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Movimento “Basta”: paz para a burguesia


25 de abril de 2010

“Não nos falta nada, minha mulher,

 meu filho, para sermos livres como os

pássaros; nada, a não ser o tempo!”

(Dehmel, citado por Rosa Luxemburgo)

A grande imprensa tem alardeado uma dita campanha pela paz, que se intitula como o “Basta”. Esse movimento é composto e liderado pela própria imprensa, por empresários, artistas, profissionais liberais, pela…(pasmem!) polícia militar e outros setores, na imensa maioria ligados a órgãos governamentais e empresariais, com raras exceções.

Logo surgem algumas perguntas: Quem realmente quer a paz? O que explica a violência em que boa parte do mundo está atolado? Como acabar com a violência e principalmente quem e como se pode conseguir uma paz duradoura?

É evidente que não se trata aqui de fazer um estudo aprofundado dessas questões, mas sim de procurar entender minimamente os objetivos dessa campanha e abrir essa discussão sobre o significado da violência, que é fundamental para entendermos a nossa realidade.

A primeira questão que deve ser destacado é que a violência está localizada centralmente nas grandes concentrações operárias e na periferia e que são os trabalhadores e pobres que são as principais vítimas. É aí que aconteceram as chacinas(só na grande SP foram 47 com 169 mortos até julho desse ano), é aí que estão os traficantes encastelados e sob a proteção da polícia, é ai que milhões de jovens se entregam às drogas por pura falta de perspectiva de vida e por falta de lazer, é ai que a educação burguesa tem como  pedagogia oficial colocar o jovem para fora da escola e não atraí-lo.

A burguesia e a dita “classe média alta” não conhecem a violência, pois seus bairros são bem protegidos pela polícia e por seguranças e guardas particulares. O grande problema, para eles, é que também têm que sair para “mundo real” e aí se deparam com a violência contra os seus bens, fundamentalmente nas esquinas e faróis. Essa campanha, para o burguês, é preventiva, é para evitar que a violência chegue aos bairros “nobres”. Porque não fizeram campanha contra as chacinas e assassinatos que a polícia comete diariamente contra os pobres e explorados? Porque não se rebelaram contra as chacinas da candelária, do Carandirú  e de Eldorado dos Carajás? Porque se calam diante da violência da polícia nas desocupações e destruição de bairros inteiros da periferia (só para atender aos especuladores imobiliários)?

 A questão da violência na sociedade moderna (o Brasil é só uma parte dessa realidade) está diretamente relacionada com a manutenção da ordem econômica e política do capitalismo. A violência na atualidade tem cada vez mais a cara do capitalismo contemporâneo, se estruturou de tal maneira que adquiriu características de um Estado.

Quando falo de Estado, me refiro exatamente como um poder estruturado, pois possuem parlamentares (família Farias de AL, Hildebrando do Acre, etc), juízes (com a tarefa de expedir os “habeas corpus”, relaxar a prisão e outros mecanismos processuais), policiais e carcereiros (para facilitar as fugas, proteger o local do tráfico, etc), oficiais das forças armadas (lembram dos oficiais da aeronáutica?) e, como todo Estado, é fortemente armado. Enfim há toda uma rede de sustentação do crime e da violência que se institucionalizou e que além do conhecimento das “autoridades” também tem a proteção das instituições oficiais. Atuam com a conivência do Estado oficial, pois cumprem um papel fundamental para a manutenção do capitalismo: o controle dos trabalhadores e dos explorados. Basta ver que nos grandes centros não existe mais o bate papo entre vizinhos e amigos seja nos “botecos” ou nas praças, todos se recolhem cedo (se não tem conversa não tem troca de experiência e questionamento coletivo da econômica, do governo, da polícia). Nestes locais é proibido se reunir à noite e qualquer organização popular deve ter o consentimento dos chefes do crime organizado.

