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Jornal 71: As lutas no Brasil no 2º semestre: Organização de base e unidade para vencermos os obstáculos


2 de setembro de 2014

As lutas no Brasil pós-junho e pós-Copa

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O processo de lutas que vem se desenrolando no Brasil, que teve seu marco nas jornadas de junho de 2013, na greve dos garis em 2014 e outras que se seguiram, e no movimento contra a Copa, pode ter a sua continuidade nas campanhas salariais do 2º semestre. Entre setembro e outubro temos as datas bases de importantes categorias nacionais, como bancários, correios, petroleiros e metalúrgicos. São categorias com uma importante tradição de luta, que tem feito greves sistematicamente nos últimos anos, e cuja mobilização representaria um peso significativo na realidade política nacional.
No caso de petroleiros e correios, seu patrão é o próprio governo federal, controlador da Petrobrás e ECT, o que também vale para metade dos bancários (funcionários do BB e da CEF). Essas empresas, ainda que nominalmente estatais, são geridas por uma burocracia dirigente que as trata como sua propriedade privada, empenhada em aumentar os lucros a qualquer custo. Esses dirigentes embolsam bônus milionários e participação nos lucros, à custa da exploração dos funcionários. Trabalhadores dessas empresas enfrentam achatamento salarial (perdas acumuladas de 80% e 90% no BB e na CEF desde julho de 1994), privatização disfarçada (80% dos trabalhadores da Petrobrás já são terceirizados), sobrecarga de serviço, assédio moral, adoecimento físico e psicológico, etc., isso sem falar na inflação que corrói o salário do conjunto dos trabalhadores. Não faltam razões para ir à luta!

Obstáculos a serem superados:

– as próprias direções sindicais, já que as principais centrais sindicais do país, como CUT, CTB, Força Sindical, UGT, NCST, etc., estão aparelhadas por partidos políticos governistas, como PT e PCdoB, cuja prioridade será a reeleição de Dilma e de seus candidatos, ou por caciques como Paulinho da Força, cuja prioridade será também a campanha eleitoral;
– a dureza da patronal: bancos e montadoras, especialmente, estão demitindo em massa e impondo “Lay-off” e férias coletivas;
– o aparato repressivo erguido no período pré-Copa do Mundo, com contingentes policiais massivos nas ruas, violência sistemática e indiscriminada da polícia contra grevistas e manifestantes, prisões arbitrárias e ilegais, intimações e indiciamentos para depoimento sem base real e puramente intimidatórios, plantões judiciais prontos para julgar e condenar sem provas ou com flagrantes forjados (como nas ditaduras), condenação das greves como abusivas pela justiça do trabalho, multas aos sindicatos e bloqueio das contas (que na prática impedem os sindicatos de funcionar, outra medida típica das ditaduras). Esse aparato repressivo é uma necessidade do Estado, a serviço do capital, para tentar impedir as lutas dos trabalhadores;
– o trabalho sistemático de difamação dos movimentos sociais por meio dos veículos da mídia corporativa, rede Globo e demais cadeias de TV, revista Veja, grandes jornais como Folha, Estadão, portais da internet, etc., todos dedicados diariamente a tratar os manifestantes e grevistas como criminosos, vândalos, extremistas, responsáveis pela violência, intransigentes, contrários à ordem pública e ao conjunto da população;
– por último, o próprio governo estará por trás dos sindicatos pelegos, do aparato repressivo e da imprensa, coordenando-os e atuando ao lado da patronal, para impedir as greves, pois seu interesse fundamental é garantir a realização das eleições, em que o partido governante, o PT e sua coligação, enfrenta um forte questionamento, ainda que não haja nenhuma empolgação pelo bloco oposicionista burguês liderado pelo PSDB. Ambos os partidos precisam impedir que a dinâmica das lutas influencie nas eleições, convergindo para altas porcentagens de abstenções, votos nulos ou votos de protesto. Precisam legitimar seu projeto (que é o mesmo, com vieses diferentes) de gestão do capital no país por meio das urnas, sem dar voz para as ruas.

Faz falta a unidade entre os lutadores!

