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Contra a tentativa de golpe na Venezuela! Por uma alternativa socialista revolucionária dos trabalhadores!


5 de março de 2014

Desde a morte de Hugo Chávez, em março de 2013, a oposição burguesa retomou a ofensiva para derrubar o governo da “revolução bolivariana”. A postura dessa oposição nas últimas eleições vinha sendo de “oposição construtiva”. Tentava ser propositiva no diálogo com a população sem se chocar frontalmente com os elementos ideológicos característicos do chavismo.

Essa foi a política da campanha eleitoral da oposição unificada em torno da candidatura de Henrique Capriles nas eleições de outubro/2012 e abril/2013, vencidas pelo chavismo. A primeira ainda com Hugo Chávez e a segunda já com seu sucessor Nicolas Maduro.

No entanto, no último período, parte da oposição burguesa mudou de postura e retomou uma política abertamente golpista. Seria um golpe em que os golpistas estariam de trajes civis buscando ampla mobilização nos bairros nobres de Caracas para encher as ruas e provocar um desgaste de Maduro, a fim de obrigá-lo a renunciar, provocando a “La saída”.

Embora a instabilidade persista os golpistas não conseguiram alcançar os seus objetivos e precisamos ficar atentos com algumas mudanças que vêm ocorrendo e que dão sinais de que as provocações continuam: como o aumento do tom das críticas vindas dos serviços diplomáticos estadunidenses e do reacionário presidente chileno, também com as mudanças na participação de Caprilles (candidato derrotado da oposição de direita) nesse processo.

É importante entendermos essa situação para orientarmos uma política no combate ao golpe da burguesia na Venezuela.

A atual situação na Venezuela

A política “propositiva” da oposição burguesa nas últimas campanhas eleitorais para presidente se baseava justamente na situação objetiva e material, ou seja, nas condições de vida da população, que seguem ruins depois de 15 anos de governo chavista. E atormentam a população cotidianamente, em especial, as situações de violência, criminalidade em geral, corrupção, inflação e escassez de produtos básicos.

Portanto, mesmo com toda uma retórica “socialista” e anti-imperialista de Chávez seu governo não rompeu com os elementos centrais do capitalismo, isto é, com a propriedade privada, com o poder dos bancos, das indústrias e dos latifúndios, com a exploração, com o trabalho assalariado, com a estrutura do estado burguês, com o saque das riquezas do país (um dos principais produtores mundiais de petróleo), com o pagamento da dívida, etc.

Sem adotar essas medidas não foi possível melhorar as condições de vida da classe trabalhadora em um grau significativo, além de melhorias pontuais na assistência social, o que é base da popularidade do chavismo.

Dessa forma, as campanhas de alfabetização e de atendimento médico (com profissionais cubanos) nos bairros mais pobres se transformaram em algo “revolucionário” num país marcado por uma longa e profunda desigualdade. E ainda hoje são a base de sustentação eleitoral do grupo chavista no poder. Mas, no essencial, a Venezuela segue sendo um país capitalista periférico e pobre.

A capacidade do governo de melhorar a assistência social à população de baixa renda dependeu de uma alta no preço das matérias primas como petróleo e gás natural, no último ciclo de crescimento da economia mundial na década passada. Isso aumentou a arrecadação dos governos do continente e deu margem para políticas sociais compensatórias. Essa política, porém, está sofrendo com as instabilidades do mercado mundial, desde a crise de 2008.

Mas, a responsabilidade pela crise social e política é resultado do próprio modelo econômico aplicado por Maduro. O governo bolivariano não adotou nenhuma medida para enfrentar a falta de alimentos, a crise energética, a inflação, ou seja, as situações que favorecem vários setores da burguesia venezuelana. Também resulta do fato de não avançar nenhum milímetro sobre os interesses capitalistas.

