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A educação em tempos de crise estrutural do capital Abril- Maio/2010


14 de outubro de 2013

Este artigo foi publicado originalmente na edição nº 36 do Jornal do Espaço Socialista – Abril- Maio/2010

 

No Brasil e no mundo os governos, mais uma vez, foram convocados, como sempre, para gerenciar a crise estrutural do capitalismo. Essa intervenção estatal direta, através da aquisição e do empreendedorismo, ignora as necessidades coletivas dos trabalhadores para garantir os lucros das grandes empresas e dos banqueiros.

Os governos emitiram trilhões de dólares para atenuar a crise. Escondem com isto um enorme endividamento público que será pago por alguém, nesse caso, pelos trabalhadores. Lula já gastou mais de R$ 480 bilhões e Serra, que já havia dado R$ 9 bilhões para as montadoras, criou um pacote de R$ 20,6 bilhões, com isenção de impostos e a construção de obras de infra-estrutura de interesse dos empresários. A isenção de impostos também foi seguida pelo governo federal através da redução de IPI para a compra de eletrodomésticos e automóveis.

O endividamento público em função da ajuda às empresas fez com que o setor público consolidado brasileiro registrasse déficit primário de R$ 5,763 bilhões em setembro, pior resultado para o mês desde 2001. Em setembro de 2008, o resultado primário havia sido superavitário em R$ 6,618 bilhões. (Reuters News 30/10/2009).

O resultado dessas ações é o sucateamento dos serviços públicos com os baixos salários e a precariedade dos serviços utilizados pelos trabalhadores.

No caso, estado de São Paulo, Serra contingenciou mais de R$ 23 bilhões e se apresenta como o verdadeiro porta-voz da burguesia para governar o Brasil, principalmente no contexto de crise.

Os professores como obstáculo para a implementação do projeto da burguesia

Embora os estados tenham gasto trilhões de dólares – e irão gastar muito mais – com ajuda financeira ao capital em crise, os professores juntamente com os profissionais de Saúde são apontados como a principal carga orçamentária dos Estados Nacionais, segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE):

“O conjunto desses países (países pertencentes a organização) destinavam, em média, 4% do seu PIB para o ensino primário e secundário e 8,3% dos gastos públicos para essas categorias, sendo que na União Europeia o percentual do PIB se elevava a 10% e, na América do Norte, a Européia 14%. Mas de 80% da soma investida nos cursos primário e secundário era destinada à remuneração dos profissionais da escola e três quartos desses recursos iam para os professores”. (In: Professores do Brasil: impasses e desafios, p. 16)

Isso evidencia o nível de controle e repressão sobre os professores em todo mundo. No caso da greve dos professores da Rede Estadual do Ensino de São Paulo possibilita-nos entender os motivos de uma mobilização massiva e longa (30 dias) ser tão fortemente combatida, desmoralizada pela imprensa e governo e ter como resultado a repressão policial sangrenta e a falta de diálogo.

Derrotar qualquer reação dos trabalhadores é necessário para a implantação do projeto burguês de contingenciamento de recursos financeiros e de conquista e manutenção de isenção fiscal.

Não é à toa que grandes empresários e banqueiros participam da discussão em torno das questões educacionais. Para a burguesia a Educação vai além da preparação de mão de obra ideal para maior extração da mais-valia.

O compromisso “Todos pela Educação”, assinado em 06 de setembro de 2006, nos mostra isso. O movimento conta com a adesão de governos de todas as legendas partidárias burguesas (PT, PSDB, DEM, PMDB…), de grupos empresariais, ONG´s (Fundação Roberto Marinho, Fundação Itaú – Social, Instituto Airton Senna, Fundação Bradesco, Grupo Gerdal, etc). Tem como objetivo central o corte nos gastos públicos e a contenção social para sobrar dinheiro que será utilizado na construção de obras de seu interesse e de um caixa para socorrê-la futuramente.

Para isso é necessário instituir Prova por mérito e Avaliação por desempenho como mecanismos de controle “que atuam diretamente sobre as escolas como forma de pressão através da competição em suma, na gestão dos sistemas escolares, há um excesso de centro, excesso de política, excesso de estado”. (Márcio da Costa. In: Pedagogia da Exclusão: crítica ao neoliberalismo em Educação. p. 63). São ações que procuram enquadrar o professor para possibilitar a implantação do projeto burguês e dos projetos impostos pelos organismos internacionais a todo o funcionalismo público.

Os organismos internacionais

Os organismos financeiros como Banco Mundial e FMI passaram a traçar diretrizes, ou mesmo intervirem, na política interna dos países endividados subdesenvolvidos e, sobretudo, da América Latina a partir da crise dos anos 70/80 que mais tarde desembocou na implementação da política neoliberal.

Estas intervenções tinham como objetivo central assegurar o pagamento das dívidas aos credores dos países centrais a partir da redução dos gastos estatais com os serviços sociais (saúde, educação, moradia) a fim de garantir ajuda financeira e fiscal aos empresários e banqueiros.

Na Educação pública, a intervenção do Banco mundial e do FMI se dá através de reformas educacionais que objetivam formar uma mão de obra que ora pode ser utilizada, ora pode ser descartada parcialmente ou totalmente de acordo com as necessidades do mercado, formando uma mão de obra precária e flexível adequada à reestruturação produtiva.

Essa lógica está aplicada na forma de contratação dos professores temporários em São Paulo (cerca de 80 mil) que ora são aproveitados ora descartados e representam a mão de obra precária e flexível na Educação.

As medidas pioneiras tomadas pelo governo estadual em relação às novas formas de contratação de professores indicam o aprofundamento do processo de precarização do trabalho no funcionalismo público, objetiva a consolidação do trabalho temporário, instável e sujeito à avaliação e demissão pelo gestor (categoria “O”).

