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Jornal 19: Março/Abril de 2007


21 de janeiro de 2013

Leia as matérias online:

 

Unidade na luta contra o PAC e as Reformas

POR UM PLANO ALTERNATIVO DOS TRABALHADORES!

Com o PAC (Plano de Aceleração do Crescimento), o que se pretende é que o Estado invista novamente grandes somas de dinheiro público em obras de interesse dos grandes empresários, o que eles próprios não se dispõem a fazer, apesar de toda sua defesa da “livre iniciativa”. Além disso, o governo Lula pretende aprovar, com a ajuda do Congresso Nacional e do Judiciário, um conjunto de leis favoráveis aos empresários e contra os trabalhadores.

Vejamos as principais medidas do PAC e sua lógica:

PARA OS EMPRESÁRIOS…INCENTIVOS.

a) Elevação do Programa Piloto de Investimentos (PPI) de 0,2% do PIB (R$ 4,9 bilhões) para 0,5% (cerca de R$ 11 bilhões neste ano e R$ 67,8 bilhões até 2010) em projetos destinados a baratear os custos de produção, distribuição e exportação das mercadorias das transnacionais – as chamadas obras de infra-estrutura –, que são caras e de retorno demorado, como portos, rodovias, aeroportos, usinas, obras de saneamento, etc. Em vez de melhorar e construir mais escolas, universidades, hospitais, moradias e promover a Reforma Agrária, o governo vai aplicar bilhões de reais em empreendimentos voltados para aumentar a lucratividade das empresas.

 b) Utilização do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço). Inicialmente serão R$ 5 bilhões, que podem subir para até 80% do patrimônio líquido do FGTS, de cerca de R$ 20 bilhões. Com esse dinheiro será criado um fundo para aplicações em obras de infra-estrutura como as citadas acima. Se os investimentos desse fundo derem prejuízo ou renderem menos do que a correção atual, os trabalhadores poderão ser prejudicados quando forem receber seu FGTS.

c) Isenções de impostos para as empresas de semicondutores, TV digital, indústria do aço, construção civil, de transportes, portos, energia e saneamento básico. Isenção de impostos sobre a venda de computadores de mesa e laptops até R$ 4.000. Antes o limite era de R$ 2.500 a R$ 3.000. Não há garantia alguma de que essas isenções serão repassadas aos preços.

d) Diminuição da taxa de juros de 13,75% para 9% sobre os empréstimos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para as empresas que queiram investir em infra-estrutura. Além disso, a quantia a ser emprestada aumenta de 70% para 80% do valor do empreendimento, e o prazo de pagamento ao BNDES sobe de 14 para 20 anos. Isso é que é um estado paternalista… com os empresários!

e) Ampliação do programa de compra da casa própria. Esse dinheiro sairá do FGTS, ou seja, do dinheiro dos trabalhadores.Uma medida demagógica, pois R$ 1 bilhão para essa finalidade é um valor irrisório, comparado ao total de investimentos que irão beneficiar os empresários. Além disso, esse crédito se restringe aos trabalhadores formais, na faixa de 1 a 3 salários mínimos, deixando de fora os trabalhadores sem registro em carteira e os desempregados.

f) Regulamentação do artigo 23 da Constituição, com o objetivo de “destravar a legislação ambiental”. O governo e as empresas querem criar formas de driblar a legislação ambiental e passar por cima de vários órgãos públicos que vêm barrando a construção de usinas e outras obras de grande impacto ambiental.

g) Criação do chamado marco regulatório, ou seja, leis que visam garantir a segurança e os lucros das PPP’s (Parcerias Público-Privadas), nos setores de meio ambiente, geração de energia, etc.; Em último caso, o estado deverá pagar indenizações a eventuais prejuízos das empresas. Vemos aqui o cinismo dos defensores de que “o lucro é a remuneração do risco do capital”.

h) Manutenção do pagamento dos juros da Dívida Pública. O pagamento dos juros da Dívida é um dos maiores responsáveis pelo atraso da qualidade de vida no país. Só durante o primeiro mandato de Lula, foram pagos R$ 439,247 bilhões. No orçamento de 2007, estão previstos mais de R$ 160 bilhões (!). Mesmo assim, a Dívida Pública continua crescendo e já atingiu a soma de R$ 1,1 trilhão (quase 50% do PIB)! Na prática, essa dívida já foi paga. Mas os especuladores querem manter a extração de dinheiro do país e dos trabalhadores, para encher o bolso dos grandes especuladores internacionais.

Os grandes agiotas da Dívida Pública também tiveram seu PAC: a taxa básica de juros, a Selic (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia), que remunera os títulos da Dívida, foi mantida em 13%, a maior taxa de juros do mundo.

 PARA OS TRABALHADORES… A CONTA

a) Salário mínimo Miserável até 2023. A partir de 2008, o aumento do mínimo levará em conta a inflação mais o crescimento do PIB de dois anos antes. Não haverá sequer a reposição das perdas históricas com a inflação dos anos anteriores, para não falar na bandeira histórica do salário mínimo do DIEESE (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos), sequer mencionada.

b) O teto máximo para o aumento do salário dos servidores públicos fica fixado pela inflação anual mais 1,5% de aumento real. Da mesma forma que no salário mínimo, são “esquecidas” todas as perdas salariais dos servidores públicos, pois 1,5% não cobre nem a diferença entre a inflação real e a oficial.

Entretanto, os salários dos políticos e juízes seguem aumentando, e bastante. Depois de serem obrigados a recuar do aumento de 91%, aprovaram a proposta de reposição da inflação dos últimos 4 anos. Mas quando os trabalhadores lutam para repor suas perdas salariais – como em Alagoas –, esses senhores dizem que isso gera inflação…

c) Corte de verbas públicas da saúde e da Previdência Social. No Orçamento de 2007, o Ministério da Saúde vai perder R$ 5,8 bilhões. Da Previdência, Educação, Desenvolvimento Social, Trabalho, Cultura e Esportes vão sair outros R$ 2,35 bilhões. Além disso, haverá a diminuição do valor do auxílio-doença e criação de mais empecilhos para o trabalhador receber esse direito.

 d) Criação do Fórum Nacional da Previdência Social unindo governo, empresários e as centrais pelegas (CUT, Força Sindical, CGT) para discutir propostas para a Previdência. Esse Fórum nada mais é do que uma forma de tentar respaldar a Reforma da Previdência como uma proposta consensual da sociedade ou de sua maioria. Mas já é amplamente divulgado que empresários e governo querem o aumento da idade mínima para até 65 anos, a equiparação da aposentadoria da mulher à do homem e o fim da aposentadoria especial dos professores e outras funções insalubres.

 e) Implementação da Super-Receita. A emenda 3 do Projeto de Lei 6272/05, aprovada em 13 de fevereiro, une as secretarias de arrecadação e fiscalização dos ministérios da Fazenda e da Previdência num único órgão. Os resultados serão acúmulo de funções e perda na qualidade de atendimento, pois o governo não prevê concursos para a contratação de mais funcionários que estão em falta. Além disso, a emenda aprovada permite aos empregadores contratarem trabalhadores informais “disfarçados” de autônomos.

A PARTE NÃO DIVULGADA…

Além das medidas acima, há outras na mesma linha, não divulgadas ainda por serem claramente antipopulares:

f) Prorrogação da alíquota de 0,38% da CPMF por mais 10 anos. Esse imposto foi criado no governo FHC, com a desculpa de arrecadar uma verba extra para a saúde. Depois passou a usado para cobrir parte do pagamento dos juros da Dívida Pública. Pela lei, ele vigora até o final de 2007. Mas o PT quer sua prorrogação, ou seja… torná-la definitiva.

g) Prorrogação da desvinculação de 20 % das verbas da União por mais 10 anos. A vinculação, prevista na Constituição, é a forma concreta de obrigar os governos a investirem na saúde e na educação um percentual fixo de verbas em relação ao PIB. Durante a presidência de FHC, foi aprovada a desvinculação, ou seja, um corte de 20% nessas verbas fixas. Essa parcela ficou livre para o governo gastar como quiser. Na prática, sempre foi gasta para cumprir o superávit primário, leia-se, para pagar juros aos agiotas internos e externos. Como essa lei que criou a desvinculação atual de 20% também se esgota em 2007, o governo pretende prorrogá-la por mais 10 anos.

 h) Correção da tabela do imposto de renda em 4,5% até 2010. Além de não repor os vários anos de defasagem, a correção das faixas da tabela do imposto de renda não segue sequer a inflação real, que tem sido o dobro desse valor.

 

OS ARGUMENTOS POR TRÁS DO PAC E SUAS CONTRADIÇÕES

O principal argumento por trás do PAC é que, havendo crescimento econômico, teremos a geração de empregos e a distribuição de renda de que o país necessita.

Mas a realidade mostra o contrário. Durante os anos 90, com o Plano Real, e mesmo nos primeiros quatro anos do governo Lula, houve crescimento econômico e apesar disso o desemprego, a degradação dos serviços públicos e a concentração de renda só se agravaram. A promessa, já insuficiente, de gerar 10 milhões de empregos foi um fiasco, pois já se sabe até mesmo pelos dados oficiais (forçados para baixo), que o desemprego no país teve alta em 2006 e chegou a 10% da população economicamente ativa. (UOL – Economia 25/01/2007).

O que tanto os empresários quanto o governo querem encobrir é que, no estágio atual do capitalismo, é possível haver  crescimento econômico sem novas contratações, ou até mesmo com aumento do desemprego, como nos mostra a experiência de vários países. Essa realidade tem a ver com a nova fase do capitalismo: a globalização.

Antigamente, a tecnologia não era tão alta. Para o capitalista ampliar a produção e, dessa forma aumentar seus lucros, precisava contratar mais funcionários e gastar uma parte maior do capital em salários, direitos trabalhistas e rendimentos da classe média. Assim, indiretamente, o sistema também aumentava seu mercado consumidor, reproduzindo-se e expandindo-se continuamente.

