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Contribuição do Espaço Socialista para o Congresso da ANEL -2011


23 de junho de 2011

Contribuição do Espaço Socialista para o Congresso da ANEL -2011

Construir a ANEL pela Base e ao Lado dos Trabalhadores

         No Congresso Nacional de Estudantes em 2009, onde surgiria o projeto da ANEL, levamos uma tese que trazia um sério balanço da realidade da educação e a inserção desta nos marcos da crise econômica mundial que então se iniciava.

            Discutimos o papel do movimento estudantil na realidade sob o impacto da então inicial crise econômica mundial e a necessidade de se construir o movimento com amplo debate nas escolas e universidades e que caminhasse para a unidade com os movimentos dos trabalhadores.  De cara colocamos como problemática a fundação de uma nova entidade sem antes fazer uma profunda discussão e balanço com a base estudantil. E na luta por uma ANEL realmente construída pela base é que fazemos algumas contribuições.

            Como hoje entendemos que os efeitos da crise continuam a se espalhar pelo mundo e no Brasil, apesar do discurso da “marolinha”, sabemos que o setor da educação pública tem sido e continuará cada vez mais a ser precarizado, como uma das medidas necessárias  para a retomada dos lucros dos capitalistas. Desta forma, boa parte de nossa tese de 2010, mantêm-se atual, já que a crise está ainda presente e as necessidades básicas dos trabalhadores continuam crescentes.

A crise e suas conseqüências no Brasil e no mundo

            A crise econômica mundial que deu seus primeiros traços ainda em 2008 é uma crise de reprodução do capital e tem suas raízes já nos anos 70, quando a tendência de queda da taxa de lucro e a crise de superprodução nos países da Europa e nos EUA forçaram uma forte intervenção estatal e um majestoso incentivo ao consumo das massas, visando assim garantir novo ascenso  de lucratividade e expansão do sistema. Com efeito, a crise iniciada em 2008 nada mais é do que um dos elementos de uma crise muito maior, a saber, crise sistêmica e social do capital.

            A liberalização econômica iniciada por Ronald Reagan nos EUA e Margaret Tatcher, na Inglaterra e que alcançou o Brasil com Collor, desenvolvendo-se nos governos de FHC e Lula, mostrou seus limites econômicos e políticos mais uma vez, na falência do atual modelo de crédito precipitado pelo estouro da bolha imobiliária estadunidense.

            Outro elemento da atual crise econômica é que esta apresenta-se como consequência da aplicação da tecnologia à produção e a formação de um mercado mundial globalizado e realmente integrado. Dessa forma a capacidade de produção foi multiplicada e o desemprego deixou de ser reserva de mão de obra para se tornar estrutural. Pela primeira vez na história da humanidade todos os países do globo estão interligados na cadeia de produção e consumo do sistema capitalista. Não há mais novos mercados a conquistar, não há mais novos exércitos de mão de obra a serem anexados, não há mais mercados consumidores a serem integrados. Mas a pior característica da atual fase do capitalismo é que mesmo que houvesse novos mercados de mão de obra, matéria prima ou consumo, não há como manter os níveis de consumo nos padrões estadunidenses sem comprometer a reprodução material das espécies vivas de nosso planeta.

            Hoje os efeitos da crise se mostram cada dia mais aparentes e colocam para a burguesia a necessidade de repassar a conta da crise aos trabalhadores, por meio de cortes e do conseqüente rebaixamento das condições de vida de nossa classe. Buscam, assim, construir novas bases para um novo ciclo de acumulação.

            Outro fator importante do desenrolar da crise é o fato de a classe trabalhadora e o movimento estudantil voltarem à cena para responder a estes ataques em vários países.

            Desde o inicio da crise assistimos em praticamente todos os cantos do planeta levantes contra os ataques, França, Grécia, Espanha, Egito, Tunísia, entre muitos outros, revelam que os trabalhadores e estudantes do mundo não ficarão parados, e mais, revelam a necessidade de reconstruir pela base a alternativa socialista.

            O Brasil entra neste contexto e dos trabalhadores e estudantes exige-se uma unidade em perfeita simbiose, capaz de superar os limites das demandas mais imediatas e de recolocar no plano atual a alternativa socialista como condição necessária à superação dos limites impostos pelo sistema do capital.