Para passar por cima dos obstáculos descritos acima, as categorias em luta precisarão aprender com as lutas do primeiro semestre e do período pré-Copa. No momento mais agudo, em que a mobilização de diversas categorias, as ocupações urbanas e as manifestações de rua, tudo isso acontecendo simultaneamente, poderia apresentar um questionamento mais sério contra a realização da Copa e pela imposição das reivindicações dos trabalhadores, o que fez falta foi uma referência organizativa e programática centralizada que unificasse todas essas lutas.
Não há no Brasil um fórum nacional de lutas ou comitês regionais, reunindo as centrais sindicais combativas e antigovernistas, os movimentos populares e da juventude, como MTST ou MPL, que tem protagonizado as principais lutas no período mais recente. Uma ação coordenada desses setores poderia servir como referência para o chamado a uma greve geral no período pré-Copa, chamado que poderia servir como fator aglutinador para que as diversas categorias e movimentos em luta convergissem para um único enfrentamento contra a patronal e o governo, reforçando o elemento de unidade da nossa classe contra os capitalistas.
Infelizmente, prevaleceu uma política mais recuada, mesquinha, voltada para os interesses de cada setor. No caso do movimento sindical, as centrais antigovernistas, Conlutas e Intersindical, limitaram-se a fazer o chamado a CUT e demais centrais pelegas para que unificasse as lutas, coisa que jamais fariam, nem farão agora no 2º semestre. PSTU e PSOL, respectivamente majoritários nessas centrais, privilegiaram suas relações de “boa vizinhança” com a burocracia cutista e governista no âmbito da superestrutura dos aparatos sindicais, ao invés da mobilização das lutas.

Reforçar a organização de base

O controle dos aparatos sindicais pelos governistas e pelegos é um elemento da maior importância, pois as diretorias dos sindicatos definem o calendário das campanhas, datas de assembleias e deflagração de greve, além da composição das mesas de negociação, em que os burocratas sindicais negociam os acordos entre quatro paredes e pelas costas da base das categorias. Quando necessário “tratoram” assembleias, impõem resultados contrários à votação da base, desligam o microfone e fogem do carro de som escoltados pela polícia.
A receita para fortalecer as lutas no 2º semestre para que tenhamos chances de vitória passa por medidas que superem esse controle burocrático (e que não foram adotadas pelas centrais oposicionistas no 1º semestre). É preciso romper totalmente com as burocracias sindicais governistas e pelegas e lutar por elementos que possam dar às bases das categorias o controle sobre suas lutas. Em 2013, os diversos coletivos de oposição que constituíram o Avante, Bancários! deram um exemplo importante na greve da categoria em São Paulo: organizaram piquetes pela base, independente da direção pelega e governista do sindicato, trancaram prédios importantes e impuseram prejuízos reais aos bancos, contribuindo para uma greve mais forte do que as dos anos anteriores. Esse exemplo precisa ser seguido este ano e também espalhado pelas demais categorias:

– intensificar a mobilização na base das categorias, chamando a realização de reuniões nos locais de trabalho e plenárias de base para discutir as campanhas;
– lutar pela democracia no movimento, exigindo a realização de assembleias, o direito de falar nas assembleias e defender propostas para organizar a luta;
– comandos de greve e de mobilização controlados pela base, organizando os piquetes e ações de luta;
– representantes na mesa de negociação eleitos em assembleia e com mandatos revogáveis;
– retomar a pauta de reivindicações reais e as verdadeiras necessidades das categorias, que podem de fato levá-las à luta, contra as pautas rebaixadas e artificiais inventadas pelos pelegos e governistas;

Pela unidade das categorias em luta!

Além disso, um elemento decisivo seria a unificação dessas categorias em luta, com greves simultâneas, em que se pudesse realizar assembleias, piquetes, passeatas e manifestações conjuntas, reforçando mutuamente cada segmento no seu enfrentamento com a patronal, o governo e a repressão. Para isso, é preciso defender no âmbito de cada categoria um calendário unificado de greve.
Uma greve unitária seria também um fator capaz de atrair e agregar os demais setores dos movimentos sociais e da juventude à luta das categorias. Para isso, trabalhadores dos bancos federais, correios, petroleiros precisam incorporar às suas lutas demandas do conjunto da população, como a luta contra o sistema financeiro e o pagamento da dívida, que determina a política econômica do governo, os cortes nos gastos sociais e a prioridade para os lucros dos bancos e especuladores.
E para fazer esse debate, categorias que têm o governo federal como patrão (caso dos trabalhadores dos bancos federais, correios, petroleiros) precisam também romper com a chantagem feita pelo PT e satélites governistas no movimento, a chantagem de que o PSDB privatizaria as estatais. O PSDB vai mesmo privatizar tudo o que ainda resta, como tem feito em São Paulo. Mas, na gestão do PT não é diferente. Mesmo que ainda a propriedade dessas grandes empresas nacionais seja nominalmente estatal, a sua gestão já é privatista, a sua prioridade já é o lucro a qualquer custo, a sua relação com a população já é predatória, o seu método de gestão já é o assedio moral e a imposição de metas, o seu lucro já é apropriado indiretamente pelo setor privado, através do pagamento da dívida pelo tesouro nacional. A única defesa contra a privatização é a própria mobilização dos trabalhadores e da população.