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Jornal 77: É possível acabar com a corrupção no capitalismo?


7 de abril de 2015

Segundo algumas pesquisas o problema que mais levou pessoas para as ruas no dia 15 de março foi a corrupção. Indignados (nesse aspecto com razão) jogavam (nesse aspecto sem razão) toda a culpa pela corrupção que assola o país nas costas de Dilma e do governo do PT. Nenhuma faixa associava a corrupção no Estado brasileiro ao PP (partido com maioria dos investigados pela “Operação Lava Jato”), ao PMDB ou ao PSDB, envolvidos nos escândalos das privatizações ou nos trens e metrôs de São Paulo.

Na quarta, dia 18 de março, procurando responder “às vozes das ruas”, Dilma apresentou algumas propostas que, supostamente, acabariam com a corrupção. Muitas dessas novas medidas são para penalizar servidores públicos como se fossem os responsáveis pela corrupção no aparelho estatal quando sabemos que a maioria dos problemas estão nos cargos comissionados ou nas indicações políticas.

Junto com essas medidas veio a regulação da “lei anticorrupção”, que estava parada desde janeiro de 2014. A “novidade” é a multa às empresas que varia de 0,1 a 20% do faturamento. Mas, claro, se a empresa cooperar (com a chamada leniência) repondo o que foi desviado, as punições administrativas podem ser atenuadas e as empresas continuarão a contratar com o Estado.

E também, como era de se esperar, não foi estabelecido nada de concreto para agilizar os processos contra os que ocupam cargos políticos (como perda de mandato, etc), esses sim, os grandes articuladores da corrupção nos órgãos públicos.

Até os coniventes membros do Judiciário e da Procuradoria criticam as medidas.

Na apresentação das medidas o ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, cinicamente, disse que “é preciso investigar e punir corruptos e corruptores, de forma rápida e efetiva”. Perguntamos: é possível que o Estado capitalista tome medidas que de fato acabem com a corrupção?

Corrupção e capitalismo

Quem é minimamente informado sabe que corrupção não se restringe ao Brasil e muito menos aos políticos e àqueles que contratam com as empresas e órgãos estatais.

Dos partidos burgueses não escapa um, dos que compõem a base governista em Brasília (Mensalão, Petrolão e tantos outros), passando pelos Estados (como o PSDB e a roubalheira no Metro e CPTM em São Paulo) chegando até os municípios (fiscais do ISS em São Paulo), todos esses partidos estão envolvidos em vários escândalos pelo país afora.

Estados Unidos, países da Europa, Japão, China, Paraguai, Venezuela, Vaticano e um longo etcetera sempre aparecem no noticiário com o mesmo problema. E são envolvidos políticos, empresários, empresas, membros do alto escalão das forças armadas, policiais civis e militares, padres, pastores, etc.
E não é só com os que ocupam cargos políticos. Até na escolha da sede da Copa do mundo e das Olimpíadas, quando deveria imperar o espirito esportivo, a corrupção corre solta com todo tipo de gente e em todos os países.

Como parte da campanha que a mídia burguesa faz contra tudo que é público, poupam as empresas privadas, mas sabemos que aí a corrupção também é algo comum e corriqueiro. Nos departamentos de compras das empresas têm as famosas “caixinhas, presentinhos ou bolas” para fechar as compras. Também encontramos a corrupção nas lojas, padarias, empresas, etc. quando não são expedidas notas fiscais.

Como se vê, a corrupção não é só brasileira, nem só de políticos e, muito menos, só ocorre nos espaços públicos. Assim, corrupção é de uma sociedade (mundial) em que a disputa e a concorrência mediam as relações e por consequência opõem interesses particulares aos interesses públicos e coletivos.

Corruptos já nascem corruptos?

Muitos tentam explicar a corrupção como se fosse algo próprio da natureza humana, de uma maldade natural dos homens (Hobbes). Outros somam a essa explicação algo próprio do povo brasileiro.

Para os marxistas, os homens não nascem corruptos (nem racistas, nem capitalistas, etc.) ou com aptidões naturais para a corrupção. Pelo contrário, é uma “educação” recebida da própria lógica de funcionamento da sociedade do capital, é mais um dos mecanismos utilizados para garantir a reprodução do capital. Não é por acaso que a corrupção ocorre exatamente nos espaços mercantis, onde se realiza a mais-valia, ou seja, quando o capitalista vai vender a mercadoria.

A existência de leis (em alguns lugares mais severas que em outros) contra a corrupção não visa acabar com ela, mas estabelecer regras e limites para sua ocorrência, que sem controle levaria ao caos a competição burguesa. Então, não nos iludamos de que a legislação, nos marcos da sociedade burguesa, vai acabar com a corrupção.

O capital tem ética?

Escândalo atrás de escândalo tem provocado diversos tipos de reações, especialmente, em um momento de corte de verbas públicas. Fica nas pessoas a sensação de que se esse dinheiro fosse investido na Educação, saúde, etc. poderiam melhorar. E como é muito dinheiro, de fato algumas coisas poderiam melhorar mesmo.