Entretanto, com o enorme desenvolvimento da tecnologia sob controle do capital, a partir dos anos 70 ocorreu a inversão dessa lógica: a tendência passou a ser de eliminação maciça de postos de trabalho, diminuição dos salários e dos direitos trabalhistas e a queda dos rendimentos da classe média.

Um exemplo entre muitos é o caso da Volks, que recentemente demitiu 3.600 trabalhadores ao mesmo tempo em que batia recordes de produção e exportação. Por isso, mesmo que haja crescimento econômico da ordem de 4% ou 5%, o problema do desemprego não será resolvido nem amenizado.  E isso não vai mudar enquanto não for questionado o controle do capital sobre a tecnologia, enquanto ela for usada para aumentar os lucros e não para o bem-estar da sociedade.

Quanto à área social, mesmo que aumente o crescimento econômico, tampouco teremos aumento significativo dos investimentos, pois o pagamento dos agiotas financeiros da Dívida Pública não deixa espaço para uma política efetiva de investimento social e distribuição de renda. Além disso, com mais isenções e créditos para as grandes empresas, cairá a arrecadação do estado e mais verbas serão cortadas da saúde e educação públicas.

Cada vez mais, o governo terá de fazer o assistencialismo para os mais pobres e miseráveis às custas dos trabalhadores formais e da classe média. Essa tem sido sua lógica nesses últimos quatro anos e tudo indica que pretende aprofundá-la. Mas, até quando os trabalhadores e a classe média vão aceitar pagar essa conta cada vez maior?

 

DIANTE DA CRISE ESTRUTURAL DO CAPITAL, O PAC SOMENTE APROFUNDARÁ OS PROBLEMAS ECONÔMICOS E SOCIAIS

Ao eliminar postos de trabalho e precarizar as condições de trabalho e o poder de compra da classe média, o capital está destruindo parte importante de seu mercado consumidor. Assim, provoca sua própria crise de expansão.

A contradição entre o crescimento permanente e cada vez mais rápido da capacidade produtiva do sistema versus um mercado consumidor em lento crescimento, ou com tendência à estagnação, é a principal marca da crise estrutural do capital.

Por mais que tente atenuar essa contradição, criando milhares de necessidades artificiais nos setores que ainda podem consumir, o capital não consegue reverter sua crise estrutural, que tende a se agravar e se tornar convulsiva com o passar dos anos. Por sua vez, essa crise leva à disputa cada vez mais acirrada pelos mercados existentes, entre as grandes corporações e entre os estados nacionais que as representam. As conseqüências são desastrosas, desde uma maior precarização das condições de vida dos trabalhadores, degradação do ambiente, até guerras pelo controle dos mercados ou das matérias-primas.

Definitivamente, não será através do crescimento econômico capitalista, cada vez mais difícil, mais excludente e mais destrutivo, que as grandes massas serão incorporadas ao consumo, mesmo dos itens mais básicos. As tendências do período do capitalismo em crise estrutural apontam no sentido contrário: de aumento do desemprego e da miséria.

Assim, se o PAC “der certo”, seu resultado ao final de 2010 será apenas o de possibilitar uma maior taxa de exploração do trabalho pelo capital e uma maior apropriação do dinheiro público pelos grandes empresários. Já o retorno social será minguado ou nenhum. Aí então, surgirão novas reivindicações de mais benesses, numa lógica de decadência que só se aprofundará, enquanto o país estiver sendo gerido de acordo com a lógica de submissão aos interesses do capital, como se estes fossem compatíveis e não antagônicos aos interesses da maioria da população, e dos trabalhadores em particular.

Se os projetos do governo Lula se efetivarem, em 2010 teremos um país muito mais dependente das grandes transnacionais, muito mais privatizado, com os serviços públicos mais mercantilizados e mais caros, com salários muito mais arrochados, e com piores índices de desemprego.

 

BUROCRACIA PETISTA: IMPLEMENTANDO O PROJETO CAPITALISTA… A SEU MODO

Diferente da burguesia, que preferia um ataque direto e frontal ao movimento, a burocracia petista não quer esgotar tão rapidamente seu principal capital: a capacidade de conter os movimentos sociais.

A equipe do governo Lula não tem diferenças com o projeto burguês em geral, implementado desde FHC, mas utiliza formas mais disfarçadas e mediadas, de modo a confundir e dividir a classe trabalhadora, ciência mesquinha que aprendeu nos anos em que esteve à frente dos movimentos, cumprindo o papel de contenção das lutas, freando greves gerais e impulsionando acordos como o da Câmara Setorial em 1991 ou o da Previdência em 1998.

Esse processo de ataques mais mediados aos trabalhadores leva a uma recuperação mais segura dos lucros do capital, porém mais lenta do que o necessário para que os setores da burguesia que atuam no Brasil possam concorrer com os que atuam em outros países.

Esse foi o motivo das reclamações dos empresários e seus analistas, que argumentam que o PAC é progressivo, mas que é preciso ir muito além, no sentido de realizar rapidamente as “reformas estruturais”, da Previdência, Trabalhista, Tributária Política, um maior superávit primário, etc., etc.

Delfim Neto, mais experiente, frisou porém que “não se pode esquecer que há uma sociedade no meio do caminho…”

O problema para a burguesia é que impor seu receituário não está mais tão fácil como nos anos anteriores.  Nos dias atuais, os EUA enfrentam cada vez mais problemas em sua estratégia de dominação super-imperialista e a América Latina passa por ciclos de rebeliões populares que deram origem a governos nacionalistas mais à esquerda. Um pacote de Reformas e ataques frontais poderia despertar a reação da classe trabalhadora do maior país da América Latina e o único ainda sob controle.

Nesse contexto, a burocracia petista bate no peito e busca reafirmar para o imperialismo norte-americano e europeu, e para os setores da burguesia interna, a sua importância na preservação da ordem. Ela é o único setor social e político capaz tanto de administrar as contradições entre os vários setores da burguesia como, principalmente, de manter a paralisia e a dispersão dos maiores batalhões da classe trabalhadora e dos miseráveis.

A burguesia, embora reclame e exija mais, sabe que pelo menos por enquanto precisa da burocracia no poder, e está disposta a tolerá-la mais um pouco, desde que continue no “caminho certo”. Evidentemente não contam que o movimento de massas possa surpreender e atrapalhar seus planos…

 

UNIDADE DOS TRABALHADORES E DA ESQUERDA SOCIALISTA PARA ENFRENTAR O PAC E AS REFORMAS!

Diante dessa situação, a tarefa prática que se impõe à classe trabalhadora é derrotar esse Plano de Arrocho e Cortes.

É preciso explodir os pilares desse pacote, impedindo o uso indiscriminado e autoritário do FGTS, os cortes nos serviços públicos e o arrocho salarial, os aumentos e prorrogações de impostos, a Reforma da Previdência, a aceitação dos pífios reajustes do salário mínimo, etc. Desmascarar as manobras que estão por trás do discurso da burguesia e do governo Lula (PT), e de seus defensores, como a CUT, a UNE, a UBES,… eis o desafio da agitação e da propaganda socialistas.

Do ponto de vista organizativo e prático, tem enorme importância o Encontro Unificado dos Trabalhadores Contra o PAC e as Reformas, convocado pela CONLUTAS, INTERSINDICAL, Consulta Popular, Pastorais, CONLUTE e outras entidades representativas para o dia 25/03 em São Paulo. Temos que garantir a mais ampla convocação e sua preparação pela base, através de encontros regionais e estaduais.

O momento atual exige maior unidade dos trabalhadores e da esquerda socialista contra os ataques do governo e dos patrões. As divergências com os companheiros da INTERSINDICAL quanto à permanência ou não na CUT, embora importantes, devem ficar em segundo plano, desde que não impeçam as lutas e a independência de ações frente à CUT.

O objetivo central do Encontro Nacional deve ser discutir e aprovar um Calendário de Lutas unificadas contra o PAC e as Reformas e um Programa Alternativo dos Trabalhadores para a situação do país.

Para que esses objetivos sejam alcançados, é fundamental que o Encontro garanta a democracia necessária para a discussão das propostas e, caso não haja consenso, a sua votação, a fim de que as divergências não sejam sufocadas, mas se aprovem os encaminhamentos decididos pela maioria.

É preciso aprender com os erros do I Encontro da Assembléia Popular onde, em nome de um falso consenso, as propostas diferentes foram impedidas de serem discutidas e votadas, o que contribuiu para a posterior desagregação daquela iniciativa.  Também não se podem repetir os erros do I Congresso da CONLUTAS, em que a apresentação das Teses e a discussão a fundo das propostas – uma tradição histórica dos Congressos da classe trabalhadora – foram substituídas por longos Painéis expositivos, o caderno de teses foi fragmentado, e emendas importantes feitas nos grupos não foram levadas ao Plenário.

É preciso uma dinâmica que dê conta da diversidade das idéias e, ao mesmo tempo, garanta a máxima unidade na luta.

SÓ OS TRABALHADORES PODEM APRESENTAR UM PLANO ALTERNATIVO AO CAPITALISMO!
Um plano coerente para enfrentar pela raiz os problemas de independência, desenvolvimento econômico e social do país, deve ter uma lógica completamente oposta ao PAC. Deve priorizar os interesses sociais da maioria e o equilíbrio social e ambiental. Assim, os critérios para o que é prioritário devem ser totalmente invertidos e, logicamente, quem deverá pagar a conta também:

  • Não pagamento da Dívida Pública (interna e externa). Investimento desse dinheiro em um Plano de Obras e Serviços Públicos decidido pelos trabalhadores, com a construção de hospitais, creches, escolas, universidades, transportes públicos, etc;
  • Estatização do sistema financeiro sob controle dos trabalhadores, para por fim à especulação financeira e à agiotagem;
  • Corte imediato da taxa de juros para 6% ao ano. Fim da remessa de capitais a outros países. Monopólio do comércio exterior e controle do câmbio nas mãos do Estado, sob o controle dos trabalhadores;
  • Reestatização das empresas privatizadas sob controle dos trabalhadores e readmissão dos demitidos;
  • Salário mínimo do DIEESE (R$ 1564,52), reposição das perdas salariais para todos os trabalhadores e aposentados;
  • Registro em carteira e direitos trabalhistas a todos os trabalhadores;
  • Fim da terceirização e dos contratos temporários;
  • Prioridade ao transporte coletivo a preço de custo, com passe-livre aos estudantes e desempregados;
  • Redução imediata da jornada de trabalho para 36 horas ou menos sem redução dos salários;
  • Cotas raciais proporcionais aos negros e indígenas nas universidades, concursos públicos e empregos em geral;
  • Reforma Agrária com a extinção do latifúndio e a distribuição das terras aos trabalhadores rurais sem-terra;
  • Expropriação sem indenização das fazendas do agro-negócio e sua colocação sob controle dos trabalhadores;
  • Por um governo socialista dos trabalhadores, apoiado em suas organizações de luta;
  • Pela apropriação coletiva da riqueza social. Por uma sociedade socialista.

