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Aquecimento global, culpa do homem?


3 de janeiro de 2009

No rastro da conferência da ONU sobre mudanças climáticas, nos últimos dias a mídia em suas diversas versões (a Rede Globo, por exemplo, apresentou no JN reportagem de uma semana) tem insistentemente falado do aquecimento global, desequilíbrio ambiental, queimadas,  efeito estufa, etc. Nada de novo porque a destruição é visível a todos. O novo nessas imagens chocantes é o diagnóstico proferido pelos “acríticos” repórteres e pela declaração da ONU de que a culpa por tamanha destruição é o próprio homem e de que tal capacidade destrutiva é inerente ao próprio homem. Mas de que homem estão falando? Do José? Da Maria? Daqueles que todos os dias saem para vender a única mercadoria (força de trabalho) que têm? Ou daqueles que controlam os meios de produção e, portanto, determinam o que e como produzir sem levar em consideração a destruição das condições ambientais, pois a única coisa que lhes interessa é o lucro?

            A afirmação desses repórteres na aparência é verdadeira, mas na realidade ela é completamente insuficiente para explicar a realidade e a causa de tamanha destruição do planeta e de seus recursos naturais. Não se trata de apresentar um relatório do que ocorre no planeta (tanto porque é visível como a mídia tem se encarregado disso), mas compreender por que, sob o domínio do capital, a destruição da natureza não só recuará como será cada vez mais intensa.

O foco da mídia burguesa tem objetivos claros, um dos quais é retirar da produção capitalista a responsabilidade por tais danos. Logo, nessa discussão torna-se urgente abrir uma batalha ideológica contra esse enfoque, porque se não identificamos as reais causas também não conseguiremos apresentar saídas que solucionem de fato o problema

Partimos do pressuposto de que analisamos os homens e suas ações não como indivíduos isolados, mas como seres sociais que cumprem determinado papel na produção material da vida e com a consciência determinada pelas relações sociais que cercam essa produção, ou seja, o homem é um ser social que em relação com a natureza produz tudo aquilo que é necessário para sua existência. É importante compreender essa qualidade eminentemente humana, pois é ela a responsável, pelo seu trabalho, na transformação do mundo (ou da natureza).

            Assim é perfeitamente claro que a natureza é fundamental, na verdade uma condição, para a produção das necessidades materiais dos humanos. O homem para produzir precisa relacionar-se com ela. Essa relação é determinada pelo nível do desenvolvimento das técnicas e instrumentos de produção acumulados pela humanidade. O determinante passa a ser, portanto, as relações de produção que foram construídas nesse processo produtivo e que será a base real ou material das relações políticas, ideológicas, etc.

            Mas nem toda produção ou relação do homem com a natureza é destrutiva. A apropriação privada daquilo que é produzido coletivamente (socialmente) obriga que o homem estabeleça relações estranhas à sua condição de produtor, alienando-se (para alguns, estranhamento) do produto do trabalho, do próprio homem e da natureza. A alienação faz com que o homem não exerça um domínio consciente, mas sim destrutivo sobre a natureza. Dessa forma, a alienação opõe os indivíduos e a coletividade de maneira que as ações não correspondem às necessidades da humanidade.

            Ainda resta uma questão a esclarecer que é o fato de que é pelo trabalho humano que a natureza é destruída. È uma contradição, mas tem explicação. Na sociedade burguesa, portanto, numa sociedade em que as relações de produção se desenvolvem sob hegemonia do capital, o trabalho aparece para todos os homens de forma negativada, ou seja, alienada, processo pelo qual o trabalhador se afasta das esferas da decisão dos atos relacionados a sua atividade.

            Essa relação é que vai determinar a sua consciência. Assim a “visão” de mundo e a ação dos indivíduos serão formadas conforme a posição que ocupa na relação de produção. Se o indivíduo – social – é dono dos meios de produção, sua visão de mundo e sua prática vão estar marcadas pelas necessidades que essa condição impõe; se, do lado oposto, for um trabalhador, a sua “visão mundana” vai corresponder a essa situação, bem como sua ação. Ocorre que essa visão de mundo dos indivíduos está, dialeticamente, relacionada com uma “consciência coletiva” moldada pelo domínio da classe que se apropria da riqueza produzida socialmente, como forma de justificar o seu poder econômico e político.

