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Declaração do Espaço Socialista ao povo haitiano


25 de abril de 2010
DECLARAÇÃO DO ESPAÇO SOCIALISTA
Solidariedade real ao povo haitiano e não à ocupação !!!
Apesar do terremoto que atingiu o Haiti ter sido um acontecimento da natureza, a gravidade das suas consequências é resultado da situação de miséria que assola a grande maioria de sua população. A dificuldade diária de se conseguir alimento e água, a precariedade das construções, a falta de uma rede de serviços sociais, são problemas que agravam muito o que já seria trágico, aumentando assim as dimensões da catástrofe. Terremotos com a mesma intensidade ocorreram em outros países –como o Japão –, sem que o impacto fosse tão devastador.
Da mesma forma, no Brasil, a imprensa atribui a causa das enchentes e deslizamentos ao excesso das chuvas. Com isso tentam encobrir o fato de que é a lógica capitalista que gera as condições precárias de moradia nas periferias e que os governos priorizam obras em favor dos empresários ao invés de outras que permitam melhores condições de escoamento da água nos bairros populares. A mesma quantidade de chuva cai no Morumbi e nos Jardins, mas não ouvimos falar de enchentes nos bairros onde mora a burguesia…
No caso do Haiti, com seus 9 milhões de habitantes, trata-se do país mais pobre do hemisfério ocidental – 146º lugar entre 177 países avaliados pelo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) –, onde mais da metade da população vive com menos de 1 dólar por dia, e cerca de 78% com menos de 2 dólares. A taxa de mortalidade infantil é altíssima: 60 em cada 1.000 nascimentos. Essa miséria não é natural, é a conseqüência das sucessivas ocupações e colonização das potências imperialistas sobre o país.
O terremoto é natural, mas as conseqüências não são
 A miséria do Haiti não é um produto do acaso, e muito menos uma vocação desse povo. Ao contrário, o povo negro do Haiti protagonizou lutas gloriosas contra inimigos muito mais fortes.
Prova disso, é que ele foi o primeiro país das Américas a se tornar livre, na Revolução liderada pelos “Jacobinos Negros”: “Em 1803, a bandeira dos homens livres levantou-se sobre as ruínas. Mas a terra haitiana fora devastada pela monocultura do açúcar e arrasada pelas calamidades da guerra contra a França, e um terço da população havia caído no combate. Então começou o bloqueio. Ninguém comprava do Haiti, ninguém vendia, ninguém reconhecia a nova nação…”
Fruto de seu isolamento e do pouco desenvolvimento de suas forças produtivas “…o Haiti acabou caindo nas mãos de ditaduras militares carniceiras, que destinavam os famélicos recursos do país ao pagamento da dívida francesa. A Europa havia imposto ao Haiti a obrigação de pagar à França uma indenização gigantesca, a modo de perda por haver cometido o delito da dignidade.”(Eduardo Galeano – Os pecados do Haiti, em www.resistir.info.net).
De lá para cá, o povo haitiano novamente esteve submetido ao saque e à dominação dos países imperialistas. Em 1915 foram os EUA que invadiram o país, governando-o até 1934, e só saindo após conseguir cobrar as dívidas do Haiti com o Citibank e modificar o artigo constitucional que proibia a venda de terras a estrangeiros. Desde então, a Casa Branca exerce uma espécie de protetorado no país.
Portanto, essas potências mantiveram o Haiti como seu fornecedor barato de matérias-primas como   açúcar, banana, manga, milho, batata-doce, legumes, tubérculos e outros mais. Hoje, aliado ao peso majoritário da agricultura, surgiu um setor de produção voltado para a exportação e que superexplora os trabalhadores.
 
ONU, EUA e Brasil no Haiti: Armas e Repressão  para manter o povo haitiano na miséria
Recentemente, em 2004, o Brasil passou a comandar a Minustah (missão de ocupação da ONU). Desde então, sempre que há revoltas ou manifestações contra a miséria e os baixos salários, entram em ação as “Tropas de Paz” para reprimir duramente. O argumento da reconstrução da institucionalidade do país não se sustenta. Os problemas sociais não foram resolvidos e, ao contrário, agravaram-se. Em janeiro de 2006, o general Urano Teixeira Bacellar, que estava no comando da Minustah há poucos meses – desde setembro de 2005 -, se suicidou após ter alertado que os problemas no Haiti não demandavam tropas e sim justiça social.
Atualmente, a liderança do Brasil na Minustah também serve de treinamento para os militares brasileiros conterem rebeliões nas favelas brasileiras, que tendem a se agravar à medida em que o capital exclui de cada vez mais pessoas dos direitos mínimos a uma vida digna.
Uma simples comparação de valores expõe o descaso da ONU e dos países dominantes diante da situação do Haiti: desde a irrupção da crise econômica, os governos destinaram para as grandes empresas e o sistema financeiro mais de US$ 15 trilhões (http://oglobo.globo.com/economia/mat/2009/02/11), enquanto que para socorrer as vítimas do Haiti, a ONU pediu aos países membros US$ 562 milhões, um valor absolutamente irrisório diante da magnitude da catástrofe. Mesmo assim, até agora só foram enviados US$ 207 milhões, 36,1% do prometido. Neste valor ainda estão incluídos os gastos militares, como deslocamento, manutenção das tropas etc.
Já o governo Lula dedicou aos empresários o equivalente a R$ 475 bilhões desde quando eclodiu a crise no Brasil (http://economia.uol.com.br/ultnot/bbc/2009/04/03/ult2283u1708.jhtm). Mas para a ajuda  humanitária ao Haiti – excluindo-se a manutenção das tropas -, até agora foram enviados apenas R$ 15 milhões.  Por outro lado, a manutenção das tropas no Haiti já tem um custo de mais de R$ 703 milhões desde 2004, segundo dados do Ministério da Defesa (www.agenciabrasil.gov.br). Isto é mais de 120 vezes a ajuda humanitária até agora destinada ao Haiti pelo governo brasileiro. E agora, como se não bastasse, Lula propôs e o Congresso aprovou o envio de até mais 1.300 militares, duplicando o efetivo atual no país.
 
