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Jornal 30: Abril de 2009


15 de abril de 2009
jornal 30 - abril de 2009
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Leia as matérias online:

 

Como lutar contra a crise e o desemprego?

 Enquanto no mundo todo a crise segue se aprofundando, no Brasil, podemos dizer que já estamos em uma recessão, cujo início ficou patente com a primeira grande leva de mais de 2 milhões de demissões ocorridas entre o fim de 2008 e o início de 2009 – entre elas as 4.200 demissões na EMBRAER. Isso sem falar na quantidade de empresas que deram licenças sem remuneração, reduziram salários e direitos.

O desemprego segue aumentando, embora em um ritmo menor, e novas levas de fechamento de postos de trabalho estão por vir com terríveis conseqüências sociais.

Governo Lula, CUT e Força Sindical: do Lado dos Patrões

A inversão rápida do ciclo anterior de crescimento econômico para uma recessão pegou os trabalhadores de surpresa pois, de uma hora para outra, viram sua situação decair.

Pior ainda, todos aqueles que teriam maior poder para fazer alguma coisa, como o governo Lula, e as grandes centrais como a CUT e a Força Sindical, estão em conluio com os patrões para convencer os trabalhadores de que não há mesmo outra saída a não ser preservar a saúde (leia-se grande lucratividade) das empresas.

Assim, realizam Fóruns como o do ABC, onde se reuniram, nos dias 11 e 12 de março, representantes das empresas, do governo (na pessoa da Dilma Ruseff) e das Centrais. O objetivo: encontrar “saídas criativas” para crise na região. Mas todos sabemos quais saídas são essas: dinheiro para as empresas, demissões, corte de salários e direitos para nós.

Empresários e governo tentam convencer os trabalhadores de que as demissões e o corte de salários e direitos são males inevitáveis, mas passageiros. Dizem que assim que a economia melhorar, os trabalhadores serão chamados de volta. Uma grande mentira.

A crise atual é extremamente profunda e a reestruturação que as empresas estão fazendo será ainda mais intensa que a dos anos 90. A maioria dos postos de trabalho fechados não serão mais reabertos, nem os direitos devolvidos.

O Estado entra para assumir as perdas da iniciativa privada. Para isso, pretende-se que haja cortes substanciais nos gastos com saúde e educação públicas, com o funcionalismo, bem como sobrecarga de trabalho e responsabilidades dos servidores.

O governo Lula já direcionou mais de R$300 bilhões para as empresas e bancos, e Serra, que por sua vez pretende se mostrar como melhor aluno ainda, destinou um pacote de R$20 bilhões. Esse dinheiro sairá do orçamento público, das áreas sociais, da saúde, da educação e dos salários do funcionalismo.

Agora Lula lança o pacote da habitação de R$ 32 bilhões com o mote de incentivar a construção de casas populares. Mas ao invés de usar nesse pacote o dinheiro que está indo para os empresários, pretende tirar esse montante do FGTS, dos cortes no orçamento da saúde e da educação, além do funcionalismo público.

Ou seja, o governo tira dinheiro dos próprios trabalhadores para sustentar as grandes construtoras em crise, e tentar preservar sua popularidade, que começou a cair.

Porém, essas medidas não serão suficientes para fazer a economia voltar a crescer no ritmo anterior, muito menos servirão para reverter o desemprego. Ao contrário, estas são medidas que visam fortalecer as empresas e ajudá-las a se reestruturar, demitindo e precarizando as contratações. O caso da EMBRAER é emblemático pois, como se viu, o governo já sabia das demissões e mesmo assim deixou a empresa de mãos livres para fazer o que quis.

Assim, a perspectiva burguesa e governista de saída para a crise já está sendo encaminhada: um processo brutal de ataques ao emprego, aos salários e direitos da classe trabalhadora, no sentido de impor uma super-exploração e recompor sua margem de lucro, a partir do atendimento a uma demanda menor. Isso sem falar das possíveis guerras, repressões e intervenções militares contra os pobres em geral, como as intervenções nas favelas do Rio e de São Paulo.

É dentro desse marco que a CUT e Força Sindical atuam, reforçando os preconceitos de que o lucro é sagrado, que fora do capitalismo não há alternativa, que deve-se dar mesmo dinheiro e isenções de impostos para grandes empresas transnacionais, reduzir salários e direitos, como se mesmo depois de tudo isso os empresários não continuassem demitindo…

“Unidade” com a CUT e a Força Sindical… mesmo elas defendendo os patrões e o governo?

Em janeiro, por ocasião do Seminário de Esquerda contra a Crise no Fórum Social 2009, foi tirado um dia de luta contra o desemprego e a crise. Essa iniciativa partia da avaliação correta de que tanto a CUT quanto a Força Sindical não iriam impulsionar mobilizações contra a crise, ao contrário, estariam defendendo medidas a favor dos patrões, o que de fato vem acontecendo.

No entanto, faltando 15 dias para a manifestação, no final de semana de 14/15 de março, a direção da CONLUTAS resolveu, por orientação do PSTU (corrente hegemônica) modificar o calendário tirado em Belém para a realização de um Ato no dia 30 com a CUT, Força Sindical, CTB, etc..

Essa mudança foi prejudicial, pois foi jogada fora a oportunidade de avançar em uma diferenciação com essas centrais pelegas. Suas reivindicações são dinheiro para as empresas, redução de impostos, banco de horas, redução de salários, PDV’s, etc, ou seja, todas as soluções nos marcos de garantia da lucratividade do capital, o que só é possível atacando os trabalhadores. A CONLUTAS por outro lado defende que sejam os ricos a pagarem pela crise que eles criaram.

Como organizar uma manifestação conjunta com objetivos opostos?

A desculpa de que todas as centrais defendem a manutenção dos empregos não procede, pois as centrais governistas têm defendido “Planos de Demissões Voluntárias”, ou literalmente se calado diante das demissões da virada do ano.

O argumento de que com a mesma data e um Ato unificado seria possível disputar os trabalhadores que ainda acreditam nessas centrais também não se sustenta.

Conforme dito acima, isso não se confirmou. O controle das manifestações e o seu caráter foi ditado pelas Centrais pelegas, com pouco espaço para um discurso de luta.

E o pior é que o esperado aconteceu: nem a CUT nem a Força mobilizaram trabalhadores, porque eles simplesmente estão contra qualquer mobilização!!! O comparecimento foi basicamente de sindicalistas liberados e de cabos eleitorais.

Seria diferente se houvesse um processo de lutas em nível estadual ou nacional, no qual essas centrais fossem obrigadas a encabeçar lutas massivas. Mas na conjuntura em que estamos, a mudança de data só serviu para manter o nível atual de dispersão e de ilusões nessas centrais pelegas.

Por último, a mudança de data em cima da hora desorientou as atividades que já estavam sendo preparadas, e além de tudo se perdeu a oportunidade de marcar um perfil independente junto aos próprios trabalhadores.

Valia muito mais a pena ter feito a atividade nos moldes tirados em Belém, ainda que com todas as dificuldades pois seria mais um passo no sentido da construção de um pólo alternativo, ainda que embrionário, à burocracia sindical da CUT e da Força.

Apostar na Unificação da Esquerda e dos Trabalhadores pela Base!

Por tudo o que foi dito antes, a situação atual apresenta-se como de total necessidade da construção de um pólo alternativo às centrais pelegas, que impulsione as lutas e apresente uma outra saída aos trabalhadores contra a crise do capitalismo.