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A luta das mulheres

A capacidade e a beleza da mulher não devem ser instrumentos da opressão capitalista!

 Ao abordarmos a situação da mulher trabalhadora na sociedade hoje é importante voltarmos ao passado para relembrarmos nossa luta:

Quando a espécie humana se dispersava da África para as outras partes do mundo, o centro dos grupos era a dupla mãe e criança e, apesar de existir a divisão sexual do trabalho, não existiam relações autoritárias nem escravizadoras entre homens e mulheres.

Com o surgimento da agricultura, do excedente e da apropriação desse excedente (propriedade) o homem passa a querer controlar não apenas a natureza mas também as relações produtivas e sociais e busca submeter a mulher à condição de mera auxiliar para a realização de suas metas.

As mulheres não assistem a todos estes acontecimentos pacificamente. Enfrentam a Inquisição na Idade Média. Promovem revoltas e questionamentos, durante a Revolução Francesa, contra a miséria a que estavam submetidas e muitas são decapitadas ou queimadas por isso. No ano em que o Manifesto Comunista é escrito as lutadoras feministas realizam seu primeiro encontro em que reivindicavam o fim da sociedade de dominação patriarcal.

Tempos depois, em 8 de março de 1857, quando protestavam contra as péssimas condições de trabalho,  os salários de miséria e a redução da jornada de trabalho nas indústrias têxteis de Nova York, 129 operárias, reunidas dentro de uma fábrica, são queimadas por ordem dos patrões.

Durante o século XX a luta não é menos árdua. A necessidade dos capitalistas (entenda-se empresários) de manter suas taxas de lucro juntamente com as guerras pela hegemonia do mercado mundial piora as condições de vida dos trabalhadores. As mulheres são obrigadas, disputando com os homens, a ocupar vários postos de trabalho para derrubar a média salarial de nossa classe.

Diante da capacidade de desenvolvermos nossas potencialidades entramos, cada vez mais, num mercado de trabalho altamente competitivo, machista e injusto além de carregarmos o fardo do trabalho doméstico.

A dupla jornada de trabalho, que nasceu com a sociedade patriarcal, passa a ser explorada ao extremo e se quiséssemos nos organizar teríamos que partir para a tripla jornada.E assim é feito…

Na Revolução Russa são as mulheres que convocam a primeira greve geral que serve de estopim contra a Monarquia. Assumem a consciência socialista e são intransigentes contra a opressão, a servidão doméstica e por uma Rússia livre. Conquistam o direito de decidirem sobre seus corpos, de divórcio, de exigir judicialmente do pai o sustento para os filhos. Reivindicam e organizam restaurantes, lavanderias e creches públicas para terem mais tempo livre do trabalho doméstico. Saem do espaço privado (dentro de casa) para realizar encontros, conferências e congressos internacionais que unificam suas reivindicações e as colocam em condição de atuarem com os demais trabalhadores.

No Brasil, na década de 70, realizam o I Congresso das Operárias Metalúrgicas, em São Bernardo, no ABC paulista, em que constatam as más condições de vida, a falta de creches nos locais de trabalho, a violência dos chefes e a discriminação sexual, ainda hoje em nossos meios.

A conquista de alguns direitos na Constituição Federal – igualdade de direitos trabalhistas, previdenciários e sociais, o fim da proibição da maternidade e o direito a terra – se deu através de muita luta de trabalhadoras em sua tripla jornada  e que, a partir dos sindicatos, se juntaram aos demais trabalhadores.

No entanto, o século XXI chegou trazendo, para nós mulheres, novas formas de imposição, opressão e morte que requerem também outras formas de dizer “não” ao sistema de exploração.

Sabemos que nesse sistema somos levadas, desde muito cedo, a desejar ser mãe, a cultivar o corpo magro e atraente, a ser executora de tarefas chatas e fáceis, a sonhar com o casamento, a se tornar uma excelente e obediente dona-de-casa que somente se sentirá feliz quando encontrar um marido que reconheça suas qualidades e a proteja. A finalidade maior disso tudo é procurar nos desencorajar diante dos menores comportamentos independentes e nos fazer ver a liberdade como algo limitado e monstruoso.

Contrariar as regras ou adaptar-se a elas custa-nos muito: Vemos meninas grávidas cada vez mais novas e assumindo sozinhas os bebês. Mortes por anorexia e bulimia para atender as exigências do mercado da moda e da mídia. Depressão por se sentirem gordas e feias. Aumento do número de abortos, da prostituição velada e da objetificação do corpo da mulher nas propagandas (cervejas, carros, internet). Sem falar do alto número de mulheres que sofrem com a violência doméstica.

Infelizmente alguns sindicatos embarcam nessa cruel onda capitalista e promovem as Semanas da Beleza, em que alguns serviços são oferecidos sem custo em troca da promoção de marcas de cosmético, contribuindo para o estelionato dermatológico (estímulo ao consumo de produtos e cirurgias para elevar a auto-estima). Enquanto isso, cruzam os braços para os verdadeiros ataques à auto-estima da mulher trabalhadora, ou seja, a opressão, a carga elevada de trabalho, os baixos salários, a dupla jornada, a exigência para que realize o trabalho doméstico e o pouco tempo dedicado ao prazer.

Até mesmo a participação das mulheres na CUT (Central Única dos Trabalhadores) foi diminuindo em contraste com o aumento do trabalho feminino. A cota de 30% de mulheres nos órgãos de decisão nunca refletiu a quantidade de mulheres no mercado de trabalho e, mesmo, se mantém.

A tal Secretaria de Mulheres, que no início era coordenada por homens, está totalmente submetida e trabalhando para implementar as políticas do governo Lula para as mulheres, ou seja, pôr fim à licença maternidade e aos direitos trabalhistas com a próxima contra-reforma trabalhista.

As mulheres que a coordenam calaram-se diante da Reforma da Previdência (que atingiu diretamente a classe que vende a força de trabalho, aumentando o tempo de contribuição e extinguindo a aposentadoria por idade) e da investida do governo contra as domésticas, há pouco tempo. Estão há muitos anos fora das fábricas, já fazem parte da burocracia sindical e implementam a lógica que distancia cada vez mais as mulheres da participação política e sindical.

A maioria das organizações que era de esquerda no período da Ditadura Militar sucumbiu. Hoje quase todas estão no poder sob fajutas denominações de socialistas, de comunistas, de verde, de trabalhadores. Aproveitaram-se da queda da burocracia stalinista do Leste Europeu para confundir a classe trabalhadora contra o socialismo, único sistema capaz de colocar a mulher, e conseqüentemente a humanidade, em uma situação superior.

Somente agora, no novo milênio, as trabalhadoras juntamente com os demais trabalhadores iniciam uma tímida reorganização através de novas coordenações de lutas (Conlutas/Intersindical), mas que ainda não incorporam as desempregadas ou subempregadas.

Essas coordenações devem estar, também, a serviço da luta das jovens trabalhadoras estudantes, que ingressamos agora no mercado de trabalho e que novamente enfrentamos os problemas das más condições de trabalho, baixos salários, jornadas de trabalho irregulares, falta de direitos trabalhistas com pomposos nomes de: estagiárias, operadoras de telemarketing, teleoperadoras, etc.

Continuar a luta iniciada por nossas ancestrais não é fácil. A luta, como mulher trabalhadora, pela sobrevivência, independência intelectual e financeira, melhores condições de trabalho e respeito aos nossos valores é cada vez mais necessária. Precisamos transformar o 08 de Março – Dia Internacional de Luta da Mulher em mais um dia de luta de todos os oprimidos, contra todas as formas de exploração capitalista e por uma sociedade justa.

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Por um movimento negro anticapitalista, independente dos partidos e antigovernista

O Brasil tem uma dívida histórica com os descendentes de africanos escravizados e que ainda não foi saldada. De uma hora para outra seis milhões de seres humanos, seqüestrados de sua terra de forma cruel e selvagem, passaram de mercadoria valiosa à terrível fardo. Foram jogados na rua da amargura por uma lei que pôs fim à escravidão legal, mas, não indenizou as vítimas da escravidão, e negou a esse povo o direito ao trabalho remunerado, à terra e à inclusão social. Desde que o primeiro africano escravizado aqui pisou, deu-se início a um processo de luta por sua liberdade, através dos quilombos, do suicídio coletivo e do aborto. Essa luta se estende até os dias de hoje, mesmo que tenha mudado de forma. Zumbi, grande líder revolucionário, não questionou apenas a escravidão, mas também o sistema de governo e da produção social da vida, pois a forma de convívio no quilombo era muito diferente da vida na colônia.

Hoje as ONG’s, mantidas e reguladas pelo governo, servem para levar a política oficial para dentro do movimento negro, pulverizando e interferindo no mesmo. Dando verbas e subvenções para projetos isolados, transformam o movimento em dois blocos: os antigovernistas e os governistas. Dentro destes ainda temos os de direita e os que pertencem à esquerda reformista que se mostram incapazes de solucionar os problemas da população, e com nenhum interesse em resolver os problemas dos negros, defendendo a causa negra em seus discursos nos dias de festa apenas com o objetivo de manter a divisão do movimento. Esta pulverização foi estrategicamente planejada para facilitar a ação da classe dominante e do governo que a representa, seja de direita ou da esquerda reformista. Ao conceder algumas migalhas às nossas organizações, governo e empresários encontram defensores para reforçar o mito da democracia racial.Afirmam que o governo não pode resolver em oito anos o que não foi resolvido em quinhentos, e que a Ford não é racista porque a Fundação Ford dá verbas para projetos de combate ao racismo. Entretanto, nesse governo há grandes dificuldades na titularização das terras de quilombo, não se avança nas cotas proporcionais no mercado de trabalho, avança-se pouco nas cotas universitárias, e ainda diz “o principal empecilho para o desenvolvimento do país são os ambientalistas e os quilombolas”.

