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Jornal 72: Marina, alternativa da burguesia (assim como Dilma e Aécio)


18 de setembro de 2014

Marina faz um discurso ambíguo e abstrato; evita dizer claramente o que pretende e como irá governar; busca dialogar com as demandas dos movimentos de junho/2013 e com a classe média; fala de uma “Nova Política” e da necessidade de romper a polarização entre PT e PSDB. Ou seja, mistura vários ingredientes de apelo popular, se apresentando como alternativa ao desgaste das instituições e dos políticos.
Mas um rápido exame de sua trajetória, seus apoiadores, e seu programa, mostra que sua candidatura, assim como a de Aécio e Dilma, é apenas mais uma das roupagens para o mesmo projeto do capital para o país. É uma reciclagem dos interesses empresariais.

Marina, sua trajetória e seus vínculos te entregam…

Marina se gaba de ter iniciado sua atuação política ao lado de Chico Mendes. Mas a verdade é que o grupo de Marina era o setor mais à direita dentro do PT na região. Chico Mendes era reconhecidamente um sindicalista, cuja luta ligava os interesses de preservação do ambiente às condições de trabalho e de vida dos povos da Floresta. Já Marina embarcou numa defesa abstrata do ambiente, bem ao gosto das ONG’s estrangeiras que pretendiam – e ainda pretendem – a “internacionalização” da Amazônia como forma de melhor se apropriar de sua biodiversidade e território.
Quando Lula foi eleito em 2002, aproveitou a imagem de Marina como ambientalista e sua história inicial para colocá-la como Ministra do Ambiente, e assim encobrir e tornar aceitável a entrega de enormes setores da Floresta Amazônica e do Pantanal ao desmatamento e ao agronegócio.
Durante sua gestão no Ministério do Ambiente, o desmatamento aumentou violentamente e os transgênicos foram liberados. Marina só deixou o ministério no meio do segundo mandato de Lula, quando viu que o desgaste já era grande, e que havia a oportunidade de sair por cima e entrar no Partido Verde.
A partir daí, se aproximou de setores do empresariado como a Natura, o Itaú, e outros grupos, e elaborou um discurso genérico, buscando a mediação entre PT e PSDB, com uma defesa do ambiente e da sustentabilidade e ao mesmo tempo do capital. Uma contradição absoluta.
Sua força nas eleições de 2010 (a chamada onda verde) consistia no fato de que representava um voto contra ambos os partidos já desgastados, um voto pela negativa, mas indefinido; não foi uma votação de esquerda.
Por pouco não foi para o segundo turno, mas montou um Instituto financiado por ninguém menos que Maria Alice Setubal, a Neca, herdeira do grupo Itáu, que apenas em 2013 doou cerca de R$ 1 milhão, bancando 83% dos custos do Instituto. Neca é hoje a coordenadora de campanha e amiga de Marina, que também tem ligação com outras empresas como a Natura e a Fundação Porticus. No ano passado, recebeu R$ 1,6 milhão em palestras. Quem será que pagou?
Marina fez alarde de que não aceitaria doações de empresas da indústria de armas, tabaco, bebidas, porém dos bancos e demais empresas sim… Depois, Márcio França, tesoureiro do PSB e de sua campanha, se rendeu ao pragmatismo eleitoral dizendo que aceita qualquer dinheiro, “venha de onde vier”…
Para ganhar o apoio dos setores reacionários, igrejas evangélicas e suas lideranças como o homofóbico Silas Malafaia, Marina abriu mão da defesa do casamento civil igualitário, e também excluiu de seu programa a defesa do PLC 122/06. Esse PLC é defendido pelo movimento LGBTT, pois equipara a discriminação baseada na orientação sexual e na identidade de gênero àquelas já previstas em lei para quem discrimina em razão de cor, etnia, nacionalidade e religião. Dilma agiu do mesmo jeito em 2010, ao voltar atrás na defesa da legalização do aborto e depois travando a distribuição do material sobre educação sexual (o kit anti-homofobia).