Construir um pólo socialista alternativo é ainda mais necessário, devido ao fato de que nos últimos anos as referências socialistas e revolucionárias ficaram em crise e na defensiva. Agora, com o estouro da crise do capitalismo, é possível e ao mesmo tempo urgente lutarmos para a reconstrução de uma alternativa socialista de massas.

De forma geral, os trabalhadores não vislumbram outra sociedade que não o capitalismo e, portanto, o discurso das empresas e do governo de que a lucratividade deve ser preservada aparece como algo natural e inquestionável. Mas é justamente a lógica do lucro que os socialistas devem ter a coragem de questionar, pois todo lucro funda-se na exploração do trabalhador, e na destruição da natureza!

Assim, continuaremos insistindo na necessidade de um amplo trabalho independente de agitação e propaganda junto à classe trabalhadora, para disputar sua consciência, denunciando as armadilhas das propostas patronais e apontando um programa alternativo em defesa dos interesses dos trabalhadores, que rompa com a lógica do lucro.

Para potencializar esse trabalho, defendemos desde o início deste ano a realização de um Encontro Nacional de Entidades de Luta e Ativistas, precedido de Encontros Regionais, como forma de abrir um amplo debate junto à classe trabalhadora e à vanguarda, para tirarmos um calendário de luta e um programa alternativo dos trabalhadores contra a crise e o desemprego.

Seria possível envolver milhares de ativistas de todo o país, a partir da unificação dos esforços da CONLUTAS e da INTERSINDICAL, que por sua vez aumentariam sua inserção junto à classe trabalhadora através da organização desse Encontro Nacional.

O Encontro poderia e deveria ser chamado ainda nesse primeiro semestre, como forma de preparar o enfrentamento às demissões e aos ataques aos nossos direitos.

Se nos lembrarmos, a experiência do Encontro de 2007 no Ibirapuera foi extremamente produtiva, e todas as correntes reconheceram isso.

A unificação da CONLUTAS com a INTERSINDICAL amplamente defendida nas palavras por todos os setores, seria assim colocada em prática a partir da realidade das lutas, e não apenas com palavras ou discussões de cúpula.

Até agora, porém, as principais correntes políticas (O PSTU, que dirige a CONLUTAS e o PSOL que dirige a INTESINDICAl), têm se recusado a encampar essa proposta de um trabalho ofensivo e pela base junto aos trabalhadores. Essa atitude é contraditória com sua disposição de se unir com a CUT e a Força Sindical.

Assim, propomos que os ativistas e trabalhadores se juntem a nós na pressão junto às maiores correntes, no sentido da realização de um Encontro Nacional anti-patronal e anti-governista, precedido de encontros regionais.

A realização no ABC do Encontro de Luta Contra a Crise e o Desemprego (ver matéria neste jornal) foi um passo importante nesse sentido.

Propostas para um programa dos trabalhadores contra a crise

1) Não às demissões! Estabilidade no emprego e reintegração dos demitidos!

2) Redução da jornada de trabalho sem redução dos salários!

3) Estatização sob controle dos trabalhadores e sem indenização das empresas que demitirem, ameaçarem fechar ou se transferirem!

4) Reestatização da Vale e demais empresas privatizadas sob controle dos trabalhadores , sem indenização e com readmissão dos demitidos!

5) Não pagamento das dívidas públicas, interna e externa , e investimento desse dinheiro num programa de obras e serviços públicos sob controle dos trabalhadores, para gerar empregos e melhorar as condições imediatas de saúde, educação, moradia, transporte, cultura e lazer . Fim da remessa de lucros para o exterior!

6) Estatização do Sistema Financeiro sob controle dos trabalhadores!

7) Reforma agrária sob controle dos trabalhadores. Fim do latifúndio e do agronegócio. Por uma agricultura coletiva, orgânica e ecológica voltada para as necessidades da classe trabalhadora!

8) Por um governo socialista dos trabalhadores baseado em suas organizações de luta!

9) Por uma sociedade socialista!

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Derrota na EMBRAER mostrou os limites de um sindicalismo imediatista

Nesta polêmica, não se trata de questionar a combatividade do sindicato dos metalúrgicos de São José, nem suas intenções, mas sim um modelo de atuação que ao nosso ver não está à altura para enfrentar os grandes ataques desse período de crise.

O que precisa ser discutido é por que em uma categoria dirigida ao longo de mais de 20 anos por um sindicato que recebe acompanhamento direto da direção nacional do PSTU, e que tem prioridade da CONLUTAS, os trabalhadores tendem a agir da mesma forma que em outros locais cujas direções não são de luta?

Ou seja, por que no caso das demissões da GM, e agora, da Embraer, o sindicato não conseguiu realizar uma greve ou formas de luta mais radicalizadas? Por que não foi possível sequer juntar e organizar os demitidos em assembléias ou atos massivos?

Foi culpa dos próprios trabalhadores? Ou isso reflete uma defasagem no tipo de trabalho que vem sendo realizado todos esses anos nos sindicatos dirigidos pela esquerda em geral?

Ao nosso ver, embora haja dificuldades objetivas, a segunda opção é a que predomina. As dificuldades de mobilização refletem a falta de um trabalho político e ideológico mais estrutural junto aos trabalhadores, o que caracteriza uma concepção de sindicalismo imediatista e economicista.

Se em períodos “normais” o sindicalismo imediatista já é limitado, num período de crise essas limitações se transformam em derrotas, pois esse tipo de atuação não dá conta das questões de fundo colocadas em toda crise estrutural – como a questão do lucro, dos objetivos da produção e da propriedade, a questão de que classe deve ter o poder político, qual rumo apontar para a sociedade.

A crise deve reorientar totalmente o tipo de atuação sindical. É necessário disputar cotidianamente a consciência das massas, discutindo a necessidade de os trabalhadores apresentarem uma outra saída para a sociedade, que rompa com a lógica do lucro e com a ordem de poder da burguesia, apontando uma perspectiva de futuro da construção de uma outra ordem política e social, sob controle dos trabalhadores.

Enfim, trata-se de estabelecer um elo entre as lutas imediatas e a proposta socialista revolucionária, pois a burguesia defende cotidianamente a ideologia capitalista de manter a produção voltada para o lucro e para o mercado. Se não fizermos essa disputa política e ideológica, deixaremos os trabalhadores à mercê da ideologia burguesa de que a lucratividade das empresas é sagrada e não pode ser questionada.

Os metalúrgicos, tanto da GM como da EMBRAER, ao não terem desenvolvido uma consciência anti-capitalista, nem um programa alternativo, pela falta de um trabalho político nesse sentido, não enxergaram a possibilidade de resistir, pois não vêem uma forma de ir além da lógica do lucro, nem de fazer de sua luta uma campanha de todos os trabalhadores. Nesse sentido o lema anterior “Demitiu, Parou” embora correto em princípio, se mostrou insuficiente.

Diante das dificuldades provocadas pela falta desse trabalho mais ideológio e político, a orientação da direção da CONLUTAS (PSTU), foi de se juntar à CUT e à Força Sindical, buscando uma “unidade”… Então vimos as cenas em que Zé Maria saiu de braços dados com o Paulinho da Força.

Isso não seria tão problemático se a Força estivesse mobilizando contra as demissões. Mas neste caso, ficou nítido que o Paulinho só queria se promover em cima da luta da EMBRAER. Tanto é assim, que a Força Sindical não organizou protestos em nenhuma categoria contra as demissões…

Essas são as conseqüências da falta de uma intervenção mais política e ideológica nos sindicatos. É preciso um novo tipo de atuação, à altura dos desafios colocados pelo aprofundamento da crise .