Estamos num momento difícil para o conjunto da classe explorada, pois está sob novo ataque do governo petista de Lula, através do PAC, com o aval da direita e das centrais sindicais. Lula vai  investir parte considerável do FGTS em  obras que beneficiarão apenas a classe exploradora, sem garantia aos trabalhadores. A burguesia será beneficiada com portos, aeroportos e estradas para exportar a produção, sem obrigações de contrapartida financeira ou de criação de empregos por parte da burguesia. Não está previsto no PAC a construção de escolas, universidades, hospitais, verbas para a reforma agrária ou para ações afirmativas.

Zumbi, questionando escravidão, sistema de governo e produção social da vida, nos deu um exemplo a ser seguido. Isso mostra que o movimento negro deve abster-se de acordos com as elites e o governo que as representa, pois utilizaram o escravismo para impulsionar o capitalismo. Sendo assim, é o capitalismo e toda sua base de sustentação nosso principal inimigo. Se não formos capazes de compreender isso, não seremos capazes de derrotar nosso principal inimigo.

É neste contexto que diversas organizações negras a nível nacional estão instalando o Congresso Nacional de Negros e Negras, com objetivo de construir um Projeto Político de nação do Povo Negro para o Brasil, a ser instalado em Belo Horizonte, MG, e que terá a duração de um ano. Esse Congresso será vitorioso e dará um grande salto de qualidade se for capaz de lançar as bases necessárias para a construção de uma Organização Política Revolucionária, centralizada pela base em organismos de discussão, e que seja independente do governo e dos patrões, tendo como objetivo central a destruição do sistema capitalista. Sabemos que não será uma tarefa fácil, mas não existe um meio termo. Isso não se constrói da noite para o dia, como a liberdade não veio sem uma luta sem tréguas.

Devemos construir a unidade em torno de um programa que prepare a militância negra para o combate, através da formação e ação revolucionárias. Sendo assim, o Congresso terá, se respeitada a democracia, legitimidade para coordenar campanhas nacionais que possam mobilizar nosso povo. Além das campanhas “Reaja ou será Morto, Reaja ou será Morta” e “não gaste seu dinheiro em lojas que não contratam negros”, podemos propor a “Lei de Responsabilidade Racial”, em contraposição à lei de responsabilidade fiscal cujo principal objetivo era barrar investimentos sociais nas áreas pobres para garantir o lucro dos empresários com o pagamento da dívida pública. Essa nossa lei colocará atrás das grades o governante que não cumprir a lei de proporcionalidade. Em troca da adesão da parte branca da classe explorada, seria lançado junto o movimento por uma “Lei de Responsabilidade Social”, para prender e tornar inelegível o governante que priorizar o pagamento da dívida às custas do desemprego, da fome e da miséria de nosso povo, preto ou branco.

Se investirmos nosso precioso tempo num congresso para construir um projeto político que priorize acordos a portas fechadas em detrimento da luta organizada de nosso povo, perderemos tempo e desperdiçaremos uma oportunidade ímpar que talvez não tenhamos tão cedo, visto que o último Congresso Nacional de Negros se deu há mais de 50 anos.

 

CHAMADO ÀS ORGANIZAÇÕES REVOLUCIONÁRIAS

Diversas organizações revolucionárias se colocam solidárias a luta negra, e está dada a oportunidade de mostrar essa solidariedade. O movimento negro não dispõe de recursos para produzir todos os materiais necessários para a convocação do Congresso. Para construirmos a independência que necessitamos, precisamos de recursos próprios que ainda não temos. Por isso, é interessante que as organizações solidárias nos ajudem a construir um congresso que garanta a participação do povo “pé de barro” no congresso. Sua doação necessariamente não precisa ser em dinheiro, que é muito bem vindo. Mas, na confecção de materiais, principalmente das teses para discussão. Acreditamos que para muitos de nossos irmãos negros a maior parte do conteúdo das teses será novidade. Além disso, as organizações poderão disponibilizar espaço físico para a realização das plenárias e também realizar a discussão em suas respectivas bases, seja sindicato, movimento social ou coletivos de discussões.

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Buraco do Metrô de São Paulo e as PPPs

Em janeiro, o Brasil viu estarrecido o desastre que culminou com 7 vítimas nas obras do metrô de São Paulo. Todas elas, trabalhadores que passavam pelo local ou trabalhavam na obra. Este fato não é isolado no presente empreendimento. Mais trabalhadores já perderam a vida em acidentes anteriores em mais duas futuras estações, mas não tiveram repercussão alguma pela mídia, pois, até então, não havia prejuízos para os burgueses assassinos. Este teve repercussão, pois, além de vitimar trabalhadores, abriu-se uma cratera de 38 metros de diâmetro por 80 de profundidade, que determinou a interdição de um corredor expressivo da cidade, que é a Marginal Pinheiros, o que impossibilitou a ocultação pelos meios de comunicação.

Com tantas ocorrências e vidas ceifadas, surgiram explicações de diversos matizes, sendo que algumas beiram a insanidade, como acusar a ocorrência de chuvas nesta época, como se a natureza fosse culpada, ou não fosse previsível a ocorrência de elevados índices pluviométricos nesta época. Por mais notoriedade que a imprensa tenha dado ao fato, nenhum meio de comunicação deu-lhe o tratamento devido, apontando que o problema central da obra (e de TODAS que estão por vir) é o modelo de contratação para execução da obra, que são as Parcerias Público-Privadas (PPP).

A obra do metrô em questão é o primeiro grande empreendimento de infra-estrutura do país sob a égide da legislação das PPPs, instituída pelo governo Lula, por meio da promulgação da lei 11079/04, sob a justificativa de que o Estado não tem condições de, sozinho, dar conta da demanda de infra-estrutura que o país necessita para crescer. Ocorre que os interesses dos trabalhadores não são os mesmos interesses dos capitalistas, e estes farão de tudo para garantir os seus lucros.

 

DESASTRE ANUNCIADO

Em 2006, os metroviários fizeram paralisações, com a finalidade de fazer o governo paulista recuar com o modelo de contratação por meio de PPP, sob a alegação de que seria uma forma fraudulenta de privatizar o metrô, e que por isso a iniciativa privada colocaria o interesse econômico acima dos interesses da população. A imprensa burguesa caiu de pau em cima dos metroviários e o governo paulista cumpriu o seu papel de proteger os lucros, acionando o Ministério Público para sufocar o movimento.

A preocupação na contratação tem todo o sentido, pois a legislação da PPP, na prática, impede que a Administração Pública seja a gestora do empreendimento, além de colocar nas mãos dos próprios executores da obra o poder de fiscalização. É o que determina o art. 9º caput,  combinado com o § 4ºda lei das PPPs. Observem:

 

art. 9º – Antes da celebração do contrato, deverá ser constituída sociedade de propósito específico, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria.

(…)

§4º Fica vedado à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante das sociedades de que trata esse Capítulo.(Grifos do autor)

Ora, se o poder público não pode gerir e nem ter o controle do capital votante, a lei dá carta branca para que a burguesia faça como quiser a obra. É notório que há indícios de problemas de qualidade e de quantidade de materiais empregados, colocando em risco a vida de toda a população. Tudo isso com a finalidade de maximizar os lucros. A maior prova disso é que não houve nenhum alarme que orientasse os trabalhadores e a população das imediações para abandonarem o local pela movimentação do solo. Outro exemplo é a quantidade de concreto insuficiente para dar sustentação às paredes do túnel, provocando então o desastre.

O número de vítimas só não foi maior porque os próprios operários do local perceberam o início do deslizamento de terra. Uns conseguiram sair a tempo, outros foram simplesmente expelidos pelo deslocamento de ar provocado pelo desabamento de terra.

 

OS EMPREITEIROS E O PT: TUDO A VER

Não existe um Estado imparcial, ou em que todos são iguais perante a lei. É uma discussão falsa, pois todo poder tem o seu caráter de classe. Com o governo do PT não seria diferente. E o fato do Lula ser oriundo da classe operária, não quer dizer que o poder, hoje, está nas mãos dos trabalhadores. O Lula e o PT estão a serviço da burguesia e movimentam as estruturas do Estado para tal fim. Basta ver as doações de campanha para confirmar a tese.

Foi publicado na Folha de São Paulo do dia 30 de janeiro de 2007 os financiadores das campanhas de Aldo Rebelo (PC do B-SP) e de Arlindo Chinaglia (PT-SP) para a Câmara dos Deputados. As construtoras Odebrech, Camargo Correa e OAS foram os maiores doadores  de ambos candidatos. Não é à toa que o PT  aprovou as PPPs.

 

ABAIXO AS PPPs!

A Parceria Público-Privada é mais uma medida do governo neoliberal do PT para encher os cofres dos capitalistas empreiteiros. Seguindo a cartilha tucana, o governo Lula é um vetor da aplicação da política da burguesia e quem paga a conta somos nós, os trabalhadores. Diferentemente do PSDB, que vendeu quase todas as estatais, o PT quer tirar o dever do Estado de prover a infra-estrutura, fazendo com que a Administração fique com os riscos (que nós suportamos) do empreendimento, para garantir os lucros dos empreiteiros.

Neste sentido, temos que nos mobilizar contra as PPPs e apoiar a luta dos metroviários de São Paulo para evitar a privatização do metrô. Pela revogação do contrato de concessão da Linha 4!

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Aquecimento global, culpa do homem?