Nos morros, favelas e periferia estão “escondidos” (todo mundo sabe onde estão, até a polícia…) os traficantes (lembram do Fernandinho Beira Mar?) e  que literalmente controlam essas regiões, impõem toque de recolher, decretam a  necessidade de autorização para entrar e para sair, realizam julgamentos e execuções sumárias daqueles que ousam desafiá-los, ou seja, o que a ditadura fazia agora é este Estado paralelo que faz.

Há uma divisão de tarefas, onde o Estado oficial cuida da entrega das estatais, de gerir os negócios da burguesia e dos aspectos legais da repressão (os processos “legais”, as prisões políticas “dentro da lei”, etc.). O Estado paralelo tem como principal tarefa o controle dos trabalhadores e do povo oprimido, podemos dizer que temos um “Estado Democrático de Direito”, representando o oficial e um “Estado Ditatorial” que é o paralelo, mas os dois têm o mesmo objetivo.

Não pensem que esta organização paralela atua só com a força, pois também tem seu lado “democrático” quando realizam funções sociais como a distribuição de cestas básicas, ajuda para enterro, planos médicos, creches e até empréstimo de dinheiro (claro que deve ser pago…). Protegem a comunidade, conversam e ouvem os problemas dos moradores, enfim um papel digno das instituições do Estado oficial.

DA SEGURANÇA PARICULAR AOS GRUPOS PARAMILITARES

Outra questão que deve ser analisada é o armamento privado que é cada vez mais presente. Além do armamento das quadrilhas e do tráfico, no campo há anos temos a UDR e os fazendeiros com seus jagunços que desde 1995 já assassinaram 214 trabalhadores sem terra em processos de luta pela terra e não houve nenhuma condenação. Nas grandes cidades os empresários estão formando um verdadeiro exército particular. As empresas de segurança particular (quase sempre de propriedade da oficialidade da policia e que vários policiais fazem “bico”), tanto nas cidades como no campo, vão se constituindo como uma base real e objetiva para formação de grupos paramilitares e que diante de qualquer ameaça à propriedade privada executam sem nenhum constrangimento.

Essa questão do armamento particular dos capitalistas é de fundamental importância entendermos, pois a Colômbia e seus grupos paramilitares, os paramilitares das ditaduras do Cone Sul e mesmo aqui no campo brasileiro com a UDR e seus jagunços  se originaram a partir de seguranças particulares dos fazendeiros e grandes latifundiários.

QUE PAZ QUEREMOS?

Estou contra essa campanha cínica  porque ela não tem como preocupação central a paz para todos, mas sim para os ricos. Estão preocupados com os seus Rolls Royce, Mercedes, seus importados e relógios “rolex”. Não pensam nos jovens da periferia nem nos sem terra, nos desempregados, nos favelados. Não se referem às medidas necessárias para pôr fim à violência, pois teriam que discutir soluções para o desemprego, o lazer, a educação, a reforma agrária o que levaria a colocar em xeque a própria existência da dominação capitalista.

A paz plena só será alcançada quando conseguirmos construir uma sociedade que não tenha como a exploração do homem pelo homem, quando a vida for mais importante que o dinheiro e os bens materiais,  quando a realidade for tão maravilhosa que não se precise de drogas para “fugir da realidade”, quando, como disse Trotsky,  livrarmos a vida de todo o mal e possamos desfrutá-la plenamente. Só conseguiremos a paz quando a humanidade extirpar  o mal capitalista e os “falsos socialismos” . Só o socialismo verdadeiro, democrático, livre de toda e qualquer burocracia, pode nos dar a paz., ou seja, só quando existir uma sociedade sem explorados e exploradores, onde a coletividade auto-organizada, exerça diretamente o poder, sem qualquer intermediação ou “representante”.

E essa tarefa só os trabalhadores e aos explorados podem realizá-la. Os capitalistas não tem paz para nos oferecer.

A campanha do “Basta” jamais conseguirá a paz , pois ela não ataca o principal sustentáculo da violência que é o capitalismo. Só colocando fim ao capitalismo é que teremos paz, pois a violência é inerente ao capitalismo.

Duarte – ABC/SP