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Encontro no aABC discute unidade da esquerda e luta contra a crise econômica

Há muito o Espaço Socialista tem insistido na necessidade de construirmos a unidade entre setores de esquerda para as tarefas imediatas, para o enfrentamento cotidiano com a burguesia e para a construção de uma ferramenta de luta que possa servir de referência para os trabalhadores e ganhá-los para a luta anticapitalista. Temos feito esse esforço porque acreditamos que os desafios colocados para os socialistas só podem ser enfrentados com unidade. É uma exigência do período histórico.

É nessa perspectiva que, desde o ano passado, temos defendido que a Conlutas e a Intersindical – duas entidades ligadas a sindicatos, categorias, organizações e partidos de esquerda – impulsionem um encontro nacional de base, aberto a todos os trabalhadores, trabalhadoras e desempregados para que possamos discutir e deliberar sobre ações concretas para enfrentar a crise econômica.

Informar, esclarecer, organizar e mobilizar os trabalhadores pela base é ir além das ações de cúpula e é, ao nosso modo de ver, a melhor maneira de enfrentarmos os planos do governo e dos patrões.

A fim de contribuirmos com essa luta pela unidade da classe trabalhadora e das organizações de esquerda propomos realizar no ABC paulista um Encontro Regional de base, aberto a todos os setores antipatronais e antigovernistas para discutirmos ações concretas de intervenção, preparar o Dia Nacional de Lutas e outras ações deliberadas.

Mas, apesar de praticamente toda a esquerda brasileira falar em unidade, observamos que na prática as coisas são bem diferentes.

 

Dois projetos em disputa: o dos trabalhadores e o da burguesia

Além da necessidade, o Encontro Regional ganhava ainda maior importância por ser o ABC paulista a sede do Seminário organizado pela CUT, PT, Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC, prefeituras, governos federal e estadual em conjunto com FIESP.

Esse Seminário teve o objetivo claro de promover o pacto social, em que a direção do movimento sindical abre mão das lutas pelos direitos dos trabalhadores para que os patrões continuem tendo lucros.

Nas crises capitalistas, como esta em que estamos vivendo, é necessária a
discussão sobre o projeto que cada classe social tem para a sua superação. A burguesia e seus aliados indicam um caminho: redução de direitos, de salários e medidas que garantam a lucratividade. Os revolucionários indicam as lutas por questões imediatas – como salário, diretos e emprego – e por questões estratégicas – como a luta contra o capitalismo e a construção de um outro tipo de sociedade.

Esse é grande desafio da esquerda, construir uma alternativa de poder e recolocar na ordem do dia a discussão sobre a necessidade da revolução como alternativa ao capitalismo.

Para o Espaço Socialista trata-se de mostrar aos trabalhadores que há outro caminho a seguir: o caminho da luta, única forma de manter os nossos direitos e de mostrar para os patrões e seus aliados que não aceitamos pagar pela crise.

Um encontro vitorioso

Essa discussão sobre projeto é uma disputa ideológica contra a burguesia e referencial para fazermos um balanço do Encontro Regional do ABC, realizado em 22/03, em São Bernardo.

Apesar do boicote de várias correntes de esquerda que atuam no ABC, contamos com a organização ativa da APEOESP (Sindicato dos Professores – subsedes Santo André e São Bernardo) na construção do Encontro e com a participação de mais de 80 trabalhadores e trabalhadoras (professores, estudantes, servidores municipais, bancários, etc).

O Encontro Regional do ABC aprovou: a construção de um Comitê permanente (Comitê de Luta contra o desemprego e a exploração capitalista); a participação no Dia Nacional de Lutas; a organização de um debate sobre concepção de movimento sindical e a participação no 1º de maio antigovenista, de esquerda e independente.

Como a Conlutas e a Intersindical mudaram a data do Dia Nacional de Lutas – de 01 de Abril para 30 de março – como forma de unidade com a CUT, a Força Sindical e demais centrais governistas, o Encontro Regional do ABC deliberou não participar do ato unificado, mas irmos a locais de trabalho e estudo a fim de discutirmos com os trabalhadores sobre a crise econômica e também apresentar as propostas programáticas aprovadas no Encontro.

Com a realização de atividades como estas pudemos observar, através da recepção dos trabalhadores, a inquietação quanto às ameaças de corte de direitos e desemprego que já atingem a nossa classe e indicam que os efeitos da crise podem provocar uma mudança na situação política.

O fato lamentável foi o boicote do PSTU ao Encontro no momento em que a classe trabalhadora mais precisa de unidade. Lamentamos, pois o PSTU é a corrente hegemônica na Conlutas, tem maior possibilidade e responsabilidade em impulsionar as lutas e construir a entidade como alternativa de esquerda e dos trabalhadores. No entanto, não estranhamos. O partido tem se recusado na prática a construir a Conlutas e a Conlute na região do ABC, não marca-se plenária, reunião ou atividades conjuntas. E quando propomos qualquer iniciativa para sairmos do profundo isolamento e impulsionarmos a construção ou fortalecimento da Conlutas na região, somos acusados de estarmos realizando fóruns paralelos.

Embora ainda reunindo poucos esse Encontro torna-se vitorioso pois, num momento de extrema fragmentação da esquerda, indica um reconhecimento dos trabalhadores da necessidade de construção da unidade dos lutadores em torno de um programa anticapitalista.

Sendo assim, o Comitê de Luta contra o desemprego e a exploração capitalista reitera o chamado à unidade na luta a todas as organizações, partidos, grupos e entidades de esquerda e antigovernistas e ao fortalecimento das atividades dirigidas para o avanço na consciência dos trabalhadores e desempregados a fim de se colocarem em movimento contra a exploração e pela unificação das lutas da classe trabalhadora.

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O que está por trás do discurso sobre qualidade do ensino público no Estado de São Paulo

 

“A minha resposta à ofensiva à educação é a luta política consciente, crítica e organizada contra os ofensores”. (FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia, p.75).

Para tratar da questão do ensino público no Brasil e no Estado de São Paulo, é necessário entender e lógica e o papel do Estado burguês em todas as suas esferas. E, sobretudo, com as tomadas para minimizar os danos causados pelo agravamento da crise econômica.

O Estado burguês surgiu e sempre agiu de modo a favorecer o desenvolvimento do capitalismo. Com seu monopólio da violência e suas definições de legalidade, expandiu e expande territórios para garantir os lucros das empresas transnacionais, se endivida de modo crônico e permanente para contornar crises periódicas em permanência, promove guerras, concede incentivos financeiros aos empresários e banqueiros e, atualmente é convocado mais uma vez para gerenciar a crise atual do capitalismo.

No nosso caso, Lula já gastou mais de R$ 300 bilhões do dinheiro público para contornar a crise e garantir os lucros dos empresários. Serra, que já havia dado R$ 9 bilhões para as montadoras, gestou um pacote de R$ 20,6 bilhões, com isenção de impostos e obras de infra-estrutura de interesse dos empresários.

Como garantir serviços públicos de qualidade com os governos usando os recursos públicos para proteger e garantir os lucros dos empresários e dos banqueiros?

No Estado de São Paulo, em 2002, 15,1% do orçamento do Estado era gasto na educação. A previsão para 2009, é de 13,1%. Com relação aos gastos com pessoal e encargos com educação, em 2002, foi de 13%. Em 2009, está previsto 9% do orçamento. Resultado: o ensino público da rede estadual de São Paulo encontra-se entre os piores do país. As escolas são sucateadas, as condições de trabalho dos profissionais da educação estadual estão precarizadas e os professores são desvalorizados – é claro, com exceção de algumas poucas escolas que são usadas como vitrines e para propagandear que a política educacional do Estado de São Paulo está dando certo.