O histórico da “revolução bolivariana”

O governo de Hugo Chávez, eleito pela primeira vez em 1998, reeleito várias vezes desde então, é resultado de um processo de luta e de mobilização que fermentou na América Latina por toda a década de 1990 (na Venezuela, desde a revolta popular do Caracazo em 1989) contra as políticas neoliberais, em especial as contra as privatizações e a entrega dos recursos naturais.

Esses processos de luta, na falta de uma alternativa revolucionária, foram desviados para alternativas eleitorais, que levaram ao poder governantes de retórica antineoliberal e anti-imperialista. A “revolução bolivariana”, na Venezuela, foi o mais avançado desses processos, que incluiu outros governos como o de Evo Morales, na Bolívia, e Rafael Correa, no Equador. Entretanto, como dissemos, ainda que todos esses governos tivessem aplicado políticas que divergissem do neoliberalismo e praticado algum enfrentamento diplomático com o imperialismo mantiveram o essencial do capitalismo.

A “revolução bolivariana” é incapaz de romper de fato com o capitalismo pelo seu caráter de classe, baseado em setores das forças armadas, da pequena burguesia, dos aparatos eleitorais, da burocracia sindical e estatal.

O partido chavista (PSUV) funciona como um aparato eleitoral burocrático, comandado verticalmente pela cúpula da “revolução bolivariana” (antes encarnada na pessoa de Chávez), sem espaço para a expressão da militância de base. É composto por setores empresariais (a chamada “boliburguesia”), políticos corruptos e segmentos das Forças Armadas.

Não se trata, portanto, de um partido operário, mas policlassista. Nem de um movimento “revolucionário”, mas nacionalista burguês. A relação do PSUV com os movimentos sociais é burocrática e autoritária, não tolera críticas pela esquerda ao governo. O movimento operário independente é duramente reprimido, os grevistas são tratados como “inimigos da revolução” e “aliados da direita”. Dirigentes sindicais que não se dobram ao governo são perseguidos e até presos, como em qualquer governo burguês.

A ofensiva golpista da oposição burguesa

É nesse contexto que, no início de 2014, depois do fracasso das últimas tentativas eleitorais (nova vitória do PSUV nas eleições municipais de dezembro/2013), parte da oposição burguesa rompeu com a unidade em torno da política “construtiva” e retomou a via do confronto direto, visando derrubar o governo.

O setor liderado por Leopoldo Lopez, inspirado no exemplo da Ucrânia, passou a convocar manifestações da massa de seus apoiadores para desestabilizar o governo. Sua base social, a pequena burguesia, se apresenta como motivada pelos valores “democráticos”, contra a “ditadura” do partido chavista. Essa oposição usa os métodos fascistas da intimidação e da violência contra os apoiadores do governo, tal como os fascistas da Ucrânia.

Uma vez que o imperialismo tem interesse na derrubada do governo chavista, toda a mídia pró-imperialista faz campanha em favor das “manifestações democráticas” na Venezuela. No Brasil, esse papel é cumprido por veículos como a Rede Globo e a revista Veja.

O fato de que a oposição burguesa tenha perdido mais de uma dezena de eleições e referendos, que seguem estritamente as regras da democracia burguesa, é jogado para debaixo do tapete, já que o interesse é legitimar um movimento golpista contra o governo.

Os setores pró-imperialistas na Venezuela, assim como no Brasil, não estão nem um pouco preocupados com a “democracia” e sim com o objetivo de seguir espoliando o povo venezuelano. A burguesia não tem nenhum compromisso com a democracia, a utiliza quando é capaz de controlar os trabalhadores e o povo. Quando não cumpre mais esse papel, apela aos golpes.

Essa forma peculiar de tentativa de golpe (por enquanto não militar) de Estado na Venezuela tem a ver com o fato de que o exército é parte da sustentação do poder chavista. Há um importante setor da burguesia que depende do Estado para continuar existindo, por isso mantém o apoio a Maduro. Também porque o principal dirigente da direita venezuelana, Caprilles, continua apostando na disputa de poder via eleitoral.