No rastro da conferência da ONU sobre mudanças climáticas, nos últimos dias a mídia em suas diversas versões (a Rede Globo, por exemplo, apresentou no JN reportagem de uma semana) tem insistentemente falado do aquecimento global, desequilíbrio ambiental, queimadas,  efeito estufa, etc. Nada de novo porque a destruição é visível a todos. O novo nessas imagens chocantes é o diagnóstico proferido pelos “acríticos” repórteres e pela declaração da ONU de que a culpa por tamanha destruição é o próprio homem e de que tal capacidade destrutiva é inerente ao próprio homem. Mas de que homem estão falando? Do José? Da Maria? Daqueles que todos os dias saem para vender a única mercadoria (força de trabalho) que têm? Ou daqueles que controlam os meios de produção e, portanto, determinam o que e como produzir sem levar em consideração a destruição das condições ambientais, pois a única coisa que lhes interessa é o lucro?

A afirmação desses repórteres na aparência é verdadeira, mas na realidade ela é completamente insuficiente para explicar a realidade e a causa de tamanha destruição do planeta e de seus recursos naturais. Não se trata de apresentar um relatório do que ocorre no planeta (tanto porque é visível como a mídia tem se encarregado disso), mas compreender por que, sob o domínio do capital, a destruição da natureza não só recuará como será cada vez mais intensa.

O foco da mídia burguesa tem objetivos claros, um dos quais é retirar da produção capitalista a responsabilidade por tais danos. Logo, nessa discussão torna-se urgente abrir uma batalha ideológica contra esse enfoque, porque se não identificamos as reais causas também não conseguiremos apresentar saídas que solucionem de fato o problema

Partimos do pressuposto de que analisamos os homens e suas ações não como indivíduos isolados, mas como seres sociais que cumprem determinado papel na produção material da vida e com a consciência determinada pelas relações sociais que cercam essa produção, ou seja, o homem é um ser social que em relação com a natureza produz tudo aquilo que é necessário para sua existência. É importante compreender essa qualidade eminentemente humana, pois é ela a responsável, pelo seu trabalho, na transformação do mundo (ou da natureza).

Assim é perfeitamente claro que a natureza é fundamental, na verdade uma condição, para a produção das necessidades materiais dos humanos. O homem para produzir precisa relacionar-se com ela. Essa relação é determinada pelo nível do desenvolvimento das técnicas e instrumentos de produção acumulados pela humanidade. O determinante passa a ser, portanto, as relações de produção que foram construídas nesse processo produtivo e que será a base real ou material das relações políticas, ideológicas, etc.

Mas nem toda produção ou relação do homem com a natureza é destrutiva. A apropriação privada daquilo que é produzido coletivamente (socialmente) obriga que o homem estabeleça relações estranhas à sua condição de produtor, alienando-se (para alguns, estranhamento) do produto do trabalho, do próprio homem e da natureza. A alienação faz com que o homem não exerça um domínio consciente, mas sim destrutivo sobre a natureza. Dessa forma, a alienação opõe os indivíduos e a coletividade de maneira que as ações não correspondem às necessidades da humanidade.

Ainda resta uma questão a esclarecer que é o fato de que é pelo trabalho humano que a natureza é destruída. È uma contradição, mas tem explicação. Na sociedade burguesa, portanto, numa sociedade em que as relações de produção se desenvolvem sob hegemonia do capital, o trabalho aparece para todos os homens de forma negativada, ou seja, alienada, processo pelo qual o trabalhador se afasta das esferas da decisão dos atos relacionados a sua atividade.

Essa relação é que vai determinar a sua consciência. Assim a “visão” de mundo e a ação dos indivíduos serão formadas conforme a posição que ocupa na relação de produção. Se o indivíduo – social – é dono dos meios de produção, sua visão de mundo e sua prática vão estar marcadas pelas necessidades que essa condição impõe; se, do lado oposto, for um trabalhador, a sua “visão mundana” vai corresponder a essa situação, bem como sua ação. Ocorre que essa visão de mundo dos indivíduos está, dialeticamente, relacionada com uma “consciência coletiva” moldada pelo domínio da classe que se apropria da riqueza produzida socialmente, como forma de justificar o seu poder econômico e político.

Como as idéias da sociedade são as mesmas da classe dominante, a burguesia se aproveita para apresentar, nesse caso, a destruição da natureza, o particular como universal. Quando se fala de homem, ser humano, etc. e de sua prática destrutiva, fala-se de um homem histórico, social, forjado conforme as relações de produção. Mas a burguesia e seus ideólogos apresentam esse “tipo humano” como expressão universal humana. O fato de que o homem no capitalismo destrua a natureza não significa que em qualquer época histórica ocorrerá essa destruição.

A partir dessas conclusões eu pergunto àqueles (e ao repórter) que dizem que o mundo está acabando por culpa do homem: de qual homem está falando? O trabalhador, que é obrigado a vender a sua força de trabalho e disponibilizá-la aos patrões para qualquer coisa, ou o burguês, que vai direcionar a produção para aquilo que dá mais lucro (mesmo que destrua rios, mares, florestas, etc.)?

A luta ideológica contra o capital exige que rechacemos tanto a idéia da destruição dos recursos naturais pela “maldade natural” dos indivíduos como a responsabilização generalizada dos homens. È o capitalismo e sua forma destrutiva de produzir que são os responsáveis pelos problemas ambientais do mundo. Essa questão é importante ser destacada porque, se é o trabalhador, com as motos-serras e outros instrumentos, que realiza o ato, ele o faz unicamente por conta de que ao dispor sua força de trabalho ao capitalista é este quem vai determinar onde e como aplicar aquela força. A atividade humana não se coloca de maneira independente com relação à sociedade e, fundamentalmente, é uma atividade que deve ser localizada historicamente, a partir de homens com “visão de mundo” burguesa, determinada, repito, pelo papel que ocupa nas relações do modo de produção. Eis Marx: “é necessário explicar esta consciência pelas contradições da vida material, pelo conflito existente entre as forças produtivas sociais e as relações de produção”.

Para colocar as coisas no seu devido lugar: A produção capitalista é a responsável pela destruição a que o planeta está submetido. O capital controla todos os processos produtivos – destrutivos ou não – e os homens são apenas instrumentos.

 

CONSUMISMO E NECESSIDADES ARTIFICIAIS: IDEOLOGIA À SERVIÇO DA PRODUÇÃO DESTRUTIVA

A crise estrutural pela qual passa o capital o obriga a desenvolver mecanismos que empurrem as contradições provocadas pela crise para o futuro. Entre esses mecanismos –econômicos e ideológicos –, para citar alguns, está a taxa de uso decrescente das mercadorias, que é a fabricação de produtos com uma vida útil menor (Meszáros), a cultura do consumismo e a criação de necessidades artificiais para as pessoas. Principalmente essas duas últimas medidas são acompanhadas de uma forte campanha publicitária.

Para que haja produção – espaço privilegiado para a realização da mais-valia – é necessário haver o consumo. Ocorre que o desenvolvimento tecnológico possibilitou salto na produtividade, ou seja, produz-se muito e, se há constantemente uma alta produção, logo chegará a um limite porque não haverá mais ninguém para consumir. Como o capital resolve essa contradição? Um: produz-se bens com duração mais curta (você já deve ter ouvido falar que hoje as coisas duram menos) para que haja troca desses bens; dois: quando só essa medida não é suficiente passa a criar necessidades artificiais.

O celular é um bom exemplo. Estima-se que já existem mais de 90 milhões de aparelhos no país. Massificado há 10 anos aproximadamente, foi a cada ano ou menos ganhando “novas” funções, como filmar, tirar foto, mapa para controlar filhos e tantas outras funções, ou seja, para que as pessoas troquem de aparelho (consumam) os fabricantes “inventam” todas essas coisas. Para tudo isso se realizar vem a propaganda relacionando esses produtos à alegria, à jovialidade, à elegância, como se ao adquirir aquele produto você se transformasse. Pode-se citar outras mercadorias, como o carro, por exemplo.

Quanta matéria-prima (recursos naturais) gasta-se para produzir esses produtos que, sob uma administração consciente, não seriam necessários? E o que fazer com o lixo que é altamente danoso para a natureza? Pense em quantos produtos desnecessários há à nossa volta e quanto dano eles causam à natureza. Então a causa de tanta poluição e desequilíbrio ambiental é a produção massiva voltada para o lucro. Para o capital não interessa se destrói ou não, interessa se há lucro. A vida não tem importância para o capital, a menos que seja fonte de lucro (como tráfico de órgãos humanos).

Esses exemplos são provas de que o capital em cada ato traz consigo mais destruição. Imagine se metade da população da China e outra metade da Índia tivessem um carro, o que seria do planeta? Eis uma contradição fundamental para o capital e para a humanidade.

MUITO BLÁ, BLÁ E NADA DE PRÁTICO

Para a burguesia estar se preocupando é porque a destruição está em um nível acima do crítico. O problema é que nós não temos acesso a todas as informações, uma vez que a burguesia nunca expõe os problemas na sua totalidade, liberando apenas aquilo que não tem mais como esconder. Mesmo do ponto de vista deles é necessário que se faça algo porque o que está em jogo não é só a nossa existência, mas também a deles.

No fim de janeiro e início de fevereiro realizou-se a conferência da ONU que discutiu as mudanças do clima no planeta. Os relatórios falam de subida dos oceanos, buraco de ozônio, culpa o homem por esses problemas, etc. Não vimos responsabilização da produção capitalista (nem temos essa ilusão) e muito menos propostas concretas de solução. O motivo é óbvio: por ser uma organização à serviço do capital imperialista ela jamais atacará seu amo.

As tímidas e ineficientes medidas – como o protocolo de Kyoto, que restringe a emissão de CO2 em 5%, quando seria necessário pelo menos 60% – não saem do papel também por conta da competição e dos interesses interimperialistas. Substituir a produção de energia baseada em combustíveis fósseis por outros tipos de energia significaria a falência de grandes monopólios e Estados que dependem desse tipo de negócio. Esse é só um de vários exemplos, mas poderíamos citar o caso das indústrias de papel que destroem os lençóis freáticos e as florestas com as imensas plantações de eucaliptos, ou ainda a monocultura na produção agrícola que devasta o ecossistema.