Uma outra ação do governo Serra – mas também do governo federal e das prefeituras como um todo – é jogar pra população que a educação e também os demais serviços públicos não funcionam com qualidade por culpa dos professores. E a partir daí, tramam toda uma campanha, responsabilizando-os pela crise na educação. Não só isso, colocam em prática uma política de enquadramento dos professores e de todos os servidores públicos, através da avaliação de desempenho, avaliação dos professores em estágio probatório e, por último, a prova dos OFAs.

A prova dos OFAs, sob o discurso de que contrataria professores melhores qualificados, também tinha outro objetivo, que era o de contratar professores recém formados, que nunca haviam trabalhado na rede, e que entrariam numa situação bem mais precarizada do que os que já estavam na rede estadual. Esses novos professores, diferentemente dos mais velhos de rede, passariam a trabalhar em regime de INSS e entrariam com salários menores do que os professores que estão trabalhando há 15 ou 20 anos, e que acumulam quinquênios, evolução funcional, entre outros benefícios. No caso das mulheres, ao invés da licença gestante de 6 meses, teriam apenas 3, como ocorre no INSS. Ou seja, o Estado economizaria mais dinheiro para dar aos empresários e banqueiros.

E o sindicato dos trabalhadores (APEOESP), dirigido pela mesma corrente sindical do presidente Lula não faz nada? Reproduzirei trechos do boletim do CR/RR.

“A grave crise internacional teve uma resposta tardia e insuficiente pelo governador José Serra. O Estado de São Paulo não investirá recurso a mais do que já estava previsto, apenas fará a antecipação da liberação de R$ 20,6 bilhões do Orçamento de 2009, para investimentos em infra-estrutura, que seriam executados ao longo no ano”. (pág.5)

E a central sindical (CUT) a qual está filiada a APEOESP, no mesmo boletim, tem um informe. Vejamos:

“ Desde o início da crise estabelecida, a Central pressionou o Governo Federal e os governadores estaduais por ampliação de crédito, redução de juros e dos spreads bancários e desonerações momentâneas e específicas para os setores mais atingidos pela crise, condicionadas a contrapartidas de emprego e manutenção da renda dos trabalhadores. (pág.9).

Vejam, caros colegas, que há a defesa descarada do uso do dinheiro público para atender os interesses dos capitalistas. A própria política educacional do Estado de São Paulo está em consonância com o PDE do governo Lula que institui também as avaliações.

Diante disso, é necessário impulsionar um processo de reorganização das lutas no setor de educação.

Além disso, é fundamental redobrar os esforços para envolver as demais categorias de trabalhadores na luta por uma educação de qualidade para os nossos filhos.

É necessário que nós trabalhadores tratemos a educação em todos os níveis, como um bem coletivo e um dos instrumentos de transformação social e espaço de produção de conhecimento e desenvolvimento humano.

Para isso, a luta por uma educação pública de qualidade sob o controle dos trabalhadores deve se combinar com a luta pela a derrubada do capitalismo e pela construção do Socialismo.

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Diplomacia e guerra: dois instrumentos de dominação do imperialismo

 

Desgaste dos estados unidos e competição imperialista

Os anos 2000 apresentaram uma novidade em relação aos anos 90: o neoliberalismo começa a perder sua força política. Os povos do mundo logo fizeram a experiência com essa política ditada por Washington e Londres e a rejeitaram, protagonizando mobilizações importantes como na Argentina, Equador, Bolívia, Venezuela e outros tantos países. Junto com essa perda de legitimidade do neoliberalismo, os Estados Unidos também perderam espaço no mundo com inúmeras manifestações de rechaço à sua política.

A perda de legitimidade do imperialismo estadunidense no mundo foi um fator importante que dificultou a implementação do projeto de dominação. Foram inúmeras dificuldades: América Latina com sucessivas rebeliões, Oriente Médio com uma feroz resistência à invasão tanto no Iraque como no Afeganistão e a rebelião dos Palestinos. Internamente, o imperialismo estadunidense também enfrentou resistências importantes que foram massificadas com a crise econômica.

O desgaste do governo Bush e a invasão a países como Iraque e Afeganistão só fizeram aumentar a oposição dos povos ao imperialismo estadunidense. Esse processo, em conjunto com as mobilizações de massas dos trabalhadores, sobretudo no continente americano, impôs limites para a política de Washington. É neste contexto que a eleição de Obama se explica: os Estados Unidos precisam mudar a sua aparência perante o mundo e se apresentar com um novo governo para recuperar o prestígio e conseguir impor sua política de dominação. A maneira de enfrentar o anti-estadunidismo é se colocar como algo novo e simular que houve mudança na política.

A atual crise econômica e a tendência à depressão também têm colocado graves problemas para as economias imperialistas, pois o seu mercado interno não é suficiente para o escoamento da produção, o que obriga cada um desses países a buscar uma maior presença no mercado mundial. Essa presença precisa ser garantida ou pelas vias diplomáticas ou pelas vias militares.

A crise de superprodução expressa uma contradição básica do capitalismo, que é o fato da capacidade de produção gerar um montante de mercadorias muito superior ao que pode ser consumido. O alto desenvolvimento de técnicas de produção faz com que esse problema se agrave, pois pode se produzir muito mais do que em qualquer outro tempo. É isso que basicamente ocorre na atual crise econômica, há uma restrição no mercado mundial.

Como um conjunto de países centrais tem uma enorme capacidade produtiva e o mercado mundial tem limites físicos (geográficos) e político-econômicos, inicia-se uma feroz competição entre os países imperialistas para ter o controle do comércio mundial. Essa competição é uma das chaves da situação política que a crise econômica fez emergir: os países imperialistas precisam (pelas leis do capitalismo) acelerar a competição e dominar a maior parte possível do comércio mundial.

A competição entre as grandes potências pode resultar em luta direta por mercados, como ocorreu nas duas guerras mundiais. Essas duas guerras não foram outra coisa senão uma disputa pela partilha do mundo, ou seja, aos vencedores caberia a maior fatia do mercado. A guerra em si torna-se também uma das soluções para a superação da crise no capitalismo, pois a destruição massiva de forças produtivas cria novas possibilidades para o mercado capitalista. Ao contrário do que dizem os analistas burgueses, a solução da crise de 1929 não ocorreu pelo new deal estadunidense ou qualquer outra política, mas sim pelo resultado da Segunda Guerra Mundial, que abriu imensas possibilidades para o capitalismo. Ou seja, a “era de ouro” do capitalismo dos anos 50 e 60 se deu às custas da morte de milhões de seres humanos.

Estados unidos se preparam para a competição

Nenhuma classe social é homogênea, há distintas frações em seu interior. A burguesia se divide como industrial, comercial, financeira e no interior de cada uma delas há outros setores e também outros interesses. No interior da burguesia industrial há, por exemplo, o setor ligado à indústria armamentista. Entre a burguesia de um país e de outro também há interesses distintos.

Nos momentos em que há uma certa estabilidade, esses diversos setores conseguem fazer uma partilha e amenizar as contradições, ou seja, mantém uma certa unidade. No entanto, quando há uma crise essa unidade fica mais instável e surgem as disputas em que um setor precisa derrotar o outro para sobreviver. Essa disputa ocorre, por exemplo, entre a burguesia industrial e financeira ou ainda entre empresas que produzem o mesmo tipo de produto, como eletrodomésticos. Nessas disputas a insanidade da burguesia se revela. A lógica de sobrevivência da burguesia ameaça o mundo.