            Como as idéias da sociedade são as mesmas da classe dominante, a burguesia se aproveita para apresentar, nesse caso, a destruição da natureza, o particular como universal. Quando se fala de homem, ser humano, etc. e de sua prática destrutiva, fala-se de um homem histórico, social, forjado conforme as relações de produção. Mas a burguesia e seus ideólogos apresentam esse “tipo humano” como expressão universal humana. O fato de que o homem no capitalismo destrua a natureza não significa que em qualquer época histórica ocorrerá essa destruição.

            A partir dessas conclusões eu pergunto àqueles (e ao repórter) que dizem que o mundo está acabando por culpa do homem: de qual homem está falando? O trabalhador, que é obrigado a vender a sua força de trabalho e disponibilizá-la aos patrões para qualquer coisa, ou o burguês, que vai direcionar a produção para aquilo que dá mais lucro (mesmo que destrua rios, mares, florestas, etc.)?

            A luta ideológica contra o capital exige que rechacemos tanto a idéia da destruição dos recursos naturais pela “maldade natural” dos indivíduos como a responsabilização generalizada dos homens. È o capitalismo e sua forma destrutiva de produzir que são os responsáveis pelos problemas ambientais do mundo. Essa questão é importante ser destacada porque, se é o trabalhador, com as motos-serras e outros instrumentos, que realiza o ato, ele o faz unicamente por conta de que ao dispor sua força de trabalho ao capitalista é este quem vai determinar onde e como aplicar aquela força. A atividade humana não se coloca de maneira independente com relação à sociedade e, fundamentalmente, é uma atividade que deve ser localizada historicamente, a partir de homens com “visão de mundo” burguesa, determinada, repito, pelo papel que ocupa nas relações do modo de produção. Eis Marx: “é necessário explicar esta consciência pelas contradições da vida material, pelo conflito existente entre as forças produtivas sociais e as relações de produção”.

Para colocar as coisas no seu devido lugar: A produção capitalista é a responsável pela destruição a que o planeta está submetido. O capital controla todos os processos produtivos – destrutivos ou não – e os homens são apenas instrumentos.

 

CONSUMISMO E NECESSIDADES ARTIFICIAIS: IDEOLOGIA À SERVIÇO DA PRODUÇÃO DESTRUTIVA

            A crise estrutural pela qual passa o capital o obriga a desenvolver mecanismos que empurrem as contradições provocadas pela crise para o futuro. Entre esses mecanismos –econômicos e ideológicos –, para citar alguns, está a taxa de uso decrescente das mercadorias, que é a fabricação de produtos com uma vida útil menor (Meszáros), a cultura do consumismo e a criação de necessidades artificiais para as pessoas. Principalmente essas duas últimas medidas são acompanhadas de uma forte campanha publicitária.

            Para que haja produção – espaço privilegiado para a realização da mais-valia – é necessário haver o consumo. Ocorre que o desenvolvimento tecnológico possibilitou salto na produtividade, ou seja, produz-se muito e, se há constantemente uma alta produção, logo chegará a um limite porque não haverá mais ninguém para consumir. Como o capital resolve essa contradição? Um: produz-se bens com duração mais curta (você já deve ter ouvido falar que hoje as coisas duram menos) para que haja troca desses bens; dois: quando só essa medida não é suficiente passa a criar necessidades artificiais.

            O celular é um bom exemplo. Estima-se que já existem mais de 90 milhões de aparelhos no país. Massificado há 10 anos aproximadamente, foi a cada ano ou menos ganhando “novas” funções, como filmar, tirar foto, mapa para controlar filhos e tantas outras funções, ou seja, para que as pessoas troquem de aparelho (consumam) os fabricantes “inventam” todas essas coisas. Para tudo isso se realizar vem a propaganda relacionando esses produtos à alegria, à jovialidade, à elegância, como se ao adquirir aquele produto você se transformasse. Pode-se citar outras mercadorias, como o carro, por exemplo.

            Quanta matéria-prima (recursos naturais) gasta-se para produzir esses produtos que, sob uma administração consciente, não seriam necessários? E o que fazer com o lixo que é altamente danoso para a natureza? Pense em quantos produtos desnecessários há à nossa volta e quanto dano eles causam à natureza. Então a causa de tanta poluição e desequilíbrio ambiental é a produção massiva voltada para o lucro. Para o capital não interessa se destrói ou não, interessa se há lucro. A vida não tem importância para o capital, a menos que seja fonte de lucro (como tráfico de órgãos humanos).

