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Uma visão da Educação pública a partir do estado de São Paulo


6 de junho de 2018

Muito se tem a dizer sobre as mudanças que estão ocorrendo na Educação brasileira, de imediato, pode-se garantir que não são para melhor desenvolvimento do conhecimento humano, especialmente, da infância e juventude caso sejam observadas a partir das perspectivas e necessidades da classe trabalhadora.

Essas mudanças tratam de limitar ainda mais o papel da escola e readequar seu ensino-aprendizagem à recente Reforma Trabalhista, à Terceirização Irrestrita e aos demais ataques que estão por vir, ou seja, à atual condição do mercado de trabalho.

Ter o estado de São Paulo como ponto de partida é importante para observarmos como a Educação pública estadual tem sido entregue para as empresas privadas e como o governo estadual tem buscado abrir caminho para aplicar a nova BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e a prevista Reforma do Ensino Médio, ataques do governo federal.

Em São Paulo, há cerca de duas décadas, já são adotadas algumas medidas que afetam e limitam muito o papel da escola, a aprendizagem dos estudantes da rede pública estadual e a categoria profissional de professor. No entanto, dois discursos são predominantes na Secretaria Estadual de Educação (SEE) o de “fim da evasão escolar” ou de “garantia de permanência” e o de “fortalecimento da aprendizagem”.

Pode-se debater todas as polêmicas que envolvem esses discursos, entretanto, interessa-nos afirmar que ambos os casos têm servido para maior solicitação de “socorro” às parcerias privadas (assessorias e consultorias com atuais “projetos” como o CIS e o MMR), maior centralização de conteúdo (de suas competências e habilidades) da rede e para a redefinição da política educacional.

Com isso, nos parece óbvio afirmar, mas, os índices de evasão nas escolas públicas estaduais se mantêm e o fortalecimento da aprendizagem continua sem parâmetro.

É nesse universo que o governo estadual busca avançar em novas formas de privatização da rede (se é que podemos denominar assim) juntamente com a BNCC e a Reforma do Ensino Médio, em que teremos uma maior transferência de verba pública para a iniciativa privada; estudantes melhor “preparados” para o mercado de trabalho precário, sem direitos e sem emprego; uma redução drástica do número de professores e professores desempregados.

Os discursos da evasão e do fortalecimento da aprendizagem

Na escola pública de Ensino Fundamental, de São Paulo, há alguns anos, teve início a Progressão Continuada, que possibilitou ao estudante ser aprovado no final de cada ciclo sabendo ou não ler e escrever e a centralização do conteúdo programático de cada disciplina. Para o governo do estado, de imediato, possibilitou reduzir gastos com a evasão (abandono) escolar e com a repetência.

Durante todo esse período, com problemas se acumulando, os institutos Itaú, Unibanco, Airton Senna, Lemann, etc., por via de verbas para determinados projetos (com isenções em Impostos de Renda), entravam em algumas escolas por tempo determinado, mantinham sua “filantropia empresarial” como estratégia de marketing, faziam suas propagandas, passavam também a oferecer créditos e faziam discursos de “interesse público” de reduzir os problemas da Educação paulista.

Também durante esse período, aos estudantes que permaneceram nos estudos, além do ensino regular, passaram a ser oferecidas a Escola de Tempo Integral (226 escolas) ou o Novo Modelo de Escola de Tempo Integral (308 escolas) para Ensino Fundamental e Ensino Médio.

Esses “modelos” foram adotados com o discurso de que fortaleceriam o aprendizado, especialmente de Língua Portuguesa e Matemática. Iniciaram pouco tempo antes de ocorrer a tentativa, pela SEE, de Reorganização da Rede Escolar (proposta de fechamento total de 93 escolas e de períodos em outras) e a Ocupação das Escolas, pelos estudantes. Isto é, fortalecer o estudo demostrou-se, dentre outros aspectos, reduzir o número de escolas ou salas de aula, limitar “melhor” aprendizagem a duas disciplinas, dificultar a locomoção de estudantes e reduzir o número de professores.

Com mais de 200 escolas ocupadas o fechamento dessas escolas foi suspenso, mas muitas salas de aulas têm sido fechadas de lá para cá resultando em fechamentos de períodos inteiros, negativas de vagas para matrícula, demissão de milhares de professores contratados e precarização do trabalho de outros milhares de professores estáveis trabalhando em até 05 escolas ao mesmo tempo.