 

SÓ OS TRABALHADORES E A PRODUÇÃO SOCIALISTA PODEM SALVAR O MUNDO

Para se contrapor e resistir ao processo destrutivo para o qual seu trabalho foi disponibilizado, é necessário o desenvolvimento de uma consciência anticapitalista e socialista que seja capaz de reorganizar a forma com que os homens produzem suas necessidades, com um domínio consciente sobre as forças da natureza, superando a oposição do homem à natureza que o capitalismo impôs.

Uma produção sob controle dos trabalhadores vai decidir o que, como e para que produzir com base nas necessidades da coletividade. Se for mais importante produzir veículos com energias alternativas, menos poluente, e voltados para o transporte coletivo, é isso que se vai produzir. Se a produção de celulares significa uma ameaça para o meio ambiente, ele será substituído por outro sistema de comunicação. A apropriação e domínio da natureza de maneira consciente vão direcionar a produção para as necessidades vitais da sociedade. Enquanto houver risco de fome, produzir bens de primeira necessidade será a prioridade. Qualquer produção será considerada como uma totalidade de benefícios e males que pode provocar para o conjunto da sociedade: se pode poluir um rio ou não, se pode provocar um descontrole ambiental ou não.

Mas uma sociedade como essa é a negação do capital e de sua produção destrutiva. É uma sociedade de máxima realização humana, de perfeita sintonia entre homem e natureza e de organização consciente de todo o processo de produção. Esse conjunto de relações sociais vai criar as condições necessárias para uma nova consciência humana, pois não haverá mais conflito entre as forças de produção e as relações de produção.

O desenvolvimento dessa nova consciência torna-se mais urgente do que nunca, pois o mundo sob a hegemonia do capital está em perigo e em direção à destruição de todas as formas de vida. Por isso reafirmamos que a disjuntiva “socialismo ou barbárie” é mais atual do que nunca: ou o socialismo ou o fim do gênero humano. Venha lutar pelo socialismo e por uma nova sociedade, que podem se realizar somente por um processo revolucionário em que os trabalhadores construam seus organismos de poder

Mas também não podemos esperar o socialismo, pois há o risco de não dar mais tempo de salvar a natureza. É necessário um processo mundial de mobilização para exigir dos governos medidas concretas para conter a destruição do planeta (como a redução de 60% nas emissões de CO). Como medida educativa para os trabalhadores, os sindicatos (e principalmente a CONLUTAS) devem começar a incluir nas pautas de reivindicações propostas de controle do que produzir e como produzir, como a proibição de despejar resíduos nos rios, exigência de severas punições às empresas que poluem e responsabilidades de recolher as embalagens e produtos que prejudiquem o meio ambiente. E caso não cumpram, as empresas devem ser estatizadas e colocadas sob controle dos trabalhadores.

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Chavez e o Socialismo

Daniel M. Delfino

Ao iniciar seu segundo mandato como presidente da Venezuela, em janeiro de 2007, o coronel Hugo Chávez anunciou um pacote de medidas que segundo ele estariam lançando seu país no rumo do “socialismo do século XXI”.

Entre essas medidas, estariam a nacionalização de empresas de setores estratégicos, como os de telefonia e energia elétrica (inclusive algumas de propriedade da estadunidense AES, dona da Eletropaulo no Brasil), o fim de algumas parcerias da estatal venezuelana de petróleo PDVSA com grupos estrangeiros, a revogação da autonomia do Banco Central, a cassação da concessão de uma das emissoras de TV que apoiaram ativamente o golpe de 2002, a mudança da estrutura administrativa, com a substituição das prefeituras por conselhos locais, e a troca do próprio nome oficial do país para “República Socialista da Venezuela”. Esse pacote “socialista” de Chávez foi lançado por iniciativa presidencial, por fora do Congresso Nacional venezuelano.

Imediatamente, desencadeou-se a reação da imprensa burguesa em todo o mundo, inclusive no Brasil. O caso foi tratado como escândalo nas manchetes de jornal e nos editoriais raivosos dos bem-pensantes guardiões da ordem. O líder venezuelano foi acusado de dinossauro, retrógrado, tirano, ditador, inimigo da democracia, etc., além de ser lembrado como amigo do “louco” e “terrorista” presidente do Irã Ahmadinejad, amigo de Fidel Castro, etc.

Os jornalistas da grande imprensa, como bons mercenários a serviço do capital, estão sempre atentos e vigilantes, prontos para condenar ao fogo do inferno qualquer ato que desagrade minimamente o mercado. Os lacaios letrados da burguesia exercem uma marcação cerrada sobre quaisquer iniciativas de soberania dos povos, por mais insignificantes que sejam, condenando-as de saída e impedindo que sejam entendidas e debatidas. Por meio da interdição do debate, estabelece-se um monopólio da opinião, através do qual a discussão sobre qualquer questão se transforma em um monólogo no qual apenas os detentores do poder podem se expressar. Uma vez que o pensamento único neoliberal não pode jamais ser contestado, segue-se automaticamente a ladainha de que o consenso de Washington deve ser obedecido à risca, o capitalismo é o único horizonte possível de liberdade e felicidade humana, etc. Toda e qualquer possibilidade de alternativa deve ser descartada em nome da obediência aos interesses do capital.

Idéias como socialismo, nacionalismo, soberania, latino-americanismo, precisam ser banidas do discurso, como se se tratasse de horrendos palavrões, blasfêmias e sacrilégios. A denúncia do imperialismo, da dominação estrangeira, da espoliação dos países, do massacre sobre os povos, é tratada com desdém, como se fosse uma “questão superada”, agora que todos supostamente usufruem as “benesses” da “globalização”. Nenhum país pode jamais ousar buscar um caminho próprio para tentar resolver os problemas de sua população.

Evidentemente, existe um grande exagero de ambas as partes, que impede a compreensão exata do que está se passando. Nem o pacote de Chávez é de fato socialista, e nem a mídia burguesa tem o direito de condená-lo. A campanha da mídia contra Chávez busca isolá-lo como fonte de uma espécie de ameaça “populista” e “antidemocrática” que estaria contaminando a América Latina, colocando em cheque a “estabilidade” da economia de mercado, cujo funcionamento “harmonioso” é a única garantia de “paz e prosperidade”.

O exemplo de Chávez está sendo seguido por Evo Morales na Bolívia, e já foram anunciados passos semelhantes por parte de Rafael Correa no Equador (entre esses passos o não pagamento dos juros da dívida externa) e Daniel Ortega na Nicarágua. Além disso, as parcerias do governo venezuelano com Cuba têm servido para revitalizar o regime de Fidel. Como se tudo isso não bastasse, o líder venezuelano estaria exercendo uma discreta pressão sobre o restante dos governos ditos “de esquerda” no continente, como o de Lula no Brasil, Kirchner na Argentina (que acaba de admitir a falência do modelo de previdência privada), Tabaré Vasquez no Uruguai e Michele Bachelet no Chile. Esses governantes de perfil mais “moderado”, que na verdade são alunos aplicados do modelo neoliberal, sofrem algum constrangimento na comparação com o “radical” Chavez. O exemplo venezuelano mostra que há outros caminhos para os países latino-americanos, e essa demonstração é perigosa porque invalida na prática a tese de que “não há alternativa” à política econômica ortodoxa aplicada em tais países.

Desenvolve-se uma espécie de disputa subterrânea entre essas duas vertentes da “esquerda” governante latino-americana. Do ponto de vista do capital, é absolutamente crucial que os governantes amigáveis ao mercado, como Lula e os demais, sejam os vencedores da disputa. Lula deve aparecer como a única versão de “esquerda” possível. Para isso, Chávez deve ser devidamente demonizado, suas idéias devem aparecer como absurdas, seus planos inviáveis, sua revolução bolivariana uma aventura irresponsável.

O fato de que o conjunto de medidas tenha sido anunciado diretamente pelo Presidente e não pelo Congresso é apresentado como evidência de um suposto pendor ditatorial de Chávez. Convenientemente, a hipocrisia burguesa esquece que, desde sua primeira eleição em 1998, Chávez já venceu de maneira esmagadora mais de meia dúzia de votações, entre eleições, plebiscitos e referendos. Além disso, foi vítima de um golpe de Estado em 2002, tendo sido reconduzido ao poder pela mobilização maciça das massas populares. Mais de um milhão de venezuelanos cercou o palácio presidencial, exigindo o retorno do presidente democraticamente eleito. Depois de reempossado, Chavez não reprimiu os golpistas, e somente agora em 2007 cassou a concessão de uma única das várias emissoras de TV que construíram o golpe. Ainda assim, acusam-no de antidemocrático.

A quase unanimidade que Chávez conseguiu em seu país está entalada na garganta da burguesia latino-americana, que não se cansa de buscar pretextos os mais absurdos para deslegitimá-lo. No que se refere ao caso do pacote “socialista” em questão, o Congresso venezuelano é composto exclusivamente por parlamentares de partidos chavistas. E foram os próprios partidos rivais que desistiram de participar das últimas eleições legislativas. Nesse caso, o fato de o conjunto de medidas “socialistas” de 2007 ter sido apresentado diretamente pelo presidente não faz a menor diferença. A votação no Congresso não passa de uma simples formalidade, uma espécie de debate interno ao conjunto dos partidos chavistas.

Entretanto, apesar de toda a popularidade de Chávez em seu país e da repercussão internacional de suas ações, o seu movimento está longe de merecer ser chamado de socialista. As medidas anunciadas no início deste ano não são sequer anticapitalistas. Permanecem nos limites do velho nacionalismo burguês. No mesmo dia em que as medidas “revolucionárias” foram anunciadas, as bolsas de valores se recuperaram do susto: haverá indenização para os acionistas das empresas nacionalizadas. Ou seja, Chávez não está desapropriando o imperialismo. Nacionalização com indenização é uma medida que não foge à estrita legalidade capitalista, já que respeita a instituição fundamental da propriedade privada.