Ao criar várias divisões na profissão de professores a categoria “O” é a que mais expressa a precariedade, pois o professor leciona por um ano e é impedido de lecionar no ano seguinte (200 dias) com intensa retirada direitos. Evidentemente, esta situação inviabiliza qualquer possibilidade de exercer um trabalho educativo adequado. Precariza simultaneamente, as condições de trabalho dos professores e o ensino público em geral, consolida o trabalho informal e desmerece a importância social do trabalho dos professores.

É evidente que esta lógica tende a se estender a todas as demais formas de contratação do funcionalismo, inclusive sinalizando para o fim da estabilidade dos efetivos.

A greve dos professores reafirma: a luta por uma educação pública deve ser todos os trabalhadores!

A greve dos professores da Rede Estadual de Ensino Público de São Paulo é um exemplo de que não podemos mais dissociar a luta desses profissionais com a luta dos trabalhadores dos demais setores, sob pena de isolamento e derrota.

Primeiro, porque são os filhos dos trabalhadores que estudam na escola pública. Segundo, porque a burguesia busca manter suas taxas de lucro, se blindar da crise econômica e jogar nas costas dos trabalhadores os custos da crise.

É necessário rompermos com os limites do corporativismo e ligar a luta imediata com a luta política tendo no horizonte a superação da lógica do capital. Precisamos envolver todos os trabalhadores na discussão sobre a qualidade do ensino público e desmascarar governos e patrões, os verdadeiros culpados pela crise da Educação.

Enquanto estávamos em Greve, em São Paulo, por condições de trabalho, contra a precarização dos vínculos de contratação, contra a política da meritocracia, o governo Lula criou o decreto nº 7133 que qual estabelece os critérios e processos de avaliação de desempenho de todos os funcionários públicos federais. Ou seja, a mesma política de José Serra.

Nesse sentido nossa luta não é apenas contra o governo estadual (Serra/Goldman), mas também contra o governo federal (Lula), pois ambos aplicam a mesma política com pequenas diferenças no modo de governar.

Atualmente as provas de mérito não são obrigatórias, com o passar do tempo serão atreladas ao processo de Avaliação de Desempenho, no caso dos professores inclui: Prova de Mérito, Avaliação de Desempenho (estágio probatório), meta da escola aferida via os indicadores de desempenho de avaliação externa dos alunos.

O objetivo é passar a questionar e acabar de vez com a estabilidade dos funcionários públicos de modo a conseguir maior subordinação e, no caso dos professores, nos sobrecarregar de atividades que não têm qualquer relação com a nossa profissão.

Enquanto a imprensa burguesa (Folha de São Paulo, Rede Globo, Estadão, DGABC) posicionava-se a favor do governo acusando-nos de estarmos fazendo campanha eleitoral, as centrais governistas (CUT, Força Sindical, CTB, CGT) não fizeram nada para fortalecer a greve dos professores. A CUT, para quem a APEOESP contribui com mais de R$ 120 mil por mês não divulgou (publicação de cartas abertas em seus jornais, sites, etc) e nem discutiu a greve com os trabalhadores das várias categorias. Teve sindicato no ABC paulista que negou empréstimo de carro de som e não aceita contribuir para o fundo de greve.

Mesmo as organizações sindicais de esquerda como a CONLUTAS (dirigida pelo PSTU) e a INTERSINDICAL (dirigida pelo PSOL) pouco fizeram e não se envolveram na greve de modo efetivo. Os sindicatos ligados a essas organizações tampouco se solidarizaram ativamente (para além dos discursos) com a greve dos professores. A maioria da esquerda também deixou de fazer a discussão da profundidade dessa greve com os demais trabalhadores. Isso demonstra que ainda prevalece a concepção corporativista – mesmo nos meios mais combativos – de que a greve dos professores é apenas problema dos professores e não uma questão que envolve toda a classe trabalhadora e que deve ser tratado como um problema de todos os trabalhadores e não apenas de uma categoria.

Além disso, a quase totalidade das correntes de esquerda também deu muito pouco peso ao caráter estratégico da nossa greve de enfrentar não apenas um projeto estadual, mas também federal e inclusive um projeto de estado e do sistema capitalista.

Isso fez com que um amplo setor da categoria ficasse preso ao discurso da maioria da direção do sindicato (Articulação/ArtNova/CSC) de que a culpa era do Serra. Discurso extremamente conveniente que visava apenas desgastar a imagem de Serra e do PSDB, ao passo que para a vitória efetiva do movimento seria necessário formas mais avançadas e mais amplas que colocassem em xeque o projeto como um todo.

De qualquer forma, independentemente de seus resultados imediatos, a greve fez com que a categoria dos professores voltasse a se mobilizar e, principalmente, a discutir e problematizar as questões da Educação e do movimento de professores. Podemos dizer que passamos a pautar os problemas estruturais da Educação no estado e no Brasil.

Outro elemento extremamente importante foi o surgimento de ativistas que assumiram tarefas relevantes na condução/sustentação da greve. Um dos maiores desafios será preservarmos e ampliarmos a nossa união e organização, envolvendo-nos como Representantes de Escola, formando redes de comunicação e integrando-nos às Comissões de Trabalho nas subsedes para uma renovação de idéias e forças no Sindicato e na rede pública de ensino.

O interesse da burguesia e do governo em derrotar a greve dos professores em São Paulo a fim de impedir a reação e a repercussão por todo o movimento de trabalhadores fica como exemplo do quanto precisamos unificar as nossas lutas se quisermos manter os nossos direitos e a nossa sobrevivência.