Marina, um novo Collor?

Anos de governo do PT foram importantes para a burguesia porque seguraram os movimentos e ao mesmo tempo conseguiram arbitrar os vários interesses do próprio capital e do imperialismo. Lula mesmo disse que a burguesia não tem do que se queixar em seu governo e no da Dilma.
Mas é nítido que a política econômica que o PT aplicou, principalmente a partir da crise de 2009, de endividamento disparado das famílias e do estado, isenções de impostos para setores do capital, visando incentivar o consumo, mostra seu esgotamento.
O aumento da competição, no contexto de uma profunda crise estrutural, tem feito com que os paliativos administrados pelo governo do PT sejam cada vez mais passageiros e com menores resultados. Todos os dados mostram dificuldades econômicas crescentes. Tecnicamente, o país está em recessão.
O capital precisa de um endurecimento da política econômica e está flertando com as alternativas que possam melhor administrar esse remédio extremamente amargo sobre a sociedade, em particular sobre os trabalhadores. Independente de quem seja o vencedor (Dilma, Marina ou Aécio) o que se prepara é um choque econômico, com medidas como essas:
– Restrição da inflação oficial (não necessariamente a real) para o centro da meta em 4,5% ao ano. Dentro da lógica do capital, isso só é possível aumentando os juros e contraindo o crédito, freando violentamente o consumo e levando à queda dos preços.
– Desemprego, provocado por esse processo recessivo de aumento dos juros e restrição do crédito. As empresas querem se reestruturar demitindo trabalhadores e sobrecarregando os que fiquem. Já há um processo de demissões e layoffs em várias empresas.
– Ataques aos direitos trabalhistas e aumento da intensidade do trabalho, com as empresas se aproveitando do desemprego crescente. Há o chamado Acordo Coletivo Especial que deve voltar à pauta do Congresso, com o objetivo de desregulamentar as relações trabalhistas, criando a “livre negociação” que na prática acaba com vários direitos.
– Reforma Tributária, com redução permanente e horizontal (para todos os setores) dos impostos como IPI, ICMS, contribuições das empresas sobre a folha de pagamentos, etc.
– Privatização total de ramos e empresas hoje já semiprivatizados como a Petrobrás (cuja maioria das ações já estão em mãos privadas), o Banco do Brasil, a Caixa Econômica, etc.
– Corte dos gastos públicos (leia-se congelamento dos salários do funcionalismo público e demissões) e avanço dos métodos da iniciativa privada no interior do serviço público. Reforma da Previdência, com aumento da idade para se aposentar.
– Endurecimento com os movimentos com repressão e perseguição aos ativistas.

Essa agenda empresarial não é nova, tem sido aplicada desde Collor, Itamar e FHC. Durante os anos de governo do PT, a entrada de capitais externos, o incentivo ao crédito, e a resistência dos trabalhadores fizeram com que vários pontos dessa agenda fossem mediados, ou jogados para depois. Mas tudo indica que a partir de agora o capital cobra a implementação de sua agenda muito mais a fundo. E precisa de um governo que se comprometa fielmente e sem pudor.
Isso tudo joga a favor da eleição de Marina, cujo principal acessor econômico e possível ministro da Fazenda, Eduardo Gianetti, é defensor de um choque econômico com as medidas citadas acima. A burguesia “pira”… Nesse caso um governo Marina teria características de um novo Collor, para fazer o trabalho sujo e quem sabe, depois ser descartado.

