar a Troika nós também podemos conseguir…

A finalização desse acordo no clima pós-Plebiscito e com a economia grega praticamente paralisada, novos ataques marcarão uma retomada das lutas na Grécia, dessa vez se voltando contra o Syriza. Os trabalhadores e o setor mais pauperizado do povo grego não irão aceitar novas doses do mesmo veneno sem lutar. Se era pra aceitar todas ou quase todas as exigências da Troika então por que o Plebiscito?

A importância desse tema no contexto atual da Europa e do mundo

A situação da Grécia, embora represente apenas 2% de todo o PIB da União Europeia, tem importância central, sobretudo política e estratégica, pois é apenas a ponta de um iceberg muito maior. Por trás da Grécia estão Portugal, Espanha, Irlanda, Itália e outros. A situação da Grécia mostra o rumo e as tendências que estão postas para os demais “primos pobres” do euro. As negociações com Troika são duríssimas e o que os espera é apenas mais austeridade.

Privados do direito básico na soberania de qualquer país de emitir sua moeda e, inclusive, de desvalorizá-la para facilitar as suas exportações como fazem abertamente os EUA, Alemanha e China, os países periféricos da Europa são postos em condições de “igualdade” sem de fato serem, uma vez que há profundas diferenças entre a Alemanha e Grécia (bem como outros países).

Ocorre que Grécia também Portugal, Espanha, Irlanda e até mesmo Itália não conseguem concorrer no mercado europeu em condições de igualdade com as potências Alemanha e França, que possuem um nível de tecnologia muito maior. Dessa forma, a Grécia e os demais países citados foram acumulando déficits e tendo que se endividarem, tomando emprestado dos bancos europeus os euros necessários para sustentar seus gastos correntes.

Ao servirem de mercado consumidor para as mercadorias das potencias centrais, ao receber investimentos financeiros para financiar esse consumo e ao mesmo tempo como suprimento de mão de obra barata e de livre circulação, esses países têm sustentado o crescimento de Alemanha e França e seus seguidos superávits.

O “problema grego” é de fato um “problema europeu” e com repercussão na economia capitalista, dado que um desmonte desse bloco (ou pelo menos o seu questionamento) cairia por terra mais uma tentativa de o capital europeu sair de sua crise estrutural.

Banqueiro e agiota fazem investimentos?

O discurso é sempre o mesmo: adotam-se essas medidas de austeridades para garantir o crescimento econômico, como se pudesse vir com um estalar de dedos. O curioso é que essas “medidas para crescer” são sempre retirando direito dos trabalhadores e aumentando dinheiro para os ricos.

Como sabemos o crescimento das economias capitalistas necessitam de “uma ajuda do Estado” e como esses não têm dinheiro suficiente precisam aumentar os impostos ou se endividarem. É aí que entram (e entraram) os banqueiros e especuladores. À procura de lucro fácil emprestam dinheiro ao Estado com juros altíssimos e com lucro crescente (que não conseguiriam na produção) e esse disponibiliza (em forma de crédito, por exemplo) para as empresas (para produzir) e população em geral (para consumir).

Ocorre que no primeiro desiquilíbrio o Estado não pode pagar a dívida e passa a buscar novos empréstimos para pagar o que venceu.

É o caso da Grécia. Toda a discussão sobre a dívida e do pacote de resgate não é para investir em emprego, escola, obras públicas ou qualquer outra coisa que possa beneficiar o povo grego, pelo contrário, esses novos empréstimos nem chegam a entrar na Grécia, pois vão direto para os cofres dos bancos credores da dívida.

Então não podemos falar em investimentos desses empréstimos financeiros dos bancos europeus na Grécia, pois eram mais um espaço de realização do capital para os países dominantes que durante esse tempo incentivaram e sustentaram o crescente endividamento grego. Isso comprova que as transações financeiras e os empréstimos dos bancos e dos órgãos como o FMI, o Banco Mundial não conseguem resolver os problemas financeiros dos países devedores, pelo contrário, eles são agravados.

Para fazer frente ao crescente serviço da Dívida esses Estados já vêm cortando violentamente os investimentos nos serviços públicos e direitos sociais ao mesmo tempo em que atacam os salários, direitos e empregos como forma de tentar tornar suas economias mais competitivas no mercado europeu e internacional (via sobrecarga do trabalho direto da extração de mais valia-absoluta). Assim, o euro é a expressão monetária de uma dominação muito maior intra-Europa.

