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Jornal 80: O Orgulho LGBT e os desafios da luta pela superação do preconceito


18 de julho de 2015

As sociedades de classes têm como fundamento a exploração de uma classe social sobre outra. Na sociedade capitalista é a burguesia que explora a classe trabalhadora, ou seja, o que os trabalhadores produzem a maior parte vai para as mãos da burguesia, essa classe social lucra se apropriando do trabalho alheio.

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Para essa exploração ser efetiva essas sociedades possuem normas (legais e morais) para legitimar essa exploração, fazer com que existam pessoas que se submetam a ela e estejam dispostas a vender a sua força de trabalho.

Mas, isso ainda é pouco. Não basta se submeter e vender a força de trabalho, é preciso vender o mais barato possível para que a manutenção de nossas necessidades físicas também seja com o mais básico possível.

E como o capitalismo consegue isso? Uma das formas é estabelecendo diferenças entre as pessoas, desqualificando a sua força de trabalho para que, além da exploração, imponha sobre elas a opressão pela cor de pele, de gênero ou de orientação sexual. Essas barbaridades já ocorreram em diversos modelos de sociedade e continuam na capitalista.

Começamos com essas constatações porque são essenciais para compreendermos que a violência contra as pessoas LGBT decorre da própria lógica de funcionamento da sociedade capitalista.

A violência contra as pessoas LGBT

Para prevalecer essa opressão a classe dominante dissemina na sociedade ideias preconceituosas e moralistas de modo que elas pareçam não da classe dominante, mas como algo “normal e natural” de toda a sociedade.

Quando a burguesia não consegue que as pessoas, passivamente, se conformem e aceitem como natural a diferenciação, escancara-se uma violência aberta. Os dados são assustadores, pela quantidade e pelas características dessa violência.

Dados do serviço “Disque 100” da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República – divulgados pelo Estadão – mostram como essa violência é persistente. Em 2011 foram 1159 denúncias de casos ligados à homofobia. Em 2014, até o mês de outubro, foram 6.500 denúncias, aumento de 460%.

Mas não se convive só com a violência “menos letal”. A ameaça à vida das pessoas LGBT é outra companhia do cotidiano. O “Relatório Anual de Assassinatos de Homossexuais no Brasil” (2014) do Grupo Gay da Bahia (GGB) apresenta dados alarmantes.

No ano passado foram 326 mortes de gays, travestis e lésbicas no Brasil. Um assassinato a cada 27 horas. Menos do que os ocorridos em 2012, mas 4,1 % a mais do que em relação a 2013. Esses dados colocam o Brasil como o país mais violento do mundo e com o maior número de crimes motivados pela homo/transfobia.

Também sabemos que esses dados não expressam com exatidão a violência sofrida pelas pessoas LGBT. Delegacias de policias, unidades de atendimento médico (hospitais, etc.) ou outros órgãos públicos muitas vezes não registram muitos casos como parte da violência homofóbica. Como os casos de assassinatos em que a tipificação vai para latrocínio ou crime contra a vida, retirando a motivação homofóbica.

Para termos uma ideia de que a violência contra as pessoas LGBT é fruto desse sistema de exploração e não “caso exclusivo do Brasil”, os dados da ILGA/2012 – uma Associação internacional de lésbicas, gays, bissexuais e transexuais – mostram que em 78 países pelo mundo afora há homofobia praticada pelo próprio Estado, com legislação e consequentemente sanções policiais e jurídicas contra as pessoas LGBT praticadas diretamente pelo Estado.

 

Os direitos das pessoas LGBT e a luta pelo socialismo

A explicação dessa violência e da construção de uma moral homofóbica não está na “natureza humana”, mas na própria ideologia que alimenta a sociedade capitalista. Como o capitalismo precisa da mercadoria força de trabalho (biologicamente gerada por pessoas do gênero masculino e feminino) para produzir outras mercadorias é fundamental a existência de um padrão normativo, ou seja, o “normal” é a relação entre homens e mulheres, capazes de reproduzir essa mercadoria especial, que é a força de trabalho.