O nacionalismo burguês ultra-tardio de Chávez constitui um fenômeno peculiar do capitalismo periférico no contexto histórico da crise estrutural do sistema. Na atual situação de crise, determinada pela queda das taxas de lucro, aumenta a voracidade do capital e diminui a sua capacidade de oferecer melhorias às condições de vida das massas. As melhorias precisam ser arrancadas com muita luta e ao custo de medidas nacionalistas como as de Chávez. E para além das simples melhorias, qualquer solução definitiva exige procedimentos realmente revolucionários, mudanças muito mais profundas do que aquelas anunciadas na retórica chavista. Entretanto, os agentes políticos do capital, na forma dos governos imperialistas, reprimem tais atitudes como atos de banditismo.

O caso se torna especialmente mais grave quando se trata de um país que, como a Venezuela, possui reservas de petróleo que a colocam como uma das maiores produtoras mundiais dessa preciosa mercadoria. A economia atual ainda é maciçamente dependente de petróleo. Nada está sendo feito, nem mesmo a médio ou longo prazo, para substituir a matriz energética em vigor por fontes de tipo renovável. Isso faz com que se desenhe um cenário de disputa feroz entre as potências imperialistas pelas reservas restantes. Mantido o atual ritmo de consumo (o qual está em constante expansão devido à recente colonização capitalista da China e da Índia), as reservas atualmente existentes devem durar por mais uma ou duas décadas. A inevitável aproximação do esgotamento das reservas naturalmente finitas e a expansão desenfreada do consumo fazem com que os preços do petróleo experimentem uma tendência irreversível de alta.

A alta do preço do petróleo permite a Chávez melhorar a assistência social ao povo venezuelano. O centro da luta nacionalista contra a burguesia venezuelana consiste justamente na disputa pelo controle da PDVSA. A estatal era tratada como patrimônio privado pelas famílias aristocráticas do país. Chávez retomou o controle governamental sobre a empresa e passou a usar parte da renda para financiar os programas sociais. É essa inversão de prioridades do Estado que a burguesia venezuelana não perdoa. Programas de alfabetização e de assistência médica são oferecidos a uma população pauperizada que jamais tivera um tratamento minimamente humano da parte do Estado burguês oligárquico, tanto na Venezuela como no restante da América Latina. Os programas sociais sustentados com a renda petroleira tornam Chávez eleitoralmente imbatível, especialmente entre os pobres.

Entretanto, isso não é suficiente para romper o círculo de miséria da população. A Venezuela não possui outros tipos de indústrias importantes além do petróleo. A burguesia venezuelana não possui iniciativa econômica própria e sobrevive como uma camada parasitária que se alimenta da corrupção da PDVSA e do Estado para sustentar circuitos de consumo de luxo. Está mais voltada para Miami do que para o próprio país. A população pobre vive na informalidade econômica. No interior do país, camponeses são mortos por jagunços a mando dos grileiros em disputas pela terra. Ao mesmo tempo, a capital Caracas, cercada por um cinturão de favelas, continua sendo uma das cidades mais violentas do continente.

Parte da população já percebeu que as medidas assistenciais são insuficientes para romper com a situação histórica de dominação e miséria. Em muitos setores os trabalhadores venezuelanos já se mobilizam de forma independente do chavismo. Na greve patronal de 2003, os operários da PDVSA assumiram diretamente o controle da produção em várias instalações. Entretanto, cessada a greve, Chávez devolveu o poder aos mesmos gerentes sabotadores e corruptos expulsos pelos trabalhadores. Essa busca de atitudes conciliadoras revela a limitação de Chávez, a qual se funda em sua origem social. Como militar de origem, o dirigente venezuelano é incapaz de romper com os limites de sua classe. O tipo de liderança chavista é incapaz de desenvolver as tarefas de uma transformação realmente socialista, porque não rompe com o respeito burguês pela propriedade.

Os líderes históricos do nacionalismo burguês latino-americano, como Perón na Argentina, João Goulart no Brasil e Allende no Chile, no momento dos enfrentamentos decisivos, em que foram confrontados com a reação burguesa conservadora na forma de golpes militares e intervenções imperialistas, recusaram-se a cruzar a fronteira de classe e a desenvolver formas de poder socialistas capazes de resistir aos golpes. Recusaram-se a armar as massas, dissolver os órgãos repressivos do Estado (Forças armadas, polícia, judiciário, etc.) e reconhecer os organismos de poder popular em gestação. Dada a conduta conciliadora de Chávez diante do golpe e de outros enfrentamentos, nada leva a crer que sua postura vá ser diferente.

Não existe via nacionalista burguesa para o socialismo; o nacionalismo burguês, conforme ensina a História, conduz à reação burguesa e ao golpe fascista. A sua fraqueza congênita o impede de enfrentar a burguesia de modo conseqüente. A única via para o socialismo é a organização política independente do proletariado e a elevação de sua consciência de classe.

A questão fundamental é que não se alterou a estrutura de classes da sociedade venezuelana. Alteraram-se tão somente alguns aspectos da condução do Estado. Falar em socialismo nesse caso não passa de uma grosseira mistificação. Essa mistificação interessa à burguesia, que assim pode atacar Chávez pelo que ele não é e impedir que os trabalhadores se diferenciem dele pelo que de fato é. E a mistificação interessa também ao próprio Chávez, que pode assim neutralizar a esquerda socialista venezuelana e imunizar-se de críticas da esquerda internacional.

Ao anunciar suas medidas nacionalistas-burguesas como se fossem “socialistas”, Chávez coloca a esquerda venezuelana e latino-americana numa espécie de “armadilha”. Todos os socialistas ficam “obrigados” a lhe dar apoio contra a reação conservadora, e nesse ato de apoio correm o risco de perder a perspectiva da necessidade da ação e da organização política independente da classe trabalhadora.

É preciso sair dessa armadilha e dizer as coisas claramente: Chávez é inimigo dos trabalhadores, na medida em que mantém o Estado como instrumento do poder de classe da burguesia, de garantia da propriedade privada, da exploração capitalista, da extração de mais-valia, e de todas as formas de opressão. Ainda que a burguesia odeie ferozmente Chavez, a única coisa que este lhe tirou foi parte da renda da PDVSA. O “revolucionário” bolivariano nem sequer reconheceu o controle dos operários sobre a produção, devolvendo a empresa aos sabotadores, como vimos.

Os socialistas devem sim marchar lado a lado com os bolivarianos e chavistas, ajudando a organizar o povo venezuelano contra a reação burguesa e imperialista, mas sem jamais abrir mão da independência político-organizativa e de um programa socialista e revolucionário.

A independência de classe dos trabalhadores se expressa pela construção de organizações políticas e organismos de luta autônomos. Essas são as únicas condições em que se pode realmente construir o socialismo. Os trabalhadores devem lutar por seu próprio programa e sustentar essa luta com suas próprias forças. Jamais se pode acreditar que algum dirigente burguês irá realizar as tarefas da transformação socialista. A capitulação da esquerda a governos burgueses, sejam eles “radicais” como Chávez ou “moderados” como Lula só pode resultar em derrotas e tragédias, como já demonstrou a História.

Não há outra saída para os trabalhadores, tanto na Venezuela como no restante da América Latina e no mundo, a não ser desenvolver suas ações e sua organização de forma independente dos governos de plantão, mesmo em se tratando de governos de perfil aparentemente nacionalista e popular. O socialismo somente pode ser construído por meio da organização dos próprios trabalhadores. As formas de organização desenvolvidas para a luta, como os comandos de greve, conselhos por local de trabalho, círculos operários, organizações de bairro, conselhos populares, etc., são a base para as formas de gestão da futura sociedade socialista. O socialismo somente pode ser construído de maneira sustentável por meio de organizações materialmente enraizadas, ideologicamente coesas e politicamente independentes. Jamais será concedido por decreto de uma liderança esclarecida, por mais aparentemente determinada e bem-intencionada que seja.

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Socorram-me: subi no ônibus em Marrocos – Crítica do Filme Babel

Daniel M. Delfino

 Babel é o nome da torre cuja malfadada construção está narrada na Bíblia, no livro do Gênesis (cap. 11:2-9). Os homens tentaram construir uma torre alta o suficiente para alcançar o céu. Mas Deus ficou irritado com a prepotência de suas criaturas, por terem a ousadia de querer alcançar seus domínios. Para impedir que isso acontecesse, Ele confundiu suas línguas, para que não pudessem mais se entender (até aquele momento, todos na Terra falavam o mesmo idioma).

Essa explicação mitológica da Bíblia para a origem das diferentes línguas contém a admissão invertida de uma premissa dotada de importantes implicações antropológicas: se todos os homens falassem a mesma língua, seriam realmente capazes de alcançar o céu. Os homens se tornariam iguais a Deus, senhores do mundo. Essa idéia repugna o pensamento religioso, que considera qualquer castigo divino bastante adequado para a inadmissível arrogância de querer igualar-se a Deus. Esconde-se aí o segredo de toda a religião: a submissão humana. A tentativa de construir a torre foi um gesto prometéico esmagado pela História, em nome de Deus.

Para quem não se contenta com a submissão, mas pelo contrário, luta pela emancipação humana, a possibilidade de que todos os homens se entendam se coloca como uma necessidade crucial. A possibilidade de uma real comunicação é fundamental para que os homens se tornem senhores de suas vidas e deixem de se submeter às potências alienadas da religião, do moralismo, dos costumes, da ciência tecnicista, do mercado, do Estado, etc., construindo formas de relações autenticamente humanas.

Qual é o obstáculo que impede a comunicação entre os seres humanos no presente, no nosso mundo real?

O filme “Babel” nos mostra alguns desses obstáculos. Ao trazer à discussão o episódio bíblico, através da própria escolha desse título, os realizadores do filme propõem a tese de que vivemos hoje em nosso mundo numa espécie de Babel de línguas confusas, e que por isso os homens não se entendem e são infelizes.

Para provar essa tese, “Babel” nos mostra uma série de episódios em que os mal-entendidos originam situações trágicas e patéticas. As tragédias poderiam talvez ser evitadas ou minoradas se os homens se conhecessem e fossem capazes de se entender, é nisso que acreditam seus realizadores. Nesse sentido, “Babel” cumpre um papel importante como obra de arte na tarefa de ajudar a dissolver os empecilhos para a compreensão mútua no nosso mundo.