Já tivemos golpes institucionais em Honduras, em 2009, e no Paraguai, em 2012, em que governantes eleitos de acordo com as regras da democracia burguesa foram derrubados “legalmente” pelo Judiciário e o Congresso, simplesmente porque apresentavam algum grau de contradição com o imperialismo. Em seguida, foram organizadas eleições para empossar os novos governantes abertamente servis ao imperialismo. Essas operações poderão ser consideradas como ensaios para o objetivo maior, de derrubada do chavismo, que seria uma vitória para a direita no continente.

Por uma alternativa socialista revolucionária!

Nesse contexto, precisamos nos colocar frontalmente contra a tentativa de golpe, contra o discurso da mídia burguesa e pró-imperialista, contra as manifestações da direita, contra os grupos fascistas que se organizam para defender interesses antipopulares e anti-operários!

Ao mesmo tempo, não podemos ter confiança de que o governo chavista de Nicolas Maduro enfrentará o golpe, pois não é um governo operário e pelos compromissos mantidos com a burguesia e com o imperialismo (os negócios do petróleo) não poderá enfrentar os golpistas como deveria.

Já tivemos um precedente em 2002, na fase de consolidação do chavismo, em que o próprio Hugo Chávez chegou a ser derrubado por um golpe da federação empresarial, mas foi reempossado poucos dias depois de uma colossal mobilização popular, com mais de um milhão de pessoas cercando o palácio presidencial e exigindo a sua volta. Naquele momento, os trabalhadores se mobilizaram para ocupar as refinarias da empresa petroleira estatal, a PDVSA, pilar da economia do país. Mas, ao invés de radicalizar nas medidas de controle operário da produção, Chávez optou por um pacto com a burguesia. Não reprimiu os golpistas, devolveu o controle da PDVA aos burocratas e desarmou a população.

Agora, depois de mais de uma década e com o chavismo enfraquecido e desgastado, a burguesia retoma uma linha golpista. O roteiro é o mesmo que já foi aplicado em outros momentos, começando pela sabotagem econômica. O comércio esconde as mercadorias para garantir uma escassez artificial e alavancar a inflação, o que aumenta a insatisfação da população e cria uma crise social, que a mídia tenta conduzir contra o governo.

Manifestantes organizados, em especial universitários pequeno burgueses, com métodos fascistas radicalizam no enfrentamento: Provocam violência e mortes. Denunciam a repressão estatal da “ditadura” e têm ampla cobertura da mídia nacional e internacional, alinhada e patrocinada pelo imperialismo.

Não se pode confiar em Maduro e no PSUV para organizar os trabalhadores e enfrentar os golpistas. E somente os trabalhadores organizados podem derrotar o golpe. Com a vitória dos golpistas serão os trabalhadores as maiores vítimas e terão que enfrentar a repressão.

O chamado aos dirigentes das organizações dos trabalhadores venezuelanos é para que rompam com o chavismo e levem adiante um plano contra o golpe e pelas reivindicações dos trabalhadores, que somente poderão ser atendidas de fato se houver a ruptura com o capitalismo.

Para isso defendemos a construção de organizações operárias e populares independentes do governo e do partido chavista, comitês locais que impulsionem a ocupação de fábricas e de grandes empresas e que controlem as planilhas de custos das empresas para acabar com a inflação e a escassez.

Abaixo o golpe na Venezuela!

Contra os grupos fascistas e manifestações da direita! Pela organização da classe trabalhadores!

Contra a mídia burguesa e pró-imperialista na Venezuela e no Brasil!

Nenhuma confiança no governo Maduro! Independência total em relação ao PSUV! Pelo direito de greve e de organização independente dos trabalhadores!

Que se distribua armas para a classe trabalhadora enfrentar os golpistas;

Pela formação de conselhos e comitês de base independentes nos locais de trabalho, estudo e de moradia! Pelo controle operário da produção e dos preços!

Por um governo socialista dos trabalhadores baseado nas suas organizações de luta!


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