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As forças da revolução estão vivas


1 de abril de 2017

Luís César Nunes – MOS (RJ)

Os recentes realinhamentos geoestratégicos da potência mundial militar em crise, respondem ao esgotamento do modelo econômico. A questão principal da conjuntura é que a ofensiva de direita ocorre em razão, principalmente, da política capituladora da esquerda.

Primeiro, a da Terceira Via, seguida pelas variantes anticapitalistas que se contentam com o programa mínimo. Segundo, o dilema do imperialismo que decide enfrentar a China, num momento em que esta é a principal responsável pela globalização.

A Direita cresce sobre os erros da Esquerda

O crescimento da direita como alternativa política para a burguesia revela o fracasso da Terceira Via, na qual baseou-se a Doutrina Bush, com seu aliado Tony Blair, que transformou o Reino Unido num 51º estado norte-americano.

A Terceira Via sofreu também um duro revés na Alemanha e o projeto de União Europeia passou a ser questionado por plebiscitos no próprio Tratado da Constituição. Mesmo assim, a União Europeia – à revelia da sanção popular – passou a legislar sobre os mínimos detalhes dos países que aderiram, quando estava num crescimento vertiginoso que incluíam os antigos Estados Operários do Leste.

Hoje, a esquerda europeia – já bastante combalida por anos de Eurocomunismo e de Terceira Via (no dizer de Bobbio, nem Marx e nem contra Marx) – tentou se rearticular no altero mundismo dos Fóruns Sociais conciliadores e no anticapitalismo do programa mínimo. Essa política transferiu Porto Alegre para Davos, que significativamente foi visitado em sequência por Lula. Logo tínhamos a chave de como a “esquerda” enfrentaria a crise mundial de 2008.

E nesse aspecto foi emblemática a atuação de Tsipras, na Grécia, que esperava que o povo grego dissesse “sim” aos banqueiros, numa reprise dos sonhos consumistas dos alemães de 9 de novembro[1], quando acreditavam que bastaria derrubar o muro para possuir um gordo cartão de crédito. Mas, o povo disse “não” e, diferentemente, da Ucrânia, esse “não” se voltava contra os Euro Bankers.

Isso os conciliadores da nova esquerda, anticapitalistas que se negam ao programa de transição da revolução socialista, não poderiam admitir. Foi então o próprio Tsipras a dizer o “sim”. Data de então o fracasso dessa “nova esquerda” como alternativa revolucionária, que semeou ilusões como o Podemos, NPA, PD, etc.

Com a crise dos refugiados ressurge o nacionalismo xenófobo e o fortalecimento eleitoral de políticas de direita explorando os erros dos partidos anticapitalistas, de esquerda e até liberais.

Da Globalização ao Neocolonialismo

A crise de 2008 ampliou a busca frenética por uma geoestratégia diretamente ligada ao controle da geoeconomia, que hoje torna-se uma retomada do neocolonialismo. E isso já era prenunciado nas guerras do Iraque, nos Balcãs e, posteriormente, na ocupação do Afeganistão e do Iraque.

Essa estratégia não foi apenas para o domínio da geopolítica do Petróleo, a qual se completou com o ataque à Líbia e o posterior controle dos preços com a estratégia combinada de superprodução saudita e o xisto de Obama. Isso tornou mais onerosa a exploração do pré-sal no Brasil e pôs em crise a economia do gás russo e da Venezuela.

Reciclando os geopolíticos britânicos da era imperial, a ofensiva foi desencadeada para controle dos países do chamado Coração do Mundo (Heartland) [2], esse era o espaço cujo domínio determinaria o domínio global. Porém, essa estratégia se completaria com as chamadas revoluções coloridas, as principais delas ucraniana e Síria. Estava aí a fórmula que já não é uma novidade na teoria política: uma revolução anticorrupção e nacionalista.

A primeira visando o cerco da Rússia e a segunda procurando fechar a saída da Rota da Seda, que conectaria a China aos mercados europeus. A reviravolta ocorreu no envolvimento russo na Síria que provocou o colapso da política militar externa dos Estados Unidos, essa a razão da derrota de Clinton.

A entrada em cena das forças armadas russas no conflito gerou uma aliança inusitada entre a Rússia, a China e o Irã. Prevalecendo-se do seu amplo poder militar, o imperialismo norte-americano controla a geoestratégia da União Europeia e do Japão, porém resta o poder militar da Rússia e o econômico da China.

Ainda que a globalização tenha sido o resultado da derrota do socialismo real no leste europeu e do fim da URSS, não foi por si só o equivalente ao fim dos Estados Operários no mundo todo. Por isso a globalização assentou-se sobre as bases do maior proletariado mundial, o proletariado chinês. Isso foi confirmado pela recente declaração de Xi Jinping, no Fórum de Davos, ao defender a globalização contra os arremates desesperados de Trump.

Com a globalização e a transferência produtiva para as ZEE[3] a China passou a ser a grande locomotiva da economia mundial. Esse era o quadro até a crise de 2008, quando surgiu o fenômeno chamado, por alguns especialistas, de desglobalização[4].

Simultaneamente, a ofensiva imperialista global prossegue e a instabilidade política no Brasil e na República Sul-Africana oportunizou uma estratégia de desmonte do BRICS pelo seu elo mais fraco, cujas megacorporações do subimperialismo brasileiro[5] estão indissoluvelmente associadas ao Estado.

Novos realinhamentos prosseguem como o de Putin com a candidata da direita francesa Le Pen, como já havia ocorrido com Trump.

Tudo isso leva a pensar que, ainda que a China (como antes o stalinismo e o neoestalinismo soviético) tenha possibilitado a sobrevivência do capitalismo monopolista global, é um grande incômodo para a sobrevivência desse sistema-mundo.

Trump quer um redirecionamento da ofensiva contra a China, buscando aliados na Rússia, na América do Sul e na nova Europa nacionalista de direita. Além disso, busca ampliar o cerco com acordos com o Japão e a recente mudança de regime nas Filipinas. Nesse aspecto, a Índia coloca-se como um pêndulo num quadro mundial muito instável, em que nada está decidido e que teve de enfrentar, inclusive, maior greve geral da história.

Superar a esquerda colaboracionista

As forças da revolução estão vivas, cabe ao movimento mundial dos trabalhadores dotar-se de uma política, uma estratégia e um partido mundial que a desenvolvam e imponham uma solução de poder operário revolucionário na cena internacional. É isso ou teremos o aumento dos ataques da direita diante de uma esquerda colaboracionista e incapaz de organizar a classe para a revolução socialista.

Notas

[1] Schicksalstag, coincidentemente nessa data em 1918, o socialdemocrata Friedrich Ebert, tornou-se Chanceler da República de Weimar, após fim da monarquia. Já em 1923: deu-se o Putsch nazista de Munique e em 1938, a Kristallnacht marca o início do Holocausto. Esses dois últimos fatos fizeram com que a data tenha ainda hoje um significado pejorativo.

[2] Halford John Mackinder, Chap. 3 (The Seaman’s Point of View), in Democratic Ideals and Reality (London, U.K.: Constables and Company Ltd., 1919), pp.88.

[3] Zonas Econômicas Especiais, na liberalização capitalista de Deng Xiao Ping.

[4] Antonio Luiz M. C. Costa, O nacionalismo de direita e a era da desglobalização. Reportagem publicada originalmente na edição 924 de Carta Capital, com o título “A era da desglobalização”.

[5] Luce Mathias Seibel retoma a tese de Ruy Mauro Marini em O subimperialismo brasileiro revisitado: a política de integração regional do governo Lula (2003-2007).