Esses discursos do governo do estado que buscaram “socorro” em parcerias privadas (Organizações Não Governamentais, Organizações Sociais, Organizações da Sociedade Civil de Interesses Públicos, etc. que fortaleceram o caminho do capital financeiro na Educação) sobre a redução da evasão escolar e de fortalecimento do aprendizado têm sido constantes e falaciosos.
Temos nos deparado, cada vez mais, com escolas sem verbas, sem os ditos atrativos para os estudantes, sem condições de trabalho para os professores e com problemas cotidianos crescentes que não favorecem, de fato, a permanência e nem a aprendizagem.

A classe trabalhadora com a evasão escolar e as políticas educacionais do capital

Segundo dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), em pesquisa mais recente, o índice de evasão chegou em média a 11,2%. O último ano do Ensino Fundamental e também o primeiro ano do Ensino Médio apresentaram as maiores desistências, de acordo com essas informações.

Para reduzir o índice de evasão – já que os próprios estudos indicam como causas as condições socioeconômicas, culturais, geográficas ou de encaminhamentos didático-pedagógicos e de baixa qualidade de ensino das escolas – não há como fazê-lo sem considerar motivos, também já apontados por estudos, como da escola distante de casa, da falta de transporte escolar, das dificuldades financeiras, do emprego precário, do desemprego, da falta de interesse dos estudantes, do uso de drogas, etc.

Além de tudo isso, parece-nos obvio que a juventude da classe trabalhadora enfrenta ainda várias outras formas de violência, poderíamos indicar os números de assassinatos de jovens nas periferias (especialmente de negros), os altos números do desemprego que atinge a faixa etária da fase final do Ensino Fundamental e de todo o Ensino Médio e EJA (Educação de Jovens e Adultos).
Assim, os índices de evasão, suas indicadas causas, motivos e formas demonstram a falácia do discurso de anos “de governo” e seus encaminhamentos no sentido de sua drástica redução.

A pergunta que se mantém é: como se acaba com o abandono escolar sem que os governos ataquem suas causas e motivos, diretamente ligados ao cotidiano escolar e da juventude?
Os governos sabem que isso não é possível em meio a situação da Educação, a necessidade de adequá-la às atuais Reformas, as crises vividas hoje no país e a crise estrutural do capital.

No entanto, mascaram esses problemas para retirar das escolas e da juventude o direito à Educação pública, gratuita e de qualidade e criam formas de transferir a verba pública para empresas privadas sustentarem seu capital e seus lucros.

A nova Base Nacional Comum Curricular e a Reforma do Ensino Médio

O MEC entregou para votação no Conselho Nacional de Educação (CNE) a terceira versão da nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Ensino Médio. Trata-se de uma política educacional que estabelece e centraliza diretrizes curriculares, que deverão ser implementadas pelas redes de ensino em todo o território nacional.

Entendemos que a escola, sob a tutela do Estado, no sistema capitalista, existe em função dos interesses da classe dominante, ou seja, de não contrariar sua função social essencial que é de formar mão de obra de acordo com as necessidades do capital e de sua “preparação para o mundo do trabalho” com uso mínimo de verba pública.

Isso significa que o empresariado junto ao governo busca moldar as redes públicas para atender seus interesses e não há de se esperar que seja para atender aos interesses humanos, da classe trabalhadora ou da sociedade de conjunto.

Portanto, não esperamos que a classe trabalhadora seja bem representada em deliberações do CNE, do MEC ou de SEEs, especialmente em um período de cortes de gastos, como o da Emenda 55 (anterior PEC 241, congela ou limita gastos sociais por 20 anos) e de reformas.

Implantar a BNCC para seguir com a Reforma do Ensino Médio significa, além de aplicar os cortes de gastos e transferir verba pública para empresas privadas, aplicar outras duras mudanças contra a classe trabalhadora que governos e burguesia necessitam. E, como já dissemos, São Paulo segue nessa sintonia.

A BNCC e algumas de suas consequências imediatas

A BNCC irá, dentre outras mudanças, impor a junção de disciplinas – (por exemplo: Português, Artes e Inglês), que se tornará área de conhecimento (por exemplo: Linguagens e suas Tecnologias) – isso possibilitará, além da básica integração entre disciplinas:
Para o professor: Haverá muita demissão, rebaixamento da formação, criação do profissional de Notório Saber (sem formação em Licenciatura, mas, com possibilidade de atuar na área), rebaixamento salarial, corte de direitos, etc.

Para o estudante: Redução dos níveis de conhecimento com a redução de disciplinas, menor contato e acompanhamento do professor de cada disciplina, número menor de disciplinas obrigatórias, portanto, menor acesso à diversidade com menor possibilidade de entrar em faculdade, concurso público, etc.