A situação do ensino no Brasil e as tarefas do movimento estudantil

            Apesar dos discursos oficiais que têm ecoado por todos os cantos do país, carregados de frases vazias como “educação é a prioridade das prioridades”, na prática professores e estudantes sabem que a realidade demonstra prioridades outras, tais como o pagamento de amortizações da dívida pública.

            Atualmente o Brasil  ocupa o 88° lugar no Índice de desenvolvimento da educação (IDE/2010), em penúltimo lugar na América do Sul, à frente apenas do Suriname. 14,1 milhões de brasileiros são analfabetos, representando 9,7% da população com idade superior a 15 anos. (Fonte: Caros Amigos/n°53)

            No ensino fundamental e médio professores deparam-se com salas aula superlotadas, na média 27 alunos por sala (MEC), mas quando andamos pelas escolas da periferias facilmente encontramos salas com 40, 50 alunos.

            A situação não é diferente quando falamos de ensino superior para os trabalhadores. Segundo dados do IBGE de 2009 apenas 13,9% dos jovens brasileiros conseguem matricular-se em um curso universitário, e dos matriculados 73,31% estão no ensino privado (MEC).

            Fica ainda mais esvaziado o discurso de “prioridade das prioridades” quando analisados os investimentos do governo federal na educação nos últimos 10 anos. Atualmente apenas 4% do PIB é destinado à educação, sendo que boa parte deste montante está a serviço da criação de bolsas de estudos em universidades privadas, por meio da transferência de renda pública aos cofres de investidores do ensino.

            Programas como o PROUNI, FIES, e agora com Dilma, PRONATEC e PROMÉDIO, apenas mostram que, longe de pensar em educação, o governo tem priorizado garantir os lucros do ensino privado. Só para termos uma ideia, este setor sofria com o não preenchimento de vagas e as altas taxas de inadimplência que antes do PROUNI beiravam um percentual de 40%.

            Para piorar 30% das universidades privadas que aderiram ao PROUNI não mantém sequer um aluno bolsista em sala de aula.

            Pouco mais da metade das bolsas anunciadas pelo governo foram realmente ocupadas, sendo que entre 2005/2008 das 610 mil bolsas ofertadas apenas 385 mil foram preenchidas, fora o fato do peso das bolsas ser irrisório quando tratamos de cursos mais elitizados, como medicina onde o peso das bolsas do PROUNI representam apenas 0,7%.

            Hoje as discussões quanto aos investimentos na educação voltaram à tona com o novo Plano Nacional de Educação (PNE), que estipula metas para um período de dez anos. O novo PNE apresentado pelo governo federal apresenta como percentual de investimento na educação apenas 7% do PIB, percentual este que fora aprovado dez anos atrás no congresso e que foi vetado por FHC e mantido por Lula. Agora dez anos depois propõem implementar os 7%, completamente defasados pelos anos de inflação.

            Entendemos o Movimento Estudantil (ME) como um movimento importante na luta frente aos ataques dos governos contra o direito dos trabalhadores a uma educação de qualidade e acessível, porém o ME só pode de fato ser um movimento transformador se superar os limites das lutas imediatas, colocando suas demandas ao lado das demandas dos trabalhadores e dando assim um salto rumo ao socialismo, respeitando ainda assim a evolução rumo ao socialismo do pensamento dos estudantes trabalhadores em relação às questões que a luta os coloca.

            É na atual conjuntura de crise estrutural do capital que devemos nos localizar para iniciar uma discussão a respeito do que interessa ao ME. A educação, como qualquer outra esfera da vida no capitalismo, assume cada vez mais o sentido de mercadoria. A lucratividade na educação privada, aliada à redução de custos em todos os níveis no ensino público, dão a tônica das políticas aplicadas ao setor.

            É esse pano de fundo que justifica que os gestores do Estado, de um lado, dêem condições para que a educação se torne cada vez mais uma mercadoria lucrativa, e de outro, se combine a possibilidade de aplicar a produção científica gerada nos centros públicos de excelência para desenvolver novos produtos. Além disso vemos o Estado se utilizar da escola nas periferias como forma de conter a revolta dos jovens que serão parte do exército de desempregados estruturais e que somente encontrarão atividades precarizadas e de baixa renda como forma de sobrevivência. Nessa missão, o Estado conta com a participação das entidades estudantis oficiais (UNE, UBES), com o financiamento de órgãos internacionais e com diversas ONG’s que fazem propaganda dos limites da vida na periferia como único espaço de sociabilidade viável e desejada, contribuindo para que os horizontes da juventude da periferia nunca alcancem os equipamentos culturais diversificados que somente existem no centro, como museus, teatro, cinemas, praças públicas e as praias das cidades litorâneas.

