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Trabalho alienado e natureza


25 de abril de 2010

Nem mesmo a burguesia consegue ocultar a discussão sobre os problemas ambientais causados pelo capitalismo, pois os efeitos da destruição da natureza já se apresentam de maneira dramática. Enchentes, secas, descontrole das temperaturas, degelo (e aumento do nível dos oceanos e mares), desertificação, perda da diversidade biológica, multiplicação de vírus e bactérias mortais, poluição, escassez de água potável, acúmulo de lixo, destruição da camada de ozônio, etc.; não são fenômenos naturais como quer fazer crer a burguesia e seus meios de comunicação.

Todos esses fenômenos têm relação com a exploração da natureza em função da acumulação de capital. O trabalho é a forma especificamente humana, social e histórica, de metabolismo com a natureza. Cada ser humano está em relação com a natureza por meio de seu corpo físico, cuja existência precisa ser mantida, mas essa relação não se dá de forma imediata, pois é social e historicamente mediada pelo trabalho. O uso de recursos naturais para produzir alimentos, vestimentas, moradias, utensílios, etc., não é feito separadamente por cada indivíduo, mas coletivamente por meio da formação social da qual este indivíduo faz parte. Ou seja, o homem somente se relaciona com a natureza indiretamente, por meio de sua relação com os outros homens, com o meio social de onde recebe uma cultura e no qual desempenha algum tipo de papel produtivo.

A humanidade do homem não está dada de modo imediato na realidade histórica, ou seja, cada homem não está imediatamente unificado com a sua humanidade, da forma como estão os animais. Cada animal é imediatamente idêntico a sua espécie e capaz de fazer tudo que a espécie é capaz. O homem, ao contrário, se encontra separado de sua espécie, da sua humanidade, seu ser genérico, por conta da condição histórica da divisão da sociedade em classes e do trabalho alienado.

Assim que o trabalho se torna capaz de produzir um excedente em relação às necessidades sociais, surge uma classe social que se apropria desse excedente. Ao longo da história desenvolve-se uma luta entre as classes proprietárias e as classes trabalhadoras pela posse desse excedente do trabalho social. O controle do excedente do trabalho pelas classes proprietárias transforma o trabalho numa atividade alienada, ou seja, estranha para a maior parte dos seres humanos. O homem se separa de seu ser genérico, sua humanidade, ao não poder determinar o que fazer com seu tempo de trabalho e ser forçado a trabalhar para outro. O homem se aliena da atividade do trabalho, dos produtos do trabalho, da sua relação com os outros homens, que aparecem todos como elementos externos e opressivos sobre o indivíduo; e se aliena também da natureza.

Se a relação com a natureza se dá primordialmente por meio da relação social e histórica de trabalho, o trabalho alienado leva a uma relação alienada com a natureza. Na sociedade de classes, a natureza se apresenta ao homem como ambiente externo e objeto estranho, a ser controlado, dominado, usufruído e descartado, conforme os interesses da classe dominante. A natureza deixa de ser o “corpo inorgânico do homem”, como a definiu Marx, e se torna propriedade privada. Na condição de propriedade privada, a natureza pode ser usada e abusada de maneira irresponsável, pois a necessidade coletiva é desconsiderada em detrimento dos interesses privados.

Na sociedade capitalista, que é a forma mais recente da sociedade de classes, a natureza mais do que nunca aparece como estranha ao homem, como puro objeto de manipulação, fonte supostamente inesgotável de matéria-prima e repositório dócil para os infinitos subprodutos da ação humana (lixo e poluição). O capitalismo simplesmente ignora que a natureza não é inesgotável nem pode suportar indefinidamente os dejetos que lhe atiramos. A lógica do capital considera apenas o curto prazo, o balanço das empresas, a cotação diária da bolsa de valores, e simplesmente despreza a sobrevivência da espécie. Como disse um autorizado representante da burguesia, o economista inglês John M. Keynes, “a longo prazo estaremos todos mortos”.

Para restaurar o equilíbrio natural e reverter os graves danos já causados é preciso ao mesmo tempo reverter a lógica que dirige o emprego das forças produtivas sociais, direcionando-as para o atendimento das necessidades humanas. É preciso estabelecer racionalmente o que a humanidade precisa produzir e de que forma isso pode ser produzido sem afetar a capacidade do planeta de seguir fornecendo indefinidamente os recursos de que necessitamos. Ao invés de produzir armas nucleares e artigos de luxo (ou seja, coisas inúteis), o trabalho humano passaria a produzir aquilo de que os seres humanos realmente precisam para viver. Isso por si só já teria grande impacto na reversão dos danos ambientais.

Mas isso só é possível com o fim do trabalho alienado, ou seja, com a conquista do controle dos trabalhadores sobre seu tempo e seus instrumentos de trabalho. Para isso é preciso romper com a propriedade privada dos meios de produção e com a divisão da sociedade em classes. Somente uma humanidade sem classes pode se relacionar de forma racional com seu trabalho, direcionando seu tempo e recursos para produzir aquilo que realmente é necessário e considerando o equilíbrio da natureza e a continuidade da vida. Ao mudar a relação do homem com o trabalho, muda-se também a relação com a natureza.

Para a natureza é indiferente que o planeta seja habitado por seres inteligentes ou por bactérias, pois o planeta seguirá seu curso em torno do sol, quer sejam os homens os seus passageiros ou os microorganismos. Para o homem, entretanto, a preservação de certas condições indispensáveis para a sua sobrevivência, como ar respirável, água potável, terras férteis, temperaturas suportáveis, etc., deve ser resultado de sua ação consciente e coletiva. Essa ação passa necessariamente pela revolução social, pela superação da lógica do capital e pela construção do socialismo, único regime capaz de devolver ao homem o controle sobre seu trabalho, sua humanidade e sua relação racional e sustentável com a natureza.