Estados Unidos, mais uma vez, mostra a sua cara
Os EUA se aproveitam para, de fato, ocupar o país com cerca de 20 mil soldados – o dobro do efetivo total da ONU –, assumindo o comando do espaço aéreo, portos e estradas do país caribenho.( ww1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u683605.shtml) .Assim, ao todo são 30 mil militares em um país de apenas 9 milhões de habitantes!
Ao contrário do que é dito pela ONU, EUA, Lula, e a grande mídia, as tropas não têm função humanitária, nem de reconstrução, mas sim de manter os trabalhadores haitianos numa situação de submissão, recebendo salários miseráveis e assumindo jornadas subumanas de trabalho para as empresas prestadoras de serviços de grandes transnacionais.
Os principais argumentos dos que defendem a manutenção e o envio de mais soldados para o Haiti são os mesmos dos que sempre defenderam a ocupação e submissão do país: argumentam que a população trabalhadora não é capaz de se organizar e de coordenar a ajuda internacional e reconstruir sua economia. Mas a história deste povo mostra o contrário, como vimos acima. Além disso, a realidade também mostra que a população haitiana possui uma rede de organizações de base como sindicatos, organizações populares, estudantis e de bairros. São essas organizações que de fato estão fazendo de tudo para manter um mínimo de serviços essenciais como alimentação, saúde e segurança.
O verdadeiro receio dos EUA e da ONU é justamente de que essa população – cuja imensa maioria é de trabalhadores e pobres – venha a assumir o controle do seu destino, em outras palavras, que seja deflagrada uma rebelião social ou um processo revolucionário, com impacto em toda a América.  
Além de tentarem prevenir um possível processo insurrecional no Haiti, os EUA aproveitam para buscar reforçar seu controle militar na região e impor limites ao papel que o Brasil vem tentando ocupar no terreno internacional. As bases militares na Colômbia e a reativação da Quarta Frota, encarregada de patrulhar o Atlântico Sul, também fazem parte dessa estratégia.  
As metralhadoras e baionetas no peito dos soldados mostram o verdadeiro objetivo das forças militares do Brasil, dos Estados Unidos e da ONU.
 
É preciso solidariedade real e não ocupação militar!
Defendemos uma campanha internacional de solidariedade aos trabalhadores do Haiti. Mas a solidariedade que defendemos é a solidariedade a serviço da luta e não se confunde com o assistencialismo propagado pelos governos e a mídia burguesa.  
A ONU, Lula, e os EUA têm a intenção de usar a “ajuda humanitária” para com isso levar as pessoas à passividade e a aceitarem a ocupação no Haiti. Já a nossa solidariedade deve ter um conteúdo diametralmente oposto. Deve estar a serviço da luta pela retirada das tropas e para que os governos responsáveis pela tragédia social do Haiti venham a ressarcir a dívida que têm com aquele país.          
Em primeiro lugar, temos que denunciar e exigir a imediata retirada de todas as Tropas de Ocupação e que o dinheiro desperdiçado para manter essas tropas seja direcionado para a ajuda humanitária e a reconstrução do país!
 Também é preciso exigir ajuda internacional compatível ao tamanho da catástrofe e não apenas as migalhas doadas até agora e sem nenhuma garantia de que chegarão, pois os governos burgueses fazem demagogia até com a vida das pessoas. A cobrança deve ser maior para as potências que sempre exploraram a economia haitiana, como EUA, França e Inglaterra.
Além disso, é preciso que toda a ajuda recolhida seja entregue às organizações de luta dos trabalhadores e estudantes do Haiti, e não nas mãos da ONU, dos EUA ou das tropas brasileiras, que usam o mote da ajuda humanitária para disfarçar e legitimar a ocupação. Só as organizações de luta dos trabalhadores podem garantir que os recursos arrecadados sejam usados para reconstruir a luta contra a ocupação, a exploração e a dominação do seu país, na perspectiva socialista, de um governo dos trabalhadores no Haiti.