            Precisamos contrapor ao projeto burguês, de uma classe que vive da extração da riqueza, um projeto da classe que produz a riqueza, um projeto da classe trabalhadora. Pois, com a crise econômica capitalista, a tendência é que se aprofundem os ataques à educação, com cortes de verbas e mais precarização das escolas/universidades, o que coloca para nós a necessidade de apresentarmos um programa que responda a essa crise e também coloque para os estudantes que só poderemos ter uma educação de qualidade e a serviço da humanidade com o socialismo.  

            A crise da educação é, portanto, o reflexo da crise da sociedade capitalista. Não é mais possível construir um ME que não responda a esses problemas estruturais. Necessitamos de um ME que lute pelas questões especificas da educação, mas que, necessariamente, faça delas uma ponte para a luta pelo socialismo.

O Movimento Estudantil e trabalhadores: Uma aliança estratégica

            Um projeto dessa magnitude precisará mobilizar amplos setores da sociedade, pois qualquer projeto alternativo aos interesses da burguesia irá enfrentar a oposição organizada dessa classe, isso, portanto, inviabiliza a possibilidade desse projeto ser elaborado somente pelos acadêmicos ou mesmo pelos intelectuais orgânicos da classe trabalhadora ou ainda por um ou outro partido ou organização. A construção de um projeto de educação a serviço das necessidades humanas somente será possível na convergência dos esforços de todos os setores envolvidos com a educação e das organizações dos trabalhadores que se mobilizarão na defesa de melhores condições de trabalho, salário e emprego para fazer frente aos ataques dos mais diversos governos e patrões.

            Somente a articulação das camadas que ainda não tiveram acesso ao ensino de qualidade, dos trabalhadores e profissionais da educação, dos estudantes e suas ferramentas de luta (grêmios, C.As, D.A’s, D.C.E’s) bem como da comunidade que utiliza as escolas e universidades poderá apontar uma ação eficaz contra a lógica do capital de seguir transformando a educação em mercadoria e a escola de periferia em depósito de desempregados estruturais.

 

Propostas para unir o Movimento Estudantil à lutas gerais e específicas dos Trabalhadores

 

  1. 10% do PIB para a educação já!!!!
  2. Proporcionalidade nos processos seletivos, que os trabalhadores e seus filhos ocupem em todos os níveis de educação a mesma proporção que existe na sociedade;
  3. Cotas proporcionais para negros e indígenas em todas as esferas da educação;
  4. Educação em período integral (8h), com investimento financeiro que propicie um ensino e equipamentos de qualidade, combinado com atividades culturais e de lazer;
  5. Gestão paritária. Que os alunos tenham possibilidade real de interferir na construção do conteúdo que estudam nas escolas e faculdades;
  6. Defesa da qualidade de ensino nos seus três níveis. Melhores salários e condições de trabalho para os professores e funcionários das escolas e universidades , melhores instalações e recursos materiais (laboratórios, bibliotecas, material didático, etc.). No ensino fundamental e médio: fim da progressão automática, fim do ensino religioso, inclusão obrigatória das disciplinas de educação sexual, filosofia, sociologia, psicologia, história e cultura da África e da América Latina;

 

  1. Redução da jornada de trabalho do jovem para 06 horas/diárias;

 

  1. Que os estágios deixem de ser forma de precarizar o trabalho do jovem. Direito trabalhista para o estagiário;

 

  1. Fiscalização dos estágios por organismos de base do movimento estudantil;

 

  1. Mínimo do Dieese como referência salarial a ser aplicado ao cálculo da remuneração proporcional dos estágios;

 

  1. Creches públicas, gratuitas, com qualidade educacional nos locais de trabalho e estudo;

 

  1. Fim do pagamento da dívida externa. Que se invista as riquezas produzidas pelo povo brasileiro para resolver os problemas do povo brasileiro.

 

  1. Fim do PROUNI, FIES, PROMÉDIO, PRONATEC, que os valores das bolsas sejam investidos imediatamente na abertura de mais vagas e escolas públicas.

 

  1. Fim das terceirizações e incorporação imediata dos terceirizados.

 

  1. Fim da criminalização dos movimentos sociais, pelo direito de livre organização, mobilização e greve!!!

 

 Espaço Socialista, Junho de 2011.