A essa disputa soma-se outra questão, que é o aumento da capacidade de produção. É preciso criar um mercado consumidor que seja compatível com o volume de produção. Com a crise econômica em curso – não há ninguém que não reconheça que ela é profunda e muito próxima daquela registrada na década de 20/30 – a disputa entre os diversos setores da burguesia torna-se mais intensa.

É no contexto dessa profunda crise econômica que precisamos compreender o significado da política internacional dos Estados Unidos, sob o governo Obama. Os Estados Unidos sabem que precisarão usar nessa disputa as ações da diplomacia e a pressão sobre diversos governos para conseguir acordos que garantam livre acesso para o capital estadunidense.

E essa crise, pela sua profundidade, já colocou em movimento todos os países na disputa por novos mercados. O desgaste que os Estados Unidos sofreram na América Latina e no mundo fez com que perdessem espaço e se abrisse a oportunidade para outras potências imperialistas. A França e a Rússia, por exemplo, já realizaram importantes acordos comercias na América Latina, tradicional “reduto dos Estados Unidos”. Não é uma disputa que está começando, pois a invasão do Iraque e do Afeganistão na verdade já é parte dessa disputa pela ampliação dos mercados. Com o agravamento da crise o controle sobre matérias-primas como petróleo e gás são fundamentais para reduzir custos e melhorar a posição na disputa.

Já temos discutido com bastante insistência o fato de que a crise estrutural do capital é um elemento fundamental nessa competição imperialista, porque cada saída que o capital apresenta para a crise trás em si limites e novas contradições insolúveis. Uma solução em longo prazo para o imperialismo só é possível com uma guerra que destrua as forças produtivas, condição para um novo “boom” do capitalismo. Manifesta-se o caráter destrutivo do capitalismo, que para continuar existindo tem que matar milhões de pessoas.

Com qual política

As armas e formas de disputa sempre são uma questão em aberto, pois dependem essencialmente da correlação de forças entre esses setores da burguesia mundial e também entre o proletariado e a burguesia. Uma guerra, ainda mais quando envolve vários países, sempre é um risco para o capitalismo (ainda que se chegue a algum momento em que, na lógica capitalista, isso se torne impossível), pois há um desgaste do regime e o perigo de que o proletariado, como ocorreu na Rússia em 1917, a transforme em uma revolução socialista.

É por isso que, geralmente, o primeiro instrumento de pressão são as gestões diplomáticas, com todo tipo de pressão política e econômica (como imposição de cotas de importação, aumento de impostos para determinados produtos, etc), mas sempre visando impor o projeto de controle do país alvo. Nesse momento, o governo Obama tem utilizado muito esse instrumento, mas, repetimos, buscando por essas vias concretizar seus interesses. Isso não quer dizer que a via militar tenha sido abandonada, pelo contrário, ela é cada vez mais uma possibilidade. A diplomacia é uma política que se combina com a ação militar. O caráter militar é na verdade a característica central do imperialismo, ou seja, não há imperialismo sem poderio militar. Nas ações diplomáticas já está representado de maneira subliminar o poderio militar de cada país.

Na década de 30, portanto no período da depressão econômica, em um momento em que a Alemanha fazia uma forte ofensiva comercial para a região, os Estados Unidos lançaram para a América Latina a “política da boa vizinhança”, que consistia em ter como centro de suas relações com os países do continente americano as negociações diplomáticas. Ao contrário do discurso do governo estadunidense, essa política não representava uma mudança no conteúdo, mas tão somente na forma em que foram adotadas novas armas e novos mecanismos de pressão. O caso mais famoso foi a imposição de cotas de importação para o açúcar cubano, que era a única fonte de renda de Cuba e tinha os Estados Unidos como o principal cliente. Também se destaca o fato de que, quando a diplomacia não era suficiente para garantir a dominação, a tática militar entrava em ação, como foi a invasão da República Dominicana, e mais tarde da Baia dos Porcos em Cuba, assim como as dezenas de golpes militares que foram patrocinados pelos Estados Unidos.

Outro elemento que contesta a versão de que o novo governo estadunidense dá mais destaque para a diplomacia é a presença de forças militares de ocupação no Iraque e Afeganistão e sucessivos ataques militares a várias regiões do Paquistão. A promessa de redução de parte do contingente militar no Iraque não muda essa caracterização. Em primeiro lugar porque, pela ação militar, conseguiu-se constituir no Iraque um governo extremamente servil aos Estados Unidos. E segundo, no Afeganistão houve aumento do efetivo militar. O recente anúncio de que os Estados Unidos vão priorizar a ação política em relação ao Irã é outra balela, pois a simples presença de milhares de soldados nas fronteiras é na prática um elemento que desequilibra qualquer negociação.

Esses são apenas alguns dos elementos que comprovam que a diplomacia é apenas uma (e não a mais importante) das táticas utilizadas e que o aparato militar é elemento fundamental na política do governo Obama. A própria proposta de negociação com o Irã é mais uma jogada, pois como pode haver negociações com a presença de tanques, mísseis e milhares de soldados na fronteira?

O importante é compreendermos que a diplomacia na política dos Estados Unidos está a serviço de uma política de dominação do mundo e não de “formas respeitosas” de relação com outros países. As conferências entre Estados, as reuniões, os tratados, enfim toda a política da diplomacia dos Estados Unidos tem um objetivo muito bem definido que é submeter outros países aos seus interesses.

Não pode restar nenhuma dúvida para os trabalhadores de que a principal política do governo Obama, assim como foi de Bush, é a política belicista. A diplomacia é parte dessa política de expansão dos seus domínios, é um complemento da força bélica.

O poder militar dos estados imperialistas

Não é possível falar de Estados imperialistas sem falar de poder bélico. Toda crise provoca um acirramento na disputa pelo mercado mundial, em que o avanço de um significa que o outro tem que recuar. Daí a importância do poder bélico, que é, em última instância, o que decide a correlação de forças em nível mundial.

Nenhuma crise do capital, ainda mais as parecidas com a atual, é resolvida no âmbito da política ou da economia, instrumentos que permitem no máximo adiá-las. Uma característica do conceito de crise estrutural é que sua solução (ainda que pela própria lógica do capital outras crises sempre virão) passa por impor uma derrota histórica ao proletariado mundial, submetendo-o a um regime de trabalho baseado na superexploração em escala mundial. Essa correlação de forças só pode ser alcançada com uma guerra generalizada.

O poder e o forte armamento dos Estados imperialistas visam assim pelo menos três objetivos, que são a manutenção de seu poder na relação com outros Estados, o controle do proletariado e a preparação para possíveis conflitos armados, que são fatos comuns na sociedade capitalista. As disputas políticas e econômicas não raro se resolvem militarmente. Assim, a indústria militar passa a ter nesses países um papel central também na esfera da política.

A relação dos governos com a indústria de armas é tanto econômica como política. É econômica porque são os Estados – que detém o monopólio das armas – que sustentam esse ramo da indústria capitalista. E é política porque a indústria de armas é quem muitas vezes impõe posições belicistas aos Estados. Para se ter idéia da relação orgânica entre Estado e indústria bélica, nos Estados Unidos o Pentágono tem escritório permanente dentro das empresas bélicas, ou seja, funcionários do Estado trabalham dentro das empresas. Também é comum que oficiais de alta patente das forças armadas, quando se aposentam, passem a ocupar postos de direção nas empresas bélicas.