Mas, o que realmente fez a Dívida de todos esses países, em particular da Grécia, dar um salto foi a operação de salvação dos bancos a partir da crise de 2008 que elevou a suas Dívidas a níveis estratosféricos. No caso da Grécia, após uma renegociação, a Dívida foi reduzida, mas os juros e a recessão a fizeram crescer novamente até atingir o absurdo patamar de 177% do PIB grego.

A dívida total da Grécia hoje é de € 332 bilhões, ou cerca de US$ 370 bilhões. Quase 80% da dívida pública grega vêm dos fundos de resgate europeus, dos empréstimos bilaterais dos países da Zona Euro, dos empréstimos do FMI ou estão nas mãos do Banco Central da Europa (BCE). A dívida grega é uma dívida pública adquirida em grande parte para que o Estado grego pudesse pagar os bancos privados. (http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/O-escandalo-e-roubo-da-divida-grega/6/32806)

A partir de então tem sido negociado empréstimos com a Troika, mas ao custo de fazer com que a Grécia fique cada vez mais pobre e dependente dos agiotas internacionais, pois quanto mais paga mais deve. A Troika tem praticamente assumido os rumos econômicos do país, fiscalizando todos os gastos e investimentos e vetando tudo aquilo que possa comprometer sua fatia do leão.

Desde 5 anos atrás quando se firmaram os primeiros acordos com a Troika, houve uma depressão da economia com a perda de 25% do PIB anual, 25 % da população está desemprega e na juventude esse índice é acima de 50%! A decadência social também se expressa nos salários e pensões dos aposentados e na queda dos rendimentos dos setores médios da sociedade.

Assim, a rejeição no Plebiscito do pacote apresentado pela Troika expressou a disposição de luta dos trabalhadores e da maior parte do povo Grego que sente que as coisas só irão piorar em uma situação insustentável.

Não Pagamento da Dívida e Romper Com o Euro! Duas medidas Cruciais para resolver o problema da Grécia e demais países periféricos da Europa

Conhecemos bem o sistema da dívida pública. Lá como aqui, quanto mais paga, mais deve. E a maior parte dessa dívida não significou sequer um leito de hospital ou uma sala de aula. São os banqueiros e os agiotas (para quem os governos da Alemanha e da França trabalham efetivamente) procurando valorizar o seu dinheiro e à custa dos trabalhadores.

Para que haja qualquer perspectiva de retomada da economia grega é preciso a imediata ruptura dos acordos com a Troika, o NÃO pagamento da Dívida Pública e a Estatização do sistema Financeiro sob controle dos trabalhadores. Essa é a única forma de estancar a sangria da economia grega e ter dinheiro para pagar os salários, sustentar os serviços públicos e os investimentos que o país precisa. Além disso, é preciso voltar a ter o controle de sua moeda. Tudo isso implica a ruptura com o Euro.

Essas medidas são defensivas do ponto de vista das necessidades imediatas da economia grega e ao mesmo tempo ofensivas no sentido da ruptura com o capital financeiro e com a dominação das maiores potencias Alemanha e França. Mas, é preciso ver essas medidas como parte de uma política para ganhar a consciência da classe trabalhadora e avançar para a ruptura não só com a zona do Euro, mas com o próprio capitalismo.

Olhando em perspectiva essas medidas teriam que ser seguidas por outras de caráter anticapitalista e socialista uma vez que a desvalorização da moeda grega, o dracma, exigiria a expropriação dos principais ramos da economia sob controle dos trabalhadores a fim de que a produção se voltasse para as necessidades sociais e não para o mercado e o lucro. Caso contrário, a desvalorização geral da moeda seria jogada sobre as costas dos trabalhadores redundando no aumento da miserabilidade da mesma forma.

Também essas medidas não podem ser vistas como “etapistas”, primeiro essas de “libertação nacional” e depois outras radicais em direção à expropriação do poder da burguesia. Essas medidas só terão sentido se forem parte de uma estratégia de ruptura com o capitalismo.