A Reforma do Ensino Médio e algumas de suas consequências imediatas

A Reforma do Ensino Médio, dentre outras mudanças, irá impor a obrigatoriedade apenas das disciplinas de Português e Matemática. Isto é, será obrigatória apenas uma disciplina da área de Linguagens e suas Tecnologias e uma disciplina da área de Matemática e suas Tecnologias.
Isso significa que as outras disciplinas e, consequentemente, as outras áreas – como de Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Sociais – serão opcionais.

Além disso, 40% das “disciplinas” no ensino regular poderão ser realizadas à distância e todo o EJA.

Como dissemos, a Base Nacional Comum Curricular e a Reforma do Ensino Médio estão a serviço de adequar as escolas da rede pública a um mercado de trabalho que já está sofrendo com o emprego precário, o desemprego e com as mudanças da Reforma Trabalhista, da Terceirização irrestrita, com o trabalho intermitente, parcial, análogo à escravidão, sem direitos, etc. e com a divisão internacional do trabalho que o Brasil assume perante o mundo.

Dessa forma, o Ensino Médio regular, das escolas estaduais, terá como disciplinas obrigatórias apenas Português e Matemática e as demais disciplinas optativas, podendo parte destas serem realizada à distância. Com isso, tenta atender a expectativa de um mercado de trabalho precário, com baixos salários e sem emprego.

Portanto, com essas mudanças teremos também um Ensino Médio (após a reforma e com a nova base curricular) com menor presença de estudantes nas escolas, o que irá exigir um menor número de professores, de salas de aulas e até mesmo de escolas.

A falácia de “Projetos” como o CIS e o MMR para “fortalecer aprendizado”

Além da Base Nacional Comum Curricular, da Reforma do Ensino Médio, do Ensino de Tempo Integral, etc., em São Paulo, nas escolas estaduais também estão sendo impostos pelo governo do PSDB (Geraldo Alckmin) dois projetos: o CIS (Contrato de Impacto Social) e o MMR (Método de Melhoria dos Resultados), que vão ao encontro, evidentemente, de unir, nesse momento, os discursos e as ações – em relação à evasão escolar e ao fortalecimento do aprendizado – do governo do estado com as políticas educacionais do governo federal.

Esses dois projetos têm como diferencial, no mínimo, o tipo de privatização e são semelhantes entre si no aspecto de garantir ao capital financeiro (através de empresas privadas) uma chegada mais efetiva nas escolas da rede pública estadual com institutos e consultorias de gestão escolar (baseadas nas leis de Ongs, OSs, OCIPs, etc.), que não atuam somente como “filantropia empresarial” e seus descontos em Imposto de Renda, como há algum tempo atrás, mas passam a abocanhar, efetivamente, parte da já minguada verba pública a partir de apresentação de resultados “positivos”.
A Fundação Lemann (de um dos maiores banqueiros do mundo, cervejeiro e o 22º mais rico do mundo), por exemplo, é um dos agentes financeiros que faz investimento de risco na Educação (através de ações na Bolsa de Valores) contratando uma dessas consultorias para dizer o que fazer para “melhorar” os índices de evasão escolar e aprendizado.

São utilizados os dados da Educação pública contra a própria Educação pública como se os problemas fossem apenas da escola e de seus atores. Em algumas escolas utiliza-se de avaliações meritocráticas (preparadas pela própria Secretaria da Educação, sem considerar a autonomia didático-pedagógica do professor) para definir melhores e piores escolas, por onde passarão determinados projetos e, obviamente, em quais escolas haverá possibilidade de investimento certo e não de risco.

É a burguesia, mais uma vez, buscando faturar alto com os problemas dos serviços públicos (transforma vulnerabilidade em lucro), impondo a adaptação da Educação pública ao mercado trabalho da Reforma Trabalhista e da Terceirização Irrestrita.

Age como se professores, estudantes e demais trabalhadores não soubessem o que fazer para melhorar os rumos da Educação no Brasil, como se não soubéssemos o tipo de mão de obra, em sua maioria, pouco qualificada que necessitam, a situação da maioria das escolas (sem verbas, sem professores suficientes, salas lotadas, sem estruturas decentes para o trabalho docente e para o aprendizado como falta de laboratórios, informática, bibliotecas, etc.) e a situação de vida da própria juventude.

São cerca de 5.200 escolas no estado, representam em média 35% das matrículas no país. Essas empresas com o MMR tiveram como proposta atuar inicialmente em 77 escolas passando já no ano seguinte para 1082 e com o CIS iniciar em 122 escolas.

O CIS (Contrato de Impacto Social) é uma parceria do Estado com empresas privadas (Insper Metricis financiada pelo BID, Institutos Itaú, Unibanco, Airton Senna, Lemann e Ongs especializadas em gestão escolar) para reduzir entre 2 a 7% as taxas de evasão no Ensino Médio contatando para isso estudantes e familiares.