Nessa perspectiva, os Estados têm verdadeiros arsenais de destruição, capazes de jogar pelos ares cada grão de areia que existe no mundo. Na economia capitalista a produção só se efetiva se houver consumo, e como o consumo de armas depende de guerras, torna-se fundamental para a sobrevivência econômica dessa indústria a existência de guerras.

O poder militar dos Estados Unidos

Como sempre o discurso é um e a prática é outra. Os dados desmentem facilmente o discurso mentiroso de Obama. Os países imperialistas, em especial os Estados Unidos, são verdadeiras máquinas de guerra. O anúncio do orçamento dos Estados Unidos para o ano fiscal de 2010 (que se inicia em outubro) é uma demonstração cabal, uma vez que destina nada menos do que 664 bilhões de dólares para os gastos militares.

O exército dos Estados Unidos é formado por cerca de três milhões de homens e mulheres, o que representa 1,5% da população dos EUA. Segundo o jornal Brasil de Fato, os Estados Unidos possuem 725 bases militares espalhadas pelo mundo e por volta de 500 mil soldados servindo fora de suas fronteiras, sem falar nos que estão no Iraque e no Afeganistão. As despesas militares passaram de 345 bilhões de dólares em 2001 para 528,7 bilhões em 2006, e agora os recém-anunciados 664 bilhões. Os gastos militares desse país são tão gigantescos que correspondem a 45% de todos os gastos militares do mundo.

Por trás dessa política de Estado (que já é condenável) estão as bilionárias empresas da indústria bélica. Das dez empresas líderes do setor no mundo, seis são estadunidenses. São cerca de 3% do PIB destinados para a defesa. Após a invasão do Iraque e Afeganistão, empresas como Am General, Armor Holdings e Oshkosh Truck, que fornecem veículos militares, aumentaram seus faturamentos em 40%. O controle das empresas é tamanho que várias áreas das forças armadas foram privatizadas, como a administração dos quartéis, sua segurança, abastecimento, etc. Isso sem falar na investidura de funções militares para as milícias. O seu poder não é só econômico, é sobretudo político, com influência em cargos importantes na hierarquia de decisões de Estado.

Com esses dados é possível destacar duas questões fundamentais: a primeira é que a política belicista não é deste ou daquele governo, mas é uma política de Estado e isso significa que Obama vai continuar com a política belicista de Bush. O diferencial é que no governo Obama a diplomacia ganha mais peso, mas como já dissemos, não substitui, e sim reforça a ação militar sobre os povos do mundo. A segunda questão é que esse mesmo Estado está sob controle das empresas do setor de armas e conseqüentemente todas as decisões dos governantes atendem a esses interesses.

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Crise expõe barbárie capitalista: avanço da xenofobia

 A mobilidade do trabalho, ou dos trabalhadores de um lugar para outro no intuito de ocupar postos de trabalho, em razão da escassez destes ou por conta de melhores condições no trabalho e de rendimentos maiores, provoca grandes êxodos, entre regiões localizadas em um mesmo país ou internacionais.

Esse deslocamento em massa provoca conseqüentemente o aumento da densidade populacional nos locais de destino desses trabalhadores e também a elevação da competição entre os próprios trabalhadores. Esse processo em última instância é interessante aos detentores dos meios de produção e aos tomadores de serviço na medida em que se amplia quantitativamente o exército industrial de reserva, gerando a diminuição do valor dos salários.

Como desdobramento desse fenômeno, também ocorre nesses lugares de destino o aumento do desemprego e da precarização das condições de vida dos trabalhadores de um modo geral, seja por conta de uma super ocupação combinada com a despreocupação dos Estados em construir infra-estrutura para readequar o espaço urbano a sua nova dimensão populacional. Essa massa humana em deslocamento acaba sendo segregada em locais desfavoráveis do ponto de serviços públicos, nas periferias das cidades, constituindo grandes bolsões de pobreza e miséria, como as favelas ou bairros degradados. Sendo que esse estado de déficit habitacional é apropriado mercadologicamente pelos empresários do setor imobiliário para especular e construir moradias, por meio de subsídios estatais ou de financiamentos públicos, moradias as quais são construídas nesses lugares distantes ou em outros tão desfavoráveis para o deslocamento aos centros urbanos quanto os lugares de favelização. Inclusive, nos Estados Unidos, a crise do setor imobiliário afetou os trabalhadores pobres mutuários que perderam as casas, hipotecadas como garantia de pagamento, e quanto a essa questão em particular, o geógrafo norte americano David Harvey, em entrevista concedida a revista Le Monde Diplomatique Brasil do mês de março de 2009, explica que:

 “a estrutura da crise financeira nos Estados Unidos é notadamente urbana no que diz respeito a suas origens. E é justamente essa relação que eu considero importante a analisar. Um dos resultados da crise é que cerca de 3 milhões de pessoas perderam suas casa nos Estados Unidos no último ano. Provavelmente, antes que esse processo termine, entre 6 e 10 milhões de pessoas estarão na mesma situação. Se observarmos onde isso aconteceu, a onda inicial de inadimplência ocorreu em duas áreas específicas: uma delas, as velhas cidades dos Estados Unidos, como Cleveland, Baltimore e Detroit; a outra coincide com a distribuição da população negra. Na realidade, tivemos o que podemos chamar de um Katrina financeiro, que atingiu todas as cidades, simplesmente varrendo do mapa os bairros pobres em municípios como Cleveland e Baltimore. Em Cleveland ocorre uma sobreposição perfeita entre bairros ocupados por afro-americanos e os lugares onde estão o maior número de pessoas que perderam suas casas por causa das execuções hipotecárias”

Esses bairros pobres a que se refere David Harvy são ocupados principalmente por imigrantes de origem latino-americana e de regiões pobres do oriente e da Europa, que serão lançados em estado de maior degradação humana.

Esse movimento de mobilização humana tem provocado o descontentamento de setores da extrema-direita, que, não de hoje, perseguem e procedem a assassinatos de imigrantes, como, por exemplo, o movimento contra o negro e o latino-americano nos Estados Unidos, que ganha coro junto com o movimento da Lei e Ordem, de cunho nitidamente fascista. E esse processo da crise econômica mundial, que se encontra em aprofundamento e que já colocou a economia mundial em recessão, está gerando aumento vertiginoso dos índices de desemprego no mundo todo, a começar pelos centros do capitalismo. Então, os imigrantes, que já são alvo de políticas de extermínio, passam a ser entendidos por parte dos trabalhadores demitidos, que são obrigados a disputarem postos de trabalho mais precarizados, como inimigos, desconsiderando categoricamente o aspecto de classe e possibilitando as condições para disputas violentas entre os próprios trabalhadores. Esse fenômeno ideológico e medonho é apropriado pelos setores da ultradireita, que tentam catalisar essa relação destrutiva. Por isso, verifica-se, não apenas nos Estados Unidos, mas também na Europa, o avanço da xenofobia, inclusive estatal, que se manifesta por meio de políticas de barreira nas divisas contra a imigração, o não fornecimento de vistos e as perseguições policiais. Exemplos disso são o vergonhoso muro que separa a divisa entre os Estados Unidos e o México, em cujo lado americano existem mercenários que literalmente caçam imigrantes e criam uma rede de corrupção para permitir a entrada de alguns, e os assassinatos de latino americanos em países europeus pela própria polícia, sob o argumento de que seriam criminosos ou suspeitos. Portanto, a crise tem acentuado o deslocamento do trabalho para países mais industrializados e confrontado isso com o desemprego nestes países.