Mas, as propostas para solução desse grave problema que é a corrupção, devido ao nível de consciência social, recaem somente contra os governantes (e seus partidos) de plantão. O senso comum das pessoas propõe acabar com os partidos (PT, PSDB, PMDB, etc), o impeachment da Dilma, a volta da ditadura e tantas outras engenhosidades. Propostas que encontram eco principalmente nos setores mais reacionários.

Alguns, por oportunismo, como a direita que defende a volta dos milicos. Outros, por ingenuidade, acreditam que mudando as pessoas que ocupam cargos políticos ou do alto escalão vamos acabar com a corrupção.

Nós dizemos que não. A corrupção é própria do capitalismo e de sociedades em que há desigualdade e, portanto, competição.

Os capitalistas, apesar de possuírem muitos interesses comuns, quando estão no mercado opõem-se uns aos outros. Buscam melhores condições para venderem os seus produtos com uma acirrada competição com os demais capitalistas (no mesmo ramo e em ramos distintos), cada um utilizando os mais sórdidos instrumentos: aumento do nível de extração da mais-valia, sonegação fiscal e, claro, a corrupção.
Os cartéis (quando empresas combinam praticar preços acima do mercado), por exemplo, é um mecanismo de “burlar” a lei do valor, de praticar preços (não entraremos aqui na forma de transformação do valor em preço) com taxas de lucros acima da média, mesmo em um ambiente com níveis de tecnologia equivalentes.
A corrupção é, portanto, um processo social construído na sociedade capitalista, no qual os corruptos e corruptores “são empurrados” para a prática de corrupção como forma de viabilizar os seus negócios. É um mecanismo da lógica privada do capital em seus negócios com a sociedade. Objetivamente há uma impossibilidade de ser de outra forma.

Subjetivamente também podemos acrescentar outro elemento que é o fato de que os capitalistas, personificação do capital, não possuem nenhum nível ético em seus negócios. Como diz o ditado popular, é cobra engolindo cobra.

Então, a ética que regula as relações entre os capitalistas permite perfeitamente que em seus negócios se utilize os mais variados artifícios legais, ilegais, morais ou imorais para “ganhar” o mercado.

O capital procura tão somente lucro. Vender órgãos humanos se resultar em lucro, haverá quem venda; se traficar drogas der lucro (e é um dos negócios mais lucrativos do planeta) haverá quem traficará, isto é, são atividades ilegais, mas que nas leis do capital (concorrência, oferta e procura, etc.) vigem em sua plenitude. Um sistema social que tolera e convive com práticas como essas pode falar em ética?

A corrupção é inerente ao capital, de modo que lutar contra a corrupção e não lutar pelo fim do capitalismo é não desejar o seu fim definitivo.

Mais-valia: a corrupção legalizada

Construindo uma prática de crítica radical ao capital não podemos semear ilusões de que seja possível acabar com a corrupção em uma sociedade em que vigem as leis capitalistas. O controle que o Estado realiza sobre a corrupção não é ditado por leis e nem repressão judicial , etc., mas pelas leis que movem a constituição do valor das mercadorias e as consequências que derivam dessa relação.

A riqueza, concentrada nas mãos de poucos, exatamente dos muitos envolvidos em caso de corrupção, é oriunda da exploração do trabalho alheio. O que é a mais-valia senão o roubo de uma parte da jornada de trabalho alheia? É essa mesma dominação do capital sobre o trabalho que permite que a burguesia viva assim como parasita.

Para os analistas e juristas burgueses a apropriação do tempo de trabalho alheio (a mais-valia) não constitui algo reprovável porque há previsão legal, com se uma lei pudesse acabar com toda injustiça que esse ato carrega, ou seja, é uma corrupção legalizada.

Medidas contra a corrupção

A convicção de que a sociedade sob a hegemonia do capital não pode acabar com a corrupção não nos leva a ter uma postura de abstenção em relação ao problema, pelo contrário, cabe-nos demonstrar as propostas que temos.

Também temos a certeza, exatamente pela convicção de que corrupção e capitalismo são irmãos siameses, que essas propostas não serão admitidas pela burguesia porque significaria colocar a corda no próprio pescoço. Somente aos trabalhadores interessa de fato a luta e uma sociedade sem corrupção, pois é uma forma de se reapropiar (em serviços públicos, por exemplo) de uma parte da mais-valia.

Assim, a luta de trabalhadores contra a corrupção deve ser independente da burguesia e de seu aparato judicial, incapazes de levar às ultimas consequências essa luta. Essas propostas têm o caráter de ruptura e contribuem para que os trabalhadores desenvolvam a experiência com os governos e a burguesia.

  • Estatização, sem indenização e sob controle dos trabalhadores de qualquer empresa (e seus dirigentes) envolvida em corrupção;
  • Imediata perda de mandato dos cargos públicos para envolvidos em corrupção;
  • Prisão e confisco de bens dos corruptos e corruptores;
  • Fim da terceirização nos órgãos públicos, que as obras e serviços sejam realizadas pelos próprios trabalhadores e trabalhadoras;