Por enquanto está suspenso em São Paulo (pelo nível de mobilização e trabalho conjunto entre universidade pública e escola pública, isto é, Universidade Federal do ABC e subsedes de Oposição do Sindicato dos Professores, APEOESP).

Essas empresas irão atuar em 61 escolas efetivamente (Grupo de Tratamento, que já possuem bons resultados segundo o governo) e outras 61 escolas (como Grupo de Controle, que já possuem baixos resultados) serão parâmetros de comparação sem receber nenhum tipo de atuação durante a vigência do contrato.

Esse contrato, projeto apresentado pelo governo do estado através das Diretorias de Ensino, é um experimento social que transforma um problema da Educação pública em lucro financeiro. E chegou nas escolas sem nenhum debate com a comunidade escolar, de cima para baixo e sem que professores, estudantes e seus familiares o conhecessem. Envolve milhões de reais por 4 anos que saem das escolas públicas e seguem para empresas privadas.

O MMR (Método de Melhoria de Resultado) é parceria do Estado com empresas privadas (além de Ongs e empresas, é coordenado pelo Instituto Falconi que tem como um de seus conselheiros Pedro Moreira Salles, presidente do conselho Itaú-Unibanco) e promete melhorar o aprendizado dos estudantes com planos de trabalho personalizados e monitorados pela própria comunidade escolar.

Nesse momento, está a todo vapor em algumas escolas do estado e subordina ainda mais diretamente as direções de escola e Diretorias de Ensino à SEE para com isso fazer com que professores e estudantes, sob pressão, se enquadrem na metodologia do “Identificar desafios, planejar forma de superá-los e implantar soluções elaboradas”, obviamente já previamente definidas pelo própria Instituto e governo. E, nesse caso, a empresa começou com método de melhoria para a disciplina de Matemática e posteriormente será Português.

Consideramos que esses projetos, que o governo de São Paulo tem buscado impor à rede pública estadual, combinam várias questões: Buscam transferir dinheiro público para a iniciativa privada (em momento de crise, em que a burguesia quer manter seus lucros a qualquer custo), buscam adequar e enquadrar ainda mais a rede pública a um mercado de trabalho precário ou sem vagas de emprego, buscam adequar a rede pública paulista a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e a Reforma do Ensino Médio.

Educação pública estadual sendo privatizada ocultando o discurso da privatização

A burguesia e os governos estadual e federal – diante de uma situação de crise no país com o aumento crescente dos níveis de pobreza, da desigualdade social, do desemprego, de emprego precário, inclusive, na juventude – têm se esforçado para readequar a Educação pública às necessidades da manutenção da lucratividade.

Para isso, utilizam a escola pública para manter uma maioria de jovens “formada e moldada” de acordo com a necessidade de um mercado de trabalho precário, que suporte o trabalho parcial, intermitente, escravo, infantil, sem emprego, etc. preparado para aceitar baixos salários e para suprir a demanda desse mercado interno e para receber investidores estrangeiros não dispostos a manter direitos que afetam lucros. Para reduzir seu número de vagas, de escolas e, consequentemente, de professores.

Dessa forma, a verba pública estadual é reduzida, parte é transferida à iniciativa privada e esse serviço público (a escola pública) passa a ser também fonte de investimento e lucro de grandes empresas.

Avançar na defesa e na luta por Educação pública de qualidade

Com tudo isso a defesa de Educação pública de qualidade necessita seguir também outros caminhos que não sejam apenas lutas e mobilizações isoladas de professores ou de estudantes. Necessitamos avançar na denúncia, para a classe trabalhadora, do que está sendo feito com as escolas públicas e onde poderá chegar. E unificar as lutas é, cada vez mais, imprescindível.

As tradicionais entidades sindicais e estudantis sequer têm sido ofensivas no diálogo e denunciado a professores, estudantes e comunidades sobre as consequências dessas mudanças. E nas oposições necessitamos avançar nesse sentido!

Estudantes necessitam entender que, com todas essas mudanças, passarão a aprender menos, que o ensino estará ainda mais limitado a determinados interesses, terão menos escolas, etc. E os professores precisam entender que, além de aumentar as pressões sobre o trabalho diário, parte importante ficará sem emprego.

Unificar as lutas de estudantes e professores com as demais lutas da classe trabalhadora!

Contra a redução de disciplinas! Contra a BNCC que reduz ou agrupa disciplinas!

Não ao fim ou à redução do ensino presencial na rede pública estadual!

Contra a Reforma do Ensino Médio!

Contra a transferência de verba pública para empresa privada! Não à privatização!

Por uma escola que atenda aos interesses da classe trabalhadora!