            Esses exemplos são provas de que o capital em cada ato traz consigo mais destruição. Imagine se metade da população da China e outra metade da Índia tivessem um carro, o que seria do planeta? Eis uma contradição fundamental para o capital e para a humanidade.

           

MUITO BLÁ, BLÁ E NADA DE PRÁTICO

            Para a burguesia estar se preocupando é porque a destruição está em um nível acima do crítico. O problema é que nós não temos acesso a todas as informações, uma vez que a burguesia nunca expõe os problemas na sua totalidade, liberando apenas aquilo que não tem mais como esconder. Mesmo do ponto de vista deles é necessário que se faça algo porque o que está em jogo não é só a nossa existência, mas também a deles.

            No fim de janeiro e início de fevereiro realizou-se a conferência da ONU que discutiu as mudanças do clima no planeta. Os relatórios falam de subida dos oceanos, buraco de ozônio, culpa o homem por esses problemas, etc. Não vimos responsabilização da produção capitalista (nem temos essa ilusão) e muito menos propostas concretas de solução. O motivo é óbvio: por ser uma organização à serviço do capital imperialista ela jamais atacará seu amo.

            As tímidas e ineficientes medidas – como o protocolo de Kyoto, que restringe a emissão de CO2 em 5%, quando seria necessário pelo menos 60% – não saem do papel também por conta da competição e dos interesses interimperialistas. Substituir a produção de energia baseada em combustíveis fósseis por outros tipos de energia significaria a falência de grandes monopólios e Estados que dependem desse tipo de negócio. Esse é só um de vários exemplos, mas poderíamos citar o caso das indústrias de papel que destroem os lençóis freáticos e as florestas com as imensas plantações de eucaliptos, ou ainda a monocultura na produção agrícola que devasta o ecossistema.

 

SÓ OS TRABALHADORES E A PRODUÇÃO SOCIALISTA PODEM SALVAR O MUNDO

            Para se contrapor e resistir ao processo destrutivo para o qual seu trabalho foi disponibilizado, é necessário o desenvolvimento de uma consciência anticapitalista e socialista que seja capaz de reorganizar a forma com que os homens produzem suas necessidades, com um domínio consciente sobre as forças da natureza, superando a oposição do homem à natureza que o capitalismo impôs.

            Uma produção sob controle dos trabalhadores vai decidir o que, como e para que produzir com base nas necessidades da coletividade. Se for mais importante produzir veículos com energias alternativas, menos poluente, e voltados para o transporte coletivo, é isso que se vai produzir. Se a produção de celulares significa uma ameaça para o meio ambiente, ele será substituído por outro sistema de comunicação. A apropriação e domínio da natureza de maneira consciente vão direcionar a produção para as necessidades vitais da sociedade. Enquanto houver risco de fome, produzir bens de primeira necessidade será a prioridade. Qualquer produção será considerada como uma totalidade de benefícios e males que pode provocar para o conjunto da sociedade: se pode poluir um rio ou não, se pode provocar um descontrole ambiental ou não.

            Mas uma sociedade como essa é a negação do capital e de sua produção destrutiva. É uma sociedade de máxima realização humana, de perfeita sintonia entre homem e natureza e de organização consciente de todo o processo de produção. Esse conjunto de relações sociais vai criar as condições necessárias para uma nova consciência humana, pois não haverá mais conflito entre as forças de produção e as relações de produção.

            O desenvolvimento dessa nova consciência torna-se mais urgente do que nunca, pois o mundo sob a hegemonia do capital está em perigo e em direção à destruição de todas as formas de vida. Por isso reafirmamos que a disjuntiva “socialismo ou barbárie” é mais atual do que nunca: ou o socialismo ou o fim do gênero humano. Venha lutar pelo socialismo e por uma nova sociedade, que podem se realizar somente por um processo revolucionário em que os trabalhadores construam seus organismos de poder

            Mas também não podemos esperar o socialismo, pois há o risco de não dar mais tempo de salvar a natureza. É necessário um processo mundial de mobilização para exigir dos governos medidas concretas para conter a destruição do planeta (como a redução de 60% nas emissões de CO). Como medida educativa para os trabalhadores, os sindicatos (e principalmente a CONLUTAS) devem começar a incluir nas pautas de reivindicações propostas de controle do que produzir e como produzir, como a proibição de despejar resíduos nos rios, exigência de severas punições às empresas que poluem e responsabilidades de recolher as embalagens e produtos que prejudiquem o meio ambiente. E caso não cumpram, as empresas devem ser estatizadas e colocadas sob controle dos trabalhadores.