E mesmo essas medidas “imediatas” para serem adotadas significam uma luta de vida ou morte com o imperialismo europeu, por isso é fundamental que seja uma luta de todos os trabalhadores dos demais países da Zona do Euro, com a criação de formas de organização para internacionalizar a luta, condição fundamental para enfrentar o capital.

Syriza e Tsipras: não dá para confiar

Com esse acordo fica nítido que nem Tsipras e nem o Syriza, assim como as organizações correlatas nos demais países como o Podemos na Espanha e outros, irão impulsionar os trabalhadores nesse caminho. São partidos e direções pequeno-burguesas que diante dos desafios decisivos de ruptura com o capital e com a burguesia, recuam aceitando “acordos” que na prática significam duríssimos ataques aos trabalhadores.

Assim, não se pode ter nenhuma ilusão em Tsipras e no Syriza, que ao serem representantes dos setores médios da sociedade e até de alguns setores da burguesia, não irão impulsionar a mobilização da classe trabalhadora e muito menos a ruptura com o pagamento da Dívida, a Troika e o euro.

Indo de capitulação em capitulação, além de ajudar a impor aos trabalhadores mesmo que uma versão menos mal dos planos de austeridade, Tsipras irá se desgastando cada vez mais, até o momento em que não será mais útil para a burguesia e será substituído.

Por uma Saída revolucionária dos Trabalhadores para a Grécia e a Europa!

Somente os trabalhadores podem apontar essa estratégia de ruptura, mas tudo indica que ainda há um caminho a percorrer em termos da sua consciência, programa e formas de organização. Esse é o maior atraso, pois se há uma rejeição massiva da austeridade, o mesmo não ocorre ainda no campo da gestação de alternativas socialistas, embora haja experiências de luta e organização independentes em curso. Isso ainda dificulta o oferecimento de uma alternativa em termos político-sociais e não apenas para os trabalhadores da Grécia mas também dos demais países mais pobres da Europa.

Essa alternativa é mais necessária devido ao fato de que de outro lado a extrema direita também se organiza e se apresenta com pseudo-saídas xenófobas e de ataque frontal aos direitos dos trabalhadores e direitos sociais alcançados nas décadas passadas. Apontar uma saída socialista para a Grécia é necessário também para se enfrentar a extrema direita que cresce em várias regiões do mundo. Na Grécia hoje estão se realizando experiências fundamentais para os trabalhadores de todo mundo.

Assim, uma ruptura com a Troika e o Euro só são possíveis a partir de um processo de mobilização e organização dos trabalhadores e da maioria do povo pobre grego independentes e contra o Syriza e a burguesia grega.

Mas, os avanços das experiências dos trabalhadores e das vanguardas de luta assim como a necessidade da construção de organizações revolucionárias podem apontar um caminho para a situação da Grécia e dos demais países em crise na Europa.

Somente o avanço das lutas, consciência e organização da classe trabalhadora e da juventude e a luta pela construção de organizações políticas revolucionárias com influência de massas podem levar a um governo socialista revolucionário que tenha a disposição de impulsionar uma revolução e ao mesmo tempo fazer um amplo chamado a que os trabalhadores e setores oprimidos nos demais países em dificuldades façam o mesmo e juntem-se em uma federação de estados revolucionários da Europa que indique um caminho para os demais países rumo ao socialismo.

De última hora… O que é ruim pode ficar pior…

Quando estávamos fechando essa nota, as negociações do governo grego com a Troika e o Eurogrupo ainda não estavam concluídas, mas as notícias indicavam que, incentivados pela capitulação de Tsipras, iam apertar o cerco com medidas muito duras e ainda avançar sobre a própria soberania do país. Para iniciar as negociações as lideranças da Zona do Euro colocaram como condição que a Grécia:

– Até o fim do dia 15 (quarta-feira) o parlamento grego vote uma lei que garanta a implementação das medidas de austeridade que os credores indicaram;

– O parlamento tem que votar uma legislação com aumento de impostos, reforma no sistema de aposentadoria aumentando a idade mínima para 67 anos e também colocar bens no valor de 50 bilhões de euros como garantia pelos novos créditos.

As noticias são de que Tsipras deve aceitar parte das exigências, incluindo nas garantias medidas como um plano de privatizações e reforma na legislação trabalhista para “flexibilizar” direitos trabalhistas, permitindo, por exemplo, demissões coletivas.