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Sobre o golpe de estado no Paraguai – Pedro Guerra


26 de junho de 2012

Este texto é uma contribuição individual, não necessariamente expressa a opinião da organização e por este motivo se apresenta assinado por seu autor.

 

 

SOBRE O GOLPE DE ESTADO NO PARAGUAI

Pedro Guerra, militante do Espaço Socialista

Na última sexta-feira, dia 22/6, num processo de “impeachment” sumario, fora desconstituido o presidente paraguaio, Fernando Lugo. Ex-bispo católico muito ligado aos movimentos sociais, sendo conhecido até mesmo como “o Bispo dos Pobres”, eleito em 2008, Lugo faz parte das vulgas “novas democracias da América Latina” (numa expressão minha, sobre a qual assumo todos os erros e imperfeições, inocentando, portanto, o Espaço Socialista), ao lado de Hugo Chavez, Evo Morales e Rafael Correia. A especificidade desses governos, de maneira geral, decorre da relativa “normalidade” de seus governos, no sentido de que, apesar de todos os limites da legalidade, atuam dentro das regras constitucionais de seu tempo.

Sobre o impeachment de Lugo, quais reflexões podemos promover? Um ponto sobre o qual sempre insisto decorre dos riscos de contaminação da classe trabalhadora pela ideologia burguesa. De maneira geral, acredita-se que basta a legalidade para se viver num regime democrático e popular. Mera ilusão! A legalidade é um instrumento burguês de dominação, um aparato superestutural que, a partir da “ideologia jurídica” (tema bem desenvolvido em Althusser no seu livro “Aparelhos Ideológicos de Estado”) cria uma nuvem de fumaça em torno da luta de classes, tornando-a supostamente inexistente. O direito, acima das classes sociais, seria, assim, mera instrumentalidade neutra, equidistante tanto dos trabalhadores quanto da classe burguesa. As acusações para o processo contra o ex-presidente Lugo decorrem de acusações genéricas tais como má administração e aproximação excessiva com movimentos populares, com uso indevido da máquina administrativo-estatal. No limite, tratou-se de uma presidencia que tentou fazer o impossível: tolerou razoavemente o movimento popular pela reforma agraria, despertando a ira das oligarquias, mas sem nunca realizar efetivamente a distribuição de terras. Logo, tornou-se um governo sem identidade.

Do dia do impeachment (22/6) até hoje, tem-se visto ou uma tola resignação diante da legalidade (cuja iniciativa, aliás, fora do próprio presidente Lugo, que se manifestou no sentido de acatar a decisão, chegando ao cúmulo de agradecer ao Parlamento e às Forças Armadas o respeito pela constituição paraguaia) ou uma crítica ao atropelamento do devido processo legal. No primeiro caso, fica evidente a fragilidade das “novas democracias latinoamericanas” (reitero que a expressão, cambaleante, é minha), cabendo à esquerda revolucionária denunciar a natureza pequeno burguesa desses governos, cujos programas são de conciliação com o grande capital nacional e com o imperialismo. No segundo caso,  cabe esclarecer às companheiras e aos companheiros da esquerda revolucionária que, ainda que tivesse havido respeito aos ritos processuais (como, por exemplo, prazo maior do que singelas 24h para elaboração da defesa de Lugo), não podemos nos iludir com a legalidade. O Estado e o direito não são instrumentos de qualquer poder, de qualquer ordem social. O Estado e o direito são mecanismos específicamente burgueses de dominação. Assim, não há porque se confiar num mecanismo que não cabe à classe trabalhadora. É bem certo que existe a luta de advogadas e advogados populares em verdadeiros épicos na defesa judicial de militantes. São feitos heroicos que merecem todo nosso respeito e apoio. Mas ainda são insuficientes para as mudanças necessarias.

O que fazer, portanto? Às trabalhadoras e aos trabalhadores, sempre lutando em condições desfavoráveis, tirando forças de onde elas não existem, cabe, sempre e sempre, organização! Faço meus melhores votos de que os trabalhadores paraguaios possam se organizar e, aproveitando o momento de comoção, avancem na luta por um governo popular. Assim, não se trata da recondução ao cargo de Lugo, mas sim de um novo governo que efetivamente promova a reforma agraria. Já houve a infame experiencia golpista em Honduras, há poucos anos. Cruzar os braços e não denunciar o golpismo burguês são uma postura irresponsável da esquerda revolucionaria.

PEDRO GUERRA

Militante do Espaço Socialista