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Luta da categoria ou luta unitária dos explorados? – Agosto/2000


13 de outubro de 2013

 

 Agosto/2000

 

Este artigo foi publicado originalmente na edição nº 2 do Jornal do Espaço Socialista

Considerações sobre a greve dos professores de São Paulo

A greve dos profissionais da educação da rede estadual por 43 dias, que ocorreu no mesmo período que a greve dos trabalhadores da saúde, universidades, ETE´s e paralisação dos metroviários, foi marcada por uma dura realidade: a falência do padrão de lutas de categoria corporativas e centradas na reivindicação salarial ou na melhoria da carreira.

Torna-se impossível saber com certeza qual foi a adesão ao movimento, tanto pela sua oscilação constante, quanto pela utilização manipulatória – pelo governo e pelo sindicato (APEOESP) – dos números da paralisação. As estimativas em momentos de crescimento falavam de 50% com muita desigualdade, principalmente entre o interior do estado, onde a adesão foi maior, e a região da capital e ABCD em que a greve foi um fiasco.

Nos últimos 10 dias as assembléias regionais e até a estadual já expressavam o fim da greve com o esvaziamento quase total e o retorno ao trabalho de quase todos os professores.

A intransigência do governo Covas – ao se recusar a negociar com os professores, ao colocar a tropa de choque para impedir ou intimidar as assembléias, nas diversas provocações ao movimento e, depois da greve, em descontar os dias parados e impor um calendário de reposição – expressa o interesse em preservar acima de tudo a garantia da manutenção das remessas de juros da dívida externa e a necessidade de manter as escolas como instrumento de contenção social.

Essa intransigência do governo de São Paulo, que também se demonstrou na desocupação em Guaianazes, se enquadra numa ofensiva nacional (prisão e assassinato de sem-terras) e até mundial de repressão aos movimentos sociais. Essa repressão se impõe com mais facilidade sobre os movimentos isolados, ao não serem capazes de despertar as energias dos imensos contingentes de proletários, cuja participação poderia mudar totalmente o rumo dos acontecimentos.

A decadência do ensino público e do movimento sindical…

Nas escolas enfrentamos desde os problemas com a falta de materiais pedagógicos, passando pelo despreparo e desmoralização de muitos profissionais até a acomodação com a crescente violência instalada ao nosso redor, o desânimo, o baixo nível de ensino e falta de perspectiva e de interesse aos estudos de nossos jovens.

Nos últimos quatro anos foram demitidos mais de 60 mil professores e aumentou a fragmentação da categoria (efetivos, estáveis, ACT’s, substitutos, eventuais, monitores, etc). Milhares de novas demissões estão previstas para o próximo ano com a Reforma do Ensino Médio. Desenvolve-se uma campanha permanente de incentivo à competição entre escolas e professores, sobre quem pesa, além de tudo, o mecanismo da avaliação anual de desempenho.

O desemprego e a fragmentação das categorias, a mundialização da produção e dos movimentos de capitais financeiros são os fatores objetivos que levaram as lutas de categoria à decadência. Foram reações dos empresários e governos de diversos países no sentido de aumentar a exploração e a dominação sobre os trabalhadores, dificultando sua resistência.

Mas, não podemos nos esquecer da ação e da ideologia desenvolvidas pelas direções sindicais que foi de aceitar e até implementar junto com os empresários e o governo suas principais políticas.

A perda de referências e alternativas geradas por essas mudanças enfraqueceram as antigas formas de luta. Acentuaram-se então o individualismo e a ideologia de que só resta nos submeter e aceitar, “se não, é pior”.

O padrão anterior, de lutas de categoria, que se desenvolveu nos anos 70 e 80, também teve como problemas a adaptação e dependência frente ao poder de Estado. Os sindicatos foram criados à imagem e semelhança do estado e neles predominam relações centralizadoras, burocráticas e corrompidas.

Mesmo que esse tipo de movimento e de estrutura, com todos os problemas, tenham obtido conquistas nas décadas anteriores, mostram-se completamente ultrapassados e impróprios para enfrentar os desafios atuais.

No caso dos professores e do funcionalismo público, também foi reproduzida a relação impositiva com os alunos e pais. Isso tudo se expressa quando uma greve é decretada e conduzida de cima para baixo, não considerando os diretamente afetados (professores, pais e alunos).

Ao insistir na questão salarial, como eixo da pauta, ao invés das condições de ensino, mesmo depois de perder essa votação em assembléia, a direção do sindicato e parte da “oposição” prejudicaram nosso movimento em três aspectos: deram ao governo e à imprensa burguesa o argumento para limitarem nossa luta à reposição dos 54%; jogaram parte da população contra o movimento e contrariaram os professores, que entraram em greve visando centralmente a luta contra o corte de aulas (Reforma do Ensino Médio) e a precarização geral do ensino.

Buscando novos caminhos

Com tudo isso, hoje os problemas que nos afligem são muito maiores do que o salário. A luta a ser travada necessita romper com as fronteiras da luta de categoria colocando-se como luta da classe trabalhadora, tendo como primeiro passo a união das comunidades (professores, alunos, pais e demais trabalhadores).

A total degradação do ensino público, que é também da saúde pública, do transporte e da moradia que atendem aos trabalhadores, desempregados e seus filhos nos empurram aos guetos e ao aprofundamento da miséria na periferia.

É necessário um novo padrão de luta e organização que permita e desenvolva as iniciativas de romper com a passividade e a representatividade em cada escola e bairro.

A união de professores, alunos e pais numa luta pela ocupação democrática do espaço da escola, tanto no cotidiano das aulas como nos finais de semana; as iniciativas de auto-organização como oficinas de Hip-Hop (rap, grafite, street dance) teatro, capoeira, etc são importantes para desenvolver o senso de solidariedade e consciência de classe em nossas comunidades.

O desenvolvimento dessas e de outras práticas comunitárias e solidárias pode se constituir como ponto de apoio para novas lutas contra a degradação do ensino público, pelo aumento das verbas e pelo direito de decidirmos coletivamente sobre o seu uso.

Com a extensão desse movimento se desenvolverão novas formas de intercâmbio e coordenação entre as comunidades e com outros movimentos sociais.

Assim, estaremos ao mesmo tempo lutando contra o capitalismo e buscando construir os germes de uma nova sociedade.

Ira, Alex, Neu e Re – ( ABC- SP )