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Jornal 72: Falta D’água em SP: Produção destrutiva, lucros privados e prejuízos públicos


18 de setembro de 2014

A situação do abastecimento de água na região da Grande São Paulo tem sido discutida há vários meses, desde que os reservatórios do sistema Cantareira, que abastece cerca de 6,5 milhões de habitantes, atingiram um nível crítico. No momento, o nível das reservas é de 10,7%. O sistema Tietê, que abastece outros 4,5 milhões de pessoas na região, está com apenas 15,2% de capacidade. A falta d’água, como não poderia deixar de ser, tornou-se mais um dos temas de debate no período eleitoral. De um lado, o governador e candidato à reeleição Alckmin, do PSDB, diz que a causa do quase esvaziamento dos reservatórios é a falta de chuvas. De outro lado, os candidatos opositores apontam as falhas na gestão do governo, que comanda a Sabesp, empresa responsável pelo abastecimento. Na verdade, ambos estão errados.

A culpa é do capitalismo…

A falta d’água em São Paulo não é apenas um problema de gestão, que poderia ser resolvido por uma administração mais competente. Afinal, a falta de chuvas é real. O estado de São Paulo enfrenta a maior seca desde 1969. A estiagem em São Paulo não é um fenômeno isolado e de âmbito apenas local. A mudança climática é um processo global, que resulta em vários tipos de desequilíbrios, como secas, inundações, ondas de frio ou calor, tempestades, furacões, nevascas, efeito estufa, etc., em várias regiões do planeta.
Essa mudança climática que estamos vivenciando nas últimas décadas é resultado do acúmulo de séculos de intervenção humana no meio ambiente, em particular a partir da Revolução Industrial. A queima de combustíveis fósseis, a extração de minérios e outros recursos, a derrubada de florestas e matas nativas, a extinção de espécies animais e vegetais, o esgotamento da fertilidade dos solos pela agricultura e pecuária intensivas, o despejo de poluentes na terra, nas águas e no ar, o lixo, a impermeabilização dos terrenos pela urbanização, destruição de margens de rios e mangues, etc; tudo isso vem acontecendo há séculos de uma maneira descontrolada, irracional, inconsequente. Isso inevitavelmente provocaria mudanças no equilíbrio ecológico e climático do planeta, com as consequências que estamos vivenciando hoje, e que não serão facilmente reversíveis.
Mas o problema não foi o simples aumento da capacidade produtiva da humanidade, o que em termos da história da espécie é uma vitória sobre a natureza. O problema é que esse aumento das forças produtivas não foi aproveitado de maneira racional para atender às necessidades humanas, e sim para aumentar o lucro capitalista. A forma mercadoria é a forma de todos os produtos da atividade humana no capitalismo, o que significa que esses produtos são produzidos não porque atendem a alguma necessidade, mas para que possam ser vendidos, e assim realizar e multiplicar o seu valor mercantil.
No auge da sua irracionalidade, vemos esse sistema produzir milhões de automóveis, que não podem circular porque provocam gigantescos engarrafamentos, milhões de eletrodomésticos que são jogados no lixo com pouco tempo de uso para serem substituídos por novas bugingangas, toneladas de alimentos sendo desperdiçados e quase um bilhão de pessoas passando fome porque não podem pagar pela comida, prédios e apartamentos sendo construídos e pessoas sem ter onde morar, milhões de trabalhadores adoecendo física e psicologicamente por excesso de serviço e outros milhões desempregados. Para o capitalismo, é indiferente que as mercadorias atendam ou não a alguma necessidade, o que importa é que sirvam como suporte para a multiplicação do valor. Por isso, vivemos uma overdose de mercadorias (e de miséria) e alterações no equilíbrio ecológico global. A produção capitalista é uma produção destrutiva.

…o capitalismo privatizou a água

Se o sistema capitalista em escala global pode ser responsabilizado pelos desequilíbrios climáticos e a falta de chuva, esse mesmo sistema e sua lógica do lucro a qualquer custo destrói as possibilidades de lidar com a falta de chuvas na escala local. No Brasil, de acordo com as definições da lei, a água em si não pode ser vendida como mercadoria. As empresas que fazem o abastecimento podem cobrar pelo serviço de tratamento e distribuição. É esse custo que vem na conta d’água que todos pagamos. Para prover esse serviço, essas empresas precisam receber uma concessão governamental, e para isso precisam se comprometer com uma série de condições.
Na região da Grande São Paulo, a empresa responsável por esse serviço é a SABESP, uma empresa de economia mista, com maioria acionária pertencente ao governo do estado e o restante das ações nas mãos de investidores privados. A concessão da SABESP para fornecer o tratamento e distribuição de água em mais de 300 cidades do estado de São Paulo foi renovada pela última vez em 2004. Na renovação, ficou estabelecido que a SABESP tinha a obrigação de investir em estações de tratamento de esgoto, aumento dos reservatórios e manutenção dos encanamentos (um terço da água se perde em vazamentos, segundo a própria SABESP). Para cumprir com essa obrigação, a empresa teria que fazer pesados investimentos.
Ao invés disso, a SABESP pagou R$ 500 milhões como lucro aos seus ricos donos somente este ano. Entre 2004 e 2013, foram ao todo R$ 4,8 bilhões! Isso quer dizer que alguns poucos estão lucrando com a desgraça e a falta d’água de outros!

Contra o capitalismo e pelo socialismo, para salvar a humanidade!

Há várias regiões da Grande São Paulo em que já falta água, vários bairros e cidades recebem água dia sim dia não, ou por apenas algumas horas do dia. Curiosamente, essas regiões ficam nas periferias, enquanto que nos bairros centrais e de alta renda, onde mora a burguesia, nunca falta água. E ainda mais curioso, a palavra racionamento está proibida. A imprensa é tão chapa branca e servil ao PSDB que não pode usar a palavra que descreve a atual situação. Não se pode assumir que há racionamento da água, porque isso poderia prejudicar a candidatura do tucano à reeleição.
Enquanto os políticos e capitalistas lucram, a população sofre. É preciso tirar a SABESP das mãos dos empresários e torná-la pública e sob controle dos trabalhadores! Só assim poderemos ter o aumento dos investimentos em tratamento de esgoto, reservatórios e encanamentos! Defendemos a reestatização da SABESP, sob controle dos trabalhadores e da população. Provisoriamente, enquanto não se restabelecem as reservas, é preciso aplicar o racionamento, mas que ele atinja por igual todas as regiões, e não apenas os bairros pobres e periféricos. Racionamento também nos bairros burgueses!
E finalmente, é preciso também ficar claro que a solução para os problemas ambientais só será possível com o fim do capitalismo. Isso porque o meio ambiente é um sistema planetário, os diversos ecossistemas locais estão interligados e interagem uns sobre os outros. A poluição numa determinada região pode provocar falta de chuvas em outra, e assim por diante. Enquanto houver capitalismo, haverá destruição ambiental. A regeneração do ecossistema planetário, de uma maneira que possa suportar a vida humana, só é possível por meio de ações coordenadas mundialmente. E o sistema capitalista é incapaz desse tipo de coordenação, já que está estruturado sobre a base da dominação de uns sobre os outros e do conflito de todos contra todos, tanto entre países e coletividades como entre os indivíduos.
Cada vez mais, o socialismo, sistema baseado nas decisões coletivas sobre o que produzir e como produzir, é uma necessidade para a própria sobrevivência da humanidade.