Ou Dilma, gerente do capital…

Mas, ao mesmo tempo em que Marina representa uma alternativa desejável, a maioria da burguesia treme de pensar que poderia ser um governo extremamente instável, que ao se chocar com o movimento pode não ter a força suficiente para se manter. Qual a estrutura de um governo Marina? Com quais partidos poderá efetivamente contar? Teria o apoio dos sindicatos como o governo Dilma? O acirramento social, ao dar força ao setor evangélico, não seria mais um fator de instabilidade política? Enfim, são perguntas para as quais nem a burguesia nem seus analistas e experts têm a resposta.
Ao mesmo tempo, o governo Dilma procura tranquilizar a burguesia e os setores reacionários, de que vai ainda mais à direita. Dilma mandou desengavetar um projeto de Lei que estava parado desde 2009, e que estabelece basicamente duas coisas: isenção total de impostos para as igrejas evangélicas e o não reconhecimento de direitos trabalhistas para auxiliares dos pastores (obreiros, presbíteros, etc). Além disso, declarou que num próximo governo irá trocar sua equipe econômica, num claro aceno de que fará um governo muito mais duro nas metas que o mercado financeiro e o capital de conjunto querem.
Quanto a Aécio, não precisamos cansar os leitores, pois seu viés de direita é mais visível. Foi o PSDB que deu sustentabilidade ao projeto neoliberal no Brasil.

Para nós, só vai sobrar a luta!

Para nós trabalhadores e estudantes fica a certeza de que qualquer uma das alternativas “viáveis” nessas eleições estarão a serviço do mesmo projeto geral do capital.
Precisamos nos preparar e preparar os trabalhadores, denunciando todas essas candidaturas e seus partidos, e chamando ao fortalecimento da luta e da organização de base, ao mesmo tempo apresentando e discutindo um programa socialista para uma mudança a favor dos trabalhadores, que seja feita pelos trabalhadores com suas organizações de luta.

PSOL aceita doações da burguesia… PSTU critica, mas se aproveita…
Um dos elementos de cooptação e corrupção do PT foi a aceitação das doações de empresas em suas campanhas. Hoje, a campanha de Dilma é a que mais recebe doações de empresários – R$123 milhões até agora -, e ainda tem o segundo turno. Se reeleita, seu governo tem dono.
A rejeição a qualquer doação de empresas ou empresários é uma questão de princípios para qualquer organização, partido ou movimento que pretenda manter sua independência de classe.
Mas na ânsia por eleger parlamentares, setores importantes da esquerda estão capitulando e abrindo mão desse ponto fundamental.
O PSOL tenta se apresentar como partido da ética e da mudança, mas desde 2008 passou a aceitar dinheiro das empresas, primeiro na figura da Gerdau – gigante do ramo de aço.
Agora, o PSOL do Rio Grande do Sul recebe doações do Grupo Zaffari –que representa a quinta maior rede de supermercados do Brasil e a primeira do RS.
Já em Alagoas, a candidata ao senado pela Frente de Esquerda (PSOL/PSTU), Heloísa Helena, aceitou apoio de representantes do PSDB, do governador Teotônio Vilela e de usineiros de Alagoas.
Já o PSTU, que critica corretamente o PSOL em ambos os casos, rompeu com a candidatura de Heloísa Helena, mas permanece na Frente eleitoral com o PSOL, assim como no Rio Grande do Sul. Com isso, o PSTU também se beneficia do dinheiro recebido das empresas (RS) como do apoio de políticos burgueses (Al), pois tanto o dinheiro como o apoio político acabam chamando votos para a Frente de conjunto, o que conta para a eleição de seus candidatos. Para ser coerente, o PSTU deveria romper com a Frente de Esquerda nos estados em que o PSOL aceitar dinheiro ou apoio da burguesia.
Assim, por trás do discurso de esquerda, sua prática também acaba sendo oportunista, priorizando eleger seus candidatos ao invés de aproveitar para ter uma postura coerente, diferenciada e educativa para os trabalhadores e a vanguarda.
O mesmo problema aconteceu nas eleições passadas, em Belém, quando o PSTU permaneceu na Frente com PSOL e PC do B (partido governista), rompendo apenas depois do 1º turno, quando já havia eleito seu vereador… pela Frente.
Não somos contra a eleição de candidatos comprometidos com a luta e com um programa dos trabalhadores. Mas essa postura inconsequente do PSTU é problemática, pois nesses casos a tática (eleger candidatos) está comprometendo a estratégia que deve ser a independência da luta e organização dos trabalhadores frente à burguesia e seus partidos.