Nesse cenário, os Estados europeus ocidentais têm hostilizado os imigrantes provenientes da África, América, Oriente Médio e, sobretudo, do leste europeu. A crise já impactou com grande intensidade os países do leste europeu, de tal forma que alguns países como a Letônia passam situação de instabilidade política no governo em razão do desemprego e da falta de medidas eficientes para a sua contenção, que levou o então primeiro ministro a renunciar em 20 de fevereiro de 2009. Na Ucrânia a crise causou a diminuição da exportação de aço e o endividamento do Estado tem dificultado medidas de intervenção na economia. Isso tudo provocou êxodos imigratórios em direção aos países da Zona do Euro, os quais estão aplicando medidas para dificultar esse movimento. O Estado Alemão tem assumido forte intenção de impedir a imigração e em abril de 2009 pretende discutir uma lei que proibirá a concessão de vistos para imigrantes de cerca de 8 (oito) países do leste europeu. Na mesma direção, a Holanda também tem dificultado os fluxos imigratórios.

Recentemente, a Europa foi palco de fortes insurgências relacionadas com o desemprego e a questão da imigração. O ano de 2008 na França foi marcado por violentas manifestações de imigrantes, africanos na maioria. Esses imigrantes criticavam a política do governo Sarkozy de expulsar imigrantes ilegais e exigia a legalização e também apontava o forte nível de desemprego, sendo as manifestações duramente reprimidas pela polícia francesa. Paris tornou-se um campo de guerra urbana. Contudo esse movimento dos imigrantes africanos pela legalização não se iniciou em 2008, já em outubro de 2005 foram travados violentos enfrentamentos com a polícia, que foram deflagrados após dois jovens imigrantes morreram eletrocutados durante perseguição empreendida pela polícia. É, portanto, nítida a postura xenofóbica do Estado francês, a qual continua sendo conduzida pelo governo Sarkozy, que deverá, inclusive, ser fortalecida diante da crise econômica. Além disso, na Grécia também ocorreram enfrentamentos em dezembro de 2008, organizados principalmente por anarquistas em conjunto com organizações da esquerda, sendo que a maioria dos manifestantes era de estudantes que ocuparam diversos prédios públicos e procederam a fortes manifestações de rua. O poder público grego adotou, não de agora, uma política endurecida contra as manifestações populares e contra os imigrantes, por meio da criminalização dos movimentos sociais e por investidas contra imigrantes ilegais, resultando, inclusive em mortes não esclarecidas pela polícia e também marcadas por absolvições, criando certa dose de crise nas instituições do Estado, sobretudo o Judiciário. Tanto que as grandes manifestações de dezembro de 2008 foram iniciadas após o assassinato pela polícia do estudante Alex Grigoropoulos , em 6 de dezembro. Após esse fato, estudantes invadiram as ruas de diversas cidades gregas, dentre as quais, Atenas, Salônica, Patras, Larissa, Iraklion, Chania (Creta), Ioannina, Volos, Kozani, Komotine. A propósito, em Petras ocorreu um ataque violento de radicais de direita contra a sede de uma organização política de imigrantes, tendo sido lançada uma bomba contra a janela do prédio em que se encontravam os militantes, durantes a realização de uma reunião.

Esses fenômenos de levantes populares, incluindo os imigrantes segregados e perseguidos pelos aparelhos de repressão estatais, não estão assumindo maiores dimensões por acaso, sendo eles conseqüências diretas da crise estrutural do capital que tem provocando o aumento do desemprego e a precarização das condições de trabalho e de vida do proletariado no mundo todo e nesse cenário os imigrantes são parte dos setores mais explorados e expropriados pela burguesia, e cuja situação civil os coloca em posição de extrema precariedade no tocante aos direitos sociais. A crise econômica em curso acentuará a xenofobia e os partidos de direita já estão utilizando isso para aumentar a hostilização em relação aos imigrantes e, principalmente, para dividir os setores da classe trabalhadora e dificultar sua organização para a luta contra o capital.

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150 anos do darwinismo: a evolução entre o mito e a ciência

Daniel M. Delfino

 A história da evolução

Nas épocas históricas de grandes mudanças sociais as classes revolucionárias se apoiam na força da razão para o combate ideológico contra os mitos que constituem o arcabouço do pensamento das classes dominantes, parte do combate político geral. Assim fez a burguesia na sua multissecular luta revolucionária e humanista contra a nobreza e o clero. Ao longo dessa luta, alguns marcos se destacam. O primeiro é a descoberta de homens como Copérnico, Bruno, Kepler, Galileu e Newton de que a Terra não é o centro do universo, mas apenas mais um planeta gravitando em torno do sol num universo infinito. O segundo marco foi a descoberta por Darwin de que as espécies animais evoluem pela seleção natural dos mais aptos, de modo que a origem do homem pode ser remontada até seus ancestrais primatas (e no limite, até as bactérias que foram a primeira forma de toda a vida no planeta). Um terceiro marco seria a descoberta do inconsciente por Freud, mas em circunstâncias históricas e ideológicas já alteradas.

A descoberta de Darwin foi publicada no livro “A origem das espécies”, cujo lançamento está completando 150 anos (em 12/02/2009 comemoraram-se os 200 anos de nascimento do próprio Darwin). A teoria da evolução já havia sido elaborada pelo naturalista inglês em 1839, no retorno de uma viagem marítima que se iniciara em 1835, e que teve entre outros destinos o Brasil e as ilhas Galápagos, no litoral do Equador. Mas a teoria permaneceu inédita, pelo receio do próprio autor de chocar a sociedade com uma novidade tão radical.

Em 1858, Darwin recebe uma correspondência de outro cientista inglês, Alfred Russel Wallace, em que este apresenta uma teoria idêntica à sua a respeito da seleção natural. Escrupulosamente, Darwin apresenta as duas teorias à comunidade científica, reconhecendo o papel de Wallace. E somente no ano seguinte publica seu livro, que teve estrondosa repercussão. Assim, Darwin passaria à história como pai do evolucionismo em biologia.

“A origem das espécies” dizia basicamente que a natureza seleciona os organismos mais adaptados a sobreviver em determinado ambiente, de modo que estes organismos transmitem suas características aos seus descendentes, terminando por constituir uma espécie em separado. O mecanismo pelo qual os organismos desenvolvem adaptações (mutação) e transmitem suas características (DNA), somente seria descoberto no século XX, com o avanço da genética, e veio confirmar a intuição genial de Darwin.

A mitologia social burguesa

O destino da teoria de Darwin seria mais um exemplo do fenômeno pelo qual “a ciência destrói mitos e coloca outros em seu lugar”. O evolucionismo destruiu os mitos de que as formas de vida foram criadas por Deus tais como existem hoje e de que o homem foi criado “à imagem e semelhança” do próprio Deus. Entretanto, o conceito de evolução acabou sendo parte do arsenal ideológico que justifica a posição de classe dominante da burguesia.

A ascensão da burguesia como classe é indissociável da ascensão do modo de produção capitalista. O capitalismo tem um papel histórico progressivo (reconhecido por Marx no “Manifesto”) de romper a estreiteza das relações sociais feudais e arcaicas, lançando as bases materiais para a luta da moderna classe trabalhadora por sua emancipação. Por outro lado, o capitalismo aprisiona o homem em relações sociais tais que a sua condição de sujeito se reverte em mero objeto do processo de reprodução ampliada do valor econômico.