Nesse sentido, entendemos que “a homossexualidade apresenta uma negação direta da função social do sexo dentro da sociedade de classes e sua família patriarcal. A relação homossexual não está a serviço do casamento, não gera filhos, não reproduz a força de trabalho. Trata-se de um tipo de relação que visa apenas a satisfação dos indivíduos e os laços entre eles, sem qualquer “utilidade social” para a classe dominante” (Resolução de Conferência/2011 Espaço Socialista).

É assim que entra a moral burguesa, como os ideólogos do sistema não podem dizer a verdade, aparecem a moral, os preceitos religiosos e outras tantas barbaridades para incutir na sociedade as ideias homofóbicas, transfóbicas e a perseguição contra as pessoas LGBT.

Desse modo explicamos a existência dessa forma de violência e entendemos que o combate cotidiano contra todas as formas de violência às pessoas LGBT deve ser somado à luta pelo fim dessa sociedade que a alimenta.

Portanto, construir um caráter classista da luta pelas “questões específicas” das pessoas LGBT em unidade com as questões mais gerais e a luta estratégica pelo fim do capitalismo são urgências para transformar essa realidade opressiva e violenta. Isso também quer dizer que é necessário ganhar a classe trabalhadora (que reproduz as ideias da classe dominante) para essa luta e, ao mesmo tempo, incorporar nas lutas por direitos, em especial nas campanhas salariais, as reivindicações das pessoas LGBT de cada categoria.

Obviamente reconhecemos que o Movimento LGBT precisa se fortalecer e buscar compreender a sua dinamicidade e entraves, visto que, não existem somente LGBT na classe trabalhadora. Isso produz uma desigualdade dentro do próprio movimento que legitima principalmente os homens gays e brancos de classe média, apelidados por GGGG. Precisamos superar as contradições e reconhecer que necessitamos de um Movimento LGBT que seja, de fato, emancipador e que se comprometa com transformação real de nossa sociedade. Que busque a superação da sociedade do preconceito e possa fortalecer todos os setores oprimidos (mulheres, negras e negros, classe trabalhadora, etc.), pois há LGBT em todos esses setores. Somente com a articulação das lutas entre todas (os) é que será possível uma transformação de fato dessa sociedade, com a superação do preconceito e das desigualdades.

 

Dia 28 de junho: dia do orgulho LGBT

A regra para nós trabalhadores é a exploração, a violência, a pobreza, a opressão por sermos pretos, pobres, gays, lésbicas. A regra é a classe trabalhadora ser resignada, aceitar passivamente, aliás, é por isso que nos dominam.

Mas, como muitos eventos na história, há momento em que um fato aparentemente comum transforma-se em algo extraordinário. Como se diz é a gota que faltava para transbordar o copo. Assim é o dia 28 de junho para o movimento LGBT.

Em Nova Iorque, na década de 1960, o bar Stonewall Inn era um espaço frequentado por gays, lésbicas e travestis e onde casais dançavam à vontade. Diante da perseguição e da discriminação na sociedade estadunidense contra os LGBT, os bares eram o espaço ideal e onde podiam se relacionar.

Como em outros bares do gênero na cidade, Stonewall Inn sofria com as batidas policiais sob os mais variados pretextos, obviamente “nunca era por conta da orientação sexual dos frequentadores”. Agressões e prisões eram comuns.

Mas, na madrugada do dia 28 de junho de 1969 foi diferente. Uma entre tantas outras batidas policiais – normalmente sob a alegação de falta de licença para a venda de bebidas alcoólicas – levou a mais violência e prisões. Mas, ao contrário das outras vezes houve resistência à investida policial. A resistência se generalizou, de um lado policiais e de outro uma multidão (com apoio dos moradores da Rua Christopher Street, onde se localizava o bar) que resistia como podia jogando garrafas de cerveja, cadeiras, etc.

Na noite seguinte a batalha se repetiu e dessa vez reforçada por mais pessoas e com reivindicações políticas, como o direito à liberdade de se expressar, o fim da violência policial, entre outras.

Pela intensidade da resistência e pela repercussão dessa luta a prefeitura foi obrigada a recuar e pôr fim à violência policial.

O principal feito da Batalha de Stonewall é o resgaste do “Orgulho LGBT” e a certeza de que a conquista de direitos somente pode vir com a luta, com a resistência. Por isso Stonewall tornou-se uma referência para o movimento LGBT e para quem luta por uma sociedade em que a liberdade seja plena em todos os seus aspectos.