“Babel” se compõe de quatro histórias diferentes, que se passam em três países, Marrocos, México e Japão, em linhas de tempo ligeiramente deslocadas umas das outras. A conexão entre as diferentes histórias é acidental, improvável e quase absurda. O absurdo das situações extraordinárias retratadas situa-se perigosamente bastante próximo da “normalidade” do cotidiano. A normalidade está por um fio. Basta que os indivíduos se desviem um pouco da sua rotina para esbarrar nos improváveis e absurdos eventos presenciados.

No interior do Marrocos, dois filhos de um pastor de cabras brincam de tiro ao alvo com o rifle do pai, atirando contra um ônibus. Essa irresponsabilidade terá conseqüências homicidas. O tiro acerta uma turista estadunidense, transformando a viagem num pesadelo para o marido, desesperado para encontrar formas de socorrê-la naquele lugar precário. Ao mesmo tempo, a babá mexicana que cuida dos filhos do casal nos Estados Unidos comete a pequena irresponsabilidade de levar consigo as crianças para uma escapada até o México, para ir à festa de casamento de seu filho. Na volta, o sobrinho que dirigia o carro, num arroubo de macheza latina, tenta fugir do arbítrio e do autoritarismo da polícia no posto de controle da fronteira, transformando o passeio festivo num pesadelo no deserto. Enquanto isso, a investigação sobre a turista estadunidense alvejada no Marrocos vai parar no Japão, onde se descobre que o rifle usado no suposto “atentado” pertenceu a um caçador amador que deixou a arma de presente para o guia de seu último safári, que por sua vez o revendeu para o pastor de cabras. O japonês se torna suspeito de contrabando internacional de armas. A polícia o encontra através de sua filha surda-muda, que tenta entregar-se sexualmente para o policial, no auge do seu desespero por não ter um namorado, que, por fim, a levará à beira do suicídio.

Descritos assim de forma linear como no parágrafo acima, os acontecimentos não possuem a menor lógica. Expostos na tela do cinema, na devida (des)ordem temporal do encadeamento das cenas, esses mesmos acontecimentos readquirem a nossos olhos a estranha plausibilidade do real. Ao presenciarmos os episódios de “Babel”, identificamos claramente o nosso mundo real e seus absurdos. O real é indizível, impossível de ser totalmente contido em simples e toscas palavras, mas é ilustrável, passível de ser exibido e entendido em película de cinema.

A arte é o terreno em que se pode construir a unidade entre os homens separados por línguas, costumes e culturas. “Babel” acrescenta mais um tijolo na prometéica torre de Babel da compreensão mútua que precisamos construir para superar nossa alienação. Entretanto, seus realizadores, como os dois garotos marroquinos, atiram no que vêem para acertar no que não vêem. Ao colocar em discussão a incomunicabilidade humana sob o aspecto das diferenças lingüísticas e culturais, aspecto destacado na própria escolha do título, os autores de “Babel” revelam inadvertidamente algumas das verdadeiras causas dessa incomunicabilidade: as relações de poder.

O que impede a real compreensão entre os homens e perpetua os conflitos não é a diferença lingüística e cultural, mas as diferenças de classe. A divisão de classes se reproduz sobre a base de relações materiais de força, que exigem precisamente a incomunicabilidade como corolário. A incomunicabilidade se expressa sob a forma de narrativas pré-concebidas, ideologicamente moldadas para instrumentalizar o confronto necessariamente hostil com o diferente e viabilizar seu controle pela força. Uma dessas narrativas pré-concebidas é aquela que diz que os povos árabes são terroristas. Logo, se uma turista estadunidense leva um tiro no Marrocos, isso só pode ser um ato terrorista. Outra narrativa diz que os mexicanos são vagabundos, bêbados, viciados, bandidos, que entram nos Estados Unidos para roubar empregos e cometer crimes. Logo, se um jovem e uma senhora mexicanos levam duas crianças loiras no banco de trás, isso só pode ser um seqüestro.

As relações de classe vigentes transformam ideologicamente os povos subalternos em terroristas e seqüestradores, legitimando a violenta repressão de que são vítimas. A brutalidade da polícia marroquina contra seu próprio povo, a atitude de atirar primeiro e perguntar depois, explicita a função do Estado burguês periférico: subjugar a população local em nome da necessidade de cumprir obedientemente o que dele espera a “comunidade internacional”, ou seja, os Estados Unidos. A presteza da polícia japonesa em localizar a origem da arma do crime se justifica pelo mesmo motivo. Essa é a raiz de todos os mal-entendidos expostos.

Os cidadãos dos Estados Unidos ocupam a posição praticamente incontestada de protagonistas do drama mundial, e o fazem em grande parte graças ao poder do cinema. Graças ao cinema estadunidense, as platéias do mundo inteiro se acostumaram a rir do que eles riem, se assustar com o que se assustam, odiar o que odeiam, chorar pelo que choram, sentir o que eles sentem. Os estadunidenses são os heróis, a as platéias se identificam com eles, torcem por eles, querem ser como eles. São eles que contam, suas vidas são as únicas que importam.

A televisão nos informa que a história da turista alvejada no Marrocos teve um “final feliz”: a mulher estadunidense acabou não morrendo. Final feliz para quem, cara pálida? E quanto ao garoto marroquino que foi morto num tiroteio no momento em que tentava escapar da polícia com seu irmão e seu pai? E o que fará com eles a polícia marroquina, bem como a polícia estadunidense com o jovem mexicano que fugiu, e a babá mexicana que foi deportada, etc. O que acontece com eles? Onde está o final feliz? Ora, são coadjuvantes, e o que acontece com eles não importa. É “secundário”. Tudo o que importa são os “protagonistas”, já que os astros Brad Pitt e Cate Blanchet estão na sua pele e fornecem com sua simples presença estelar a razão para que a maior parte do público vá ao cinema.

“Babel” acerta ao mostrar o ponto de vista desses “coadjuvantes”. Mas aparentemente erra ao supor que o problema das diferenças humanas está na incomunicabilidade lingüística; suposição expressa na referência que o título traz ao episódio bíblico da confusão das línguas. As línguas são convenções criadas arbitrariamente e desenvolvidas pelo uso e pelo costume. É para realçar o caráter acidental e arbitrário das diferenças lingüísticas que escolhemos o maior palíndromo da língua portuguesa para o título desse comentário.

Lida ao contrário, a frase “socorram me subi no ônibus em Marrocos” diz a mesma coisa do que diz no sentido normal. O significado de “Babel” não está nessa bizarra coincidência, que não é mesmo mais do que simples coincidência. O significado do filme é a ilustração de alguns exemplos das barreiras que separam os homens. Mais do que incomunicabilidade lingüística formal, o problema da humanidade está na incomunicabilidade substancial socialmente criada.

Pessoas que falam uma mesma língua podem muito bem não se entender. O que o casal estadunidense estava fazendo no Marrocos, em primeiro lugar? O deslocamento espacial não os ajudou a superar a distância que imperava em seu casamento, devido à perda de um filho que ambos não haviam encontrado meios de elaborar e assimilar psicologicamente em conjunto.

E o que dizer da garota japonesa surda-muda? A sua incomunicabilidade com o pai, com o policial, com os jovens do sexo oposto, não está em sua deficiência auditiva e expressiva, mas na impossibilidade de enunciar um conteúdo que a sociedade japonesa não admite como comunicável: a necessidade sexual das mulheres. Eis um conteúdo que nenhuma sociedade, seja ocidental ou oriental, elaborou adequadamente. Que o digam um dos garotos marroquinos e a irmã com seu jogo erótico adolescente.

Desde as relações de poder internacionais até as opressões moralistas mais sutis são aqui dissecadas. Esse episódio fará o jovem e precoce Youssef tornar-se adulto antes do tempo e assumir toda a responsabilidade, inclusive pela morte do irmão. Não seria nenhuma surpresa se ele se transformasse naquilo que os guardiões da ordem chamam impropriamente de “terrorista”, mas que seria mais adequado chamar de revolucionário.

 

Nome original: “Babel”

Produção: Estados Unidos/México

Ano: 2006

Idiomas: Inglês, Espanhol, Francês, Japonês, Bérbere e Árabe

Diretor: Alejandro González Iñárritu

Roteiro: Guillermo Arriaga

Elenco: Brad Pitt, Cate Blanchet, Gael García Bernal, Adriana Barraza, Rinko Kikuchi

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Moção de Repúdio contra a Prisão de Marcelo Buzetto

Ataques típicos de um governo burguês são desferidos contra os lutadores, enquanto os assassinos de sem-terras e outros lutadores continuam livres e impunes. Esta é a justiça do Estado Burguês, esta é a justiça do Governo Lula.

Esta afirmação é possível quando analisamos os atuais aliados de Lula e suas ações no governo, p.e. sua relação com Blairo Maggi, governador reeleito do Mato Grosso, considerado o maior produtor individual de soja transgênica do mundo. E a liberação da soja transgênica, mais um dos ataques deste governo dito de esquerda à economia familiar, ao MST e à economia sustentável, capitulando aos interesses do agrobusiness, da UDR, das multinacionais dos agrotóxicos e das sementes transgênicas.

Existem atualmente cerca de 200 militantes dos movimentos sociais presos, vítimas de perseguição política, numa clara tentativa de intimidar os movimentos sociais e frear a sua luta.

Como parte desses ataques, foi preso no último dia 19 de janeiro o companheiro Marcelo Buzetto. Diante disso, queremos expressar nosso repúdio à prisão ao companheiro Marcelo, e nossa solidariedade ao mesmo.

Conclamamos à todos os lutadores que se somem ao Comitê Pela Libertação dos Presos Políticos do MST.

– Liberdade para Marcelo Buzetto.

– Liberdade para todos os militantes dos movimentos sociais presos, vítimas de perseguição política.

– Prisão para todos que atentam contra a vida dos trabalhadores.

– Prisão para os criminosos do latifúndio.

– Extinção das milícias armadas, financiadas e mantidas pelo latifúndio.

– Reforma Agrária e Urbana sob o controle dos trabalhadores.

 

Espaço Socialista, 28/01/2007.

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