As relações sociais capitalistas requerem um arsenal ideológico de justificação, uma mitologia social que se baseia no individualismo. Os pensadores burgueses, de Hobbes e Locke a Adam Smith, tomaram a condição do burguês inglês dos séculos XVII e XVIII e generalizaram essa condição como sendo a “natureza humana” em geral, em todos os lugares e em todas as épocas. Inventaram a lenda da “guerra de todos contra todos” no “estado de natureza” e a necessidade da invenção do Estado dotado do monopólio da força para proteger a propriedade privada “adquirida pelo trabalho” (na verdade, trabalho alheio), que culmina na estapafúrdia afirmação de que a busca de cada um pelos seus interesses individuais resulta “automaticamente” no bem coletivo, por obra da “mão invisível”.

Competição na natureza e na sociedade

Tais mitos são a base do direito burguês e do Estado moderno, a lógica com a qual os indivíduos explicam a si mesmos a vigência das relações capitalistas, da concorrência, do “livre mercado”, etc. Essas idéias já eram comuns no tempo de Darwin. Na verdade, Darwin se inspirou em Malthus, epígono vulgar dos economistas clássicos, para encontrar na natureza o fenômeno da luta pela sobrevivência. Malthus foi o autor da idéia de que a população cresce mais do que os recursos necessários para sua sobrevivência, de modo que a humanidade estaria condenada a uma luta permanente contra a escassez.

A competição, idéia motriz da sociedade burguesa, serviu de inspiração para que Darwin identificasse a luta pela sobrevivência no mundo natural. A descoberta de Darwin é verdadeira, mas a inspiração de onde ele partiu é falsa. A luta pela sobrevivência existe na natureza como um fato dado, um ponto de partida. Mas a competição na sociedade humana tem causas humanas, sociais e históricas, não naturais. A competição entre os homens não tem a ver com uma suposta “natureza humana egoísta”, mas com a divisão da sociedade em classes, um fenômeno histórico e transitório.

A teoria malthusiana se provou objetivamente falsa, pois tanto a escassez com que se depara a maior parte da humanidade, os trabalhadores, quanto a abundância de que desfruta a minoria, a burguesia, não são dados fixos absolutos e a-históricos, mas relativos, artificiais. Não existe escassez de recursos ou subcapacidade produtiva na sociedade. Ao contrário, existe a irracionalidade das relações sociais capitalistas, que condenam a humanidade a crises econômicas periódicas nos momentos em que as forças produtivas não podem ser colocadas em movimento de modo lucrativo. A miséria caminha lado a lado com a superprodução, pois a atividade produtiva não está colocada a serviço das necessidades humanas e sim do lucro. O problema está, portanto, na lógica capitalista de apropriação privada da produção coletiva.

O mito do progresso e a evolução

Sob pretexto da luta contra a escassez, mas na verdade tendo como objetivo a multiplicação do lucro e a reprodução ampliada do capital, a burguesia está permanentemente obrigada a desenvolver as forças produtivas. O aumento quantitativo da produção é o motor secreto de toda a vida social capitalista, que se alimenta da incorporação de inovações tecnológicas, que por sua vez exigem um avanço constante do conhecimento científico.

Em nome desse mecanismo, o aumento da produção passou a ser sinônimo de progresso. E o progresso passou a ser o objetivo de todas as sociedades. A ideologia burguesa do progresso desconsidera completamente a capacidade da natureza de suportar as intervenções humanas, com as catastróficas conseqüências ambientais com as quais nos defrontamos hoje.

O impulso para o progresso é outro mito social burguês que contamina a compreensão da realidade, a tal ponto de ter sido incorporado pelas próprias ciências naturais. A evolução passou a ser compreendida como um valor moral, sinônimo de melhoria. O processo de evolução, um mecanismo cego e aleatório, que consiste simplesmente no fato de que as espécies animais se adaptam ao seu ambiente, passou a ser tratado como evidência de progresso no sentido burguês, como se houvesse um objetivo previamente traçado para a transformação das espécies animais em seres superiores.

Darwinismo social e imperialismo

Repõe-se assim disfarçadamente o mito da divindade do homem, como se a evolução natural tivesse como objetivo produzir o homem. E dentre os homens, naturalmente, os vencedores e os vencidos. A burguesia seria a classe social dominante porque estaria composta dos indivíduos mais aptos. Da mesma forma os povos europeus teriam o direito de conquistar as raças bárbaras da África, Ásia e América pois seriam superiores. As diferenças históricas entre as classes e os povos, os processos de dominação pela força, etc., foram grosseiramente apagados da história por essa grotesca teoria do “darwinismo social”.

As conseqüências mais trágicas do darwinismo social foram vivenciadas no século XX, quando, em nome do triunfo da “raça ariana”, os nazistas perpetraram o extermínio de milhões de judeus. O projeto de eugenia, ou melhoramento da raça, realizado pelos nazistas é o mais dantesco corolário do darwinismo social. Desde então os adeptos desse pensamento foram forçados a disfarçar um pouco as conexões abusivas que fazem entre teorias da natureza e da sociedade.

Entretanto, tais teorias continuam despontando, como aquela que foi formulada na década de 1970 segundo a qual o único objetivo dos seres vivos é transmitir seus genes. Todo o comportamento animal (e humano) seria explicado por um instinto que o obriga a difundir seus genes. A teoria do “gene egoísta”, transforma um instrumento, os genes, em causa de todo o processo, justamente porque não contempla a perspectiva da totalidade do processo.

História natural e emancipação humana

As diferenças e semelhanças entre a história natural e a história social só podem ser compreendidas na moldura de uma lógica dialética, que explica a continuidade na descontinuidade e a descontinuidade na continuidade. O homem rompeu com a natureza e ao mesmo tempo continuou sendo parte dela. As duas esferas preservam sua ligação e ao mesmo tempo sua especificidade, sua lógica própria, que não pode ser transposta de uma esfera à outra.

A luta pela sobrevivência na natureza não é feita apenas de competição entre os organismos, mas de cooperação e mutualismo, tão abundantes quanto à sobrevivência do mais apto. É falso transpor o individualismo liberal burguês para a história natural, assim como é falso explicar as diferenças sociais por causas naturais. Na história humana, a cooperação e o coletivismo são fenômenos presentes durante milênios, muito mais disseminados que a competição, a qual é típica apenas da época capitalista.

A burguesia enquanto classe é incapaz de desenvolver essa compreensão abrangente da história natural e social. Ao mesmo tempo em que necessita da ciência, a burguesia precisa distorcê-la, fragmentá-la, transformá-la em conhecimento altamente especializado de partes limitadas do real, impedindo uma visão da totalidade. Por negar a compreensão da realidade como um todo, a burguesia acaba repondo a necessidade do mito. Nos Estados Unidos há uma intensa luta de setores religiosos para impor o ensino do criacionismo nas escolas, negando a evolução e defendendo a existência de um “desenho inteligente” na natureza, que só poderia ser obra de um criador.

A sociedade que desenvolve ao máximo a ciência é a mesma que reproduz o obscurantismo religioso. A causa dessa contradição está na divisão social do trabalho e na existência de uma classe dominante que vive às custas do trabalho alheio. O homem somente será livre dessa dominação quando se tornar senhor do seu trabalho, do qual atualmente é escravo. Foi a partir do trabalho que os primatas evoluíram para humanos, quando gradualmente seu corpo, suas mãos, seu cérebro, sua mente, se converteram em instrumentos altamente sofisticados. A evolução dos primatas até se tornarem humanos é explicável no quadro da teoria da evolução descoberta por Darwin. A transformação do homem em efetivamente humano só é realizável por meio da teoria marxista da emancipação do trabalho.

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